Antropologia

BAILARINAS E CANTADEIRAS
ASPECTOS DA PROSTITUIÇÃO EM MACAU

Isabel Nunes*

Pei-Wang-Ha,"uma das mais formosas pei-pa-c hais de Macau", mais tarde artista de cinema em Hong Kong; in António Lopes,"A China e os Chineses",1933

INTRODUÇÃO

Entre os valores culturais que constituem o Património Histórico de Macau contam-se as profissões tradicionais que, pelas suas particularidades, justificam um lugar na História cultural de Macau.

O presente estudo sobre as mulheres floridas e as p'ei-pá-t'chái faz parte de um projecto mais vasto que visa a pesquisa histórica das profissões que se tomaram tradicionais em Macau. Começamos por apresentar o estudo elaborado acerca destas mulheres, conhecidas também por cantadeiras e dançarinas, e cuja profissão se identificou com a prostituição.

A prioridade dada ao estudo do exercício da prostituição em Macau obedece a duas justificações fundamentais: uma de ordem subjectiva, que reside no fascínio que representou o estudo desta matéria, acerca da qual não foi até hoje realizada nenhuma síntese histórica; o segundo, o motivo determinante, deve-se às características de que se revestiu a prostituição em Macau, fazendo com que esta profissão universal aqui se individualizasse. O conceito de prostituição no Oriente, neste caso, em Macau, divergindo substancialmente daquele que a caracterizava no Ocidente criou, aqui, um mundo, envolvendo a prática da prostituição com características muito próprias.

O plano de trabalho e a forma como foi tratado o tema, subordinaram-se às informações recolhidas nas fontes primárias e secundárias consultadas que, sobre a matéria, infelizmente não abundam. Por isso não foi possível, como se pretendia, aprofundar alguns aspectos como, por exemplo, os referentes aos barcos das flores, aos locais e casas toleradas e às questões relacionadas com a saúde pública. Temos, portanto, consciência que o presente estudo não vem esgotar o assunto. O seu objectivo final foi dar a conhecer uma perspectiva histórica de um aspecto que se revestiu de características especiais na realidade social de Macau, podendo servir, simultaneamente, como ponto de partida para futuros estudos que se venham a desenvolver neste campo.

MULHERES FLORIDAS E P'ÊI-PÁ-T'CHÁI: UMA FORMA DE PROSTITUIÇÃO EM MACAU ASPECTOS GERAIS

A prática da prostituição existe desde os tempos mais remotos, é "tão antiga como o mundo"(1)e encontra-se em todos os povos, o mesmo não se verificando em relação ao seu conceito, que variou através dos séculos de acordo com os costumes e a moral de cada povo.

Várias são as definições que lhe foram dadas ao longo da história, começando pelas leis atenienses no tempo de Sólon que, segundo se crê, foram as primeiras relativas ao tráfico da prostituição, passando pelos enunciados propostos no Século XVII à luz do Direito Canónico e do Direito Germânico, sem falar nas numerosas designações por que foram conhecidas as meretrizes: as quaestosa e meretrix romanas, as heteras, dicteríadas e palakinas gregas, as cortesãs indianas, e muitas outras.

Pintura de Gu Hongzhong, encomendada pelo imperador-poeta Li Yu (937-978).

Foi apenas no Século XIX que o conceito de prostituição se consolidou, quer como factor sociológico, quer assumindo estatuto jurídico. As mulheres que se dedicavam à prostituição passaram a partir de então, e no caso de Macau mais precisamente a partir de 1851, a reger-se por um conjunto de normas que, para além de regular a sua actividade profissional, as vinha submeter também a determinadas regras, denunciadoras da marginalização a que eram votadas por parte da sociedade. Entre estas regras contavam-se a obrigação de viverem em bairros separados, de serem sujeitas periodicamente a inspecções médicas, para não falar dos conflitos que diariamente se geravam em tomo de alguns casos pontuais e das reclamações apresentadas por virtuosas e respeitáveis senhoras de "famílias graves"(2), indignadas com a tolerância que em seu entender existia por parte das autoridades para com as mancebas mundanárias, como lhes chamou Fernão Lopes.

Estas e outras questões, entre as quais os conceitos chineses de mulher e de casamento, ocupam lugar determinante e irão permitir compreender, por um lado, como foi encarada e aceite a prostituição no Oriente e, por outro, identificar as mulheres do mundo florido como uma das profissões tradicionais de Macau, não pela sua exclusividade, mas antes pela especificidade que fez dela o fascínio de muitos que por aqui passaram.

Depressa nos apercebemos desse fascínio quando, guiados pela pena de alguns desses visitantes, somos arrastados num deambular nocturno pela movimentada Rua da Felicidade e nos cruzamos com as cabaias vistosas, de sedas berrantes ou avistamos "- uma estrela do Bazar - imponente, hierática, divinizada, verdadeira rainha vaporosa daquela noite de luz (...)"(3), fascínio que se prolonga nas descrições pormenorizadas dos barcos das flores ou dos jantares e ceias em coulaus (restaurantes chineses) "alegradas com lindas canções de lendárias eras entoadas por delicadas p'êi-pá-t'chái que se faziam acompanhar a si mesmas ao psaltério".(4) Em suma, conforme afirma Jaime do Inso: "Como tudo aquilo é diferente! Não é só outro país, é outro mundo, de beleza estranha, que a civilização europeia vai minando e pondo em risco de se perder."(5)

Todos eles, mesmo aqueles que teceram considerações mais moralistas, consequentemente menos favoráveis, retiveram na memória a imagem sensual das p'êi-pá-t'chái: "(...) são flores exóticas, garridas e perfumadas, a matizarem a massa anónima e escura (...) da multidão que passa."(6)

ORIGENS DA PROSTITUIÇÃO

Várias foram as razões que, ao longo da História, levaram as mulheres a dedicar as suas vidas e os seus corpos à prática da prostituição. Na religião encontraram alguns povos a justificação, fazendo da sua entrega uma autêntica homenagem às divindades que, como Vénus, Falos, Volúpis, Afrodite e outros deuses, deixaram os seus nomes indissociavelmente ligados ao acto sexual. Ainda hoje no nosso vocabulário vamos encontrar termos e expressões evocativas dessa associação. Outros, no domínio profano, consideraram a prostituição como uma manifestação de hospitalidade, enquanto para a maioria, conforme o termo prostare (estar à venda) indica, se tratava de uma forma de comércio. Não pretendendo desenvolver uma tese acerca das origens e causas da prostituição, ir-se-á analisar esta última, ou seja, a prostituição exercida como profissão, na medida em que era esta forma que dominava e se perpetuou na história de Macau, fazendo do seu mundo florido um aspecto tradicional.

A sua origem assenta fundamentalmente, tal como no Ocidente, num problema de ordem económica, e por isso a vamos encontrar com maior implantação nos períodos em que se verificou uma recessão na conjuntura económica, tendo sido praticada, na sua maioria, por mulheres pertencentes às classes sociais de parcos recursos.

Para compreender as origens do mundo florido torna-se necessário, dir-se-á mesmo fundamental, abstrair de preconceitos em que assenta a mentalidade ocidental, não significando esta atitude que os ignoremos mas, sim, estar receptivos a diferentes filosofias de vida, diferentes conceitos de família e de mulher, e diferentes formas de encarar o casamento e o sexo. Enfim, estar abertos a um mundo que assenta em valores distintos, onde o peso da tradição foi capaz de manter vivos, durante séculos, certos costumes. Apenas deste modo se estará apto a penetrar no mundo das mulheres floridas e das p'ei-pá--t'chái, e a analisar qual o papel das concubinas, e os motivos por que se distanciaram das meretrizes, bem como a perceber a situação dúbia das muichai.

Estruturalmente patriarcal, a família chinesa assentava, até ao Século XX, em valores filosóficos e morais confucionistas, que concediam ao homem importância primordial, ainda hoje sentida apesar das reformas que já ocorreram no capítulo da emancipação da mulher. Ter um filho varão representava, e ainda representa para um Chinês, aspiração fundamental, pois que, além de continuador da linhagem paterna, a ele cabe mais tarde dar "(...) continuidade ao culto ou (...) oferecer preces e sacrifícios (...)" em benefício da alma de seu pai.

A filha, pelo contrário, rejeitada logo à nascença, era remetida a uma posição subalterna, e submetida desde a infância a uma disciplina rígida no lar paterno, autoritário, onde, para além de receber um tratamento diferente de seus irmãos, lhe era vedado, entre outros direitos, o acesso à cultura ou a possibilidade de manifestar qualquer opinião ou sentimento. Assim, crescia com um estatuto de inferioridade que a acompanhava pela vida fora, e que a fazia aceitar com resignação uma vida desigual, inferior à do homem, por pura discriminação sexual. Esta vida de submissão constante era aceite como forma de "(...) expiar faltas eventualmente cometidas numa vida anterior (...)"(9). Deste modo, a mulher foi, durante séculos, tratada como um ser inferior ao homem, desigualdade consagrada em leis de um ordenamento jurídico que especificamente a penalizavam.

Enquanto no Ocidente, ao longo do Século XIX, a mulher foi conquistando o seu espaço jurídico e social, no Oriente a situação feminina mantevese praticamente inalterada até ao Século XX.

Foi com a implantação da República Chinesa, em 1911, que se deram os primeiros passos, incipientes, no sentido da emancipação da mulher, em que se inscreveu, em 1919 (10), a abolição dos lírios de ouro, que durante tantos anos atormentaram os pés femininos, diminuindo as capacidades físicas da mulher, ao mesmo tempo que lhes coarctavam a liberdade de acção. Foi, no entanto, preciso esperar pela promulgação da Lei do Casamento, em 1950 (11), para que fossem abolidos a compra da mulher e o casamento feudal, pondo termo ao sistema tradicional de casamento baseado num convénio prévio entre as famílias. Este sistema, que também existiu no Ocidente, faz reportar aos casamentos realizados à luz do Direito Consuetudinário nos primeiros tempos da nacionalidade portuguesa. Embora os princípios confucionistas remetam a diferentes conceitos de ordem moral, não se pode ignorar que no Ocidente também existiu o sistema de casamento acordado previamente entre as famílias, do qual fazia parte igualmente um dote.

A evolução do Direito e o contributo da Igreja Católica fizeram com que no Ocidente este tipo de casamento caísse progressivamente em desuso, enquanto na China o espírito conservador e tradicional se associou ao hermetismo, forma de resistência à influência estrangeira, levando a que este hábito se mantivesse até meados do Século XX.

Como parte deste processo, a mulher, ao casar, passava da submissão paterna à sujeição matrimonial, onde a esperava um conjunto de deveres e obrigações como esposa e como nora, surgindo por vezes, do contacto e da convivência, a afeição e o amor, embora estes não fossem considerados valores fundamentais nem decisivos para justificar ou manter a união matrimonial.

Resignada com a sorte que lhe estava destinada, era ela, mais tarde, como mãe, a ministradora de uma educação dura e austera aos seus filhos, incutindo-lhes e impondo-lhes respeito e sujeição à autoridade paternal, considerada a principal das virtudes, a piedade filial. A suas filhas, para além destes princípios, incutia também a humildade e a aceitação do seu estatuto de inferioridade relativamente ao homem, preparando-as para um dia o servir como mulheres e servas.

Ao conceito de mulher e de casamento encontrava-se associada a função sexual, que segundo a filosofia chinesa tinha "um objectivo duplo, sendo o principal o da propagação do clã familiar (...) e o secundário o de intercâmbio de energia vital".(12)

Tão enraizados se encontravam estes conceitos tradicionais nas populações chinesas de Macau, que a Administração, impotente para as obrigar a ceder neste campo, e com o objectivo de evitar conflitos internos, criou, em 1869, o "Código dos Usos e Costumes dos Chins de Macau", onde, acerca da família e descendentes, lhes foram concedidas situações de excepção.

