História

A DIPLOMACIA DE D. JOÃO V NO EXTREMO ORIENTE

Benjamim Videira Pires, S. J.*

Introdução

Não subscrevemos a crítica deprimente da década de 1870, com Oliveira Martins à frente, contra a História de Portugal e os reis da última dinastia.

Pelo contrário, fazemos coro com Alexandre Herculano, o Visconde de Santarém, Jaime Co rtesão, A. G. Matoso (1) e Veríssimo Serrão (2) - para só enumerarmos alguns do s maiores historiadores -, julgando que, em conjunto, no nosso Império de Além-Mar, embora tivéssemos perdido, no Oriente, durante o cativeiro dos Fili-pes de Espanha ou pouco depois, territórios importantes como Ormuz, Malaca, Molucas e Ceilão, reconquistámos, dilatámos e solidificá mos a parte melhor deles, no Brasil, na África e até no Oriente.

Assim, iniciámos a penetração no interior de Moçambique; ganhámos pé em Mada gáscar; o imperador mogor cedeu-nos Pondá e enviou-nos uma embaixada; o marquês de Cast elo Novo (1741-1746) triplicou a superfície do território de Goa com as "Novas Conquistas"; aproximámo--nos diplomaticamente da Pérsia; e entre o imperador da China, Kang-si (1662-1722), o senhor da Cochinchina, Nguyen Phuóc Chu ou Minh Vuong (1691-1725), e D. João V, permutaram-se faustosas embaixadas.

Macau era a nossa mais longínqua e isolada possessão e urgia manter e aumentar a sua influência comercial e cultural, no estratégico e rico Sueste Asiático, que é o pesc oço entre o sub-con-tinente da Índia e os dois colossos, China e Japão.

O príncipe D. Pedro, durante a incapacidade de D. Afonso VI, enviara já um embaixador extraordinário à corte de Pequim (1667-1670) - a primeira missão oficial de Portugal à China, depois das malogradas de Tomé Pires (1521), Gil de Góis (1564) e outras (3).

O "Magnânimo" continuou esta acertada política e despachou duas missões ao Celeste Império e uma à Cochinchina. As duas legações enviadas à China chinesa, a saber, a d o P.e António de Magalhães, S. J. (1721-1722) e a de Alexandre Metelo de Sousa e Meneses (1726-1727), foram estudadas e publicadas, com dados suficientes, respectivamente pelo Dr. João de Deus Ramos, em comunicação de Abril de 1988 à Academia Portuguesa de Hist ória (4), e por Júdice Biker na sua Collecção de Tratados e Concertos de Pazes & c, Tomo VI, e na sua Memória sobre o Estabelecimento de Macau, Lisboa, 1876.

Por isso, só vamos estudar, neste artigo, a embaixada da Cochinchina, por ser mais des conhecida e apresentar determinados pontos comuns com a recente intervenção norte-american a no Vietname.

Vejamos o que era a Cochinchina, a sua situação política e comercial, as relaçõe s com Macau e os dois intervenientes, na embaixada: o referido "rei" anamita e a pessoa do em baixador, o jesuíta aragonês, P.e Juán Antonio Arnedo. Principiamos pela biog rafia do último.

O Embaixador

O Padre Juán Antonio Arnedo nasceu com a Primavera, aos 21 de Março de 1660, em Fara ro-na, no reino de Aragão, já unido a Castela. Entrou na Companhia de Jesus aos 13 de Jun ho de 1674, em Saragoça.

Embarcou para o Oriente, via Lisboa, em 1 de Abril de 1684, chegando a Macau três anos mais tarde. Seguiu logo para a Missão da China, trabalhando em Cantão (1 de Outubro de 1687) e na Província de Kiang-si até, pelo menos, 1691. Regressado a Macau, ensinou Teologia, du\-rante um ano, na Universidade da Madre de Deus (S. Paulo).

Cerca de 1693 (5) foi enviado à Cochinchi-na, suavizando a perseguição que Nguyên Phuóc--Tan (falecido em 1691) suscitara. De facto, o suces\-sor deste monarca, Min h Vuong ou Nguyên Phuóc-Chu (1691-1725) estimou sempre muito os talentos do P.e Arnedo e livrou-o de todas as ve-xações.

Em 1695, Arnedo predisse com exactidão um eclipse do sol e, por isso, foi imediatamente nomeado matemático da corte, Comissário do rei para as mercadorias que comprava à China e à Batávia e Terceiro Redactor do Calendário ofi-cial. Os missionários estrangeiros, assim, não lhe podiam imputar as superstições que nele saíam publicadas.

O P.e Arnedo estabeleceu-se em Tho-Duc, junto à igreja da N.a S.ra da Conceição, proprie\-dade de Clemente da Cruz (filho do Fundidor Régio, Jo ão da Cruz) que sucedeu ao pai no ofí-cio, nas honras e valimento.

Arnedo foi ainda superior da Missão dos Je\-suítas na Cochinchina, em 1701, 1708, 1712 e 1714.

Conservam-se de Arnedo uma carta escrita de Sinoa ou Hué, "capital da Cochinchina", com a data de 31 de Julho de 1700, na qual refere mui-tos pormenores da dita perseguição e outros do\-cumentos relativos às suas embaixadas a Macau, a Goa e a Portugal. O velho núcleo do Le al Senado conserva bastante desse material que vamos utili\-zar nesta monografia.

O P.e Arnedo faleceu de febres, dobrado o Cabo da Boa Esperança, aos 22 de Ma rço de 1715, confiando ao seu ajudante, Padre Manuel Botelho, a carta credencial de Minh Vuong e os outros papéis que levava a D. João V.

É o caso de dizer, ao gosto oriental: "Ar-nedo plantou a árvore e outros sentaram-se à sua sombra".

A formação da Indochina

Desde a Pré-História (cultura hoabinhiana do paleolítico retardado, bacs oniana do proto--neolítico e dongsoniana do neolítico), a Penín-sula da Indo china é um lugar de encontro, mas nem sempre de miscigenação, de grupos étnicos e cul turais diversos. Exemplifica a migração para o sul, onde estão as planícies férteis dos grandes rios e das matérias-primas, empurrada pelos chi-nas unificados por Ts'sin Che-huang-ti (224 a. C.) e pelos genuínos Hans (202 a. C. - 220 d. C.). Na raça e na língua, o povo ficou afim do chinês, que ocupou a terra durante dez séculos.

Ganhou identidade com a dinastia propriamente vietnamita Lê (1010-1224), a mais import ante, mas, no reinado de Lê Chieu-tong (1516--1526), o poder régio enfraquecçu, perante as ri\-validades entre as três famílias influentes do País: Mac, Trinh e Nguyên.

Em 1591, Trinh Tung destroçou os Mac, no delta do Rio Vermelho, e reinstalou a dinastia Lê, na sua capital Hanói (Thang-long), em 1592.

A partir de 1660, o Tonquim reconhecia a autoridade dos Trinh e a Cochinchina, no sul, era dominada pelos Nguyên. Ao princípio, o rio Song Gianh e, em 1630-1631, a muralha de Dong H oi eram a fronteira.

De 1620 a 1673, decorreu a luta entre as duas partes do Vietname. Os portugueses e os hol andeses ajudaram os Nguyên. A esta guerra seguiu--se uma trégua de um século (1674-1774), durante a qual os Trinh acabaram por despojar os Lê de todo o poder real e os Nguyên alar garam o terri\-tório para o sul, à custa de Champa, composta de restos dos antigos estados indianizados de Funam e Lin-yi, que continuaram a vegetar na região de Phan-ri e do Camboja (6).

No período que nos diz respeito (século XVII e três primeiras décadas do século XVIII), os senhores Nguyên tinham por capital Hué e, às vezes, Cacham (a actual Quáng Nam), a 7 ou 8 léguas de Tourane. As províncias do reino eram, acontar do Norte: 3 quartos de Quáng Binh, Quáng Tri, Thúa Thiên, Quáng Nam (ou Cacham), Quáng Ngai e as pro víncias da antiga Champa, no delta do Mekong, conquistadas por Hien Vuong ou Nguyên Phúc -Tan (1648-1687), como vamos ver.

O centro internacional mais importante da Cochinchina (e assim de todo o Vietname de então) era Faifó, na costa, onde habitava uma rica colónia japonesa e que distava apenas 6 ou 4 léguas de Tourane (a actual Danang, onde os norte--americanos possuíram uma grande base aer o-na-val).

