João Rodrigues Tçuzzu

O CALENDÁRIO JAPONÊS INSTRUMENTO DE HARMONIZAÇÃO DO CÉU, DA TERRA E DO HOMEM
(O OLHAR DE TÇUZZU)

Sandra de Amaral Monteiro*

«1. L'harmonie est le bien le plus précieux, éviter lesdiscordes droit être le but de tout l'homme. » 1

Constituição em Dezassete Artigos, séc. VII.

«Donde toda sua ciência [do céu] dividem em três membros (...) cujo sujeito são as três cousas principais do Universo. ss. céu, terra e homem (...)»2

João Rodrigues Tçuzzu, Século XVII.

Conta a história que o príncipe Shôtoku-taishi (574-622), após assumir a direcção da governação no Japão, foi responsável pela elaboração do primeiro texto que fundamenta o poder políticodo soberano na seguinte concepção: a ordem humana é um reflexo da ordem natural; tal como a ordenação do universo reside no céu, enquanto princípio activo relativamente ao qual a terra se comporta como elemento passivo, assim também a sociedade humana deve obedecer à direcção fixa do soberano.

O referido texto, codificado na "Constituição em Dezassete Artigos", insere-se num processo de sinização imposta pela é lite e serve-se das teorias cosmológicas chinesas como arquétipo legitimador do reforço do poder do soberano, como meio de assegurar a ordenação harmoniosa da sociedade. As raízes chinesas do carácter moral do pensamento político no antigo Japão não se explicam apenas, como facilmente se compreende, pelo interesse e conhecimento dos clássicos chineses que se atribui ao príncipe Shôtokutaishi3. Se é certo que uma compreensão global desta questão obrigaria a uma análise profunda das relações entre a China e o Japão, nem por isso é menos interessante, na perspectiva do presente estudo, dirigir o olhar para alguns traços conjunturais da primeira metade do século VII.

Verificamos que, após uma interrupção de mais de um século, no ano de 600 foram retomadas as relações entre o Japão e a China, registando-se até meados do século IX numerosas embaixadas entre os dois países. No campo da Astronomia, começavam a dar frutos as diligências da corte japonesa, que remontavam já a meados do século VI, junto dos reinos Coreanos: em 602 chegaram ao Japão monges de Kudara, especialistas em Cosmogonia, Astronomia e Calendário, munidos dos livros e instrumentos necessários para ensinar estas matérias. Dois anos mais tarde o calendário chinês, que era usado no Japão pelo menos desde o século V, foi definitivamente adoptado. A partir do século VII a corte japonesa passou a considerar (à semelhança da chinesa) como um dever essencial presidir à elaboração do Calendário. Foi ainda nesta época que, dividindo o tempo em ciclos de sessenta anos, se concebeu uma cronologia da história oficial do Japão4.

Atentar nestes factos serve dois objectivos essenciais para a compreensão da forma como o tema do calendário japonês é abordado na obra de Tçuzzu.

Primeiramente, porque remetem para a conjuntura em que a corte japonesa opta definitivamente pela divisão e cômputo do tempo com base no calendário chinês, luni-solar, mostrando como esta medida pressupôs a consolidação dos conhecimentos no campo da Cosmologia e da Astronomia. A fonte que agora importa analisar — a História da Igreja do Japão — apresenta também uma relação estreita entre estes elementos. O padre João Rodrigues, seu autor, dedicou sete capítulos à exposição da Astronomia e da concepção do universo (céu e terra) que lhe estava ainda associada no Japão do século XVII. Só depois enveredou pela explicação das origens e fundamento do calendário, num extenso capítulo que é seguido por uma breve incursão no campo da Astrologia. Estes nove capítulos constituem, assim, um todo coerente, que deverá necessariamente ser olhado em conjunto, para possibilitar a compreensão da sua lógica interna5.

Em segundo lugar, porque os factos atrás citados suscitam uma série de questões que são de alguma forma examinadas no texto de João Rodrigues. Como observador atento do país em que viveu por mais de trinta anos, não limitou a sua exposição sobre estas matérias a uma descrição dos princípios e do funcionamento do calendário, antes a enriqueceu com reflexões sobre os homens e a sociedade em que teve origem e se consolidou.

Quais as fontes de inspiração da civilização japonesa, nas referidas matérias? De que instrumentos (materiais) se serviu para as aperfeiçoar? Quais as características fundamentais que dão forma à sua concepção de tempo? Que categorias mentais se exprimem na forma de relacionamento com o mundo natural e social? São estes alguns dos problemas que em seguida serão abordados, à luz do texto do padre João Rodrigues.

Uma vez que este traduz, implícita ou explicitamente, a perspectiva do autor, impõe-se começar por apresentar alguns dados sobre a sua vida, na medida em que sejam relevantes para uma melhor compreensão do conteúdo dos capítulos seleccionados, bem como para a sua contextualização numa obra que, afinal, anunciara tratar da História da Igreja do Japão.

A VIVÊNCIA DE JOÃO RODRIGUES NO ORIENTE

João Rodrigues viveu trinta e três anos conse-cutivamente no Japão, onde chegou em 1577 com a idade de dezasseis anos. Foi neste país que iniciou a sua formação jesuíta, entrando em 1580 no noviciado recém-fundado em Usuki. Não importa agora acompanhar o acidentado percurso de uma educação constantemente interrompida e retomada em função de factores como a instabilidade político-religiosa da época ou de várias tarefas de que João Rodrigues era encarregue6. Interessa apenas registar a forma como os estudos de Humanidades, Filosofia, Teologia, Artes, Ciências e Latim, próprios de uma formação cristã, foram enriquecidos com outros tão variados como os de língua e etiqueta japonesa ou literatura chinesa.

Este plano de estudos traduzia uma concepção de missionação, a da acomodação, ou adaptação cultural, que suscitava grande polémica e era minoritária entre os europeus. Era, no entanto, claramente defendida por A. Valignano (1539-1606), Visitador da província da índia, que a impôs no Japão aquando da sua primeira visita ao Arquipélago entre 1579 e 1582. Durante este período, estabeleceu estreitos contactos com João Rodrigues, que não terá sido imune às suas concepções7. Valignano considerava que o Cristianismo devia despojar-se das suas vestes europeias, para poder implantar-se no Oriente. Apelava, assim, a um conhecimento dos costumes e modo de vida dos japoneses e a uma adaptação que tornasse os missionários e a sua religião menos estranhos às populações nativas.

No mesmo sentido se exprimiu um grande número de missionários no Oriente, entre os quais Pedro Gómez, que viria a ser vice-provincial do Japão entre 1590 e 1600. Exercendo funções de professor no Colégio de Funai desde 1583, afirmava, por exemplo, que igual importância devia ali ser dada ao conhecimento da Língua japonesa, do Latim e das Artes8. Gómez acompanhou o percurso de João Rodrigues por mais de dez anos, tornando-se numa figura particularmente marcante na formação do jovem João Rodrigues. Por um lado, porque o nosso Autor se tornou, de facto, num exímio conhecedor da língua, dos costumes e do povo japonês; por outro, porque Pedro Gómez, autor do primeiro livro sobre Astronomia ocidental publicado no Japão (em 1594)9, foi o mestre com que João Rodrigues descobriu a Cosmologia, Astronomia, Metereologia e Ciências Naturais em geral. Estes estudos tinham por base o tratado clássico de João de Sacrobosco, De Sphaera (séc. XIII), o qual constitui uma das fontes mais citadas na História da Igreja do Japão.

Muitos foram os missionários jesuítas reconhecidos pelos seus conhecimentos de Astronomia, mas, sobretudo no que toca à exposição da Astronomia oriental (de base chinesa), João Rodrigues atingiu um grau de profundidade e de solidez dos dados apresentados que toma difícil suplantá-lo10.

Dificilmente se poderá compreender que João Rodrigues tivesse adquirido estes conhecimentos se não tivermos em conta que nas suas constantes viagens, e ao servir regularmente de intérprete às mais altas dignidades da corte japonesa, o Autor acabou por se ligar a este escol intelectual e político. É inegável que esta situação lhe facilitou um acesso directo a fontes passadas e presentes para o domínio das ciências atrás referidas, até porque a corte mantinha o monopólio da ordenação do Calendário. Ao mesmo tempo, os longos períodos de residência junto da corte11foram momentos privilegiados de obtenção de apoios, mais ou menos dissimulados, que contribuíram decisivamente para a sobrevivência do Cristianismo a partir de 1587.