Barcos de flores

É neste contexto de cultura e de mentalidades que se encontra inserida a prostituição chinesa. Para os Chineses, que até 1950 viram reconhecido oficialmente o regime de concubinato em que viviam, a prostituição não assumiu o significado que a caracterizou junto dos ocidentais. A sua procura, face ao sistema instítuido de casamento, permitia-lhes encarar a prostituição com naturalidade, como se se tra-tasse de "(...) uma compensação para esta desvantagem (...)"(13), ao mesmo tempo que do ponto de vista físico a consideravam recomendável, pelo seu efeito "(...)revigorante para a energia masculina (...)"(14), considerado como importante contributo para a saúde.

Entre o Ocidente e o Oriente, realidades bem distintas trazem à luz, não só razões de base totalmente diferentes para quem frequentava esses meios, como também contrapõem mundos de prostituição diversos: por um lado, a vida boémia e debochante associada à prostituição ocidental, por outro, o sentido de arte - arte do amor - em que a mulher chinesa era cuidadosamente educada e preparada desde criança.

Enquanto do Ocidente Lusitano ficam na memória as guitarradas e o fado batido, acompanhado de vinho carrascão e da faca na liga, do Oriente fica a discreção e subtileza com que as "(...)p'êi-pá--t'chái, deliciosas donzelas, especialmente adestradas na arte de quebrar a monotonia e insipidez dessas reuniões..."(15) cantavam e dançavam ao som da p'êi-pá, do saltério e do piano.

P'êi-pá-t'chái e mulheres floridas - famosas cantadeiras e dançarinas - todas elas provinham de famílias pobres ou de parcos recursos financeiros. Os seus progenitores, na consciência de lhes faltarem meios para sustentar mais uma fêmea e de poderem vir mais tarde a não ter posses para "as casar convenientemente"(16) abandonavam ou vendiam as suas filhas ainda nos primeiros tempos de vida. Durante séculos, parte da comunidade chinesa recorreu a estas soluções, lógicos e únicos meios de alívio para o encargo económico que representava o indesejado nascimento de mais uma filha.

Na maior parte dos casos era a Santa Casa da Misericórdia, à imagem do que acontecia em Lisboa, que recolhia essas crianças abandonadas e as alimentava até aos sete anos, após o que se viam novamente sem lar, entregues a si mesmas, e tendo de garantir a subsistência pelos seus próprios meios. Não admira, pois, que sendo tão pequenas, muitas delas se entregassem nos primeiros tempos à mendicidade, e mais tarde, depois de tentativas falhadas para arranjar emprego, enveredassem pela prostituição. Este aspecto, já em finais do Século XVIII se torna alvo de preocupação, conforme é perceptível na carta acerca da roda dos expostos, que o então Governador Diogo Salema Saldanha dirigiu ao Bispo D. Alexandre Guimarães:

"Para que V. Exa. venha no conhecimento de que a origem dos referidos males está por hora irremediável, vou a dizer que o desamparo de todas estas mulheres que por necessidade se entregam aos chinas, a estrangeiros e a todos os mais, tem o princípio em que a Misericórdia dá os seus expostos para se criarem a mulheres pobres, que os aceitam com o interesse de acharem ali a paga mensal com que ela contribui.

"Mas fechados os sete anos não os sustenta mais nem por eles mais pergunta e dali por diante como as ditas amas os não podem alimentar nem vestir, põem-nos logo a pedir esmola pelas portas e pelas boticas e a comprarem o que em casa lhes é preciso."(17)

Outras vezes, essas mesmas crianças abandonadas caíam facilmente nas mãos de "malfeitores que se dedicavam ao sequestro de menores, as quais, vendidas a tarascas Kuai-p'ó, ficavam retidas em seu poder até ao fim da vida, se não conseguissem ser alforriadas por algum ricaço que as desejasse levar para as suas casas como concubinas."(18)

À prostituição estavam também destinadas, sem que lhes fosse dada qualquer possibilidade de escolha, aquelas que eram vendidas por opção dos pais. Para estas crianças o destino era-lhes claramente traçado logo de início, ao serem adquiridas por donas de casa que as compravam com o único propósito de as educar na arte do amor. Levadas para os lupanares, recebiam uma educação esmerada, aprendendo não só música e poesia como também princípios de boas maneiras, e ainda os principais segredos do arranjo e embelezamento pessoais, até ficarem aptas na complexa arte da sedução.

Tinham fama de cantar e dançar muito bem, o que lhes valeu as designações de cantadeiras e dançarinas, por que são frequentemente conhecidas.

A regulamentação tratou-as genericamente de meretrizes, não estabelecendo entre elas diferenças que permitissem distingui-las entre si. Por isso, a tentativa de criar no seu seio uma tipologia ou critério de classificação levanta diversos problemas, uma vez que são muito mais numerosas e significativas as semelhanças do que possíveis diferenças. Começando pelas monografias de Macau, a maioria dos autores que abordaram este tema fizeram-no utilizando indistintamente qualquer das designações, revelando, assim, não existir qualquer critério especificamente adoptado, nem tão pouco demonstrando tal necessidade. Por outro lado, a legislação pouco mais veio acrescentar: primeiro, porque como já ficou dito, as designou a todas meretrizes, à imagem da regulamentação emitida em Lisboa; depois, porque as diferenças consideradas entre donas de casa e meretrizes de lª. e 2ª. e 3ª. classes, traduzindo a supremacia que as primeiras, como proprietárias, exerciam sobre as meretrizes, no fundo se resumiam a critérios de tributação e de controlo higiénico e sanitário.

O MUNDO FLORIDO AS MULHERES FLORIDAS

Associada fundamentalmente às mulheres floridas e aos barcos das flores ficou a expressão mundo florido para referir todos estes aspectos, nela se incluindo na sua generalidade toda a prostituição em Macau, nomeadamente as p'êi-pá-t'chai.

Inúmeras foram e serão sem dúvida as razões que levaram os homens a associar o designativo flor -símbolo de pureza e beleza - a esse mundo que, segundo os conceitos morais ocidentais, se considerava depravado e impuro.

Com o objectivo de entender o motivo de tal associação, procurou-se ver qual a importância da flor em termos antropológicos e para isso recorreuse a uma breve retrospectiva histórica na qual se verificou existir uma longa tradição, quer no Oriente, quer no Ocidente, que atribuía às flores presságios e superstições. Na mitologia, ocuparam as flores um lugar de relevo como símbolo de fertilidade, de renovação individual e da natureza, tendo nesta perspectiva sido associadas a certas divindades, como por exemplo à deusa Flora entre os Romanos, ou à deusa Clóris entre os Gregos, e sido motivo na celebração de festividades e procissões em sua honra. A Igreja Católica identificou algumas delas, entre as quais a flor de laranjeira, como símbolo de castidade, utilizando-a com carácter ornamental nas grinaldas e nos "bouquets" das noivas, onde ao valor estético se acrescentava o simbólico.

No campo profano, e ainda com um sentido de beleza e de pureza, as flores ocuparam lugar igualmente importante nos mais diversos domínios. Na arte, a flor figurou como um dos motivos de maior importância na pintura, tendo sido largamente utilizada, quer em pequenos e singelos detalhes decorativos, quer como elemento primordial em decoração, e em cerimónias públicas e privadas, enquanto na poesia foi um dos temas mais tratados. Com a chegada do Século XIX adquiriu, com as tendências literárias da época sob a influência românica e naturalista, uma conotação diferente, tendo sido empregue pelos escritores com valor metafórico, utilizando-a para intitular as suas obras sob a capa de uma falsa ingenuidade, de que são exemplos A Dama das Camélias e a Rosa Enjeitada, que escondiam no seu conteúdo realidades da vida e do amor censuradas pela moral pública, ao mesmo tempo que reflectiam o sarcasmo e a ironia com que esses autores souberam criticar sabiamente a sociedade de então.

No Oriente, e principalmente na cultura chinesa, as flores ocuparam, mais do que em qualquer outra civilização, um lugar fundamental. O amor pela natureza tornou-as, a par com outras plantas, alvo de observação e cuidado, o que permitiu, através do conhecimento milenar das suas propriedades, delas tirar o melhor aproveitamento.

No domínio da superstição, tão enraizada como se sabe na cultura chinesa, as flores foram associadas a diversos presságios, bons ou maus, conforme a espécie em causa. Disto constituem exemplo as peónias, tão utilizadas em representações pictóricas chinesas como símbolo de amor e fertilidade, podendo as dálias, os crisântemos e muitas outras ser acrescentadas a estes exemplos. Com base nestes aspectos, vários podem ter sido os motivos que levaram a associar a flor às meretrizes chinesas e ainda à prostituição em geral. Entre eles, a beleza que tinham fama possuir essas mulheres pode ter sido, por associação à beleza das flores, sem dúvida um deles, visto o conceito de prostituição para os Chineses não possuir a conotação negativa que tinha no Ocidente. Mas o mais decisivo foi provavelmente o hábito das meretrizes chinesas se adornarem com flores, o que lhes mereceu o epíteto de mulheres floridas por que tradicionalmente se tomaram conhecidas. As flores eram utilizadas, a par da sua maquilhagem acentuada, como um complemento ornamental às "cabaias vistosas, (...) braceletes e anneis, manilhas de prata nos tornozelos..."(19), e ainda nos seus penteados, habitualmente de grande altura, onde se distribuíam profusamente. Era ainda com flores que as meretrizes engalanavam as casas, casas floridas onde residiam, e decoravam artisticamente os seus altares, em cujo esmero rivalizavam por ocasião da Festa das Sete Irmãs ou Festividade das Tch'ât-Tchêk, consagrada às raparigas solteiras, festa por excelência das meretrizes que, por isso, primavam no requinte das decorações floridas.

Do ambiente florido, e sobretudo das mulheres floridas, das suas toilettes profusamente ornamentadas, ficou o registo da beleza e do exotismo. Mesmo aqueles que teceram considerações reprovativas a esse mundo florido não deixaram de lhes realçar a formosura. Obviamente que esta forma de se arranjarem e ornamentarem, ao mesmo tempo que tinha o objectivo de realçar a sua toilette e a sua beleza, constituía uma forma de chamar a atenção funcionando, neste caso, como um sistema simples e primário de publicitar a sua profissão. Por isso os excessos ornamentais não eram aconselhados às mulheres decentes, a quem eram impostos a discrição e o recato, sendo-lhes igualmente vedado o contacto e o convívio com o sexo oposto que, tal como no Ocidente, estava reservado às mulheres públicas.

Mulheres floridas e p'êi-pá-t'chái recebiam desde crianças uma educação esmerada, na qual os mais pequenos pormenores não eram descurados, do arranjo cuidadoso e requintado ao culto da música e das letras. O que mais impressionou aqueles que com elas privaram, foi a forma discreta e insinuante com que sabiam explorar os dotes femininos, proporcionando, conforme as situações, uma companhia agradável. Frequentavam os meios públicos participando nos mais diversos tipos de reuniões, fossem jantares ou serões, que se prolongavam pela noite fora, e onde cantavam e dançavam ou, para quem preferisse, recitavam poemas e conversavam com elegância entre "expressões de gentileza e meneios de olhos e de mão"(20), que sabiamente empregavam para entreter e seduzir os participantes. O abuso destes serões prolongados levou a que, em 1911, saísse um Aviso a proibir a frequência e permanência dessas mulheres em hospedarias para além das duas horas da noite.

AS P'ÊI-PÁ-T'CHÁI

No caso das p'êi-pá-chai o seu nome encontra-se associado ao instrumento de música, p'ei-pá, que habitualmente tocavam, e ao som do qual cantavam. É instrumento de quatro cordas, composto por uma caixa de ressonância em madeira, bojuda, em forma de pêra.