Em meados de 1524, aportou a essa costa Duarte Coelho, e aí deixou um padrão gravado nu m rochedo. Em 1540, mantínhamos já relações comerciais com a sultana de Patáni, com o Camboja e a Cochinchina, no dizer de Fernão Mendes Pinto, que aqui voltou em 1555 e onde viu o padrão de Coelho.

O comércio com a Cochinchina era mais livre e aberto do que com o Japão, embora não tão lucrativo, pois ainda não dispunha das matérias--primas de hoje: estanho, borracha, etc..

Os melhores produtos da Cochinchina eram a águila ou pau-água (aromática), da qual a ca-lamba é a melhor qualidade, e que constituía monopólio real; e ainda benjoim, ébano, açúcar, várias espécies de almíscar, cinamomo, pimenta da Samatra, arroz e ninhos de andorinha dos Par-céis.

Importavam-se, para o porto franco de Faió, rubis, pérolas (mercadoria que os eunucos dos imperadores da China, sobretudo, procuravam avidamente), fazendas, ouro, caixaria, sedas e m bruto e tratadas, canhões de Macau, secomilhas, azougue, vermelhão, pau da China, alcati fas, cangas de algodão, nunos de linho, louças e porcelanas, chumbo, enxofre, salpetre, ch á, papel, cobre e prata do Japão.

Com a quebra do comércio entre Macau e o Japão, decretada pelos xoguns Tokugawa s em 1639, os macaenses e os chineses buscaram e acharam outras alternativas para as suas tran sac-ções. As principais foram Faifó e Hanoi, Manila (viagem interrompida dois anos, em vi rtude da restauração de Portugal, proclamada na Cidade do Nome de Deus em 1642) e Macassar, na ponta ocidental da ilha Celebes (Sulawesi).

Os Cochinchineses levavam a Faifó os seus produtos, a China e Macau os seus, e os japoneses inundavam de prata e cobre esse mercado. De resto, o país achava-se aberto a todos os comerciantes estrangeiros.

A cidade formigava de gente de todas as raças e os próprios anamitas eram aí numer osos. A maioria, porém, da população compunha-se de chineses e japoneses, que tinham os seus bairros separados na cidade e viviam segundo as suas leis e costumes nacionais (7).

Apesar do chorudo negócio, que compensou Macau, durante longos anos, da perda do empór io de Nagasáqui, a avidez dos príncipes e mandarins, que reduziam ao mínimo os lucros dos comerciantes (a história dos Hong, mais tarde, em Cantão), a parte insignificante q ue a arraia miúda auferia dos ganhos, a abertura de entrepostos novos, a concorrência dos atilados moradores de Cantão (com os quais, em igualdade de circunstâncias, ninguém podi a concorrer) e a paz entre o Norte e o Sul da Indochina, de 1674 a 1774, fizeram diminuir, no século XVIII, as viagens e o tráfico de mercadorias, a ponto de, já em 1635, António Bocarro declarar que esse comércio era "de pouca consideração" e que se continua va era mais por causa de apoiar as Missões Católicas (8).

Após a maior proscrição de missionários do Japão, em 1614, os Jesuítas entraram na Cochin-china, aos 18 de Janeiro de 1615. O capitão Fernando da Costa conduziu uma missão do Senado de Macau, o Governo Político-Administrativo da Cidade-República até 1835, ao rei Nguyên Hoang (1600-1615), que se levantou contra o imperador Lê Kinh-Tong (1600-1619) do Norte. A pátria vietnamita ficava, de novo, sem cabeça. Aqui está a origem radical da sua desunião e desagregação político-social. Até hoje, inclusivé...

Sai Vuong ou Nguyên Phuóc Nguyên (1613--1635), que construiu, em 1630-1631, o muro de Kong-Hoi, de que já falámos, foi um príncipe tolerante; e a Fé em Cristo progrediu, a té ao ponto de, nos primeiros dez anos de evangelização, os fiéis subirem a 20.000. A p rópria irmã do rei, Bá Maria Madalena, baptizou-se e, até 1664, foi grande sustentá culo do Catolicismo. No furor, porém, da perseguição desse último ano, apostatou por fr aqueza perante os tormentos, mas regressou, com muitos homens ricos, ao primeiro fervor (9).

Relações da Cochinchina com Macau

Os portugueses estabeleceram-se em Tu-rane (1617) e em Faifó, que foram, juntamente com Cacham e a ilha costeira de Pulo Cambi, as cristandades principais. De Malaca, vieram também comerciantes lusos. Não conseguimos, porém, fundar uma feitoria, nem muito menos erguer uma fortaleza.

Não obstante, a nova embaixada de Rafael Carneiro de Siqueira (10), em 1621, que tr azia na sua companhia o visitador da Missão, p.e Manuel Fernandes, S. J., foi rec ebida com pompa e obteve algum êxito.

Numa longa carta para o seu provincial, datada da Cochinchina a 6 de Julho de 1622, o p.e Fernandes relata pormenorizadamente a viagem e a embaixada (11).

Largaram de Macau a 29 de Dezembro de 1621, e logo apanharam uma tormenta que os obrigou a refugiar-se num mato, onde passaram a noite. Em 4 dias atingiram a costa da Cochinchina e, no quinto dia, chegaram a uma grande enseada, na boca dum rio. Deitaram as âncoras, mas estas p renderam-se ao fundo e as fortes ondas empurraram o barco para a costa rochosa, onde conseguiu amarrar.

Ali ficaram dois dias, por serem os ventos rijos; ao terceiro dia partiram, indo surgir na barra de Turane. Era o dia 5 de Janeiro de 1622, véspera dos Reis Magos.

O P.e Francisco Pina (12) e o Irmão Paulo foram lá buscá-los e leva ram-nos a Faifó, que dista dali 6 ou 7 léguas. A casa tinha as paredes e o tecto de palha, sendo a igreja emprestada.

O provincial de Macau recomendara que se fizesse uma consulta sobre se convinha que os Pa -dres acompanhassem o Embaixador ao palácio real. A resposta foi afirmativa, indo lá os p. es Fernandes e Pina e o Ir. Paulo. Os padres de Pulo Cambi não puderam ser cons ultados a tempo mas, mais tarde, concordaram com a decisão to\-mada.

O embaixador foi, pois, com dois compa-nheiros seus e com os três jesuítas à cidade d e Ca-cham, capital da província do mesmo nome, visi\-tar o rei, o governador e o feitor real que ali vi-viam.

Disseram-lhes que vinham de Macau com presentes para o rei, de que o feitor tirou a lista. Foram bem recebidos, com comes e bebes "Bandejas altas com comer, em que havia carne, peixe, frutas, doces de várias laias... tu do em louça da China, com muita limpeza".

Voltaram a Faifó, que fica a uma légua de Cachan. Passados 8 a 10 dias, o rei mandou-os chamar, enviando uma embarcação com 5 soldados para os acompanhar. Partiram de Turane; n avegando 3 dias pelo mar e 3 pelo rio; chegaram a Sinua (Hué), a 31 de Janeiro, ao escurecer.

Por ordem do rei, um mandarim foi buscá--los à praia e levou-os para sua casa, onde os hospedou. A casa estava ornamentada "com panos de Laos, que não pareciam mal".

O rei mandou o seu balão e o seu sombreiro de honra. Na companhia do mandarim, desembar caram à porta do paço.

- "Entrámos -escreve o P. e Fernandes- por um páteo bem capaz, deste passámos a uma varanda ou sala aberta por uma parte, no meio da qual nos esperava El-Rei, acompanhado d e uma e outra parte de muitos mandarins e soldados, que estavam por ordem encostados às pare des. Então fizemos uma cortesia todos juntos, que foi uma inclinação profunda.

Logo o rei nos mandou assentar à sua mão direita, um pouco abaixo, onde já estava m aparelhadas esteiras dobradas sobre outras grossas.

Eu tive o primeiro lugar. O P.e Pina(intérprete), o Irmão Paulo, ap ós ele o Embaixador, no cabo um companheiro que consigo levara.

E porque o Embaixador, aqui e nas mais visitas, remeteu a mim a prática, reparti-a em duas partes. Na primeira disse como a Cidade de Macau e V. R. (o provincial, a quem escreve), certificados pelos Padres que andam neste Reino do amor que S. Alteza tinha aos Portugueses e favores que fazia aos mesmos Padres, mandaram o Embaixador e a mim visitar Sua Alteza, saber da sua saúde, dar-lhe os parabéns dela e as graças pelo que fazia aos Padres e desejo que tinha de os Portugueses frequentarem (os seus) portos.