Os últimos anos da vida de João Rodrigues foram passados na China, para onde seguira após uma breve estadia em Macau (1610-1612), no início do seu exílio12. Tudo indica que a sua expulsão do Japão terá sido motivada pelo excessivo envolvimento com as questões e o meio político, administrativo e comercial, na medida em que foi considerado como um comportamento mais "temporal" do que "espiritual", suscitando comentários e acusações por parte dos Japoneses, Espanhóis e Holandeses (que rivalizavam entre si e com os portugueses pela obtenção de influência junto da corte), bem como dos próprios jesuítas13. Tratava-se de um momento de difícil conciliação entre o trabalho diplomático e apostólico.

Já na China, João Rodrigues retomou a actividade missionária, ao mesmo tempo que acompanhou e valorizou a missão confiada aos jesuítas pela corte de Pequim: a correcção de erros detectados no Calendário (relativamente à previsão de eclipses) e no registo das latitudes dos diferentes lugares do império.

Redigida alguns anos mais tarde, a partir de 1620-1621, a História da Igreja do Japão apontou alguns "erros" que entretanto se procuravam corrigir, com base em cálculos mais rigorosos. Mas o Autor procurou, antes de mais, salientar o carácter enganador das superstições que decorriam destes erros introduzidos no Calendário e que eram contrários à doutrina cristã. Uma vez mais, importava evitar as discórdias entre as ciências celeste, terrestre e humana.

ORIGENS DO CALENDÁRIO JAPONÊS

O ano de 1685 assinalou uma alteração importante no modo de dividir e contar o tempo: «pela primeira vez, o calendário não é uma simples transposição de obras chinesas, ele é fundado nos cálculos e nas observações feitas no Japão»14. Em consequência da detectação de erros e do aperfeiçoamento de cálculos (relativos ao movimento dos astros), o Governo de Edo recomendou à corte a adopção de um calendário mais rigoroso — o da "era Jôkyô".

Antes desta revisão do calendário japonês, já em plena era Tokugawa, nada mais havia do que uma clara transposição e adopção dos cânones chineses de medição do tempo.

O calendário chinês vigorara no Japão durante cerca de dez séculos, de forma praticamente inalterada. A história desta adopção, seguida de uma profunda e duradoura assimilação, obriga a procurar na China Antiga as origens do calendário nipónico.

Há que remontar aos séculos III e II a. C., ao «momento em que a História e o Tempo recomeçaram»15. Depois de terem sido introduzidas alterações nas datas dos solstícios em 113 a. C., proclamou-se o novo Calendário (104 a. C.). Ao longo da época dos Han (206 a. C. - 220 d. C.) encontramos já fixados os princípios essenciais da calendarização do tempo, tal como serão "importados" pelo Japão. Isto sucederá por via dos intercâmbios com origem na China (e também na Coreia, espécie de "intermediária"), que se mantêm pelo menos até inícios do século IX, mesmo que de forma irregular16.

Alguns autores afirmam que o primeiro calendário chinês conhecido no Japão data de 55417, mas outros referem-se a vestígios deste uso já no século anterior18.

Como já foi referido, o século VII revestiu-se de particular importância. Culminando um processo de aquisição de conhecimentos sobre aquela matéria, adoptou-se oficialmente o calendário chinês, com os seus ciclos sexagesimais e a complexa articulação do movimento dos corpos celestes (sobretudo do Sol e da Lua), observado a partir da Terra. Tomando nas mãos a tarefa de elaboração do calendário, foi também nesta altura, em 676, que a corte dotou os especialistas do tempo, com um observatório astronómico. Surgiram instrumentos de medição cada vez mais rigorosos, que permitiam aplicar a "lei dos números" à observação do céu19 e registar, por exemplo, as horas20.

As consequências do trabalho realizado no campo da Astronomia e do Calendário tornaram-se visíveis no século IX: entre 821 e 824 completou-se a elaboração do Calendário "Senmyôreki"21, o qual é constantemente publicado a partir de 861, não sofrendo alterações até finais do século XVIII.

Novas revisões pontuaram os séculos XVIII e XIX. Genericamente, obedeceram a um impulso por parte de sábios versados em astronomia europeia e de um poder político que procurava seguir as tendências daquela. Entre outros aspectos, procuraram abandonar o calendário luni-solar e tornar a divisão do tempo menos dependente dos ritmos naturais. O mau acolhimento que estas medidas receberam por parte da população fez com que o antigo calendário fosse oficialmente tolerado até ao século XX, sendo utilizado ainda hoje, especialmente em meios rurais, para determinar datas litúrgicas e festivas22.

O TESTEMUNHO DE JOÃO RODRIGUES

Michael Cooper, ao tratar das condições de produção e das temáticas abordadas na História da Igreja do Japão, transmite-nos a seguinte reflexão: na sequência da exposição sobre as artes liberais e mecânicas, João Rodrigues prometera entrar no campo da poesia, «mas em substituição inclui um grande volume de informações estranhas sobre astronomia e astrologia Orientais»23.

Gostaria de começar por discutir esta afirmação de Michael Cooper. Naturalmente, não a observação relativa à inexistência do anunciado capítulo sobre poesia: é um facto que a promessa não foi cumprida. O que não pode deixar de surpreender é a classificação das passagens sobre Astronomia e Astrologia (às quais Cooper se refere, aliás, como longas, complexas, detalhadas e reveladoras de um profundo conhecimento por parte do Autor) como "estranhas" ou "alheias" à economia da obra em que se inserem.

Nada de melhor do que procurar nas próprias palavras de João Rodrigues a justificação para a inclusão destes capítulos: «Assim como os Japões receberam da China as letras, as ciências, e outros muitos costumes políticos que têm, assim também dela receberam muitas das artes liberais e mecânicas que têm, principalmente as matemáticas que são aritmética, geometria, música e astronomia»24.

Recorrendo a uma sistematização típica do ocidente medieval, inseriu a exposição sobre a astronomia no conjunto formado pelas quatro artes que correspondem ao quadrivium.

Escolheu, assim, uma dupla filiação para o tema que vai tratar. Por um lado, a tradição ocidental, predominantemente cristã; por outro, uma civilização oriental, cuja sabedoria é fundada na matriz chinesa. Ao longo do texto, João Rodrigues referiu--se constantemente a estas duas vertentes dos conhecimentos que expôs25. Apoiou-se para tal num vasto conjunto de fontes e de autores abundantemente citados26, tarefa em que revelou amplos conhecimentos de Latim, Chinês e Japonês27.

É interessante verificar que, relativamente às questões analisadas, a preocupação de João Rodrigues consistiu em harmonizar as duas vertentes atrás referidas. Neste sentido, radicou-as numa origem comum, garante de veracidade: «De modo que parece certo conforme ao que dissemos ter a astronomia e astrologia judiciária bem fundada, sua origem dos primeiros padres antes do dilúvio»28. Continuou explicando que cento e trinta e um anos após o dilúvio (ou seja, por volta de 2272 a. C., aquando da "confusão das línguas")29, este saber guardado pelos filhos de Noé teria sido transmitido pelos diferentes continentes, «para que em todo o mundo houvesse conformidade entre os homens»30. (Daí ser semelhante entre os Hebreus, Europeus, Caldeus, Egípcios, Chineses e Japoneses.) Acrescentou ainda que as condições de isolamento que caracterizaram em seguida a história da China terão contribuído para que, «nesse fim do mundo», a memória e a ciência tivessem sido preservadas: «desde sua primeira fundação permaneceu até agora intacta, sem se misturar com outras nações nem ser delas dominada e corrupta em sua antiguidade».31

O enquadramento da Astronomia e da "boa astrologia" oriental num fundo compatível com o ocidental só é possível quando se detém um conhecimento profundo das duas tradições.

Ao procurar estabelecer os pontos de contacto, João Rodrigues poderia ser motivado por vários objectivos. Por exemplo, possibilitar ao Ocidente um conhecimento daquelas ciências orientais, tornando-as simultaneamente menos estranhas, mais próximas, mais credíveis. Ou poderia ser um simples resultado dos estudos e das vivências de um jesuíta que parece ter entendido a missionação no Oriente como uma tarefa que implicou um conhecimento e um contacto profundo com a cultura e os costumes das populações a evangelizar. Neste sentido, importa lembrar que isolar traços comuns é uma tarefa por natureza aproximadora, mas que pode também conduzir a uma demarcação mais nítida dos factores dissemelhantes.