Embora tenha sido a p'êi-pá ou pi'pa o instrumento musical privilegiado do mundo florido, outros foram igualmente tocados por essas mulheres, como o saltério, "martelado com grande virtuo-sidade"(21), e o piano, trazido "debaixo do braço"(22) pelas amas que as acompanhavam. Era assim frequente, depois de fazerem a sua actuação, irem "(...)tocar para outras partes, de coulau em coulau."(23)

Quem as desejasse procurar e disfrutar-lhes a companhia, ia à zona do Porto Interior ou do Bazar, sendo famosa a Rua da Felicidade, onde se concentrava grande número de casas toleradas. Aí se podiam ver e contactar as mais diversas categorias de p'êi-pá-t' chái: "(...)as de menor fama desciam e ficavam à entrada, em grupos, muito pintadas, com flores e ornamentos nos penteados, trajando cabaias de cores berrantes, abanando-se e conversando garrulamente"(24), enquanto aguardavam cliente. Havia, depois, as outras, de maior fama, que ao contrário das anteriores se reservavam discretamente em casa ou em seus quartos, aguardando os contactos. Algumas destas mantiveram relações assíduas com certos clientes, a quem especialmente recebiam em seus próprios quartos, ou a cujas casas se deslocavam.

Havia por último aquelas que, por serem "fêmeas maduras, retiradas das pelejas sexuais"(25), eram na maior parte donas das casas. Era assim frequente serem vistas a fumar ópio e a conversar pacatamente.

No geral, primavam pela educação, cultura e arte de agradar, qualidades que se requintavam em algumas delas, gerando especiais inclinações ou fixações nos frequentadores habituais, ou afamando--as como Iêng-Hông, Iu-Sâng, Fá-Pêk-Lin, "as mais donairosas servidoras (desse estabelecimento) e aquelas que com mais rigor sabiam cumprir as regras de bem receber e de obsequiar os chineses ricaços que desejassem folgar-se com a companhia das suas presenças."(26) Aqueles que preferissem as brisas refrescantes do rio nas noites mais quentes, podiam gozar da companhia destas mulheres em opulentos barcos deflores. Quer num caso, quer no outro, a estas mulheres que pertenciam ao mundo florido ficaram associadas a cultura e a arte, o que fez com que a prática da prostituição tivesse, em Macau, um cariz distinto da que se praticava no Ocidente.

AS MUICHAI

Ocupando o lugar mais baixo na hierarquia das serviçais apareciam as muichai, com um estatuto semelhante ao das escravas. Não eram, no entanto, verdadeiras escravas, nem podiam ser consideradas como prostitutas. A sua situação era um pouco dúbia pois que o hibridismo do seu estatuto levava a que em certas ocasiões desempenhassem as duas funções, consoante a vontade e determinação do seu patrão, simultaneamente seu propietário. Na maioria, pertenciam a famílias portuguesas que as compravam, ou por quem eram apropriadas, herdando a mesma sorte ou estatuto de suas mães, pelo facto de terem nascido no seio das famílias onde elas já serviam.

A instauração do liberalismo em Portugal e as medidas tendentes a acabar com a escravatura, vieram proporcionar uma definição mais clara do estatuto destas mulheres, afastando-as do conteúdo conceptual da prostituição. Contudo, estavam longe de serem sanados os abusos cometidos com estas serviçais que, embora à face da lei fossem consideradas libertas, continuavam na prática a ser escravas. Deste modo não se podem tomar as muichai como meretrizes, pois apesar de muitas vezes terem sido utilizadas como tal, não era a prostituição o seu modo de vida. Só após a promulgação do Código do Governo da Colónia, em 1937, é que se conheceram verdadeiras medidas repressivas da utilização abusiva das muichai.

Atendendo a todos os aspectos referidos não se consideraram as muichai como meretrizes, tendose, relativamente à prostituição, partido de um todo - o mundo florido - no qual, com base no binómio rio-terra, se distinguiu a prostituição praticada por mulheres que habitavam as embarcações da que era praticada em terra. Esta foi meramente uma questão metodológica, partindo do princípio de que, para além da terminologia, nada mais diferenciou as mulheres floridas das p'êi-pá-t'chái.

OS BARCOS DAS FLORES

Constituía o estuário do Rio das Pérolas um ambiente sui-generis, no qual sucessivas gerações de famílias habitaram em barcos, com uma estrutura perfeitamente montada de modo a satisfazerem as suas necessidades primárias, sem precisarem de ir a terra, onde geralmente só iam por altura do Novo Ano Chinês. No lugar das casas toleradas, dos restaurantes e dos bares, as cantadeiras e dançarinas encontravam-se aí nos tancares e nos barcos das flores. Assim, entre a diversidade de embarcações que se encontravam fundeadas, contavam-se aquelas onde se exercia a prostituição, que "(...)agrupadas às vinte e trinta, formam um bairro à parte, de prazer e de luxo...", e se encontravam ligadas entre si por uma série de "(...)velhos passadiços, das pranchas e pontes que ligam entre si convez a convez (...)".(27)

Desta prostituição praticada a bordo podem distinguir-se dois tipos, segundo o ambiente do local que a rodeava, isto é, segundo o tipo de barco, ou segundo as suas características envolventes. No seu nível mais baixo, a prostituição praticada em modestos tancares, pobres e sem qualquer requinte de ambiente, cheirando a miséria e pobreza, exercida por tancareiras, que habitualmente acumulavam esta profissão com a de prostitutas. Para a maioria delas representava uma actividade adicional a que se dedicavam para sobreviver, quando, como tancareiras, o dinheiro recebido pelo pagamento dos fretes não chegava para fazer face aos encargos familiares.

A sua clientela era constituída pelas tripulações dos barcos ancorados no porto, com quem estabeleciam contacto durante os pequenos percursos de transporte para terra, ou quando regressavam. Ofereciam-se também, habitualmente, para coser e lavar a roupa desses indivíduos, que por se acharem em viagem aceitavam de bom grado o pagamento de uma pequena importância pela prestação desse serviço. Também os soldados fizeram parte da sua clientela, durante as folgas de serviço, que aproveitavam para se deslocar às embarcações, no intuito de se divertirem, provocando por vezes distúrbios, conforme se refere no ofício enviado pelo Procurador ao Mandarim Cso-tam(28), em 1837.

A outra forma de prostituição, envolvida em luxo, portanto de um nível muito superior, era praticada em requintados barcos deflores.

Pouca documentação existe acerca destes barcos e muito menos sobre a sua origem. Ao que parece esta remonta ao tempo do Imperador Liu Ch'ao, (Seis Dinastias, a. d. 265-589) tendo perdurado em Cantão, onde eram numerosos, até à Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung. A causa da sua origem encontra-se associada à poesia, uma vez que esses barcos eram muito frequentados pelos poetas, que buscavam na companhia das mulheres dos barcos floridos, famosas pela sua educação e cultura, e ainda no vinho e no ópio, inspiração para as suas obras.

Diversas foram as formas e utilizações que tiveram estes barcos. Havia-os de grandes dimensões, Lou-tzu, com cerca de 35 pés, também conhecidos pela designação de barcos com galeria, onde se realizavam festas civis e religiosas, e onde era possível alojar dezenas de convidados, e outros, mais pequenos, com cerca de 10 pés, que comportavam unicamente oito pessoas. O seu aspecto exterior, para além da lanterna de papel colorido, iluminada, que os anunciava à distância, era marcado por uma ornamentação exuberante, carregada de flores polícromas - peónias, dálias e crisântemos, símbolos de amor, fertilidade e felicidade - em que predominava o vermelho, e que se entrelaçavam em frisos, envolvendo-os e emoldurando-lhes as janelas. Era este aspecto garrido que os distinguia, pelo contras-te, da sobriedade habitual dos barcos do sul da China. O seu interior, tal como o seu exterior, era exuberante e luxuoso pois que os seus frequentadores mais assíduos, homens de negócios ou ricos proprietários, apreciavam o conforto proporcionado por estes ambientes: "Os tancás-flores constituem um autêntico luxo, requintados e ricamente decorados. O seu interior forrado com cortinas de seda, vidros corados, ornamentadas entradas. Flores e mobílias escolhidas com cuidado e preocupação de dar um tom de ambiente e requinte."(29)Os mais pequenos, e embora de menores dimensões, igualmente primavam pelo requintado ambiente. Deles fazia parte um salão de recepção guarnecido de largos divãs que se destinavam a proporcionar adequado conforto enquanto se fumava o ópio.

Foram, no entanto, estes últimos que mais vivos ficaram na memória chegando até aos nossos dias alusões relativas aos belos momentos proporcionados pela companhia das mulheres floridas que os povoavam. A utilização destes barcos encontra-se ligada a uma velha tradição chinesa, em que a gente rica, especialmente grupos de jovens, os alugavam para, na companhia das mulheres floridas, fazerem longos passeios refrescantes pelas águas dos rios e dos lagos, enquanto fumavam ópio. Acerca destas mulheres pouco mais há a acrescentar além do que já foi referido anteriormente, apenas que diferia o local onde exibiam os seus dotes. Da memória destes barcos de flores ficou, sem dúvida, o encanto e a beleza com que se destacavam na escuridão da noite, pelo brilho das luzes e do seu colorido, e também pela recordação dos momentos de prazer neles passados, e a que se encontrava intimamente associado o vício do ópio. Os autores que a eles se referiram, fizeram-no marcados pelo verdadeiro encanto dos "promenades sur l'eau, dans un canot fleuri, à installation confortable, au bruit cadencé des rames qui vous bercent mollement, nous donnent à la fois plaisir et repos"(30), ou ainda, pelo belo espectáculo proporcionado pelos "barcos das flores feéricamente iluminados."(31)

OS LOCAIS E CASAS TOLERADAS

Além da prostituição que se praticava a bordo dos barcos de flores que povoavam o estuário do Rio das Pérolas, havia também aquela que se praticava na cidade, exercida por prostitutas que viviam em grupo ou isoladas. No primeiro caso concentravam-se na mesma casa, a viver em comum, sob a tutela de uma patroa, a dona da casa, para quem trabalhavam. Encontravam-se deste modo abrangidas, não só pelos Regulamentos em vigor, como pelas regras impostas pela dona da casa. Se para elas constituía preocupação o respeito pelos Regulamentos, maior preocupação era posta no cumprimento das regras internas da casa em que habitavam, pois que a desobediência às normas poderia traduzir-se em expulsão, ficando deste modo sem tecto e sem emprego. Uma das regras de ouro era a de não se deixarem seduzir ou envolver sentimentalmente com os seus clientes, o que não impedia, contudo, que pudessem vir a ser alforriadas por algum indivíduo rico que pretendesse adquirir uma concubina. Neste caso o acontecimento era festejado por todas as suas companheiras, pois constituía motivo de honra para a casa a eleição de uma das suas raparigas, e porque a mesma iria ter uma vida melhor. Quando alguma p'êi-pá-t'chái era alforriada e abandonava a profissão, era costume ornamentar as casas (lupanares) de luminárias; e vendo-se as "(...)fachadas ricamente engalanadas de flores e decoradas com festões encarnados, já se sabe que se trata de alguma donzela que vai abandonar, definitivamente, o prostíbulo para entrar em casa dalgum ricaço como sua mulher legal."(32)

As meretrizes que viviam isoladas, por conta própria, habitavam em quartos onde eram contactadas para marcar encontros, sendo raro aí receberem os seus clientes, pois que, na maior parte dos casos, eram elas que se deslocavam aos locais combinados que eram muitos e diversos, como restaurantes, bares, hotéis, hospedarias, casas de jogo e casas de ópio, havendo ainda como alternativa a casa dos seus clientes.

As meretrizes encontravam-se disseminadas pela cidade, especialmente nas épocas de maior concorrência, e introduziam-se em todos os lugares que se lhes apresentassem como mais propícios a arranjar clientela. O aumento de prostituição verificado ao longo do Século XIX veio agravar este aspecto que, associado a outros factores de ordem social, originou a publicação, em 1845, do Edital que proi-bia, à semelhança do que havia sido publicado em Lisboa, em 1838, que as meretrizes habitassem determinados locais da cidade, por se considerar que a sua vizinhança era moralmente prejudicial.