O rei agradeceu mto. a visita e perguntou logo a causa porque os Portugueses havia algun s anos não vinham a este Reino como antes e outras coisas a propósito.

Na primeira parte, eu disse como os Holandeses afirmavam em Japão que tinham licença de S. Alteza para virem com suas naus a este Reino fazer nele Feitoria etc. e, posto que a Cid ade (de Macau) e todos os Portugueses tinham isto por falso, que bem sabiam o bom ânimo de S. Alteza, que não havia de agasalhar nem favorecer ladrões, quais eram os Holandeses, c ontudo, queriam saber a verdade (da boca) de Sua Alteza; porque, vindo os Holandeses a seu s portos por serem inimigos nossos capitais, não podiam vir nossos navios, como Sua Alteza de sejara, nem os Portugueses dar-lhe este gosto.

Respondeu (Sai Vuong) que não dera tal licença, enquanto os portugueses vies sem frequentar seus Portos, porque sabia quem eram uns e outros. Nos Portugueses achava sempr e muita verdade e primor; dos Holandeses sabia que eram ladrões, acrescentando novas coisas acerca disto e perguntando outras. Por fim, fez sinal para os seus que fizessem vir bandejas (com refrescos e comida).

Era véspera de N. a Sr. a das Candeias (1 de Fevereiro). (Apesar de ser dia de jejum), contudo houve o parecer, fundado na experiência da terra, que as deixássemos vir e co méssemos alguma coisa, pouca, porque o contrário era descortesia...

Saiu o rei satisfeito e não pouco edificado. Com isto nos despediu, dizendo que veria a carta da Cidade de Macau e logo nos despacharia.

Em chegando a casa, do mesmo modo como tínhamos ido, veio um recado com dois carros d e arroz, dois boiões de vinho e dez mil caixas.

Ao terceiro dia, depois de vermos a horta, a artilharia que não é muito grossa mas está muito bem aparelhada, nos falou em uma casa, que está em um campo onde atiram ao alv o as peças, vestido a nosso modo com roupas que tínhamos levado.

Mandou atirar ao alvo e muitos acertaram, depois com uma peça feita em Lisboa que o levou de meio.

Vindo a nosso intento, prometeu o Embaixador, de parte da Cidade, que, não admitindo Sua Alteza os Holandeses, viria cada ano o navio dos Portugueses. E acrescentou El-Rei que, pa ra essa amizade ficar firme e entenderem os Portugueses o amor que ele (lhes) tinha, des ejara que viessem alguns viver a este Reino, no qual daria terras e fariam uma igreja mto. gra nde, onde melhor lhes parecesse, a que ele concorreria com os gastos, mostrando-nos em tudo sin ais de amor e alegria que se podiam desejar.

Despediu-se dizendo que a Faifó nos mandaria a carta e o presente para a Cidade de Macau e a casa nos mandou dez taéis para ajuda dosgastos do caminho.

E porque nós lhe tínhamos pedido por terceira pessoa que viesse ouvir em particula r o Padre Francisco de Pina, mandou-o chamar à tarde e o dito padre informou (o Rei) de todo o negócio; e ele prometeu fazertudo como desejávamos. Foi para nós coisa de muita importância saber que temos entrada com El-Rei, em público e em particular".

Vindos, tornámos a Cacham, demos o presente ao Príncipe e visitámos outros ma ndarins que podiam ajudar a conseguir o bom despacho, e todos prometeram seu favor".

Sai Vuong concedeu, então, uma carta de residência aos missionários jesuítas e comerciantes de Macau, neste comedido teor:

"Anos atrás, mandaram os Holandeses uma embarcação para solicitarem (res idência) neste Reino. Porque eles não são como os outros homens, nós não lha concedemos.

Agora, mando esta pequena carta para que conste aos Vereadores do Senado e ao Grande Padre (Visitador dos Jesuítas) dos Portugueses, (em Macau), acompanhada de du as peças de seda, para dar a essa Terra um sinal de lembrança e amizade.

Sou muito contente que, daqui por diante, vão e venham aqui mercadejar os navios do s Portugueses e comunicar como dois Reinos entre si amigos" (13).

Foi, porém, ainda nesse reinado de Sai Vuong ou Om Tuy, que, por intrigas dos bonzos-o Budismo era a Religião do Estado - estalaram as primeiras perseguições contra o Cristi anismo, perturbando indirectamente as relações comerciais com Macau (1616,1625,1629,1633).

Anualmente, os navios da Cidade do Nome de Deus iam à Cochinchina, às vezes em grande número.

Em 1646, foi mandada lá outra embaixada, na pessoa de Francisco Cotrim de Magalhães, munido dum regimento de 3 de Agosto desse ano, dado por D. Filipe de Mascarenhas, Vice-Rei da Índia, a fim de opor-se às manobras dos holandeses que tinham posto pé em Gale (nosso "Cabo da Galé", ao sul de Ceilão) e procuravam expandir--se por Sião, Camboja e a própria Cochinchina.

Na monção de Julho e Agosto de 1651, chegaram a Macau "tres patachos e um chó, que tinham ido à Cochinchina carregados de caixaria, de que vieram bons retornos, em prata e fazendas, mas não de tanto ganho como o do anno passado, pellas muitas embarcações que lá mandaram". Nessa ocasião, João de Sousa Pereira, capi-tão-geral de Macau (1650-1654), escreveu a Nguyên Phuóc-Tan (1640-1687) pedindo-lhe autorização para os padres residirem no seu reino e enviando-lhe de presente uma peça de artilharia. A acompanhar o cobr e vinham os p.e Metello Sa-canno e o mestiço luso-nipónico de Nagasáqui Pero Marques, apóstolo dos japoneses em Faifó. O rei enviava aí um presente ao capitão-geral e prometia admitir os padres na Cochinchina. O monarca escreveu, na mesma altura, carta ao Vi sitador dos Jesuítas ("O Padre Grande ", como ele diz em anamita), Sebastião da Maia (1650-1651), agradecendo a sua carta e os seus presentes e pagando-lhe com presentes seus; pedi a-lhe que recomendasse ao capitão-geral a fundição das peças e reenviassem os padres co m peças fundidas, que ele lhes daria lugar para morarem.

Eis o interesseiro documento régio dessa ocasião (14):

"Eu, Rey do Reyno de Cochinchina, escrevo esta carta ao Capitão-Geral da Cidade de Macao.

Sempre ouvi dizer que, no mundo (dos homens), se dá a primazia à razão e justiça. No tracto entre as terras vizinhas, da fidelidade se faz o fundamento. Pelo que, a Cidade de Macao e este Reyno de Cochinchina com amor e benefícios se hão-de unir, com justiça nos havemos de tratar.

Desde que fui Rey athéagora, não tenho mostrado meu affecto e amor para com V. M (ercê). Contudo V. M. me mandou de prezente hũa pessa de artelharia, que muito esti mo. Se V. M. se quizer servir de algũa cousa de meo Reyno, não serei escasso.

O que V. M., (n) os meses passados (me escreveu) acerca dos P. es da Comp. a morarem em Minha terra, digo: que os Reys, meus antepassados, sempre prohibirão morarem em este Reyno; pelo que, em os não admitir, não faço cousa nova. Contudo, já que agora tem os conhecimento e amizade, eu admitirei, por amor de V. M., que em sua carta mostra ter-me, nun ca poderei negar nem corresponder a tanta obrigação.

Outra vez torno a dizer que, se neste Meu Reyno há cousa em que o possa servir, me avize e será servido.

Pede V. M. que eu admita estes p. es em meo Reyno; certo elle hé tão pequeno e os P .estão grandes, que para cada hũ delles hé estreito; pelo que não seja V. M. estreit o em pedir, pois eu desejo ser largo em conceder.

Mando cinco mil cates de cobre. Confiado no amor de V. M., lhe peço o mande fundir em peças de artelharia, e terei isto por grande benefício, de que nunca me esquecerei; porque ainda que na Minha terra se possam fundir, contudo pela confiança que tenho cõ V. M., as de sejo fundidas em Macao.

