Centenário

6 POEMAS DE
José Augusto Seabra

(Do livro "Poemas do Nome de Deus" editado pelo Instituto Cultural de Macau)

DO NOME

    De vir chegando, ao longo de ficar
    mais perto do partir, atravessando
    o lugar infinito de não estar
    na presença a fugir do onde ou quando
    que é só pura memória de chegar, 
    eis quase no horizonte o sinal pando
    a tremular ao sol de nau em nau: 
    o teu nome sem nome, ó Deus, Macau. 

DA ROSA

    Da rosa do oriente
    deixaste-me o perfume
    e a cor evanescente
    do sangue e do ciúme. 
    
    Ficou só o momento
    de florir por engano
    num verso muito lento
    de Camilo Pessanha. 
    
    Num verso e no reverso
    do Cruzeiro do Sul
    escrito do avesso
    
    do sangue e do perfume, 
    do norte e do oriente, 
    da rosa e do ciúme. 

DAS RUÍNAS

    Arde o infinito
    no altar de Paulo
    pelo céu aflito
    a rasar as chamas
    voando num grito
    da fachada alta: 
    a última epístola
    lida pela alma
    da pátria. Tão tarde
    para a eternidade? 

DO JARDIM

    Debruçada no lago a mente pênsil
    curvava-se ao silêncio da folhagem
    com seus olhos de fénix fixos entre
    a ternura dos lótus e a miragem
    duma porta lunar ensombrecendo. 
    Era a hora da flor fluindo ágil
    nas ruínas das águas transparentes. 

DAS SETE LUAS

"i é a nota da sétima lua"(trad. do Chinês por Camilo Pessanha)

    Lua, mínima lua, lua à míngua
    de lua, lua amiga, lua exígua: 
    ao crescente do exílio tão ambígua
    entre sílaba e luz, ó lua língua. 

DA PROFECIA

"Um ancorar puríssimo, encantado, num Oriente mais anunciador..."(António Patrício)

    Quando só formos
    a vela alta
    e diluída
    sem mastro nem
    flâmula ardendo, 
    que âncora ainda
    anunciará
    na desmemória
    outro Oriente? 
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