Quer isto dizer que, ao reflectir sobre o posicionamento de João Rodrigues sobre estas questões não nos podemos limitar a reconhecer o homem profundamente marcado por uma vivência "orien-talizante", que nos oferece um testemunho privilegiado da história e das sociedades que conheceu ao longo dos trinta e três anos que viveu no Japão e dos vinte e três que esteve na China. Há que ter presente que nunca abandonou o trabalho apostólico. Como ele próprio afirmava, actuou na corte «sem qualquer outro motivo para além da honra de Deus e o bem da companhia»32.

Veremos depois o modo como denunciou aquilo que contrariava o seu objectivo de implantação do Cristianismo. Num contexto de conciliação, é compreensível que tenha sido tomado como um desvio, um erro humano passível de correcção.

Esta constitui mais uma razão pela qual os nove capítulos aqui referenciados podem ser analisados como um todo coerente: se todo o capítulo sobre a divisão dos tempos é um exemplo de um meio do qual os homens se serviram para harmonizar a ciência celeste com a terrestre, o capítulo seguinte é revelador de como o homem, na perspectiva de João Rodrigues, pode ser causador de discórdias entre o céu e a terra, cometendo «muìtas mal-dades, e muitas ofensas de Deus incitadas pelo demónio»33.

A CIÊNCIA DO CÉU E DA TERRA

Uma vez que a Astronomia «trata da máquina do mundo superior, e inferior»34, do seu funcionamento (Astronomia especulativa) como dos seus efeitos (Astronomia prática), importa começar por esclarecer de que "mundo" se está a falar. Isto porque, pelo menos aparentemente, a existência de uma pluralidade ou mesmo infinidade de mundos foi defendida por diferentes autores "pagãos" (como os filósofos da Grécia antiga), bem como pelo budismo indiano e outras "seitas" seguidoras da doutrina do Buda Sakyamuni, a quem o Autor se referiu como "Xaca" ou "Xekia"35.

Resolvendo esta incompatibilidade relativamente à Cosmologia, João Rodrigues advertiu para o facto de que a literatura búdica e a da antiguidade, apesar de fazerem referências a "muitos mundos", afirmaram que só um é habitado por homens, animais e plantas, só um tem céu, Sol, Lua e estrelas. «Todos os demais foram fábulas metafóricas, e misteriosas, a respeito do que passa dentro do homem», sendo claramente apresentados naqueles textos como mundos «enigmáticos, e simbólicos»36. Fez prevalecer, assim, a concepção de um só mundo (tal como é comprovado pelas navegações)37 de forma circular.

Tratando de um mundo agora melhor definido, o Autor dedicou-se à análise do seu funcionamento. Começou pela "máquina superior" ou "esfera celeste", onde incluiu o estudo do céu como princípio masculino, activo, causa universal eficiente de todas as coisas que se geram e que se corrompem38, cujo corpo é composto pelos doze signos em que se divide a zona zodiacal, pelas estrelas e pelos planetas (dos quais o Sol, quente e seco, e a Lua, fria e húmida, são as fontes das qualidades elementares), bem como por todos os fenómenos que ocorrem em função do movimento que anima a esfera celeste39. Tratava-se de um cosmos ordenado, de uma "maquinaria" funcionando como um todo em que cada parte tende para a sua "natural inclinação" e para a conservação e permanência do conjunto40. Por este motivo era possível encontrar as leis gerais que regem o seu movimento. Os pontos de referência para medir (em graus) esse movimento correspondem aos caminhos aparentemente percorridos pelo Sol e pela Lua41. É justamente na observação destes dois movimentos, e na sua conciliação, que se funda o calendário chinês.

A "ciência celeste" sintetizava apenas parte dos fundamentos da divisão do tempo. Esta seria incompreensível se não fosse tida em conta a sua ligação à "ciência terrestre". A terra é caracterizada como princípio passivo, «cujo ofício é receber, e sustentar, e por isso se chama mãe fêmea»42. É o «receptáculo comum que em seu regaço recebe todas as influências do céu»43. A expressão fáctica, no mundo natural, das alterações registadas ao longo do tempo na posição dos planetas e das constelações de signos legitima assim determinadas divisões no Calendário. Caso exemplar, é o das estações do ano: «os quatro tempos do ano parecem ficar mais acomodados neste modo para seus efeitos, e participam melhor das qualidades que se lhe atribuem»44. Mais "acomodados" porque se iniciam e terminam no momento em que toda a natureza dá "sinais infalíveis" de mudança — desde a temperatura e os ventos até às árvores, às flores e aos comportamentos dos animais. Permitia, assim, aos agricultores usar o calendário como almanaque, a fim de programar os ritmos dos trabalhos agrícolas de acordo com as previsões climatéricas45.

Estabelecia-se uma correspondência "natural" e "própria" entre as conjunções dos corpos celestes e os seus efeitos. Havia deste modo «acordo frutuoso das estações e das obras humanas»46, tal como «provam os Chinas, e Japões por várias razões, e experiências que têm observado em espaço de 4000 anos até ora»47. Razão e experiência quotidianamente renovada constituíam os fundamentos da divisão do tempo para os quais João Rodrigues repetidamente chamou a atenção48. Surgia assim, simultaneamente, como uma tarefa acessível a todos («quem o experimenta e adverte, infalivelmente o sente»49) e um saber antigo e complexo, restrito aos especialistas do calendário. Tanto mais que se tratava de um ofício que tendia a manter-se dentro das mesmas famílias, uma vez que o exercício do cômputo dos tempos e elaboração dos reportórios anuais, que incluíam informação sobre Astronomia prática, era proibido a quem não tivesse foro da casa real que acedesse a essa função. É interessante atentar na justificação apresentada pelo Autor para aquela posição: «porque têm ser meio para tomar o reino pelo conhecimento, e ciência que têm por seus prognósticos, e juízos»50. Tal temor só fazia sentido na medida em que o Calendário não se limitava a ordenar os tempos do ano (solar e lunar), determinando os solstícios e equinócios, bem como os meses, dias-e horas. Efectivamente, o calendário sino-japonês tinha também um carácter divinatório que não se esgotava no mundo natural. A sua extensão ao campo das actividades humanas conferia-lhe um certo carácter sagrado, misterioso, poderoso; daí a sua restrição a um corpo limitado de especialistas, sob a alçada da corte.

A CIÊNCIA DO HOMEM (TEMPO, HISTÓRIA E PODER)

A tradição sino-japonesa apresentava "céu" e "terra" como princípios originais, cuja relação era responsável pela "geração" e "corrupção" de toda a matéria. Constituíam assim duas forças vitais que, harmonizando os pólos contraditórios que encerram, geravam equilíbrios, perceptíveis no mundo natural.

A observação dos efeitos causados pelos movimentos celestes e terrestres pressupõe o alargamento desta dualidade a um terceiro elemento — o Homem. A sua condição enquanto sujeito que procura compreender aquela relação, suscita o desejo de encontrar o seu lugar no cosmos, incitando-o a criar os instrumentos que lhe permitem uma inserção que não perturbe a ordem universal, mas antes colabore com ela.

Neste sentido se justifica que João Rodrigues se tenha referido a «céu, terra e homem» como «as três cousas principais do Universo», compondo uma trindade que não seria naturalmente estranha às categorias de um pensamento cristão.

Passando à análise da "ciência do homem", o Autor descreveu detalhadamente a forma como se procedia à divisão do tempo na China e no Japão. A inscrição na temporalidade, dimensão por essência humana, conduziu em seguida João Rodrigues a uma breve incursão no modo de organização da memória desse tempo, a História, estreitamente ligada ao estabelecimento do poder político.

Os cálculos referentes à divisão e ao cômputo do tempo eram sistematizados no «calendário dos tempos anual que se faz cada ano e se manda por todo o reino»51, sob a forma de folhas impressas.