Envio entretanto emprestados estes p.es (15) que ajudarão este negócio e lhes dirão, de palavra, o amor e afecto que tenho para com V. M.; chegando a monção, mande V. M. outra vez estes p. es, para que venham morar em Meo Reyno, e juntamente me m ande V. M. no mais que for servido a V. M. cõ amizade verdadeira; peço a V. M. me trate com a mesma.

As pessas que dezejo, sejam à vontade de V. M., ou grandes ou pequenas, contanto que s e empregue nellas o cobre todo. Este benefício será tão grande como os montes e outeiros e permanecerá no meu coração, como as ágoas que descem dos mesmos montes, que nunca fa lham.

Mando a V. M. hum pequeno prezente, e ainda que a couza em sy hé vil, servirá para mostrar meo coração. Estamos distantes entre nós muitas légoas. Contudo, quando faç o esta, me parece estou de presença f allando com V. M..

O prezente são as cousas seguintes:

Vinte pessas de seda boa. Três pedaços de calamba, que pezam um cate. Duas pontas d e abada. Seis dentes de marfim, que pezam cem cates.

Feita no 3. o Anno do meo Reynado aos 26 da3. a Lua, do anno de mil e seis centos, ci ncoenta e hum".

Redigida em termos parecidos, embora mais breves, houve outra carta do mesmo monarca ao re ferido p.e Visitador ("o Padre Grande") (16).

Seguiram-se pedidos de mais artilharia da fábrica macaense do Chunambeiro, sita na ensead a do Bom Parto. A demora no envio encole rizou o avarento e explosivo rei Hien-Vuong ou Nguyên Phuóc-Tân. Num ímpeto de ira, mandou arrasar a igreja construída na casa de sua tia-avó, Bá Maria. O p.e Pero Marques, então, conseguiu fazer chegar rapidamente um a carta a Macau e os pedidos sob ameaças de Hien Vuong- mestre em chantagem política - fora m imediatàmente atendidos. Um barco de João Vieira levava, em 1659, a artilharia pedida.

Os missionários obtiveram a restituição da casa e do jardim que lhes haviam confiscad o em Faifó, com o direito de aí erguer uma igreja.

Em 1664, todavia, este rei ateou uma grande perseguição, que fez muitos apóstatas (as mulheres eram lançadas aos elefantes) mas também 37 mártires excelentes. Sobre ela, o P. e Marques escreveu, a 29-5-1665, uma Relação esplêndida em português, espa nhol, italiano e um resumo em latim, com 35 páginas e que se conserva na colecção "Corte s da Academia Real de la História" (Calle León, Madrid) e no Arquivo Romano da Companhia de Jesus (17). Foi um chinês, Guico, casado com uma japonesa e cego, que ateou iabolica-men te esta tormenta, usando o mesmo processo sacrílego do "fumie" (pisar as imagens sagradas), imitado do Japão. No fim da perseguição, caiu em desgraça e fugiu para Camboja, tendo recebido o baptismo antes de morrer. O lugar das audiências e dos tormentos foi a cidade de Cacham, capital, a 7 léguas de Faifó.

Em 1671, o P.e Marques teve de partir, de novo, para Macau, com uma quantia d e 10.000 escudos, a fim de comprar mais material de guerra para o rei conquistador, Nguyên Phuóc-Tân.

"Os habitantes de Macau exploraram os recursos da Cochinchina e acharam-nos tão ricos e importantes- escreve Ljungstedt- que, num conselho geral de 1685, resolveram que o n avio"N.a S.ra de Monserrate" levasse àquele país o enviado Fr utuoso Gomes Leite, nomeado pelo Vice-Rei da Índia, D. Francisco de Távora, Conde de Alvo r"(1681-1686)(18).

Aos 19 de Fevereiro de 1689, o Leal Senado decidiu mandar a Nguyên Phuóc Tân mais dua s peças pequenas de bronze, pelo navio "Sto. António", a requerimento do vereador João Ga rcia de Luares, proprietário desse navio.

O capitão do navio era Felipe Fróis de Quadros e o Feitor Manuel de Faria (19).

O rei Nguyên Phuóc Tân faleceu em 1691.Seu filho e sucessor Nguyên Phuóc Chu (1691--1725) não cumpriu as promessas do pai e ateo u violentas perseguições contra a Igreja em 1698 e em 1700, interrompendo as relações comerciais com Macau.

Um dos pilares mais fortes da presença da Igreja Católica e de Portugal na Cochinchina foi o mestiço de Macau, João da Cruz. Esteve, primeiro, ao serviço do rei de Camboja, que o elevou, pelos seus serviços distintos, à dignidade de Ocu-nhá, governador de uma província. Quando o rei Nguyên Phúc-Tân ou Hien Vuong lançou, em 1658, um ataque contra Udong, as tropas cochin-chinesas vitoriosas trouxeram-no para Hué.

Instalou-se em Tho Duc, onde construiu a igreja de N.a S.ra, e con viveu com os Padres Barto-lomeu da Costa, Domingos Fuciti, José Candone e Juán António Arnedo.

Conservou o título de Ocunhá e foi o Fundi-dor Real de canhões, bacias e outro s objectos, alguns dos quais se conservam no Camboja e no Vietname.

Graças a essa artilharia, melhor temperada que a das nações da Europa, que também adquirira, Hien Vuong, desde a província de Phu-Yen da Champa, anexada por Nguyên-Hoang em 1611, avançou até ao rio Phan-Rang, em 1653, fundando a província do mesmo nome.

Em 1658, interveio contra o Camboja (Chan Lap), tomando Saigão (hoje, denominada Cidade d e Ho Chi-minh). Por isso, João da Cruz chama a Nguyên Phúc-Tân "Senhor da Cochinchi na, Champa e Camboja ". De facto, graças à artilharia de Macau e à que ele fabricava, Champa desapareceu, nesse tempo, como nação de cultura india-nizada.

Nos conflitos de jurisdição eclesiástica contra o bispo Lambert de Lamotte, incrusta do no Padroado Português, e pela política unilateral da Congregação da Propagação d a Fé (em que pululavam os inimigos de Portugal e os partidários de Luís XIV), Hien Vuong, que sempre apoiara João da Cruz, acérrimo defensor dos Jesuítas Portugueses e dos nossos direitos, declarou-se favorável aos Franceses.

Estes tinham começado a infiltrar-se, política e religiosamente, em toda a Indochina, recorrendo a uma carnificina de portugueses, na qual foram mortos, cobardemente, dezenas de le igos e um sacerdote.

Era "tanta a tormenta e a vontade" depravada dos nossos opositores que a estrela de João da Cruz e de seu filho Clemente, que herdou por algum tempo a aura e o poder do pai, declinava, vindo a falecer em 1682. O seu vencimento era de 500 escudos anuais, mais o sustento da famí lia.

Deve ter influído no seu desaparecimento o desgosto por ver os seus padres condenados pe la Bula contra os Ritos Chineses de 28 de Janeiro de 1680 (Inocêncio XI) e a expulsão dos missionários mais influentes. Só o matemático da côrte, Arnedo, o cientista João Lou reiro e o médico João Koffler (Thay Nhien), foram poupados à proscri'cão e condenaç ão pontifícias.

Nunca, na história das Missões Católicas, ocorrera semelhante incompreensão e inj ustiça, que só no papado de Pio XII (8 de Dezembro de 1939) seria reparado e corrigido. O mal, porém, estava consumado em todo o Oriente, de modo irreparável (20).

Nestas circunstâncias de uma presença portuguesa moribunda no Sueste Asiático, que tinha as ambições imperialistas da França e a desunião da Igreja contra nós, ia pro cessar-se a embaixada do p.e Arnedo a El-Rei de Portugal, D. João V.

A tripla embaixada do p.e Arnedo

Atingido o maior raio de expansão territorial da Cochinchina, por virtude principalmente do seu rei Hien Vuong, fortalecido pelos canhões portugueses e o auxílio de Macau, vamos ve r o seu declínio, até se desintegrar como nação nas mãos dos franceses.

Em 1691, faleceu Hien Vuong (ou Nguyen Phuóc-Tan). Sucedeu-lhe seu filho Nguyen Phuó c-Chu (1691-1725), que não cumpriu as promessas do pai, favoráveis aos macaenses e às su as florescentes missões católicas. Ateou perseguições contra a Igreja, destruindo, na d e 1698, a própria capela de Clemente Cruz e execrando os túmulos de seu pai e família. Em 1700, chegou a interromper as relações comerciais com Macau.