"Edital para não poderem allugar cazas às meretrizes menos no Chunambeiro e S. Lázaro

"(...) faz saber a todos os Proprietarios de Cazas da mesma [cidade] que constando-lhe haver grande número de meretrizes trajadas já a Europea, já a China, habitando em differentes partes da Cidade entre Cazas honestas quasi promescuamente, sem selecção alguma incommodando por isso as suas vizinhanças o socego; e recato de famílias graves, e corrompendo a moral pública, e querendo este Leal Senado de alguma maneira obviar hum tão reprehensivel, e extranho procidemento, determina, que além dos siteos do Chunambeiro, e S. Lazaro, os que tiverem suas Cazas, allugadas a taes mulheres, as farão despejar dentro do prazo de 20 dias contando desde esta datta, com a comminação de serem os contraventores do prezente Edital multados... bem como os que para o futuro allugarem suas cazas a dittas meretrizes..."(33)

Verificando-se que estas medidas não eram respeitadas pelas meretrizes nem pelos proprietários das casas, mais interessados em alugá-las do que em discriminar as pessoas pelos seus hábitos e actividades profissionais, a Administração fez publicar novos Editais especificando as Ruas e Travessas em que as meretrizes eram autorizadas a residir, que se localizavam genericamente na zona chinesa, no Porto Interior e no Bazar. Pretendia-se, com esta concentração em determinados locais, satisfazer não só os requisitos de ordem moral, como ainda facilitar à Administração um controlo mais eficaz do cumprimento do Regulamento e a cobrança das taxas.

Além destas restrições, o 1º Regulamento, publicado em 1851, ditava ainda que "É expressamente prohibida a admissão de mulheres prostitutas, e o exercicio e prostituição nas hospedarias, tavernas, lojas ou cazas de bebida, e em geral em todas as cazas publicas semelhantes"(34), acrescentando punições: "Aos donos e administradores de cazas, logo que conste o abuzo, será immediatamente caçada a licença para o exercicio do seu commercio licito, e elles postos em detenção, e entregues ao Poder Judiciario para serem processados e punidos nos termos das leis em vigor contra os que dão cazas de alcouce."(35) Nem mesmo assim se amedrontaram os proprietários, que continuaram a permitir que. as p'êi-pá-t'chái e mulheres floridas frequentassem os seus estabelecimentos, nem tão pouco elas que, como cantadeiras e dançarinas, se sentiam no direito de os frequentar. Deste modo não foi possível sanar a situação ao longo do Século XIX, agravada no Século XX com a massa de emigrantes chineses que, sem emprego, fugidos da China, afluiram a Macau.

Os relatos de que se dispõe continuam a mencionar os mais diversos tipos de lugares, localizados na zona do Bazar antigo, onde se podia conviver com as meretrizes chinesas - restaurantes e entre estes os coulaus, hospedarias, casas de jogo, de fumo - havendo mesmo em alguns casos pequenas referências ao seu ambiente.

Entre todos os locais onde se praticava ficou célebre na história de Macau a Rua da Felicidade pela grande concentração de casas toleradas. O próprio nome - Felicidade - era já prenúncio de sucesso no amor para quem aí se dirigisse, reforçado pela fama de que tradicionalmente gozavam as mulheres do mundo florido. Esta Rua, marcada durante o dia pela calma e o sossego, onde "As casas das flores tinham as janelas fechadas, porque se dormia a sono solto, depois da faina da véspera"(36), adquiria à noite movimento e animação: "Esta Rua da Felicidade é pelo seu tráfico semelhante às que existem em todos os portos de mar, mas aqui oferece o interesse de serem unicamente chineses os que a frequentam (...) Compõe-se de casas estreitas, cujo piso baixo é ocupado inteiramente pela porta (...)"(37)

As luzes dos lampiões, acesos em todas as casas, irradiavam nela tons de brilho e de vida, e o colorido e boa disposição das p'êi-pá-t'chái, agrupadas às portas a conversar garrulamente, o vai-vém dos frequentadores, possíveis clientes, no seu deambular até encontrarem a companhia pretendida, tudo lhe conferia uma animação peculiar: "Mas é a população feminina, bem mais do que os janotas, do que os cegos, do que os vendilhões de flôres, que formiga na Rua da Felicidade. Abrem-se as gelosias das janellas, onde as conchas translúcidas substituem os vidros; assomam bustosinhos de raparigas franzinas, rostos pintados a branco e rosa, flôres nos penteados altos, os braços pendentes carregados de pulseiras."(38)

A primeira casa oficialmente estabelecida em Macau foi aberta nos finais do Século XIX e situava-se nas proximidades da Praça da Ponte e Horta à esquina da Travessa dos Trens. Foi "(...) T'am-Ung-Ku, que acabara de regressar de Singapura com algumas das suas pupilas, quem iniciara a exploração dêste negócio, que foi inaugurado no 4º. ano do reinado de Kuóng-Sôi (1879)."(39) Como característica exterior fundamental apresentava as janelas com um formato octogonal como forma de atrair a atenção, ao que parece com bons resultados atendendo ao significado que o número 8 tem para os chineses, o que levou a que o exemplo fosse seguido por outras casas. No ano seguinte, em 1880, inaugurava-se a Casa de Mil Flores com o mesmo tipo de janelas, e possivelmente outras teriam surgido, pois Luís Gonzaga Gomes assinala ainda a presença de uma casa desse tipo na Travessa das Felicidades. O seu ambiente foi descrito como "(...)uma casa de diversão, onde se reuniam os estouvados ricaços chineses com o fim de se divertirem ao jogo ou para se banquetearem em lautas ceias, no meio da companhia de deliciosas donzelas (...)."(40)

Mas os mais típicos foram os coulaus -restaurantes chineses - onde se ouvia música, "ao som da qual o chinês come, joga ou medita, fumando ópio."(41) Havia-os das mais diversas categorias, mas "Entremos no Cam-Ling, um Coulau de luxo, com vinte casas de jantar, tôdas decoradas diferentemente; a sala de marfim, a sala doirada, as salas de jade, de porcelana, etc."(42) Para além destas salas "Há compartimentos com largos catres de pau prêto, sôbre os quais poisam as mesazinhas do ópio com as lamparinas e os restantes acessórios que permitem a dois fumadores aspirar simultâneamente o precioso veneno"(43), compartilhados pelos clientes e pelas p'êi-pá-t' chái, a quem competia a preparação do cachimbo para o seu companheiro.

Não são muito abundantes as descrições da presença e actuação das p'êi-pá-t'chái nestes ambientes, algumas referências existindo, no entanto, como a de um jantar de aniversário realizado num destes restaurantes, onde as p'êi-pá-t' chái, "Uma a uma começam a entrar" para fazerem o seu número: Siu-Moi, a primeira "Senta-se e começa a ouvir-se o martelar dolente das duas varinhas de bambu, muito flexíveis, com que toca o piano china (...)"(44), e terminada a sua actuação "(...)passados uns dez minutos, levanta-se e sai com a mesma impassibilidade com que entrou (...)"(45), seguindo-se-lhe as restantes. No seu conjunto "(...) aquelas figurinhas que não parecem mulheres, como as nossas mulheres, mas, sim, bonecas delicadas, bibelots, porcelanas raras, fantasias de vivas côres que se movem num cenário da mais característica feição"(46), animavam com a sua companhia e boa disposição estas festas, onde "já estrugiam fortes gargalhadas e o seu arrôto grosso(...) e as pipa-chais arrastavam as cadeiras para junto dos convidados (...)."(47)

ASPECTOS REGULAMENTARES

A análise da origem dos Regulamentos aplicáveis à prostituição depara com a existência de inúmeras leis criadas ao longo da história pelos mais diversos povos, podendo concluir-se que, se a prostituição tem longos séculos de existência, também as suas leis remontam à Antiguidade.

Para os povos da Antiguidade, que aliaram a utilização pública da mulher à fertilidade e ao culto dos deuses, fazendo do exercício da prostituição uma cerimónia religiosa, as normas que a regulavam baseavam-se em obrigações tendentes à sua prática, como aconteceu nas ilhas de Chipre, Citera e Lesbos, onde, à semelhança de Babilónia, todas as mulheres se tinham de prostituir, pelo menos uma vez na vida, no Templo de Vénus. Mais exemplos poderiam ser dados, desde Astracã, no Tibete, onde as mulheres não conseguiam casar se não tivessem perdido a virgindade, até à Grécia, Egipto e Índia, onde a religião não proibia os prazeres carnais, antes os divinizava sob a protecção dos deuses e das tábuas da lei. Para as civilizações que a consideravam imoral, sobretudo com a expansão do cristianismo, a legislação teve um carácter proibitivo. Assim se verificou em Portugal, onde, desde a sua fundação até ao Século XIX, se penalizou o exercício da prostituição com leis mais ou menos repressivas consoante o modo de pensar da época. O crescimento acentuado da prostituição ao longo do Século XIX levou, por necessidades de ordem sócio-moral e de saúde pú-blica, face à propagação de doenças venéreas, a que fossem adoptadas novas formas para as combater. Optou-se assim por uma via legalista que, em vez de utopicamente a tentar extinguir, perseguindo-a, veio a considerar na lei a prostituição como um problema real, tentando assim controlar o seu exercício.

O Código Administrativo publicado em 31 de Dezembro de 1836 considerou, pela primeira vez, tolerada a prostituição. Isto não significou, porém, que a prostituição passasse a ser social e moralmente aceita ou bem vista, mas o certo é que deixou de ser considerada crime e de ser proibida, tornando-se a partir daí tolerada, e com ela os locais onde era exercida, que dentro dessa política se passaram a designar por "casas toleradas".

A decisão de tornar extensiva a Macau a regulamentação sobre o exercício da prostituição adoptada em Portugal permitiu, face à falta de outros elementos documentais, reconstituir de certo modo a evolução deste aspecto característico da vida local, e concluir que a regulamentação em Macau seguiu, em termos gerais, a mesma tendência abolicionista que já se verificava com certo avanço na Europa (onde, já em 1869, Josephine Buttler havia dado início ao combate à prostituição com a proposta da sua abolição), apesar dos problemas que decorreram da sua aplicação, provenientes do contraste entre as civilizações ocidental e oriental. O facto é que, por ter havido consciência de algumas dessas divergências culturais, se optou, em 1867, pela publicação do "Código de Usos e Costumes dos Chins de Macau", no qual foram mantidos e ficaram consignados os princípios matrimoniais e familiares chineses.

Encarada em Portugal, até início do Século XX, como um problema institucional, a prostituição passou, a partir de 1921, a ser considerada cada vez mais como um problema social e de saúde pública. Em 1926, por ocasião da realização do 1º Congresso Abolicionista em Portugal, foi decidida a extensão ao Oriente do conjunto de actuações dele emanadas, apesar de conhecerem ritmos de aplicação diferentes. Posteriormente, em 1937, foi realizada a Conferência das Autoridades Centrais em Bandoeng (Java) subordinada ao tema O tráfico de mulheres e de crianças, com o objectivo de decidir um conjunto de medidas a tomar contra a prática da prostituição e contra o comércio ilícito de menores. Ocupando lugar de relevo entre os locais do Oriente com maior incidência de prostituição, Macau, que se fez representar pelo Dr. Carlos Sampaio, foi alvo de críticas acentuadas pelos restantes parceiros, sobretudo pela forma como a Administração Portuguesa tolerava a prática da prostituição, à qual aplicava a legislação metropolitana "(...)à la manière d'être sui generis de sa population (158.738 chinois et 5.846 portugais ou assimilés, d'aprés les derniers statistiques) avec sa psicologie très spécial." (48)

Foi após a adesão das autoridades portuguesas às recomendações emanadas da Conferência, que foram, à semelhança do movimento europeu, pela abolição oficial da prostituição, que o Governador Tamagnini Barbosa veio a tomar as primeiras medidas repressivas contra o mundo florido, entre as quais se contam a ilegalização dos lupanares e a proibição da frequência de bares, hotéis e restaurantes por cantadeiras e dançarinas menores de 18 anos. Apesar das diversas medidas aplicadas e de ter sido cada vez menos tolerada, foi necessário esperar até ao ano de 1954, para que a prostituição fosse efectivamente proibida por lei.

DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO

Embora até ao Século XIX a legislação portuguesa tivesse proibido e penalizado o exercício da prostituição, encontramo-la largamente enraizada em Macau desde muito cedo. Entre os vários factores que contribuiram para este aspecto conta-se a estrutura administrativa e cultural do Território, em que "Apesar da cidade depender da soberania portuguesa, na prática as suas estruturas e desenvolvimento local eram controlados e condicionados pela China." (49) A forma natural com que a cultura chinesa aceitava a prostituição, contribuiu assim decisivamente para a sua existência e expansão em Macau.

A permissividade chinesa neste capítulo foi bem aceita pelos homens portugueses que, obrigados até ao Século XVIII a navegarem sem a companhia feminina, aqui desembarcavam. A maioria deles, embora conhecedores das normas proibitivas, preferiram ignorá-las e disfrutar das benesses que o mundo florido, para eles totalmente novo e sedutor, lhes podia oferecer. Desta forma se viveu até meados do Século XIX, apesar dos esforços empreendidos em vão pela Igreja contra um mundo por ela condenado, e ainda das advertências por parte das autoridades chinesas contra certos abusos.

Das medidas tomadas com o objectivo de impedir o crescimento da prostituição, merece menção o Edital (51), publicado em 22 de Julho de 1845, delimitando as áreas de habitação das prostitutas.

Na mesma linha regulamentarista que em Portugal dominou quase toda a 2a metade do Século XIX, surgiu em Macau, no ano de 1851, segundo se tem conhecimento, o 1º Regulamento (52) aplicado à prostituição.

A partir daí todas as meretrizes passaram a ser obrigadas a matricular-se na Procuratura dos Negócios Sínicos, conforme estipulava o artigo 1º desse Regulamento: "Haverá na Procuratura um livro de registo no qual serão obrigadas a inscrever-se todas as mulheres prostitutas ora existentes nesta Cidade, ou que de futuro nella vierem estabelecer-se", sendo em 1872 fixada a idade mínima de 15 anos para o exercício da prostituição, e 25 anos no caso das donas de casa.

Embora o Regulamento não considerasse mais do que uma classe de meretrizes, estabelecia, para além da distinção entre estas e donas de casa, a diferença entre meretrizes que viviam "em commum ou em companhia" (53) em casa tolerada com directora, ou as que viviam "(...) sobre si (...)". (54)

Baseada neste critério distintivo saiu mais tarde, no artigo 2º do Regulamento de 1872, a classificação das meretrizes em duas classes.

Os Regulamentos que posteriormente foram publicados até ao Século XX, não vieram introduzir grandes alterações, referindo-se a maioria delas à saúde e ao controlo higiénico das meretrizes. A respeito destas e do exercício da profissão, as alterações introduzidas limitaram-se a pequenas precisões, como no caso do Regulamento de 1872, em que apareceu a definição: "Todas as meretrizes - mulhe-res que se prostituem por dinheiro - são obrigadas à matrícula na admininistração do concelho." (55)

O Regulamento de 1887, sendo na sua globalidade muito semelhante ao de 1872, vem, contudo, acrescentar dois aspectos. Um deles diz respeito à prostituição exercida nos barcos: "As disposições d'este regulamento são extensivas ás meretrizes que vivem em embarcações, as quaes são para tal effeito equiparadas ás casas de meretrizes." (56) O outro estabelece ainda, para efeitos do pagamento de taxa, uma 3a classe de prostitutas, acerca da qual se não conhece outra informação para além do valor da taxa anual que lhes era cobrada.(57)

Na prática, a sua aplicação não foi tão simples, e conforme se verifica pelo ofício enviado em 15 de Novembro de 1897 ao Secretário Geral do Governo, o pagamento das taxas não era cumprido por parte das meretrizes, tendo sido por esse motivo proposta "(...) uma revisão do mencionado regulamento, especialmente na parte relativa ao registo e disposições geraes, a fim de se estudar a melhor forma de Cobrança do que fôr devido no intuito de se attender como Governo aos interesses da fazenda, parecendo talvez conveniente que, embora se proceda a um novo arrolamento geral das meretrizes elaborando-se novo registo em folhas separadas o que tornará mais facil a escripturação, a tabela das taxas seja modificada de forma que estas incidam em geral sobre as proprietárias das Casas, classificadas quanto ao número de meretrizes que podem receber e outras circunstancias que se entenda deverem ser attendidas(...)." (58)

Um ano mais tarde era publicado um novo Regulamento, que iria vigorar até 1905, em que já era introduzido um conjunto de medidas repressivas do exercício da prostituição, dando-se início a uma nova fase, que embora ainda fosse regulamentarista, se viria a caracterizar por uma tendência abolicionista que vinha sendo desenhada ao longo do Século XIX em Portugal, e iniciada já há muito no resto da Europa.

Data de l de Julho de 1905 o Regulamento que veio a vigorar até 1933. Com ele foi conferido novo carácter à prática da prostituição, que deixou de ser assunto do foro policial para ser encarado também como problema do âmbito da saúde. Nesta perspectiva, o capítulo referente à higiene e inspecção médica passou a ter um peso muito maior, sendo proposto abertamente o combate à prostituição, seguindo duas linhas de actuação: por um lado, perseguir a prática da prostituição clandestina e, por outro, controlar de uma forma mais rigorosa a saúde e higiene das prostitutas, através de uma inspecção médica cuidada e de tratamento hospitalar rigoroso.

Nessa mesma linha de combate ao exercício da prostituição, o Regulamento pretendia controlar o número de casas toleradas e de prostitutas que nelas trabalhavam, limitando o seu número a nove, e intervir mais rigorosamente sobre a actividade das donas ou directoras das casas, sobre as quais, para além de se aplicarem as disposições do Regulamento das Meretrizes, recaíam outros deveres perante a Lei, dando-lhes, no entanto, a possibilidade de recusar clientes: "As donas das casas não são obrigadas a receber n'ellas pessoas que lhes não mereçam confiança."(59)

Relativamente ao estabelecimento das casas toleradas, elas passaram, a partir de 1851, a carecer da autorização do Procurador da Cidade, autorização que lhes era concedida face à apreciação de requerimento que devia conter a identificação da dona da casa, do estabelecimento e das meretrizes que nela viriam a habitar, sendo igual procedimento exigido às meretrizes que viviam isoladas.

O artigo 8º do referido Regulamento é elucidativo:

"As directoras das cazas toleradas são responsáveis: Pela limpeza e aceio dos Estabelecimentos a seu cargo, os quaes deverão prover de trastes e utencílios que a salubridade reclama.

"Pelo estado sanitário das mulheres prostitutas sob a sua inspecção.

"Pela devida decencia e comedimento na conduta e porte das mesmas mulheres em público."(60)

Este último aspecto seria reforçado e especificado, advertindo-se que "Toda a mulher prostituta que fôr encontrada na rua praticando actos desonestos, ou provocando os passageiros por palavras ou por acções; a que fôr encontrada nas tavernas ou em qualquer das cazas mencionadas no artigo antecedente [hospedarias, lojas ou cazas de bebida e em geral em todas as cazas publicas semelhantes]; (...)soffrerá uma multa de cinco a dez taeis ou será expulsa da Cidade coforme (sic) a gravidade do cazo o pedir."(61)

Posteriormente, segundo se afirma, a bem da moral pública, surgiu novo aditamento à delimitação das áreas de residência das meretrizes que, para além dos locais permitidos, não podiam habitar "(...) já mais junto aos templos, tribunais, casas de educação e outros estabelecimentos públicos."(62)

Em 1872 a legislação veio, na sequência das medidas de contenção que vinham a ser delineadas, aumentar de 15 para 18 anos a idade mínima para admissão das raparigas nos lupanares e, posteriormente, a estabelecer um controlo mais apertado do registo das meretrizes, determinando que "(...)de cinco em cinco annos serão renovadas as folhas de registo e rectificada a numeração de todas as casas e meretrizes"(63), e tornando igualmente obrigatório, por parte das meretrizes, o esclarecimento, em caso de deixarem a profissão, do motivo do seu abandono e a casa ou lugar em que passavam a residir, que teriam de comunicar à Procuratura ou à Administração do Concelho, conforme se tratasse de meretriz chinesa ou não. Deveriam ainda entregar o livrete e, para maior garantia de veracidade, ficavam sujeitas a vigilância especial por parte das autoridades.(64)

A figura e responsabilidades das donas de casa eram assim definidas: "Para os effeitos d'este regulamento considera-se dona do lupanar a pessoa que n'elle habite e que esteja encarregada da sua superintendencia, exerça ou não prostituição."(65) No caso de não haver quem se apresentasse como dona de casa seriam "as respectivas inquilinas ahi encontradas" as responsáveis pelo cumprimento do Regulamento.(66)

Tendo a legislação sempre estabelecido uma diferença entre meretrizes chinesas e as restantes, o Regulamento produzido, em 1933, veio acabar com essa distinção, passando daí em diante a encontrarem-se todas abrangidas pela mesma lei: "Ficam sujeitas a registo, em Macau, todas as casas de prostituição habitadas ou unicamente frequentadas por mulheres que pratiquem a prostituição." (67)

DAS CASAS TOLERADAS

O aumento da prostituição no Século XIX veio trazer como consequência uma intromissão crescente das meretrizes na vida pública, vivendo e passeando por qualquer lugar da cidade, sem pejo de constituir, aos olhos da época, um desafio à moral das "famílias honestas e recatadas."(68) A este facto veio associar-se o perigo de contágio das doenças venéreas e nomeadamente da sífilis, cuja propagação constituía uma ameaça à saúde pública.

Com o objectivo de controlar estes problemas procurou-se, recorrendo ao Código Administrativo de 1836, regulamentar a actividade, não só das meretrizes, como das casas toleradas. Particularidades sociais, económicas e culturais vieram contribuir para que, nesta matéria, Macau se antecipasse ao resto do reino, tendo em 1851 saído o primeiro conjunto de normas que regulamentavam o exercício da prostituição, enquanto em Portugal só no ano de 1865 foi publicado o 1º Regulamento das Meretrizes.

As duas principais medidas referiram-se, uma à delimitação de zonas específicas para a residência das meretrizes e estabelecimento de casas toleradas, que ficaram limitadas aos seguintes locais:

"Rua do Bazarinho - Rua do Desfiladeiro -Travessa de Maria Lucinda - Rua de Alleluia - e a Rua da Mata-Tigre, todas no Bazarinho.

"O Sítio chamado Prainha, ou Feitoria

"O Sítio do Chunambeiro; e

Os Sítios denominados - Becco do Estaleiro -Travessa do Becco do Estaleiro - Becco da Praia Piquena - e Becco do Armazem Velho." (69) Era-lhes interditado o habitarem em todos os demais lugares dentro dos muros da Cidade e, ainda, proibida a sua presença em todos os locais que não fossem considerados áreas de prostituição; a outra pretendia acabar com a prostituição existente nas "(...)cazas construídas sobre estacas á beira-mar nos sítios do Matapáo, Bazar, Praia-piquena (sic), e outros (...)" (70), propondo a sua transferência para "outras cazas sitas em terra; devendo logo (...) ficar demolidas as ditas cazas, e removidas as estacadas que ora completamente obstruem aquelles sitios." (71)

Procurava-se assim criar, pela via legal, um espaço próprio na cidade, para onde apenas se deslocassem as pessoas interessadas em o frequentar, ao mesmo tempo que com a inspecção sanitária se procurava evitar o perigo de contágio de doenças e facilitar a tarefa de policiamento. Para isso, nenhum proprietário de prédios ou seus administradores po-deria, fora dos locais estabelecidos, alugá-los para o exercício da prostituição. Todas as casas toleradas passariam a ser registadas, devendo, para efeitos da sua instalação, ser obtida a autorização do Procurador da Cidade. A dona ou directora da futura casa teria de apresentar um requerimento em que declarava" - seu proprio nome, e naturalidade - o nome da rua, e o numero da Porta do estabelecimento-...". Idêntico documento era exigido às meretrizes que viviam sozinhas.