Apresentando como unidade referencial o "ano pequeno" (solar e lunar), sobrepunham-lhe o "ano grande", semelhante ao ano platónico do Ocidente. Consideravam que o "ano grande" era formado por doze períodos, correspondentes à sucessão dos doze signos por 10 800 anos. Atribuíam-lhe, em consequência, um total de 129 600 anos, ao longo dos quais se completava um ciclo de passagem do caos ao cosmos e se regressava ao caos. Cosmogonia e divisão do tempo assentavam assim numa teoria circular que descreve um movimento de criação do céu, da terra, do homem e das restantes coisas (orientado no sentido da perfeição), seguido de um passar dos tempos marcados pela corrupção do universo, em direcção ao caos52.

A concepção cíclica do movimento evolutivo e involutivo do universo (até porque era sua crença que «do nada, nada vem»53) está constantemente presente nas restantes divisões do tempo no calendário. Ela revelava-se nos períodos de sessenta anos que formam os ciclos sexagesimais, formados pela combinação de dez elementos celestes com doze animais terrestres54. Agrupados desde o século VII pelos "mestres do calendário" em conjuntos de 1260 anos, constituíam uma outra espécie de "grande ano"55.

Todos estes ciclos tinham como unidade o ano, simultaneamente fundado no movimento aparente do Sol à volta da Terra e nas revoluções da Lua. Quanto ao ano solar, era-lhe atribuída a duração de «365 dias e 25 minutos ou um quarto de dia, o que equivale a três horas suas, e seis nossas»56. Subdividiam-no em quatro partes equivalentes às quatro estações do ano, sendo o meio de cada uma marcada por um ponto equinocial (Primavera ou Outono) ou solsticial (Verão ou Inverno)57. Às diferentes partes do ano (cada uma subdividida em seis partes de quinze dias nossos) atribuíam três signos animais (ou "casas") do ciclo zodiacal, bem como um certo número de propriedades climatéricas, apropriadas aos ritmos naturais agrícolas. A informação contida no texto de João Rodrigues permite elaborar o Quadro C, coincidente com o que podemos encontrar em Theodora Lau58.

lang=EN-US style='font-size:14.0pt;mso-bidi-font-size:12.0pt'>QUADRO C

4PARTES     

DO ANO      

 INÍCIO DA      

 PARTE DO ANO     

  FIM DA        

  PARTE DO ANO  

   SIGNOS 

          

   QUALIDADES 

              

Primavera   

            

            

            

            

Verão     

            

            

            

Outono      

            

            

            

Inverno     

            

 15ºAquário   

 5 Fevereiro      

                  

                  

                  

 15ºTouro       

 7 Maio           

                  

                  

 15ºLeão      

 7 Agosto         

                  

                  

 15ºEscorpião 

 —               

 15ºTouro     

 6 Maio         

                

                

                

 15ºLeão    

 6 Agosto       

                

                

 15ºEscorpiõ

 —             

                

                

 15ºAquário 

 4 Fevereiro    

Tigre     

(Lebre)   

Dragão  

          

Cobra     

(Cavalo)  

Carneiro  

          

Macaco    

(Galo)   

 Cão    

          

Javali    

(Rato)    

Vaca      

   Fria       

   Húmida   

   Quente     

              

   Quente     

   Seco       

   Húmido   

              

   Quente     

   Seco       

   Frio       

              

   Frio       

   Húmido   

   Seco       

 

A observação do ano lunar conferia-lhe uma duração de 354 dias ou, mais rigorosamente, 354 dias, 8 horas, 40 minutos e 33,6 segundos59, repartidos por doze meses de 29 e de 30 dias. Para compatibilizar o ano lunar com o solar introduziu-se um "ano intercalar" em cada dois anos e meio, que passou a ter uma duração de 384 dias, isto é, passou a ser um ano aumentado de um mês, também ele intercalar60.

João Rodrigues afirmou por duas vezes que esta ordenação do tempo e determinação dos anos solar e lunar, bem como dos meses que lhe correspondem, foi obra dos primeiros padres pré--diluvianos, posteriormente transmitida aos Hebreus, Caldeus, Egípcios, Gregos e Romanos61. O mesmo se passa com a repartição dos meses62 em semanas, e estas em dias e horas.

Distinguiu-se entre um "dia natural" (que dura "vinte e quatro horas nossas", ou "doze horas suas") e um "dia artificial", "dia comum e vulgar dos tratos humanos", que equivalia ao período de "seis horas suas" (e "doze nossas"), durante as quais o Sol é visível63. Dividiam ainda cada hora em quartos e atribuíam-lhes, tal como aos meses e aos anos, nomes de signos animais64. Porquê estes signos? Conta a lenda que Buda, antes de partir da Terra, convocou todos os animais: só doze compareceram para se despedirem, e chegaram pela ordem que desde então se segue para dividir o tempo, começando pelo Rato e terminando com o Javali65. Mas este não é o único modo de designação e contagem das horas do dia: o Autor afirmava que «os japões além deste modo têm outro também muito ordinário semelhante aos hebreus, ou também aos caldeus, e dos chinas antigos, de que agora também usa a Igreja nas horas canónicas»66.

Após tomar contacto com a divisão do tempo, tal como é apresentada na História da Igreja do Japão, e a propósito da preocupação constantemente manifestada por João Rodrigues de "evitar as discórdias" entre a "astronomia especulativa" oriental e a ocidental, seria interessante estabelecer alguns dos traços fundamentais da concepção do tempo que está em causa.

Na sociedade chinesa e japonesa foram postos em evidência elementos de uma vivência do tempo astronómico (cíclico, repetitivo, circular) e que erapautado pela sucessão periodicamente renovada dos ritmos da natureza: das sementeiras e colheitas, dos tempos que marcam o início e o findar das estações do ano. Esta vivência, típica de sociedades rurais em geral, opunha-se, de forma relativamente esquemática, a uma outra que vai irrompendo nas sociedades urbanas, nomeadamente no Ocidente cristão, fruto das exigências específicas da vida e do trabalho nas cidades, mas também em função de uma tarefa de cristianização desenvolvida pela Igreja. Com efeito, esta instituição foi largamente responsável pela expansão da concepção judaica de um tempo linear, mensurável e progressivo67.

Os capítulos aqui analisados fornecem algumas indicações que nos permitem supôr que, tal como no Ocidente, a Igreja no Japão seguiu uma orientação tendente ao enraizamento daquela concepção de tempo. Neste sentido podem ser entendidas as críticas à concepção cosmogónica que postula o carácter cíclico do movimento que parte do caos em direcção aos cosmos, e que ao caos regressa, pois o tempo salvítico é necessariamente progressivo, linear. Do mesmo modo se compreende a minúcia e o rigor dos cálculos para a divisão do tempo e a descrição dos instrumentos que sintetizam esse saber, na medida em que as ciências astronómicas, a elaboração do Calendário e as técnicas de construção desses aparelhos legitimavam e serviam um tempo preciso, quantificado e instrumental. Por último, também a referida equiparação das horas do calendário luni-solar às horas canónicas pode ser enquadrada num processo de implantação de um tempo mensurável, sendo possivelmente expressão de uma crescente necessidade de medir o tempo do trabalho humano.

A forma de organização da sociedade num quadro temporal (ou a vivência da historicidade) participa directamente do modo como o tempo é concebido. Numa abordagem sobre "o tempo e o homem oriental"68, essencialmente centrada na civilização chinesa, Joseph Needham defende a presença simultânea de relatos historiográfícos baseados num "tempo compartimentado" e num "tempo contínuo"69. Situa em meados do século II a. C. as origens de uma compartimentação que usa como escala principal a divisão dos anos em dinastias e reinados e relaciona esta prática com o tempo cíclico advogado pelos pensadores tauistas, budistas e neo-confu-cionistas. Entende que nos séculos VI-VII se sobrepôs a esta forma de relatar a história uma outra, cuja existência pode ser anteriormente detectada, mas que só então se terá tornado dominante. Essa compartimentação é perceptível nas narrações que estabelecem relações causais em áreas como a história das civilizações, das instituições governamentais ou outras. Resultariam das teorizações de um certo confucionismo mais erudito e das investigações dos funcionários dos departamentos de Astronomia e Cronologia da corte. Pautadas por uma crescente recusa de criação ex nihilo, teriam conduzido ao desenvolvimento de um tempo linear, progressivo, evolucionista e mecânico. Conclui que «a China esteve, em suma, mais próxima da cultura irano-judai-co-cristã, do que da cultura indo-helénica»70. Diria o mesmo sobre o Japão? Também aqui a Clio vestiria com o mesmo à vontade vestes japonesas?