No dia 16 de Julho de 1710, chegou a Macau, na fragata "N. s.ra da Visitação", o procurador do Senado Gaspar Francisco da Silva que trouxe de D. João V a confirmação de todos os privilégios da Cidade.

Só havia um último recurso para a Cochin-china e as nossas relações com ela: era o matemático da côrte, P.e Arnedo, que fora poupado em todas as crises.

O Visitador dos Jesuítas, Miguel Amaral, mandou-o ir a Macau. Ming Vuong, o novo monarca, aproveitou-se da oportunidade para nomear o p.e Juán António Arnedo seu enviado, para o restabelecimento das relações normais com Macau.

O P.e Amaral informou da vinda do Embaixador o Leal Senado que, aos 25 de Agosto de 1712, reuniu sob o vereador do mês Gaspar Martins, para deliberar sobre a solenidade da recepção.

"Todos uniformemente assentaram... mandar convocar a gente toda da ordenança (21) praças e 3 oficiais), para que (o aguardasse) perfilada na Rua Direita (ho je, chamada Central) até à porta do Senado. Dois homens em palanquim iriam ao Colégio da Madre de Deus (S. Paulo), para o acompanhar até esta cidade. A Mesa pediu a José da Cunha d'Eça e a Luís Sanches de Cáce-res (fossem esses gentis acompanhantes do P. e Arnedo). No (edifício do) Senado, (determinou--se) se desse um assento em cadeira, que há-de estar posta em cima duma alcatifa e um tamborete diante e um coxim à direita do bufete, que fica da grade para fora. (Além disso, estabeleceu-se) que houvesse salva (de nove tiros da Fortaleza) do Monte".

Na tarde do mesmo dia, apresentou-se na Casa do Senado o P.e Juán Antonio Ar nedo, "enviado d'El-Rei da Cochinchina, e fez a sua Embaixada, entregando uma patente que trazia do Mandarim e Marquês da Cochinchina e também particular carta para o Senado do Pr íncipe Almirante do dito Reino, as quais se guardaram no Arquivo da Cidade".

A Colecção de vários factos, de autor desconhecido, descreve a cerimónia com mais alguns pormenores: o Embaixador "fez a sua entrada em manxelha (sic), com quatro moradores também em manxelhas, ao uso da Cochinchina, acompanhando-o atraz e adeante duas manxelhas, em que iam Luiz Sanches de Cáceres e José da Cunha de Eça e em outra um coc hinchina, que trazia uma carta com quatro pagens montados em gineta; e assim vieram até à cidade aonde os receberam à porta(22)os ministros do Senado, dando a fortaleza do Monte uma salva de nove tiros".

Como Arnedo trazia em sua companhia naturais da Cochinchina, depois de alguns dias o s Vereadores da Câmara visitaram o Embaixador, no Colégio - Universidade da Madre de Deus, onde se hospedara.

Aos 5 de Outubro, comunica-lhe a Câmara, por escrito, que determinou nomear a fragatinha de "N.a S.ra da Penha de França", do senhorio Manuel Favacho (23), para o transportar de volta à Cochinchina, a que o p.e Arnedo responde, aos 8 de Outubro, com toda a cortesia. Afinal, porém, foi preferida a chalupa ou nau "N.a S.ra da Boa Viagem" de Luís Sanches de Cáceres. O Embaixador levou para Minh Vuong um saguate no valor de sessenta e tantos taéis, que Macau estava pobre e o rei não merecia mais.

Aos 15 de Abril de 1714, o Senado, pelo seu alferes e escrivão, Manuel Pires de Moura, d irige uma carta ao dito monarca, pedindo o estabelecimento duma feitoria, "na parte adonde mais conveniente parecer", a Minh Vuong. O capitão do barco, fragatinha ou chalupa era M anuel Vidigal Giam.

O Senado avisou o Vice-Rei de Goa de todos estes trâmites, este aprovou o restabeleciment o do comércio com a Cochinchina e ordenou que a Embaixada de Arnedo, chegada a Goa na primav era de 1714, "passe com o mesmo carácter à corte de Lisboa", segundo era a intenção de Minh Vuong. "Dentro de cinco ou seis dias (12 ou 13 de Maio desse ano), fará a sua entrada pública". O Vice-Rei, Vasco Fernandes César de Meneses elogia Luís San ches de Cáceres, por ter arruinado a sua fazenda no serviço de El-Rei, e ter--se exposto a tantos perigos, "que he certo não escaparia ultimamente de ser tomado dos Selvagens (24), se não fora a Armada do Sul, que o livrou desta moléstia".

Aos 31 de Agosto de 1715, leu-se no Senado uma carta do rei da Cochinchina, em que mandava um saguate: o qual "constava de uma peça de loa, duas lanças guarnecidas de cobre dourado, huas sescentas (sic) de duas sortes, huns poucos de cates de pimenta, e huns cin co ou seis cates de ninho de pássaro (andorinha dos Parcéis) e huns 30 ou 40 cates de azas (barbatanas) de peixe (tubarão); ambas coisas chegaram já podres; e se re partio tudo entre os Ministros, e offíciaes (do Senado), excepto as lanças"(25).

Por causa das perdas que Cáceres experi-mentou e pela renovação da perseguição à Igreja, nenhum comerciante de Macau desejava viajar para a Cochinchina e satisfazer o pedido do Vice--Rei.

Do que aconteceu ao Embaixador em Goa e a caminho de lá, além do susto do encontro com os navios dos "Selvagens", talvez do arquipélago de Andaman ou dos piratas do Malabar, apenas possuímos duas cartas do Vice-Rei a D. João V, ambas com a data de 5 de Janeiro de 1715.

A primeira carta diz:

"Senhor:

Em Abril do anno passado (1714), chegou a Goa o Padre Juan Antonio Arnedo, religioso da Companhia de Jesus, conduzido de Cochinchina em huma chalupa de Luiz Sanches de Casseres, e v indo com o caracter de Embaixador daquelle Rei (Minh Vuong); feza sua entrada (em Goa) e propoz os motivos a que vinha, os quase fará também presentes a Vossa Magestade, para cujo efeito passa a essa côrte com o mesmo carácter a sua real presença.

E supposto que a sua embaixada ou legacia se estribe em dois pontos, não me parece qu e se deve admittir mais que hum delles.

Intenta (em primeiro lugar), este Rey que com elle se estabeleça o negocio, mandan do-se--lhe embarcações de Macau, de Goa e desse Reino (de Portugal), havendo em o se u tão poucos géneros, que tenham conta, que duvido queiram ainda os de Macau fazer aquella viagem, não obstante lhes ser fácil, e ficar tanto nas suas vizinhanças.

Promette (Minh Vuong) livrar aquella chris-tandade, summamente constante e dilata da, das perseguições, com que até agora a oprimia, e não há dúvida que já sem em bargo algum trabalham os Missionários naquella missão, donde publicamente pregam o Evangelho e a palavra de Deus, o que até aqui se não fazia; e como este seja o commercio mais util e o que Vossa Magestade antepõe a todos os outros, só delle se deve tratar, para que, facilitado e estabelecido, consiga Vossa Magestade propagar a fé, e extinguir a idolatria.

E se, para se ajustar esta matéria de sorte que fique sólida, firme e constante, for necessario que àquelle Reino vá alguma embarcação, bem poderemos conseguir que os de Mac au façam aquella viagem, porque ainda que não tirem grandes conveniências della, poderá este governo (doEstado da Índia, onde se acertam as viagens de comércio de Macau) per mitir que o barco que for fazer negócio áquelle reino, se lhe siga a viagem de Timor (donde se trazia, todos os anos, o sândalo).

Desta sorte, não deixarão aquelles moradores de admitir esta prática, de maneira que pontualmente se execute e se consiga em parte o que El-Rey de Cochinchina pretende.

Deus guarde a muito alta e muito poderosa pessoa de Vossa Magestade, felicissimos annos ". (Data e rubrica do Vice-Rei) (26).

O teor da segunda carta é o seguinte:

"Senhor:

Pelo Conselho Ultramarino dou contra a Vossa Magestade da diligencia a que o Padre Juan Antonio de Arnedo veio a Goa, e passa nesta monção à presença de Vossa Magestade.