No domínio do funcionamento individual das casas, estabelecia ainda o Regulamento que todas aquelas em que residissem duas ou mais meretrizes, seriam obrigadas a ter uma directora sem a qual não seria autorizada a instalação.

Embora toda a informação retirada dos Regulamentos aponte para que, mesmo com deficiências, os registos destas casas e das meretrizes tenham sido efectuados, o certo é que nenhum deles foi encontrado.

Os Regulamentos a seguir produzidos, quer no caso das casas toleradas, quer no caso das meretrizes, não vieram introduzir alterações relevantes, tendo-se em termos gerais pautado por um crescente rigor por parte da Administração no que se referia à sua instalação e funcionamento. Assim, o Regulamento de 1872 estendia a proibição de estabelecer casas, mesmo nas zonas reservadas, "... junto aos templos, tribunaes, casas de educação e outros estabelecimentos públicos." (72) No sentido de isolar a prostituição do resto da sociedade, o mesmo Regulamento especificava ainda que "(...) não é permitido estabelecer nas casas de prostituição qualquer outra espécie de negócio, nem ali habitar pessoa estranha ao seu serviço especialmente sexo feminino e tendo mais de 5 anos e menos de 15 anos..." (73); e atendendo a que as casas toleradas existiam em zonas restritas onde, naturalmente, se concentravam, tal como acontecia na Rua da Felicidade, de modo a evitar conflitos, o Regulamento proibia "... casas diferentes com diferentes directoras terem acesso comum." (74)

Para facilitar a fiscalização e oferecer maior segurança ao público frequentador destes locais, cada casa teria de afixar em local bem visível uma lista das meretrizes que nela existissem. (75)

A par do rigor que progressivamente ia sendo posto nas disposições dos sucessivos Regulamentos, a partir de 1873 foi criada uma separação clara entre a prostituição exercida para chineses e a que se praticava com christãos. Esta distinção, que se manteve até 1933, incidia particularmente sobre os aspectos respeitantes à inspecção sanitária, que era mais rigorosa no caso da prostituição frequentada por indivíduos não chineses. Em 19 de Maio de 1887 saía um Edital, esclarecendo o Regulamento publicado a 13 de Abril do mesmo ano, onde se determinava que nas casas toleradas onde só fossem "recebidos chinas"(76) as meretrizes não careciam de inspecção médica. Quanto ao estabelecimento de novas casas toleradas, o Regulamento de 1887 mostrou-se mais restritivo, proibindo-as "em lugares onde possam ser nocivas à moral publica ou ao decoro das famílias visinhas."(77) Para seu cumprimento deveriam as autoridades "attender todas as reclamações justas que lhes forem dirigidas", ao mesmo tempo que estendia estas preocupações às casas já estabelecidas, prevendo a possibilidade de mandar encerrar todas as que não respeitassem essas determinações.

A partir deste ano, as embarcações com meretrizes passaram a estar igualmente abrangidas pelo mesmo estatuto das casas toleradas e, por isso, sujeitas às mesmas disposições do Regulamento.

Para efeitos do pagamento de taxas, a Administração passou a classificar as casas segundo "o local onde se acharem estabelecidas, o seu arranjo e outras quaisquer circunstâncias dignas de aten-ção."(78)

Apesar de todo este enquadramento legal, o respeito pelas disposições regulamentares estava longe de ser uma realidade. As meretrizes continuaram a frequentar os restaurantes, as hospedarias e demais lugares proibidos, assim como continuavam a detectar-se irregularidades quanto ao registo e pagamento das taxas das casas toleradas. O Regulamento de 1898 veio tentar de algum modo obviar estas questões, determinando que "os registos serão feitos, Quanto às casas chinezas, na Procuratura Administrativa dos Negocios Sinicos, e quanto às restantes na Administração do Concelho, pelos respectivos escrivães."(79)

O conceito de casa tolerada que havia sido apenas definido de uma forma genérica no Regulamento de 1851, volta a ser referido no Regulamento de 1887: "É considerada casa de meretrizes e como tal sujeita às disposições deste regulamento aquela em que houver uma ou mais mulheres cujo notório modo de vida seja prostituição ainda que tenha outro."(80) Cerca de dez anos mais tarde, o Regulamento de 1898 viria a classificar estas casas em três categorias para efeitos do pagamento de taxas: de 1ª classe todas as que tivessem mais de seis meretrizes, de 2a classe as que tivessem entre quatro e seis, e de 3a classe as que tivessem até três meretrizes.(81)

O elevado número de meretrizes que se verificava nas casas toleradas, onde frequentemente o número de quartos era substancialmente inferior, levou a que em 1905 fosse limitado o seu número máximo a nove meretrizes por casa. (82)

Mais tarde, no Regulamento de 1933, este artigo seria revisto, passando as casas toleradas a designarem-se por casas registadas, e a serem classificadas, para efeitos de tributação, em três classes:

"As casas registadas classificam-se:

a) Casa de domicílio próprio e onde uma meretriz vive sem outras companheiras, directamente alugada por ela ao senhorio, quando não seja sua propriedade;

b) Casa onde as meretrizes têm domicílios próprios e vivem em comum com outras companheiras, tendo cada uma o seu quarto, e podendo todas ter uma sala e uma cozinha comum, tendo uma delas as obrigações do artigo 11º;

c) Casa onde as meretrizes têm domicílios fixos e vivem em comum, mas sob a direcção de uma dona de casa."(83)

Este regulamento veio já precisar de uma forma mais clara os artigos referentes às casas, tendo-se mantido até ao Governo de Tamagnini Barbosa, que deu início a uma perseguição mais declarada ao exercício da prostituição, nomeadamente pela proibição de abertura de novas casas registadas. Contudo, apenas em 1954 elas foram dadas oficialmente por extintas.

DAS DOENÇAS VENÉREAS

Contraídas por contacto sexual, estas doenças tiveram o seu grande veículo de transmissão precisamente nas mulheres que se dedicavam à prostituição. Contra estas doenças e, nomeadamente, contra a sífilis, precaviam-se as tancareiras que se dedicavam à prostituição, tal como as meretrizes que habitavam em terra, fazendo "uso ordinário de carne de rato" que segundo os Chineses tinha propriedades anti-sifilíticas: "As meretrizes são dadas ao uso da carne de rato, porque os chins intendem que a carne deste animal é antisyphilitica." (84)

Para o seu contágio contribuíam a falta de higiene e de controlo médico a que, por lei, estavam sujeitas as meretrizes. A facilidade com que estas doenças se propagavam veio tornar o problema alarmante no Século XIX, atendendo ao crescimento acelerado da prostituição e, consequentemente, da doença. Daí que esta constituiu a preocupação fundamental do Conselho de Saúde Pública, logo após a sua criação, em 1837, quando solicitou a Francisco Ignácio da Cruz (85) a elaboração de um projecto em que fossem sugeridas medidas para controlar a situação.

Com base neste projecto, apresentado a 14 de Agosto de 1837, foi elaborado mais tarde o primeiro Regulamento envolvendo a prostituição que, segundo a documentação existente, foi publicado em Macau no ano de 1851, antecipando-se, assim, à Metropóle, que só no ano de 1865 viria a publicar o seu Regulamento.

A regulamentação criada contemplou duas linhas de acção: uma, primeira, referente às meretrizes, e outra que, embora incidindo indirectamente sobre elas, actuava sobre as donas das casas. A primeira obrigava a que a partir daí todas as meretrizes se matriculassem na Procuratura, onde passaria a existir um livro de registo do qual constariam os seus nomes, naturalidade, idade e morada.

Pretendia-se com esta medida controlar de uma forma mais segura e eficaz as mulheres que exerciam a prostituição, e ainda facilitar a detecção, de uma forma mais fácil e rápida, de alguma que tivesse contraído a doença. Para tomar mais eficiente este controlo, o Regulamento publicado em 1872 obrigava a haver na Repartição da Saúde um livro de registo idêntico ao da Procuratura, com o fim de ter o cadastro de todas as meretrizes, devendo ser-lhe "... comunicadas por esta repartição [Procuratura] todas as alterações que houver no registo das meretrizes."(86) Este Regulamento tratou ainda outros aspectos, referentes aos cuidados médicos a que esta-vam sujeitas as meretrizes.

A outra forma de actuar era por intermédio da colaboração das donas das casa, que passam a ter, a partir de 1851, perante a lei, outras responsabilida-des, nomeadamente, "Pelo estado sanitário das mulheres prostitutas sob a sua inspecção"(87), correndo o risco, em caso de incumprimento, de sofrer penalização de multa pecuniária "e nos casos de reincidencia lhe será cassada a licença, e ficará inhabilitada para já mais obter a renovação della."(88)

Com esta medida procurou-se responsabilizar as donas de casa e obter a sua colaboração com a Administração, na tarefa de controlo higiénico e sanitário. Apesar dos regulamentos posteriores terem mantido os princípios básicos destas linhas de actuação, verificou-se a tendência para se acentuar o seu rigor no campo da saúde e da responsabilidade das donas das casas. Seguindo estas linhas de actuação os serviços de saúde empreenderam diversas medidas de carácter higiénico-sanitário de modo a garantir a segurança dos clientes.

Em sequência, o Regulamento de 1872 vinha obrigar todas as meretrizes a serem submetidas a um exame médico periódico:

"Todas as meretrizes ficam sujeitas ao exame médico nos dias, horas e local que lhes forem determinados, podendo ser feito no proprio domicílio, nos hospitais, ou em qualquer casa para esse fim.

"Parágrafo 1. Cada uma terá um livrete que será fornecido no acto da matricula - quando é consultada fica escrita a data e o resultado da consulta."(89)

Em caso de doença as meretrizes deveriam comunicar à dona de casa ou "ao facultativo no caso de viver só"(90) a fim de serem internadas no hospital, de onde saíam após a realização de novo exame médico, devendo ainda apresentar-se "dentro de 24h. na administração do concelho onde se tomarão as notas competentes."(91) O controlo de saúde das meretrizes, para além de se encontrar a cargo das donas de casa, era ainda feito por "facultativos encarregados da inspecção sanitária e empregados da polícia"(92) que para o efeito dispunham da liberdade de se deslocarem às casas toleradas sempre que o considerassem necessário, sobretudo quando se tratasse de algum caso urgente, podendo nesse caso fazê-lo de dia ou de noite.