Avaliar a implantação destas duas formas de conceber o tempo e a história na civilização chinesa e japonesa implicaria um estudo profundo de testemunhos de diversa proveniência. Tais fontes deveriam ser produzidas em várias épocas, oriundas de espaços diferenciados (rurais e urbanos) e de estratos sociais distintos. Não sendo este o objectivo do presente estudo, importa apenas averiguar da aplicabilidade destes instrumentos conceptuais à nossa fonte, isto é, aos nove capítulos seleccionados da História da Igreja do Japão. Recorrendo às fontes do conhecimento do passado nipónico, João Rodrigues deparou com um registo de acontecimentos típicos da concepção de tempo atrás analisada. O Autor apontou algumas das características dessa forma de registo, como sejam o seu objecto, meios de transmissão, unidades de contagem em que assenta e motivações inerentes à preservação da memória.

Começando por atentar nos factos assinalados, verificou que correspondiam aos que perturbavam os ritmos normais da vida quotidiana. Exemplo desta opção teria sido a inscrição nos "anuais públicos do reino" da ocorrência de eclipses do Sol e da Lua, «como cousa notável, ou de outros factos prodigiosos, como o aparecimento de cometas»71.

Quanto às formas de transmissão destes dados do passado, João Rodrigues encontrou na oralidade o seu suporte original. Neste sentido, e a propósito dos prodígios atrás referidos, afirmou que «a ciência de computar os eclipses do Sol e da Lua é antiquíssima nos Chinas de quem os Japões a receberam», suscitando a criação de «muitas fábulas no povo rude como é costume»72. Teve consciência, no entanto, de que a transmissão perene da memória dependia da passagem à escrita. Para ilustrar a importância do suporte escrito, recorreu uma vez mais ao cômputo dos eclipses, referindo-se aos erros que existiam nos calendários que incluíam previsões destes fenómenos. Fazendo radicar tais erros na generalização a todo o Japão de cálculos realizados para a antiga metrópole da China, João Rodrigues alertou para a causa da sobrevivência desta fragilidade teórica: «seus antigos parece que tiveram disso perfeito conhecimento, cujos livros se perderam em uma queima deles, que um rei sínico tirano mandou fazer 210 anos antes de Cristo Nosso Senhor para extinguir a memória da antiguidade, e perpetuá-la na sua família»73. Ou seja, o Autor atribuiu ao desaparecimento do suporte escrito a responsabilidade pela quebra da transmissão do conhecimento.

Um outro aspecto interessante neste excerto consiste no rigor com que João Rodrigues situou a "queima dos livros" no ano de 210 a. C., revelando a sua concepção de um tempo linear, quantificado com precisão. Esta sua observação é, ainda assim, inseparável do conhecimento que tinha de uma realidade fortemente implantada (dominante ou não) na historiografia da China e do Japão. Correspondendo à terceira característica do discurso historiográfico em análise, tratava-se de uma unidade de registo geracional e biológica. Com efeito, os relatos cronológicos fundados num tempo cíclico substituíram frequentemente as datas precisas pela referência a uma personagem conhecida, normalmente o rei. João Rodrigues assinalou esta circunstância, ao afirmar que, «porque carecem de eras, ou suas eras são o nome do rei, que actualmente reina, e são tantas quantas forem os reis, ou ainda mais»74. Segundo Francine Herail, "reinados" (contados a partir da entronização de cada imperador) e "eras" foram os sistemas mais comuns de contar os anos, enriquecendo a divisão dos ciclos sexagesimais75. Ao longo da história do Japão, a proclamação de novas eras constituiu privilégio do imperador76. A aquisição deste privilégio confun-diu-se desde o início com o estabelecimento da História oficial do Japão. Para tal compreender, basta lembrar que as "Crónicas do Japão", redigidas no século VII, apontaram o ano de 660 a. C. (ano oficial de entronização de Jimnu-tennô, que na verdade viveu no século III d. C.) como o ponto de partida da sua História.

Desde cedo, portanto, foi perceptível uma relação estreita entre o imperador e o registo historiográfico. Importa agora procurar compreender as motivações que teriam levado os soberanos a impulsionar a fixação da memória do passado, a fim de completar a quarta característica da historiografia nipónica, tal como a podemos observar no relato de Tçuzzu. Como vimos já no início, este movimento coincidiu com a elaboração da "Constituição em Dezassete Artigos", texto que servia objectivos de centralização do poder soberano, acompanhado por uma responsabilização da corte pela elaboração do Calendário77. Para esta tarefa tinha a seu cargo funcionários especializados (os "matemáticos reais") e organizava uma série de rituais e cerimónias que efectivavam os tempos prescritos pelo Calendário78. Em consequência, o soberano adquiriu títulos como "filho do céu", "mestre do tempo"céu "mestre único do calendário"79.

Na História da Igreja do Japão, João Rodrigues fundamentou este traço estrutural e estruturante das sociedades que observou. Afirmou que «fundaram toda a sua doutrina moral, civil, imitando em suas acções o céu e terra, pais universais, cujo filho primogénito têm ser o primeiro homem e mulher, cabeças e tronco dos demais de modo, cujo legítimo sucessor têm ser seu rei, e por isso se chama filho do céu»80. A ordenação social e política do mundo natural tinha como paradigma a ordem celeste, inscrita nos fundamentos da Astronomia, ciência de harmonização do céu e da terra. Assim como esta só era possível mediante a actuação de um princípio ordenador fixo, centralizado e perpétuo (o céu), também aquela ordem do mundo inferior (as sociedades humanas, na sua relação com o meio natural) só seria viável quando os reis «procuram no céu os princípios da sua conduta»81. Tais princípios deviam ser traduzidos em "leis morais e civis", relativamente às quais a sociedade se comportava como "receptora". Este serviço, globalmente encarado como perpétuo, inscrevia-se obrigatoriamente na temporalidade. Pautava-se por um tempo periodicamente renovado, tal como era anualmente exposto às populações por meio do Calendário. Isto para o tempo presente (e também futuro, por via das práticas divinatórias), já que para o passado recorriam a um outro meio: «a história não difere de um calendário ilustrado por imagens genéricas»82, também ela nascida das "especulações" sobre a divisão do tempo.

Em suma, o soberano servia-se do tempo do mundo para gerir o tempo dos homens, tudo para que a sociedade dos homens actuasse em harmonia e evitasse as discórdias entre os seus elementos e face à ordem universal.

A FALSA CIÊNCIA

Ao longo de oito capítulos, João Rodrigues habituou-nos a um discurso essencialmente conciliador entre a tradição ocidental e a oriental. No campo da "astronomia especulativa", e mesmo ao tratar da Cosmologia, optou por realçar traços comprovativos de um continuum histórico. Quando confrontado com dados nitidamente contraditórios, como no caso da "forma e unidade do mundo", defendeu o carácter aparente da oposição, apontando para as ilusões criadas por uma interpretação abusiva do sentido metafórico. Noutros casos, detectou nas ciências orientais "do céu, da terra e dos homens" verdadeiras imprecisões e erros, mas tratou-os com complacência... e passou a outras questões.

Tudo muda com a exposição da "astronomia prática". O tom tornou-se claramente crítico e voluntariamente acusador. João Rodrigues não hesitou em apontar as divergências que separavam a concepção ocidental e cristã (cuja defesa assume) das «vãs superstições da judiciária, que depende dos aspectos dos planetas, e estrelas, e de outras várias sortes que têm deste género»83.

Começou por pesquisar as origens históricas da "astronomia prática", e encontrou-as nos "primeiros padres antes do dilúvio" (semelhante, portanto, ao que estabelecera para a "astronomia especulativa"). Nesse tempo, correspondia à ciência «que ensina os efeitos que os movimentos, conjunções, e aspectos dos corpos celestes causam nestas cousas inferiores; a qual ciência é natural fundada em razões naturais adquiridas pela experiência»84. Era, em suma, uma "astrologia judiciária bem fundada" e com um "bom fim"85.

Registou-se posteriormente uma corrupção desta ciência, introduzida na transmissão que dela fizeram aos Caldeus os "maus filhos de Caim", que passou em seguida à China86.