Tendo com este Religioso varias e repetidas conferencias, reconheci nellas que (elle) não era totalmente destituido de affecto aos (Missiona-rios) da Propaganda, e summam ente parcial dos que seguiam as opiniões francezas; e como determina passar a Roma, parece-me que Vossa Magestade deve considerar, em caso que me nao engano no juizo que faço deste sujeit o, se convem permittir-se-lhe o hir àquella côrte.

Deus guarda a muito alta e muito poderosa pessoa de Vossa Magestade felicissimos annos". (Data e rubrica do Vice-Rei) (27).

O Relato da Embaixada do p.e Juán António Arnedo a D. João V, juntamente com os embaraços ao comércio de Macau com a Conchinchi-na, descreve-os uma carta do Senado, de 1717, ao rei Minh Vuong, nestes termos:

"Muito ill. o e poderoso Rey.

A singular benevolência de V. Magde pa. com esta nossa Cidade de Macao nos obriga a irmos por esta a significar-lhe o nosso agradecimentos, dando juntamente notícia plena dos effeitos da Embaixada que V. Mg.de mandou pelo P.eAnt.oArnedo a El Rey de Portugal Nosso Sñor.

Foy muy sentida de todos a morte do mesmoPadre Embaixador Ant. o Arnedo, o qual depois de partir pa. Portugal, aos 20 de Janr.o de 1715 (28) em hũa grande nao que pa. isso lhe deo o Sor. V. Rey da India.

Tendo já mes e m. o de viagem, adoeceu de febres e, depois de 15 dias de doença, morreu aos 22 de Mr. ço do dto. anno a mesma nao na qual le- vava consigo de Goa outro relig.sopor seu companhr.o cham.do Manuel Botelho, a q.em antes de morrer fez o mesmo P.e Antonio Arnedo seu substituto na Embaixada de v. M g.e entregando--lhe a carta e o sagoate, ("catana de ouro calam-bã"), p. q'elle, em chegando à grande corte de Lix.a desse a Embaixada e entregasse tudo a El--Rey nosso Snr.

Chegou o dito substituto a Lx.a em 25 de Sbro. de 1715 e logo deu a Embaixad a e entregou a carta de V. Mag.ea El-Rey Nosso Sr. q. tudo recebo, cõ singular affecto e estimação e cõ as honras costumadas; e por outra nao q. partiu de Lisboa em 14 de Mr. de 1716mandou a sua resposta e sagoate pa. V. Mag. e cõ hũ homḽ relig.ochamd. (P.e) Varella, o ql. chegando a esta Cid. e de Macao em 30 de Agosto, do dito anno 1716; pouco depois, adoeceu e morreu aqui mesmo, em 27 de Setembro do mesmo anno.

Veyo na mesma nao outro relig.o chamado António Freire homé muito sabio e vírtuoso e digno de toda a estimação(29) q. he Irmão do P.e M edico, João Baptista Sanna(30) e veyo movido do dez. o de o ver e de estar cõ e lle nesse Rn.o; por esta causa elegemos nós a elle por substituto na Embaixada de El-Rey Nosso Sr. P.aV. Mag.e, fazendo-lhe entrega da carta e do sagoate q. elle entr egará a V. Mag.e.

Sentimos muito q. não chegassem a esta Cid.e de Macao os cavallos q. o Sñor. V. Rey da India mandava e morreram antes de chegarḽ cá; nem he possivel vire cavallos ta m briosos, embarcados tanto tpo. sem poderḽ ter os pastos frescos a q. são acostumados, p assando tantos mares e climas tão diversos, quaes há daqui athé Goa e chegarḽ cá cõ vida.

O mesmo Sr. V. Rey e El-Rey Nosso Sr. (D. João V) nos té recomendado m.to o Comercio desta Cid.e cõ esse Rn.oda Cochinchina, o qual também nós desejamos(pr) ser esta a vont.e de V. Mag.e.

Não nos he possível obrigar a nenhũ destes Moradores de Macao a hir cõ o seu b arco a esse Rn. o com a certeza que todos têm de tirarem perdas e não lucros deste comercio, por causa de alguns costumes que ahi sé observam e não há em outros reynos dos muitos a q.e os nossos barcos vão comerciar. Sé porém V. Mag.e sé dignar de isentar os barcos desta Cidade dos taes costumes, de sorte q. possam elles tirar deste comercio os lu- cros necessr.os e racionaveis, com grande vont.ehírão elles lá c omerciar, com utilidade da fazenda de V. Mag.ee sem damno nosso.

O 1.o costume he avaliarem os avaliadores dos barcos q. vão a esse Rn.o por altos pr eços as fazendas que não são m.to estimadas nesse Reino e porpreços muito d iminutos as fazendas m.to estimadas em q. pode haver conveniência e estas sé tomam e dist ribuem pelas mesmas avaliações diminutas, ficando a cargo dos Feytores dos barcos as outra s fazendas em q. não pode haver interesse.

Do qual costume se seque infallivelm.te hũa m.to grande perda q. e impossibilita o Comercio de Macao cõ esse Rn. o da Cochinchina.

P.a se estabelecer pois comercio he necesr.o q. V. Mag.e izente deste costume aos barcos de Macao ordenando eficazmente aos seus vassallos a q.m toca, q. se não possão fazer as ditas avalia-çõens em fazenda algua nḽ das q. se pode terinter esse nesse Rn. o né das q' não pode ter, mas sim cobrarḽ os seus dr.tos geralmente de todas a oyto por cento, como se estilla em os Reynos e Portos a q. vão co merciar os nossos barcos; e querendo a V. Mag.e ou qualq.er dos seus Mandarins comprar, serão pelos preços q. entre o comprador e o vendedor se ajustar e, desta sorte, não poderá haver género algũ de queixa sem assistência do Cap.am e do Feitor do barco, para q' não estan do satisfeitos por serḽ os preços diminutos, se lhe levantem athe elles ficarḽ satisfeit os, de q. se seguirão também mayores interesses p.a a faz.a de V. Mag.e, q. cobrará mais direitos das taes fazendas avaliadas por mayores preços.

E da mesma sorte hé necessr.o q. sejao obrig os os Avaliadores o u aspes, asa q.m toca a to-mar as outras fazendas de menor estima ção q. avaliarḽ por preços altos pera as pagarḽ pellos mesmo altos preços por q. fo rão avaliadas ou se-jão obrig.os a pôllas na sua justa avaliação ordenando-lhe V. Mag.eassim efficazmente.

O 2.o costume he terḽ os Ministros das Alfândegas nesse Rn. o as suas propinas e comida à custa dos Cap.ens e Feytores dos barcos. He pois necessr. o q. V. Mag.e efficazmente ordene q. as ditas propinas e comidas se tirḽ dos dr.tos q. pagaré os br.cos de Macao nas Alfândegas de V. Mag.e; ordenando junta mente q, os direitos dos barcos de Macao sejão somente oito por cento de todas as faz.as q. cada barco levar como fica dito, dos q.es direytos conforme as sobreditas avalia-çoens dellas; dos q.es dr.tos se tire as ditas propinas e comida dos Ministros da Alfândega e tu do o restante seja p.a V. Mag. e ou p.a q. m V. Mag. e ordenar.

03.o costume hé não se expedirḽ os barcos q' vão comerciar a es se Rn. o a tpo q' possão conseguir a sua viagḽ felizmente, mas se expedem e sah em dela muito tarde e fora da monção ou no fim della, donde se segue q' com os ventos cont ra-rios ou se perdem totalmente os br.cos ou arribão p. a os mesmos Portos donde s ahirão ou p.a outros nos quaes ficão quasi hũ anno com gravissimas desp. as e damnos.

Hé pois necesr.o q' os br. cos de Macao partam da Cochinchina para cá athé os 15 de Julho ordenando V. Mag.e efficazmente que antes desse dia se pague tudo o q'se comprou ao Cap. am e Feitore à maisgente de barco e q'pornenhũ outro impedim.toseja barco algũ de Macao detido mais tpo em qualquer Porto desse Rn. o.

E pera mayor segurança pedimos a V. Mag. e q' seja servido exprimir todas e cada hũa destas suas reaes ordens em hú seu Decreto cõ a efficacia necessr. a p. a se observar infa livelmente; e juntam. tesuplicamos a V. Mag.ese digne de mandar--nos est e tal Decreto seu p. anelle levarḽ os barcos de Macao q' forḽ a esse Rn. o a segurança de que todas as ditas ordens de V. Mag. e serão observadas.