O incumprimento da lei implicava penalidades que podiam ser pecuniárias ou de prisão, sendo o seu número de dias proporcional ao montante a pagar, visto que cada dia de prisão era correspondente a uma determinada importância. A penalidade considerada mais grave era a de detectar um caso de doença sem ter sido participado, o que poderia levar a 20 dias de prisão ou a uma multa de 20 patacas. Do mesmo modo e com idêntica multa era autuado "o homem que infectar mulher prostituta."(93)

A tendência para se considerar a distinção entre a prostituição que se praticava exclusivamente para chineses, da que era frequentada por christãos, foi nítida, logo em 1873, onde o Regulamento acrescentou o artigo: "- Ficarão unicamente sujeitas a inspecção medica as meretrizes que recebem christãos, sendo examinadas no proprio domicilio, nos hospitaes ou em qualquer casa para esse fim estabelecida"(94), enquanto as meretrizes chinesas eram inspeccionadas em Hong Kong, até 1887. Neste mesmo ano, o novo Regulamento das Meretrizes e Casas Toreladas passou a especificar, acerca das inspecções sanitárias a que se encontravam sujeitas as meretrizes pertencentes a casas frequentadas por "individuos extranhos à população chineza"(95), que a inspecção médica "effectuar-se-á normalmente uma vez por semana e extraordinariamente todas as vezes que o exija o facultativo encarregado d'este serviço."(96) Quanto aos dias e horas da inspecção, os mesmos seriam anunciados no Boletim Oficial. Quanto ao local de inspecção havia a possibilidade de as meretrizes optarem entre o hospital da Misericórdia onde existia "um aposento exclusivamente para esse fim"(97), ou a sua casa, e neste caso, mediante um pagamento estipulado pelos Serviços de Saúde.

O Regulamento obrigava também todas as meretrizes afectadas pela doença a serem tratadas exclusivamente no hospital onde deviam dar entrada imediata. Aí haveria "(...) uma sala exclusivamente reservada ao tratamento das meretrizes, isolada quanto possível das restantes enfermarias"(98), tendo "(...) de graça durante a sua estada ali, alimentos, médicos, roupa, cama e serviço clínico e hospita-lar."(99) As meretrizes chinas, ao ser abolida em Hong Kong, no mesmo ano, a inspecção sanitária das meretrizes, passaram, a partir daí, a ser inspeccionadas em Macau por mestres chinas.

Este facto suscitou certa celeuma por parte do chefe do Serviço de Saúde que, em ofício dirigido ao Secretário Geral do Governo da Província, se manifestou contra a inspecção sanitária das meretrizes pelos mestres chinas, apesar do Regulamento de Saúde lhes reconhecer a necessária competência porque, em seu entender, eles não possuíam conhecimentos nesta matéria. O documento revela um interesse extraordinário, quer pela informação nele contida, quer pela argumentação produzida que recorre a imagens e comparações. Por ele fica-se a saber que as meretrizes sempre se manifestaram contra a inspecção - "Tem sido este o escolho em que tem naufragado os regulamentos de inspecção de prostitutas em Macau. Apenas o projecto é convertido em lei provincial as meretrizes fazem greve com grande celeuma, ameaçando abandonar esta cidade..."(100) - assumindo esta luta proporções maiores ou menores consoante a concorrência. Isto porque, ela era apoiada, como refere o documento, pelos "proprietários das casas da Rua da Felicidade e similares, receosos de ficarem, por algum tempo ao menos, sem inquilinos nas casas (...)."(101) Nos períodos em que havia maior número de prostitutas, o seu protesto perdia expressão uma vez que "se aquellas fossem outras viriam occupar-lhes o lugar"(102), o que não impedia, contudo, como forma de reprovação do Regulamento, que as meretrizes optassem por o não cumprir, considerando-o letra morta.

Atendendo a estas circunstâncias, o Regulamento seguinte tenta, através de uma actuação mais dura, que as meretrizes não fujam à inspecção sanitária e ao tratamento hospitalar, medidas estas que englobavam igualmente as meretrizes chinesas, pois "No hospital chinez Keng-hu haverá uma enfermaria, isolada quanto possível das outras, exclusivamente destinada ao tratamento das meretrizes chinezas"(103), enquanto que "No hospital civil haverá egualmente uma outra enfermaria nas mesmas condições, onde serão tratadas as meretrizes não chinezas."(104)

Ainda, e de forma a melhor controlar o seu cumprimento, ficavam as donas das casas obrigadas a apresentar todos os sábados às 2h. da tarde "uma relação das meretrizes que ahi existam n'esse dia, declarando na casa das observações se alguma d'ellas se acha doente de molestia venerea, syphilitica ou suspeita (...)"(105), estabelecendo-se também o tratamento hospitalar gratuito, apenas para as meretrizes doentes que por sua iniciativa ou das donas das casas, dessem entrada no hospital. Nos restantes casos, em que o internamento era feito por ordem da autoridade, teriam de pagar além de uma multa as custas do hospital. Destinado a promover ainda o cumprimento destas determinações, o Regulamento procurava aliciar as pessoas que tivessem conhecimento de transgressões, a denunciá-las, garantindo o secretismo e prometendo metade do valor da multa. O cumprimento deste conjunto de disposições seria vigiado por dois empregados nomeados pelo Procurador, sendo um china, a quem competia o controlo das meretrizes chinesas, dependendo directamente do Procurador, e outro a quem se reservavam as meretrizes sujeitas à administração do concelho, sujeito ao Administrador do Conce-lho.(106)

O Regulamento de 1905 que o veio substituir, e que iria vigorar até 1933, explicitava ainda que as meretrizes chinesas que entrassem no hospital chinês seriam "exclusivamente tratadas sob sua inteira responsabilidade pelos mestres chinas, sob a fiscalização do médico que para esse fim fôr nomeado pelo Governo da Província."(107)

Em 1933, atendendo a que aos olhos da época se considerava "indecoroso o cortejo das meretrizes duas vezes por semana, pelas ruas da cidade para serem inspeccionadas no Hospital de S. Ra-fael"(108), procurou-se resolver este assunto, passando a inspecção a realizar-se no dispensário instalado num prédio do bairro onde as meretrizes viviam. A educação sanitária e os princípios básicos de higiene diária e do conhecimento da doença estavam também previstas, cabendo a sua administração ao facultativo encarregado da inspecção das meretrizes.

Apesar de todos os esforços desenvolvidos o problema não ficou solucionado, nem tão pouco deixou de ser alvo de discussões. Tratando-se de um assunto do domínio internacional, o caso de Macau acabou por ser abrangido pelo conjunto de medidas que, mais tarde, em 1937, conforme já referido, seriam tomadas no sentido de abolir a prostituição.

CONCLUSÃO

Se a prostituição é conhecida como "a mais antiga profissão do mundo" e não constitui, portanto, um aspecto exclusivo de nenhum povo, o mesmo já se não verifica quanto à sua prática, que assumiu, em Macau, características muito específicas. A sua especificidade resultou de um conjunto de princípios morais e sociais em que assentava a sociedade chinesa, entre os quais se contam os conceitos de mulher e de casamento que, durante séculos, relegaram a mulher para uma situação de subalternidade e servilismo face ao homem. O sistema de casamento instituído, baseado num prévio acordo entre as famílias dos nubentes, e o reconhecimento do concubinato vieram, igualmente, contribuir para que, aqui, a prostituição fosse encarada de uma forma completamente distinta. A estes aspectos acresce um outro, relativo ao modo como era praticada a prostituição, que também revelou características completamente diferentes.

Relativamente a este aspecto, que constitui o fulcro do trabalho elaborado, as fontes históricas de que dispusémos fornecem dois tipos de informação: uma, objectiva e clara, constituída, na sua maioria, por Editais e Regulamentos; outra, de carácter pessoal e, por conseguinte, enfermando de uma certa subjectividade, consiste nos relatos que nos chegaram, escritos por indivíduos que frequentaram o ambiente de Macau, quer como simples visitantes, quer como seus habitantes.

No primeiro caso mencionado, ou seja no caso da regulamentação produzida, foram-nos transmitidos aspectos legais do exercício da prostituição. Na sua maioria decorreram da aplicação das leis portuguesas que vinham sendo produzidas sobre esta matéria, tendo em vista abranger todas as mulheres que exerciam a prostituição, designando-as genericamente por meretrizes, sem ter em conta o seu enquadramento sociológico na realidade macaense.

No segundo caso encontram-se as descrições que nos foram transmitidas por indivíduos que contactaram de perto com a realidade social de Macau e, particularmente, com a vida das mulheres floridas e das p'ei-pá-t' chai. A sua presença e forma de actuar, quer cantando, quer dançando, quer, ainda, conversando, a sua sedução, são-nos descritas por esses testemunhos vivos que pretenderam registar aspectos da vida quotidiana de Macau através da sua escrita. Esta informação transmite-nos uma imagem mais próxima da realidade, da forma como foi visto o mundo florido. Não se deve, nem se pode, contudo, tomá-la rigorosamente, pois sendo uma informação de carácter pessoal é, por conseguinte, subjectiva.

Em suma, há que conciliar estas realidades procurando novos dados que possam vir a fornecer e esclarecer matérias ainda insuficientemente aprofundadas que, por seu lado, contribuam para melhor conhecer aspectos desta profissão tradicional.

BIBLIOGRAFIA

FONTES MANUSCRITAS

A. H. M. - Ofícios da Procuratura, cópia, Vol. 1, 1839-1841.

A. H. M. - Ofícios da Procuratura, cópia, Vol. 2, 1843-1846.

A. H. M. - Administração Civil, cx. 31, nº 1786.

A. H. M. - Administração Civil, cx. 33, nº 1853.

A. H. M. - Leal Senado.

FONTES IMPRESSAS

ÁLVARES, José -"A Ásia na história portuguesa" in Nam Van; Macau (11) Abril, 1985.

ÁLVES, Rodrigues - "Mostrar a realidade de Macau"; in Nam Van, Macau, (1) Junho, 1984.

AMARO, Ana Maria - "Lembrando imagens perdidas" in Revista de Cultura. Edição do Instituto Cultural de Macau. Macau. (3) Outubro-Dezembro, 1987.

ANDRADE, José Ignácio de - Cartas escriptas da Índia e da China, a sua mulher, 2a edição. Lisboa, Imprensa Nacional, 1847.

ÂNGELO, Alda de Carvalho - Fragmentos do Oriente, S. Paulo, 1965.

ARNOSO, Conde de - Jornadas pelo mundo, Porto, 1916.

AUDEMARD, L.- Les Jonques Chinoises, Vol. VIII. Rotterdam,1965.

BARROS, Leonel - "Tancares e tancareiras" in Tribuna de Macau, Suplemento. Macau, 25 de Abril, 1986.

BARROS, Leonel - "O funeral chinês e o seu simbolismo", in Tribuna de Macau. Suplemento. Macau, 26 de Agosto. 1986.

BARROS, Leonel - "Comemorando o "T'chat-chek ou a Festa das Sete Irmãs" in Tribuna de Macau. Suplemento. Macau, 3 de Setembro, 1988.

BOXER, Charles - "A presença portuguesa no mundo" in NamVan. Macau, (5) Outubro, 1984.

CALADO, Maria; MENDES, Maria Clara: TOUSSAINT, Michel; Macau, Cidade Memória no Estuário do Rio das Pérolas, Macau, 1985.

CARMONA, Artur Leonel Barbosa - Lorchas, Juncos e outros barcos usados no Sul da China: a pesca em Macau e arredores. Macau, Imprensa Nacional, 1954.

CARVALHO, Alberto de Moraes - Narrativas do Oriente: apontamentos de viagem. Lisboa, Tipografia da Cooperativa Militar, 1915.

COELHO, Beltrão; JORGE, Cecília - A Fénix e o Dragão, realidade e mito do casamento chinês. Macau, Instituto Cultural de Macau, 1988.

COLOMBAN, Eudore-Hommes et choses d' Extrème--Orient. Macau, Imp. de l'Orphelinat et Imaculée Conception, 1919.

CRUZ, Francisco Ignacio dos Santos (dirigido por BRITO, Joaquim Pais de) - Da Prostituição na Cidade de Lisboa. Lisboa. Publicações D. Quixote, 1984.

DALGADO, Monsenhor Sebastião Rodolfo - Glossário Luso-Asiático, Vol. 2, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1919.

FERNANDES, Diogo - "A Santa Casa da Misericórdia: uma herança Portuguesa no Oriente", in Nam Van. Macau, (17) Outubro, 1985.

GOMES, Luís Gonzaga - Curiosidades de Macau Antiga, separata da Revista "Renascimento". Macau, s. n., 1945.