Por esta via, chineses e japoneses adquiriram a "vã astrologia", "judiciária" e "prognosticativa"87. O autor da História da Igreja do Japão identificou três grandes tipos de "judiciária". Referiu-se primeiramente à "magia natural", entendia como forma de prever a natureza e destino de cada indivíduo a partir da conjunção astral registada no momento da concepção e nascimento. Ao afirmar que andam «muitos enganados com esta vaidade do fado inevitá- vel»88, João Rodrigues procurou combater uma concepção que era contrária a noções fundamentais do cristianismo, como a de "liberdade do homem" enquanto criatura de Deus.

A mesma crítica à influência decisiva dos corpos celestes no "destino pessoal", surgiu quando abordou o segundo tipo de judiciária: a "astronomia"89 prognosticativa. Aplicando o mesmo raciocínio à vida quotidiana, procuravam determinar os dias fastos e nefastos para todo o tipo de acção90. Num diálogo com Honda Masazumi, um adepto do budismo Zen, o padre João Rodrigues exprimiu com suficiente simplicidade e clareza as suas ideias sobre estas práticas: «dia de azar para um cristão era aquele em que partia em viagem e era apanhado no meio de uma tempestade de chuva»91.

Em último lugar, considerou o conjunto das "judiciárias das coisas da terra". Enquanto sistema geomântico, aplicado a habitações, sepulturas e restantes edifícios, visava «descobrir os lugares onde predomina a influência benéfica e, em caso contrário, alterar por meios artificiais o ambiente, de forma a poderem conseguir-se resultados propícios»92. Reflectia uma concepção panteísta da natureza e uma visão dos cosmos como um todo contínuo em que se estabelecem efeitos recíprocos entre os três elementos da trindade cósmica (céu, terra e homem). Como já atrás foi analisado, esta concepção do universo, negadora da criação ex nihilo (logo, de Deus como criador) era inaceitável para o cristianismo.

Segundo João Rodrigues, eram cinco os "erros" implantados através da "astrologia judiciária": «àcerca de Deus, da criação do Universo, das substâncias espirituais e alma do homem, e do fado inevitável»93. Sendo esta síntese reveladora do quanto estes "erros" contrariavam o cristianismo no cerne da sua doutrina, não nos pode espantar a firmeza e mesmo a violência das palavras do nosso Autor94. Elas são uma exacta medida de dois factores. Por um lado, do fortíssimo grau de implementação destas crenças e práticas nas sociedades chinesa e japonesa. Isto acontecia em grande parte devido à inclusão das informações indispensáveis a estas práticas nos calendários que eram anualmente impressos e recebidos pelas populações. Por outro lado, uma medida do empenho colocado por João Rodrigues no seu trabalho apostólico. Tal tarefa pressupunha, portanto, como facetas indissociáveis do conhecimento do outro a evangelizar, duas orientações que só aparentemente são contraditórias: a harmonização de perspectivas e a demarcação da "ortodoxia", da pureza doutrinal, tão claramente quanto era permitido pelo grau de envolvimento com a cultura e os povos junto dos quais fora fundada a missão.

A IDENTIDADE E A DIFERENÇA

Na sua relação com o mundo, o homem inscreve-se no domínio da temporalidade. Qualquer actividade humana, ao deparar com a realidade do tempo, é susceptível de despertar a necessidade de medir esse mesmo tempo.

Seja no domínio da vivência do presente ou do relato (passado ou futuro) que dele se faz, há que encontrar pontos de referência e unidades à divisão que melhor traduza o modo de relacionamento com o cosmos.

Porque é essencialmente fundada no movimento de dois corpos celestes, Sol e Lua (tempo do céu), bem como nos efeitos que estes geram no mundo terrestre (tempo da terra), a divisão do tempo expressa no Calendário (tempo do homem) surge como uma síntese organizadora da ordem universal.

A História da Igreja do Japão, oferece um testemunho valioso da forma como o Calendário em vigor no Japão e na China constitui um instrumento de harmonização das «três cousas principais do Universo. ss. céu, terra e homem». Valioso porque resulta de um conhecimento profundo, adquirido através de um longo contacto com as línguas e as culturas chinesa e japonesa, mas também porque alia à experiência vivencial, directa, um saber erudito, cuja exposição analítica não dispensa a constante referência às fontes da informação transmitida.

Estão, assim, reunidas em João Rodrigues as condições privilegiadas para intuir algumas das categorias estruturantes do pensamento do homem oriental. Esta tarefa é facilitada pelos traços semelhantes que partilhou com a tradição ocidental cristã de que era oriundo — um saber antigo "fundado em razão e experiência".

O Autor inseriu as concepções àcerca da ordem universal em projectos e acções concretas observadas na ordem humana. Nesta perspectiva, concluiu que a divisão do tempo no Calendário tinha uma "função moral e civil", traduzida na dupla ligação à construção do poder político e da memória histórica, esta também relacionada, na sua faceta oficial, com o reforço da identidade e poder do Estado.

Nos capítulos analisados, o realce e o aprofundar das continuidades históricas entre tradições distintas entram em relação dialéctica com a demarcação da diferença. Remetem para um isolamento do "outro", na medida em que se manifesta nas práticas supersticiosas, divinatórias, cujas regras são inscritas no Calendário.

Estas questões são, portanto, indissociáveis do propósito claramente assumido por João Rodrigues de denunciar e combater as «muitas ofensas de Deus (...) com que o demónio traz esta miserável e cega gentilidade, desinquieta nas cousas temporais da presente vida».

Poderá, então, concluir-se que a ordenação harmoniosa do Céu e da Terra que o próprio Autor equacinou e defendeu acabou por se revestir de um sentido religioso, apostólico e evangélico.

Fica assim justificada a coerência interna do todo formado pelos capítulos sobre a Astronomia, a divisão do tempo e a Astrologia, bem como a sua inserção na História da Igreja do Japão. 1986, p. 60.

QUADROB

 

 

 

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QUADRO B

 

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QUALIDADES

LOCALIZAÇÃO

PROPRIEDADES

PLANETAS

FONTES

ELEMENTARES

 

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ELEMENTARES

Ignea

Sul

Fogo

Marte

Sol

Lignea

Oriente

Pau

Júpiter

(Quente e Seco)

Terrestre

Meio

Terra

Saturno

 

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Aguea

Norte

Água

Mercúrio

Lua

Metalicia

Poente

Metal

Vénus

(Húmida e

Fria)

 

NOTAS

1 Cit. in Francine Herail, Histoire du Japon, Des Origines à la fin de Meiji. Matérieux pour l'étude de la Langue et de la Civilization Japonaise, Paris, Publications Orientalistes de France,

2João Rodrigues, História da Igreja do Japão, cap. 10.

3 Cf. Francine Herail, op. cit, pp. 58-65.

4 Cf. Ibidem, pp. 20-21.

5 Os nove capítulos seleccionados correspondem aos que se iniciam no fl. 156v. eterminamnofl. 181 (Cap.8, fls. 156v.-160: «Das Artes da Matemática de Japão Donde os Japões as receberam»; Cap.9, fls. 160-162: «Da Astrologia Sínica, e japoa, em particular»; Cap. 10, fls. 162-164v.: «Do céu em particular, e graus em que o dividem»; Cap. 11, fls. 164v.-166.: «Dos graus, e Signos em que repartem o Céu, e da Equinocial, e Eclíptica»; Cap. 12, fls. 167-167v.: «Dos eclípses do Sol, e Lua»; Cap. 13, fls. 168-170v.: «Das estrelas e Constelações que põem Número de Estrelas, e ordem como as distribuem em seu globo celeste»; Cap. 14, fls. 170v.-172: «Da terra, e água, sua figura em graus de elevação em que dizemestar»; Cap. 15, fls. 172v.-179: «Divisão do tempo que fazem os Japões, e Chinas»; Cap. 16, fls. 179-181«Da Astronomia Prática Judiciária destas nações, e várias superstições que nisto têm»).

6 Cf. Michael S. J. Cooper, Rodrigues, The Interpreter. An Early Jesuit in Japan and China, Weatherhill, New York — Tokyo,1974, pp.54-67.

7 M. Cooper aventa a hipótese de João Rodrigues ter saído de Portugal em 1574 na mesma frota em que A. Valignano partiu para a Índia. Viriam a cruzar-se depois no Japão, onde João Rodrigues aporta em 1577 e o Visitador em 1579 — cf. Ibidem, p. 52.

8 Cf. idem, ibidem, p. 59.

9 Cf. Armando Martins Janeira, O Impacto Português sobre a Civilização Japonesa. Seguido de um epílogo sobre as relações entre Portugal e o Japão do século XVII aos nossos dias, 2ḁ edição, Publicações D. Quixote, Lisboa, 1988, p. 171.