E nesta forma irão os barcos desta Cid.e a comerciar a esse Rn.o e somente as contingencias do mar q'nós não podemos assegurar poderão ser a cauza de não chegarḽ o q. m.to sentiremos.

P. a tudo o mais q 'se offerecer do aggrado e serv.çode V. M ag. e fica mos promptissimos; e sup-plicamos ultimamente a V. Mag.ese digne de aceitar hua demo nstração do nosso affecto q' com esta carta offerecemos a V. Mag. e, cuja Real Pss. a Gu. e Deo s felices annos".

Temos ainda uma carta importante do rei Minh Vuong da Cochinchina ao "Sereníssimo S.or Rei de Portugal D. João V." Diz o seguinte:

"O Rey de Cochinchina dez. aq'o Ceo encaminhe ao bom homem, q' entregar esta Carta no Palacio de V. Mag. e Neste mundo o mesmo sol pode alumiar todos os termos, e cantos da redondeza da trr.amas o vasto Mar de entremeyo impede se communiquem as vozes. Os an nos pss. dos tendo vindo a este meu Rn. ohúa Nao de Maccao, soube cõ clareza q'tod o o nobilissimo Rn.o de V. Mag. e he fertil, e abundante, e q' produz couzas muy pr eciozas: tem por Ley estimar em m. to a fidelidade, e a Carid.e mutua, e a justiça. Por isso com consideração enviey ao Prezd. te do meu Tribunal da Mathematica, o P. eJuán A nt. o Arnedo, p.a q' cõ respeito entregasse a V. Mag.e hua carta minha acompanhada de húa Catana de ouro Ca-lambã, e outras couzas: as quaes escaçamente tiue rão o meu bom intento de com effeito serḽ entregues em tão grande distância, porq', con tra o q' cuidava, o P.eJuán Ant.o Arnedo de doençamorreo no caminho, ainda q' as couzas 2.o o rol dellas forão aprezentadas aos pees de V. Mag.e: mas na Cochinchina foy sentida inexplicauelm. tea perda do nosso extraordin ario Embaixador. Agora, outra vez preparo com esta breve Carta alguas couzas de meu Rn. opor significação de minha boa vontade: o q'tudo será entregue à Cid.e de Macao p. aque, havendo ocazião, dep.ois se offereção a V. Mag. e, ficando eum.to certo que (se)rão recebidas com gosto. O que dez.o he q' haja grande frequência de Mercadores, q' venhão contratar neste meu Rn. o e trazendo as drog as precio(zas) desse Rn.o haverá mutua retribuição aos q' viere', e voltarḽ com a mesma uni(dade) q' hà entre o dia, e a noite, e florecerà sempre esta mutua communic ação, as(sim) como húa fermoza flor, q' de novo abre; e para q' isto seja assim, escrevo esta respeitosa Carta, aos 12 de Agosto de 1717"(31).

A documentação do Arquivo do Senado sobre as relações com a Conchinchina continua ainda, por vários anos, mas verifica-se que sem resultados palpáveis, pelos motivos dema siado conhecidos: extorsões das autoridades da terra contra os mercadores, que perdiam o fr uto do seu trabalho; perseguições religiosas; guerra civil dos Tai--sons, de descen dência real; interferência dos franceses e conflitos de jurisdição com os Vigários Apostólicos da Propaganda.

Por imprudência do comerciante francês Pedro Poivre, estalou a perseguição de 1750, sob Nguyên Phuóc-Khoát (1738-1765) ou Vo Vuong, que permitiu aos franceses o estabelecimento duma feitoria em Faifó e comércio livre.

A 6 de Maio, Ong Cai An-tin mandou prender todos os missionários e confiscar-lhes os bens. No navio "S. Luís" do comando do capitão Manuel Mateus, às 2 horas da manhã do dia 26 de Agosto, embarcaram para Macau 27 missioná-rios, sendo 8 jesuítas, 8 franciscanos, 2 italianos da Propaganda e 9 franceses. Só o médico do rei, o jesuíta João Koffler, natural de Praga, não foi inquietado.

A 27-2-1751, Luís Coelho pediu licença ao Senado para no seu barco "S. António" ir à Co-chinchina desfazer junto do rei o seu equívoco contra os missionários. O Senado anuiu aos 17 de Abril. Havia então 80.000 cristãos na Cochinchi-na.

A 3-11-1751, Luís Coelho comunicava ao senado que perdera, em Faifó, a sua casa de arm azém com as fazendas e cabedal que lá estavam, bem como o seu barco "S. Miguel" na costa d a Índia.

Como o rei mostrou ao capitão português desejo de ter consigo um médico e um mate mático, partiram, na chalupa "S. Paulo" de Luís Coelho e Vicente Ferreira, dois jesuíta s, com presentes para o monarca (Loureiro, o grande botânico, e Monteiro). A perseguição , porém, não amainou com a morte de Nguyên Phuóc-Khoát (1765). Seu sucessor Nguyên Phuóc-Thuan propôs-se exterminar o Catolicismo, em todo o seu povo.

O resto da história conta-se em 3 frases:

No século XIX, em 50 anos, houve 100.000 mártires. Só de 1874-1886, foram mortos 50.000 cristãos.

Isto deu pretexto aos franceses para se apoderarem da Indochina e do Tonquim e, depois, do Laos e do Camboja.

Conclusão

As diligências de El-Rei D. João V, "O Magnânimo", para ajudar a resolver a situação socio--religiosa da Cochinchina estavam, por isso, de antemão, votadas ao ins ucesso, dadas as circunstâncias apontadas.

Os Jesuítas, em 1762, foram expulsos das suas florescentes Missões do Extremo Oriente e do Sueste Asiático e penaram, mesmo os estrangeiros como Koffler, nas enxovias de Pombal.

Perdida Malaca, e longe de Lisboa e de Goa, Macau era fraco para afirmar a presença de Portugal, numa zona tão cobiçada pelas grandes potências imperialistas da Europa: Ingla terra e França. Recorde-se que, em princípios do século XX, a França chegou a possuir uma base em Kuóng-Chau-Wán (Fort Bayard), frente à Ilha de Hainão, que o s missionários franceses ocuparam também, relegando os portugueses (PP.es Pita e Paulo Hó, que ainda conhecemos) para a região do Si-Kiang, em Shiu-Hing. Toda a proví ncia de Cantão, excepto Hong Kong, situava-se dentro da zona de influência da França (qu e ajudara os ingleses a tomar Cantão, na 1. a Guerra do Ópio).

Era o assalto à China dos Manchus pelas potências ocidentais. Os portugueses tinham de deixar passar essa vaga altaneira e, em resposta, a ressaca dos nacionalismos da mesma China e do Japão. De 1942-1945, sob a ocupação japonesa, só no Tonquim, morreram 2 milhões d e vietnamitas de fome e de tifo. Em 1954, os comunistas de Hó Chi-minh arrebatam o antigo To nquim à França. Apesar do poderio formidável da América do Norte, todo o Vietname cai sob o jugo comunista, em 1975.

Contudo, no meio dessas convulsões gigantescas, conservámos intacta Macau, a Cidade do Nome de Deus.

Até hoje.

NOTAS

(1)Na Enciclopédia Verbo, palavra D. João V, vol. 11, cols.

606-11. "Manda a justiça que vejamos nele um dos monarcas que mais trabalhou pelo engr andecimento do País e melhor soube impô-lo, numa atmosfera de paz, ao respeito e ad miração de todos os Estados do seu tempo".

(2)Joaquim Veríssimo Serrão - História de. Portugal, Verbo, 1986, vol. V, ps. 270-6.

(3)"Breve Relação da jornada que fez à Corte de Pekim o Senhor Manuel de Salda nha, Embaixador Extraordinário del Rey de Portugal ao Emperador da China e Tartaria (1667-1670)", escrita pelo Padre Francisco Pimentel e documentos contemporâneos, compilados e anot ados por C. R. Bo-xer e J. M. Braga, Macau, Imprensa Nacional -1942.

(4)Além desta breve comunicação, cujo exemplar manuscrito o Autor teve a gentilez a de nos oferecer, aguardamos com sumo interesse a Biografia completa do P.e Antón io de Magalhães, S. J., que o Dr. Ramos tem no prelo.