GOMES, Luís Gonzaga - Chinesices,1a edição. Macau, Instituto Cultural de Macau - Leal Senado, 1952.

GOMES, Luís Gonzaga - Macau Factos e Lendas: páginas escolhidas. Macau, Instituto Cultural de Macau - Leal Senado, 1986.

INSO, Jaime do -A China, Lisboa, Ed. Europa, 1936.

LANG, Olga - La vie en Chine. Paris, Ed. Hachette, s. d.

LAUTURE, Comte d'Escaynac de - Memoire sur la Chine. Paris, Lib. du Magasin Pittoresque, 1865.

LILIUS, Aleko E.- I Sailed with Chinese Pirates. London, 1932.

LOUREIRO, Adolpho - No Oriente de Nápoles à China. Lisboa, Imprensa Nacional, 1896 (1° Vol.); 1987 (2° Vol.).

LOPES, António - A China e os Chineses, Lisboa, Livraria Popular de Francisco Franco, 1937.

MORAES, Wenceslau de - Traços do Extremo Oriente, 2ª edição, Lisboa, Livraria Barateira, 1946.

PALHA, Francisco Augusto dos Santos Mourão Garcez - Índice Alfabético da Legislação em vigor na Provincia de Macau, de 1859 a 1958, 2 vol. Macau, Imprensa Nacional.

PEIXOTO, Rui Brito - "Visões de um Mundo flutuante", in Nam Van. Macau, ( 7 ) Dezembro, 1984.

RÊGO, Francisco de Carvalho - Cartas da China. Macau. Imprensa Nacional, 1949.

RODRIGUES, Armanda-"O Ofício de Tancareiro: a extinção dos filhos do rio" in Nam Van., Macau, ( 14 ), 1985.

SAMPAIO, Carlos - Relatório apresentado na Conferência das autoridades centrais dos Países do Oriente. Sociedade das Nações, Bandoeng (Java), 1937.

SAMPAIO, Manuel de Castro - Os Chins de Macau., Hong Kong, Tip. Noronha e Filhos, 1867.

SAN BRUNO, Emílio de - O caso da Rua do Volong: cenas da vida colonial. Lisboa, Tip. do Comércio, 1928.

TEIXEIRA, Pē Manuel - As Canossianas na Diocese de Macau: 1 centenário (1874-1974). Macau, Tip. da Missão do Padroado, s. d.

TEIXEIRA, Pē Manuel - Toponímia de Macau, Ruas com Nomes Genéricos, Vol. 1. Macau, Imprensa Nacional, 1979.

TCHENG, Ki-Tong- Les Plaisirs en Chine. Paris, G. Charpentier et Cīe, Editeurs, 1890.

TISSOT, Victor-La Chine. Paris, Librairie Fume, Jouvel et Cīe, Editeurs, 1891.

WORCESTER, G. R. G. - The Junks and Sampans of the Yangtze. Annapolis, Maryland, Naval Institute Press, s. d.

Boletim do Governo da Província de Macau, Timor e Solor, 1850-1851.

Boletim da Província de Macau e Timor, 1872.

Boletim da Província de Macau e Timor, 1873.

Boletim da Província de Macau e Timor, 1883.

Boletim da Província de Macau e Timor, 1887.

Boletim Official do Governo da Província de Macau, 1898.

Boletim Official do Governo da Província de Macau 1905.

Boletim Official do Governo da Província de Macau, 1911.

Boletim Official do Governo de Macau, 1933.

Revista Mosaico, Macau, Vol.6 (33-34) Maio-Junho, 1953.

Revista Mosaico Macau, Vol.15 ( 71-73 ) Junho-Setembro, 1956.

NOTAS

(1). "Histoire de la legislation sur les femmes publiques", p. 35, citada por Francisco Ignacio dos Santos Cruz in "Da prostituição na cidade de Lisboa", p.54

(2). A. H. M. - AH/LS/565, fl. 42

(3). INSO, J. do - China, p. 278

(4). GOMES, L. G. -"Curiosidades de Macau Antigo", separata da Renascimento, p. 45

(5). INSO, J. do - China, p. 36

(6). Ibid.-p.278

(9). COELHO, B. e JORGE, C. - ob. cit., p. 37

(10). Ibid. -p.25

(11). Ibid. -p.82

(12). Ibid. -p.36

(13). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 130

(14). COELHO, B. e JORGE, C. - ob. cit., p. 36

(15). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 131

(16). Ibid.-p. 131

(17). TEIXEIRA, Pē Manuel -As Canossianas, p. 25

(18). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 132

(19). MORAES, W. de - Traços do Extremo Oriente, p. 52

(20). TEIXEIRA, Pē Manuel - Toponímia de Macau, Vol. I, p. 468

(21). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 45

(22). INSO, J. do - ob. cit., p. 278

(23). Ibid. - p. 390

(24). TEIXEIRA, Pē Manuel - ob. cit., p. 468

(25). Ibid.- p.465

(26). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 131

(27). MORAES, W. de - ob. cit., p.33

(28). Revista Mosaico, Macau, Volume 15 (71-73), Junho-Setembro, 1956, p. 209

(29). Ibid. - p. 34

(30). - TONG, Tcheng Ki -Les plaisirs en Chine, p. 104

(31). DALGADO, S. R. - Glossário Luso Asiático, Vol. 1, p. 532

(32). GOMES, L. G. - ob. cit., p. 133

(33). A. H. M. - AH/LS/565, fl. 42v

(34). EDITAL publicado no Boletim do Governo da Provincia de Macao, Timor, e Solor, nº 43 de 13 de Setembro de 1851, artigo 12º, p. 145

(35). Ibid.- p. 145

(36). TEIXEIRA, Pē Manuel - ob. cit., p. 468

(37). IBAÑEZ, Vicente Blasco - La Vuelta al Mundo de um novelista, Tomo II, p. 176-196, cit. in TEIXEIRA, Pē Manuel - Toponímia de Macau, Vol. I, p. 465

(38). MORAES, W. de - Traços do Extremo Oriente, p.52

(39). GOMES, L. G.- ob. cit., p.131

(40). Ibid.- p.131

(41). INSO, Jaime do -A China, p.36

(42). Ibid.- p.36

(43). Ibid.- p.36

(44). Ibid.- p.389

(45). Ibid. p.390

(46). Ibid.- p.392

(47). SAN BRUNO, Emílio - O caso da Rua do Volong, p.216

(48). SAMPAIO, Carlos- Relatório da Conferência de Bandoeng, Java,1937, p.25

(49). CALADO, M. e outros - Macau: cidade memória no estuário do rio das Pérolas, p.34

. Revista Mosaico, Macau, Vol.6 (33-34), Maio-Junho,1953, p.110

(51). A. H. M.- AH/LS/565, fl.42v

(52). EDITAL publicado no Boletim do Governo da Província de Macao, Timor e Solor, nº 43, de 13 de Setembro de 1851, p.145

(53). Ibid.-artigo 3º, p.146

(54). Ibid.- artigo 4º, parágrafo 1º, p.146

(55). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 24, de 8 de Junho de 1872, artigo 1º, p.99

(56). Regulamento das Meretrizes e Casas Toleradas, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 15, de 14 de Abril de 1887, artigo 22º, p.132

(57). Ibid.- artigo 35º, p.132

(58). A. H. M.-cx.31. Proc. nº 1786

(59). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 28 (suplemento), de 19 de Julho de 1905, artigo 35º, p.525

(60). Edital publicado no Boletim do Governo da Província de Macao, Timor, e Solor, nº 43, de 13 de Setembro de 1851, artigo 8º, p.146

(61). Ibid.-artigo 13º, p.146

(62). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 24, de 8 de Junho de 1872, artigo 6º, p.99

(63). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 32 (supplemento), de 6 de Agosto de 1898, artigo 6º, parágrafo 3º, p.290

(64). Ibid.- artigo 10º, p.290

(65). Ibid.-artigo 12º, p.290

(66). Ibid.- artigo 12º, parágrafo úncio, p.290

(67). Regulamento das Meretrizes, publicado no Boletim Oficial da Colónia de Macau, nº 15, de 15 de Abril de 1933, artigo 1º, p.348

(68). A. H. M.- AH/LS/565, fl.42V

(69). Edital, publicado no Boletim do Governo da Província de Macao, Timor, e Solor, nº 43, de 13 de Setembro de 1851, artigo 10º, p.145

(70). Ibid.- artigo 10º, parágrafo 2º, p.145

(71). Ibid.- artigo 10º, parágrafo 2º, p.145

(72). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 24, de 8 de Junho de 1872, artigo 6º, p.99

(73). Ibid.-artigo 16º, p.99

(74). Ibid.- artigo 17º, p.99

(75). Ibid.-artigo 20º, p.99

(76). EDITAL de 13 de Maio, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 20, de 19 de Maio de 1887, p.186

(77). Regulamento das Meretrizes e Casas Toleradas, publicado no Boletim da Província da Macau e Timor, nº 15, de 14 de Abril de 1887, artigo 21º, p.132

(78). Ibid.- artigo 27º, p.132

(79). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 32 (supplemento), de 10 de Agosto de 1898, artigo 3º, p.290

(80). Regulamento das Meretrizes e Casas Toleradas, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 15, de 14 de Abril de 1887, artigo 4º, p.132

(81). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 32 (supplemento), de 10 de Agosto de 1898, artigo 20º, p.290

(82). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 28(supplemento), de 19 de Julho de 1905, artigo 23º, p.525

(83). Regulamento das Meretrizes, publicado no Boletim Oficial da Colónia de Macau, nº 15, de 15 de Abril de 1933, artigo 12º, p.348

(84). SAMPAIO, Manuel de Castro - Os Chins de Macau, p.32

(85). CRUZ, Francisco Ignácio dos Santos - (1787-1859), médico, Vice-Presidente e mais tarde Presidente do Conselho de Saúde Pública

(86). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 24, de 8 de Junho de 1872, artigo 4º, p.99

(87). Edital publicado no Boletim do Governo da Província de Macao, Timor, e Solor, nº 43, de 13 de Setembro de 1851, artigo 8º, parágrafo 2º, p.146

(88). Ibid.- artigo 9º, p.146

(89). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 24, de 8 de Junho de 1872, artigo 27º, p.99

(90). Ibid.- artigo 8º, p.99

(91). Ibid.- artigo 11º, p.99

(92). Ibid.- artigo 22º, p.99

(93). Ibid.- artigo 29º, p.99

(94). Regulamento para as Meretrizes e Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 4, de 25 de Janeiro de 1873, artigo 5º, p.13

(95). Regulamento das Meretrizes e Casas Toleradas, publicado no Boletim da Província de Macau e Timor, nº 15, de 14 de Abril de 1887, artigo 4º, p.132

(96). Ibid.- artigo 10º, p.132

(97). Ibid.- artigo 12º, p.132

(98). Ibid.- artigo 18º, p.132

(99). Ibid.- artigo 20º, p.132

(100). A. H. M.- Fundo da Administração Civil, cx.33, Processo nº 1853, de 23 de Maio de 1898

(101). Ibid.

(102). Ibid.

(103). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 32(supplemento), de 10 de Agosto de 1898, artigo 34º, p.290

(104). Ibid.- artigo 34º, parágrafo único, p.290

(105). Ibid.- artigo 11º, alínea eº, p.290

(106). Ibid.- artigos 36º e 37º, p.290

(107). Regulamento das Casas Toleradas em Macau, publicado no Boletim Official do Governo da Província de Macau, nº 28(supplemento), de 19 de Julho de 1905, artigo 14º, p.525

(108). Portaria Provincial nº 1:093, de 7 de Abril de 1933

*Licenciada em História. Investigadora do Gabinete do Património Cultural do ICM. Este trabalho foi realizado no âmbito de investigações em curso no G. P. C..

desde a p. 95
até a p.