10 «A sua longa e complexa discussão da astronomia oriental, bem como o uso fluido que faz dos termos técnicos em Chinês e em Japonês, demonstram que o seu conhecimento destas matérias deve ter igualado o seu entendimento da astronomia ocidental aprendida quarenta anos atrás nas lições de Gomez em Funai» — M. Cooper, op. cit, p. 308.

11 Segundo M. Cooper, João Rodrigues pode ter servido de intérprete a Hideyoshi nos anos de 1586-1587. No entanto, os longos períodos de residência de Tçuzzu junto da corte (de Hideyoshi e Ieyasu) iniciaram-se em 1591 e só terminaram em 1610, com a sua expulsão do Japão — cf. Ibidem, pp. 67,73,94, 104,105,253,263,267. A ligação do trabalho apostólico de João Rodrigues com a sua função de intérprete e diplomata é registada, por exemplo, no "Catálogo dos Padres e Irmãos de Japão repartidos pollas Casas e Residências em que cada hum delles reside" (Outubro de 1607), que assim se refere ao Autor: "Pe. João Rodríguez, que corre com a Corte" — Monumenta Historica Japoniae I. Textus catalogorum Japoniae (1553-1654), Roma, 1975, p.505.

12 Cf. M. Cooper, op. cit., pp. 273 e ss.

13 Cf. Ibidem, pp. 253-263.

14 F. Herail, op. cit, p. 21.

15 Marcel Granet, La Civilization Chinoise. La Vie Publique et La Vie Privée, Éd. Albin Michel, Paris, 1988, pp. 48-58.

16 Cf. Edwin O. Reischauer, Albert M. Craig, Japan: Tradition and Transformation, Charles E. Tuttle Company, Tokyo, 1978, p. 13. Lembre-se que a China e a Coreia foram durante muito tempo os reinos de que "tinham os J apões notícia" e com os quais se relacionavam. — João Rodrigues, op. cit., cap. 14.

17 Cf. A. M. Janeira, op. cit, p. 170.

18 Cf. F. Herail, op. cit, p. 20.

19 Cf. Marcel Granet, op. cit, p. 22.

20 João Rodrigues apresenta uma descrição minuciosa dos "artificiosos" relógios usados no Japão para saber as horas (cap. 15). Não se tratando de "relógios ordinários", nem por isso deixam de cumprir a sua função: relógios de fogo, de sol e de água; a cargo dos bonzos nos templos ou de funcionários da corte nas cidades; dotados de um grau maior ou menor de precisão, são um meio de informar as populações. Seria interessante averiguar como este modo de percepção e de noticiar as horas terá sido acompanhado por uma alteração da vivência do tempo (e provavelmente do trabalho) pelas populações à semelhança do que é patente nos estudos realizados para o Ocidente por autores como Jacques Le Goff ou E. P. Thompson.

21 Cf. F. Herail, op. cit, p. 21.

22 Cf. Ibidem, p.21-22.

23 M. Cooper, op. cit, p. 308.

24 João Rodrigues, ibidem, cap. 8.

25 Vide cap. 8 (sobre o movimento dos astros e sobre as artes liberais e mecânicas); cap. 9 (a propósito da cosmogonia e cosmologia); cap. 13 (relativamente às estrelas e constelações; sobre os efeitos, na terra, das diferentes conjugações de estrelas e planetas; e ainda resumindo todos os aspectos atrás referidos e acrescentando os modos de divisão do tempo); cap. 15 (igualmente sobre a divisão do tempo).

26 Refira-se a título de exemplo, as longas passagens da Sagrada Escritura, que cita em latim, das histórias chinesas e de autores greco-latinos como Clístenes, Aristóteles, Plínio, Diógenes, Anaxarco, Ptolomeu e Maniqueu.

27 Ao longo de todo o texto, o Autor apresentou em constante paralelo os termos em chinês e em japonês.

28 João Rodrigues, ibidem, cap. 13. Quanto à referência à "astronomia judiciária bem fundada", entenda-se aquela que não se baseia em "vãs superstições", ou seja, que trata dos efeitos do "mundo celeste" no "mundo natural", sem incorrer em "erros" como a magia natural, a crença no "destino inevitável" ou a idolatria. Destas questões se tratará mais à frente.

29 Estes cálculos são baseados na informação apresentada no cap. 8, bem como no cap. 15. Existe uma diferença de setenta anos entre os dados contidos nas referidas passagens: na primeira, o Autor refere-se ao episódio da "confusão das línguas" como tendo tido lugar 3892 anos antes do ano de 1620, enquanto que na segunda o situa 3822 anos antes daquela data. Natabelaque se segue (Quadro A) optou-se pela primeira referência, porque só ela é concordante com a informação, repetida nas duas passagens, de que terão passado 5682 anos desde Adão até ao ano de 1620. Naturalmente, João Rodrigues usa como fonte as Sagradas Escrituras.

30 João Rodrigues, op. cit., cap. 13.

31 Ibidem, cap. 13.

32 M. Cooper, op. cit, p. 250.

33 João Rodrigues, op. cit., cap. 13.

34 Ibidem, cap. 9.

35 Segundo João Rodrigues, também os antigos Gregos e os Caldeus foram influenciados na sua concepção pela doutrina de Sakyamuni. No cap. 9 encontra-se uma descrição muito pormenorizada destas teorias cosmogónicas e cosmológicas.

36 Ibidem, cap. 9.

37 Cf. M. Cooper, op. cit, p. 101. Quanto ao problema da "forma do mundo", mantém-se a contradição entre concepção cristã (na qual céu e terra têm forma circular) e a teoria confuciana que afirma ser o céu redondo e a terra quadrada. Note-se que a cosmologia confuciana chinesa está em vigor no Japão até inícios da era Tokugawa — A. M. Janeira, op. cit, p. 170.

38 João Rodrigues, op. cit., cap. 10.

39 A astronomia oriental fala de um movimento de Oriente para Ocidente, enquanto no Ocidente se postula um movimento em sentido inverso — Ibidem, cap. 10. O quadro que se segue (Quadro B) procura sintetizar a informação contida no cap.10.

EPISÓDIO BÍBLICO

 

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lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>QUADRO A

 

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EPISÓDIO BÍBLICO

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DATAÇÃO

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Tempo de Adão                   

4062 a.C.

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x:str="Tempo do Dilúvio ">

Tempo do Dilúvio

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yes">                

2403 a.C.

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Tempo da "Confusão das

Línguas"

2272 a.C.   

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Tempo de Redação

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yes">              

 

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da História da Igreja do Japão

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1620 d.C.

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40 Ibidem, cap. 13.

41 Não nos esqueçamos que até finais do século XVIII vigorou no Japão a teoria geocêntrica — A. M. Janeira, op. cit, p. 170.

42 João Rodrigues, op. cit, cap. 10.

43 Ibidem, cap. 13.

44 Ibidem, cap. 15.

45 Theodora Lau, The Handbook of Chinese Horoscope, Arrow Books, London, 1981, p. 3. Comparando as vantagens e desvantagens do calendário ocidental com o oriental, a autora afirma inclusivamente que apesar de o calendário ocidental, baseado no movimento do Sol, ser mais consistente e mais fácil de compreender, o calendário lunar do Oriente é mais preciso no registo das mudanças das estações e do crescimento de toda a vida no universo—p. 3.

46 M. Granet, op. cit, p. 191.

47 João Rodrigues, op. cit., cap. 15.

48 Nos capítulos analisados, o argumento da "razão e experiência" para fundamentar a divisão do tempo no calendário constitui um tema que parece retroceder às origens e ao qual repetidamente se recorre. Surgira já, por exemplo, no cap. 8.

49 Ibidem, cap. 15.

50 Ibidem, cap. 12.

51 Ibidem, cap. 15.

52 Cf. Ibidem, cap. 10. Uma explicação mais detalhada desta teoria cosmogónica pode ser encontrada no capítulo «El Budismo Antiguo», da obra Las Religiones en la India Y en Extremo Oriente. Formación de las religiones universales y de salvación, (dir. Henri-Charles Puech), vol. 4, col. «Historia de las Religiones», Ed. Siglo XXI, s. d., pp. 214-215.