(5)Louis Pfister, S. J. - Variétés Sinologiques N.o 59 - Notices Biographiques e Bibliographiques sur les Jésuites de l'an-ciene Mission de Chine (1552-1773), tome 1, N.o 166, P.412 - Chang-Hai. Não possuímos a última edição desta obra, várias vezes corrigi da e aumentada. Joseph Dehergne -Répertoire des Jésuites de Chine de 1552 à 1800, Institu-tum Historicum S. J., Roma,.1973, p. 16.

P.e Manuel Teixeira, Macau e a sua Diocese, XIV, As Missões Portuguesa s no Vietname, ps. 354-8. A documentação aduzida por estes dois autores é dispersa e, às vezes, contraditória. Necessita-se mais crítica, mais poder de síntese, melhor orde nação do material e sobretudo mais investigação.

A última observação também nos diz respeito. Consola-nos que a pesquisa histórica nunca tem fim...

(6)B. Videira Pires, em "Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura", Verbo, palavra Vietname, vol. 18, cols. 110-119.

(7)B. Videira Pires, S. J., A Embaixada Mártir, 2.a ed. 1988, Macau, I. C. M., ps. 36 e ss.; Id, A viagem de comércio Ma-cau-Manila nos séculos XVI e XIX, 2. aed., Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1987, ps. 33 e ss.

(8)W. J. M. Buch, La Compagnie des Indes Néerlandaises et l'Indochine, em Bulletin d e l'École Française de l'Extrème Orient, T. XXVI, 1936, fasc. l, ps. 125-6.

(9)Biblioteca da Ajuda, Lisboa, colecção "Jesuítas na Ásia", cód. 49-IV-66, fóls. 81-82.

(10)De família nobre, desempenhou em Macau cargos importantes e tem, junto a St.o António, descendo da Rua de S. Paulo para a da Senhora do Amparo, a "Calçada do Embaixador". Devia, segundo as regras da toponímia do tempo, ter aí a sua casa.

(11)Ajuda, Lisboa, colecção "Jesuítas na Ásia", cód. 49-4-7, fóls. 347-350. Modernizámos a escrita e dividimos os parágrafos da narração.

(12)O jesuíta que inventou a romanização da língua vietnamita. Ainda hoje, o se u Quoc Yue é a escrita oficial e literária dessa nação.

(13) P.e Manuel Teixeira, Macau e a sua Diocese, XIV, As Missões Católicas no Vietname, Macau, I. N., 1977, ps. 71-74, transcreve o documento indicado na nossa nota 11.

(14)Ajuda, Lisboa, colecção "Jesuítas na Ásia", códice 49-IV--61, fóls. 29-30. Para melhor compreensão, ordenamos o texto e aclaramos a tradução do anarnita, feita certamente pelos Jesuítas, em Macau.

(15)pp.es Metello e Saccano e Pero Marques, como dissemos.

(16) "Jesuítas na Ásia", cod. 49-IV-61, fóls. 30-31v..

(17)A. R. S. J., Jap-Sin. 70, fls. 151-213; fls. 151-161, 174-175, 177-211. Possuímos cópia xerox deste longo documento de martírio.

(18)Historical Sketch of the Portuguese Settlements in China, Boston, 1836, ps. 127 ss..

(19) P.e Manuel Teixeira, Macau e a sua Diocese, XV, ps. 172-3.

(20) O livro melhor sobre o assunto é o de Malcolm Hay, Failure in the FarEast, Neville Spearman, London, 1956, sobretudo nos caps. 6.o e 7.o, ps. 95-146.

(21)A Voz do Passado ou reedição fac-similada da Colecção de vários factos... com prefácio de José Maria Braga, ICM, 1987, p. 24. No dia 6 de Agosto do mesm o ano, fez-se, na Catedral de Macau, e na Fortaleza do Monte a cerimónia da aclamação do mesmo rei, com salvas em todas as fortalezas.

Os dois manuscritos conhecidos da Colecção (...) estão escritos na letra de D. Joaquim de Sousa Saraiva, bispo eleito de Pequim, que nunca saiu de Macau onde faleceu em 1819.

Alguns comentários, metidos às vezes entre parênteses, são também certamente do D. Saraiva.

As notícias históricas até 1706 são precedidas do verbo "consta", mostrando que são copiadas duma fonte antiga.

"Até 1735- escreve certamente Mons. Saraiva-, os factos foram extraídos de m anuscritos que me foram confiados e me asseguram serem verídicos, mas os factos de 1735 emd iante (até 1748) foram-me contados de viva voz, por pessoas antigas que os viram acontece r e a maior parte por mim mesmo, que não sou dos mais modernos". Id., ps. 55-6.

Os episódios relativos a António de Albuquerque Coelho procedem duma testemunha muito relacionada com ele tanta é a viveza dos pormenores e a manifesta simpatia d narrador por es se governador de Macau e de Timor.

Quanto a D. Leonardo de Sá, segundo a Colecção (...) e o Oriente Conquistado, deteve-se em Goa 6 anos para assisti a vários Conselhos Provinciais e exercer outros min istérios.

Na viagem para Macau, ficou cativo dos Achéns 9 anos chegando a Macau, pela primeira e última vez, em 1594. Fa-leceu aqui em 15 de Setembro de 1597.

Ora sabendo nós pelo P.e Valignano que D. Melchior Car-neiro, em 1584, ainda se encontrava forte (o que contraria versão do P.e Pires, no Pontos do que me alembra) e que portanto faleceu no fim desse ano, quando muito, não s pode atribuir a D. Leonardo qualquer parte na fundação d Leal Senado, como o P.e Manuel Teixeira sempre afirma.

Ele só passou 3 anos em Macau, já depois de o Leal Senado estar fundado há 10 anos.

(22) Guardam-se muitos elementos, no velho núcleo documen-tal do Leal Senado sobre esta ocorrência da Cochinchina P..e Manuel Teixeira transcreve praticamente tudo, em Ma-cau e a sua Diocese, XV, 1977, ps. 169-206.

(23)Benfeitor dos Jesuítas, sepultado no interior das naves de S Paulo (Macau).

(24)Macau e a sua Diocese, XV, ib..

(25)Presidiu, como na sessão da manhã o vereador do mês Gas-par Martins. Arquivos de Macau, Junho de 1974, 304 ss.

(26)Archivo da Índia, Livro das Monções, n. o80, fol. 168. As duas viagens de Timor e de Batávia, sem falar na de Goa Surrate (Golfo de Cambaia, junto a Dam ão), eram, no sé-culo XVIII, as mais rendosas para Macau. Cfr. a nossa obra Vida Mar ítima em Macau, no século XVIII, no prelo.

(27)Id., ib., fol.233.

Embora afecto aos Missionários da Propaganda e das Missões Estrangeiras de Paris, a viagem de Arnedo a Roma era necessária para informar a Santa Sé e o Superior Geral dos Jesuítas sobre a perseguição acintosa dos Vigários Apostó-licos (haja em vista por exemplo, Mons. Lambert de Lamot-te) contra os jesuítas, o que lhes apressou a supressão e ex-pulsão da Missão. Por mais simpatia que Arnedo, diplomaticamente, mostrasse com os franceses, não podia aprovar as suas intrigas e ambições. A missão, sem dúvida, era difí-cil. A Providência resolveu o assunto, com a morte prema-tura do Embaixador, que, na opinião do Vice-Rei, não seriaa pessoa mais indicada para essa delicada Missão. O sábio P.e João Loureiro parecia ser melhor, e mais isento diplo-mata. Mas Minh Vuong é que escolheu Arnedo, talvz mesmo pelo seu carácter condescendente, que furou po meio de tanto s obstáculos e engolindo muitos "sapos vivos como sujeitar-se, no princípio, a cuidar dos cães do monar-ca.

(28)Desde Goa. Por esta narração, parece que no regresso d Lisboa, o substituto P.e Miguel Varela não passou por Goa.

(29)O P.e Freire foi superior da Missão da Cochinchina em 1736.

(30)Da Sardenha. Chegou à Cochinchina em 1714 e faleceu emHué em 1726, mas o seu túmulo conserva-se em Faifó.

(31)Transcrito dos Arquivos de Macau, em P.e Manuel Teixei-ra, o. c..

* Lic. Literatura Portuguesa e Filosofia (Univ. Lisboa). Orientalista e investigador da História Portuguesa no Oriente e da Missão Jesuítica na Ásia com dezenas de títulos publicados. Governador da Associação Internacional dos Historiadores da Ásia e Sócio da Academia Portuguesa de História.

desde a p. 5
até a p.