53 João Rodrigues, op. cit, cap. 10.

54 Cf. Ibidem, cap. 15 e F. Herail, op. cit, p. 18.

55 F. Herail, op. cit, p. 21. A autora lembra que esta outra espécie de "ano grande" terá sido a medida usada no século VII para se recuar 1260 anos e assinalar o ano de 660 a. C. como o ponto de partida que inicia oficialmente a história do Japão.

56 João Rodrigues, op. cit, caps. 8 e 15. A cada dia faziam corresponder um grau e a cada grau cem minutos; logo, "um quarto de dia" equivalia a vinte e cinco minutos.

57 Ibidem, cap. 8.

58 Cf. Ibidem, cap. 15 e Theodora Lau, op. cit, p. 13.

59 Padre Avelino de Jesus da Costa, «Calendário» (1), in Dicionário de História de Portugal, dir. de Joel Serrão, vol. I, Lisboa, s. d., pp. 435-438.

60 João Rodrigues, ibidem, caps. 8 e 15.

61 Idem, ibidem, cap. 15.

62 João Rodrigues apresenta no cap. 11, um quadro em que relaciona os nomes que os japoneses e chineses atribuem aos meses com os do calendário ocidental (Quadro D).

NOMES JAPÓNICOS

 

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QUADRO  D

 

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NOMES JAPÓNICOS

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NOMES

SÍNICOS

NOMES NOSSOS

style="mso-spacerun: yes">       

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NOSSOS

MESES

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MESES

OU LUAS JAPOAS 

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Ne       

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style="mso-spacerun: yes">  Teu    

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Rato         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Dezembro

x:str=" Decima Prima ">

 

Decima Prima       

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x:str="Bxi ">

Bxi      

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style="mso-spacerun: yes">  Cheu   

 

Vacu ou Touro     

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Janeiro

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Duodecima         

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x:str="Tora ">

Tora      

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style="mso-spacerun: yes">  Yn    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Tigre         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Fevereiro

 

Primeira Lua ou mês do ano

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B       

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style="mso-spacerun: yes">  Mao    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Lebre         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Março

x:str=" Segunda ">

 

Segunda          

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Tatçu    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

style="mso-spacerun: yes">  Xin    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Serpente ou Dragão 

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Abril 

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str=" Terceira ">

 

Terceira        

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x:str="Mi ">

Mi       

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style="mso-spacerun: yes">  Su    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Cobra         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Maio  

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str=" Quarta ">

 

Quarta          

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str="Vma ">

Vma      

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

style="mso-spacerun: yes">  B     

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Cavalo        

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Junho 

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str=" Quinta ">

 

Quinta          

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x:str="Fitçuji ">

Fitçuji   

style="mso-spacerun: yes">  Vi    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Carneiro       

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Julho 

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str=" Sexta ">

 

Sexta          

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str="Saru ">

Saru      

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

style="mso-spacerun: yes">  Xim    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Bugio ou Macaco    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Agosto 

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str=" Setima ">

 

Setima          

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

x:str="Tori ">

Tori      

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

style="mso-spacerun: yes">  Yeu    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Galinha ou Galo    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Setembro

x:str=" Oitava ">

 

Oitava          

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x:str="Ynnu ">

Ynnu      

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

style="mso-spacerun: yes">  Siu    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Cão         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Outubro

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Nona          

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x:str="Y ">

Y       

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style="mso-spacerun: yes">  Hay    

style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

Porco Montês ou Javali

 

Novembro

 

Decima         

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体'>

 

63 Ibidem, cap. 15.

64 Os dados apresentados na História da Igreja do Japão (cap. 15) são incompletos e algo confusos. Coincidem, no geral, com adivisão das horas contidas em bibliografia vária — F. Herail, op. e it, p. 20; Theodora Lau, op, cit, p. 12. Podem ser compilados no quadro seguinte (Quadro E):

65 cf. Theodora Lau, op. cit, p. l.

66 João Rodrigues, op. cit, cap. 15.

67 Estas reflexões são devedoras dos estudos de autores como J. Le Goff ou E. P. Thompson e da síntese apresentada para o Ocidente por Luís Krus, «A Vivência Medieval do Tempo», in Estudos de História de Portugal. Volume I — Séculos X-XV. Homenagem a A. H. de Oliveira Marques, Editorial Estampa, Lisboa, 1982, pp. 343-355.

68 Joseph Needham. La Science Chinoise et 1'Occident. Le grand títrage, Éditions du Seuil, Paris, 1973, pp. 155-203.

69 Segundo o autor, esta mesma "amálgama" seria uma constante na historiografia ocidental, dominada pela concepção de um "tempo contínuo" — ibidem, p. 203.

70 Ibidem, p. 203.

71 «Antigamente se escreviam os eclipses nos anuais públicos do Reino como cousa notável que acontecia o caso, assim como se notam todas as demais aparências celestes de cometas de dois e três sois» — op. cit., cap. 12. Vide também Marcel Granet, op. cit, p. 68.

72 João Rodrigues, ibidem, cap. 12.

73 Ibidem, cap. 12.

74 Idem, ibidem, cap. 15.

75 F. Herail, op. cit, p. 22-23. A autora defende que, a partir do século VIII, a historiografia recorreu mais ao uso das "eras" que dos "reinados", as quais correspondem a uma adaptação do costume chinês de renovar os tempos por intervalos sensivelmente regulares.

76 Cf. Ibidem, p. 23.

77 Cf. Ibidem, pp. 21 -23.

78 Cf. João Rodrigues, ibidem, cap. 12.

79 Cf. M. Granet, op. cit, p. 22 e 408.

80 João Rodrigues, op. cit., cap. 10.

81 Marcel Granet, op. cit, p. 59.

82 Ibidem, p. 59.

83 João Rodrigues, op. cit., cap. 16.

84 Ibidem, cap. 13.

85 Ibidem, cap. 13.

86 Ibidem, caps. 8 e 13.

87 «Trata do mau e bom dia para obrar, e outras cousas contingentes que pelas aparências celestes e aspecto; e conjunções dos planetas entre si e com as estrelas prognostica» — Ibidem, cap. 9.

88 Ibidem, cap. 16.

89 O termo é usado no sentido que damos à palavra "astrologia". João Rodrigues utiliza frequentemente de forma indistinta os termos "astronomia" e "astrologia", facto que não deve ser totalmente alheio à íntima relação entre os dois conceitos na mentalidade chinesa e japonesa.

90 Cf. Ibidem, cap. 16. Determinava também o carácter fasto ou nefasto de várias unidades de tempo, como as horas ou outros períodos justificados por situações particulares — F. Herail, op. cit, p. 21; Theodora Lau, op. cit, p. 3.

91 Relato feito por M. Cooper, op. cit, p. 251.

92 "Ramón Lay Mazo, «O Feng-Shui», in Revista de Cultura, Edição do Instituto Cultural de Macau, nº 9, 3º vol.. Ano IV, Janeiro/Fevereiro/Março, 1990, p. 49-61.

93 João Rodrigues, op. cit., cap. 8.

94 São exemplo do tom do discurso do Autor passagens como «sujeitaram a influência do céu contra toda a razão, e experiência para que com essa cor pudessem cometer muitas maldades, e muitas ofensas de Deus incitados pelo demónio» (cap. 13). Ou «com várias cerimónias, e hipocrisias, e fingimentos com que enganam os coitados, os quais se vão muito contentes com o prognóstico, ou juízo com o dinheiro fora da bolsa» (cap. 16). Ou ainda «e outras várias superstições desta sorte com que o demónio traz esta miserável e cega gentilidade, desenquieta nas coisas temporais da presente vida» (cap. 16).

QUADRO E

    SIGNOS                                      HORAS A QUE CORRESPONDEM
    Rato................................................23.00- 1.00
    Vaca ou Touro.......................................1.00- 3.00
    Tigre...............................................3.00- 5.00
    Lebre................................................5.00- 7.00
    Serpente ou Dragão..................................7.00- 9.00
    Cobra...............................................9.00-l1.00
    Cavalo..............................................11.00-13.00
    Carneiro............................................13.00-15.00
    Bugio ou Macaco.....................................15.00-17.00
    Galinha ou Galo.................................... 17.00-19.00
    Cão.................................................19.00-21.00
    Porco Montês ou Javali..............................21.00-23.00

*Mestra em História Medieval (F. C. S. H.); bolseira da J. N. I. C. T..

desde a p. 155
até a p.