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O CAVALO NA HISTÓRIA NATURAL E NA MEDICINA DA CHINA ANTIGA

Extraído e traduzido do inglês de "The Chinese Repository" (Art. I. Notices in Natural Histo-ry: 1, the ma or horse), Vol. VII - Dezembro de 1838-N° 8.

Xilogravura de diagrama do cavalo, mostrando e indicando os pontos de acupunctura.

Dezassete páginas do Pan Ts'au 本草 são preenchidas com uma descrição do cavalo, tratando dos usos das várias partes internas e externas do seu corpo em medicina, e do modo como se aplicam nas doenças. A forma como o assunto é aqui versado segue a ordem tradicional utilizada pelos compiladores daquele livro, nas suas descrições dos numerosos artigos que constituem a materia medica chinesa - e nós vamos segui-los, não só para deixar aos leitores uma ideia dessa sequência, mas também para lhes transmitir o que dizem os chineses desse nobre e favorito animal.

Para tanto, contudo, não é necessário descermos a minúcias acerca de pílulas, etc., bastando dar os pontos principais de cada Secção.

Secção I.

"Explicação do nome. Li Shechin diz: Gan Heu nota que o cavalo é um animal de guerra. O carácter má representa a sua figura, cabeça, crina, cauda e pernas. O que se escrevia originalmenteIMG=AAAAAé agora estilizado em 馬 má. Nomes diferentes são aplicados a garanhões e éguas, e aos potros de diversas idades e cores, que são muito variadas; vide o Urh Ya.

Secção II.

"Gan King diz: Existem cavalos de muitas cores, mas para a medicina o melhor é o branco puro; mesmo assim, se o animal tem algumas manchas nos olhos, na boca ou nas patas, podem ser ignoradas. Li Shechin diz: Há cavalos selvagens em Yunnan e Shanse. Regra geral, os cavalos do Norte e do Oeste são superiores aos do Sul e do Leste, que são pequenos e fracos. A idade tira-se pelos dentes que, pequenos no início, vão crescendo à medida em que aumenta a idade do cavalo. O olho do cavalo reflecte a imagem inteira de um homem. Se comer arroz, as patas tornam-se pesadas; se comer excremento de ratazana, a barriga incha; se se esfregarem os dentes com bichos-da-seda mortos ou com amei xas pretas, ele não quererá comer, mas o efeito é anulado esfregando-os com folhas de amoreira. Pendurando-se uma pele de ratazana ou de lobo na manjedoura, não comerá. Não se deve permitir que os cavalos comam na pia de um porco, para não contrair alguma doença: se se prender um macaco no estábulo, não cairá doente.

Secção III.

"A carne de um cavalo branco puro é a mais nutritiva: se estiver amarga ou fria, é nociva. Muitos autores são citados acerca dos valores nutritivos da carne do cavalo, mas as opiniões diferem. Um diz que aqueles que comem da carne de um cavalo doente, move em cada dez morrem; deverá ser assada e comida com gengibre e carne de porco. Outro assinala: Comer a carne de um cavalo preto e não beber vinho a acompanhar, levará certamente à morte. Li Shechin recomenda comer amêndoas e tomar um caldo de juncos no caso de se sentir mal disposto depois de comer carne de cavalo. Deve aqui acrescentar-se que a vimos à venda nos açougues de Cantão, e que provavelmente se come com mais frequência nas províncias do Norte do que nesta região.

Secção IV.

"A gordura da parte superior da cabeça é doce, e faz menos mal à saúde; estimula o crescimento do cabelo: dá brilho a um rosto sombrio, e cura a flacidez da pele das mãos e dos pés. É princípio geral da farmácia chinesa, aqui ilustrado, que qualquer parte de um animal é boa para curar a parte correspondente no doente.

"Secção V.

"Li Shechin diz: Na dinastia Han fazia-se um licor do leite da égua. O leite é doce e refrescante; quando preparado em Kumiss, a sua consistência é macia; e bebê-lo emagrece.

Secção VI.

"o coração de um cavalo branco, ou o de um porco, vaca ou galinha, quando seco e macerado numa bebida alcoólica, e assim ingerido, é remédio contra o esquecimento: se o paciente ouvir uma coisa, sabe dez.

Secção VII-VIII

"Descrevem-se aqui os pulmões e o fígado. O fígado é muito venenoso. Wuti£? da dinastia Han, diz: ao comer carne de cavalo, não se coma o fígado. Quem comer fígado de um cavalo, morrerá, diz outro. Os chineses atribuíam as propriedades deletérias do fígado à ausência de vesícula biliar que se sabe estar em falta na anatomia do cavalo. Pensam que a vesícula é a sede da coragem e, para menosprezar um covarde, dizem: Vou-te mandar comprar uma vesícula de cavalo. No dicionário de Kanghi há um exemplo para demonstrar as propriedades venenosas do fígado de cavalo, muito a carácter com a mentalidade chinesa: O cavalo corresponde ao fogo e, como o fogo não pode produzir madeira (que é da competência da água), logo, o cavalo tem um fígado sem vesícula£? e como a vesícula é o dreno da madeira (que corresponde ao fígado) e não existe no fígado, portanto, se uma pessoa o comer, morre.

Secção IX-X.

"Os rins, diz Li Shechin, contêm um líquido como tinta, que está relacionado com o bezoar da vaca e com os cálculos do cão, mas os antigos desconheciam as suas propriedades. A placenta do potro é um remédio para a menstruação tardia.

Secção XII.

"Acima dos joelhos, o cavalo tem olhos-de--noite (verrugas) que lhe possibilitam andar de noite. São úteis no tratamento das dores de dentes.

Secção XIII.

"Os incisivos e molares, reduzidos a cinzas e misturados com saliva, ministrados às crianças, são eficazes no tratamento de ataques de arrepios.

Secção XIV-XVII.

"Os ossos do tronco, cabeça e pernas, bem como os cascos, são eficazes. Se um homem não consegue descansar e está desperto quando quer dormir, e se é necessário que descanse, misturam-se as cinzas da caveira com água, dão-se-lhe e, com um crâ-neo a servir de almofada, ficará curado. As mesmas virtudes protectoras parecem ser atribuídas pelos chineses a um casco de cavalo afixado numa casa, como as que os nossos antepassados atribuíam a uma ferradura pregada por cima da porta.

Secção XVIII-XX.

"A pele de um cavalo baio antecipa o parto. A crina e a cauda são úteis.

Secção XXI-XXIV.

"Os miolos, o sangue, o suor e os excrementossão receitados; os três primeiros são extremamente venenosos. Quem tenha sangue de um cavalo vivo no corpo, dentro de um dia ou dois aparecer-lhe-á um grande inchaço que crescerá gradualmente até ao coração e o matará; se ao esquartejar um cavalo ferir a mão e lhe entrar sangue no corpo, nessa mesma noite morrerá".

"Desta forma são discutidas as várias matérias no Pan Ts'au ; e através de índices gerais e letras de tamanhos diferentes, o estudante pode encontrar rapidamente qualquer tópico que procura. Diz-se que existem cavalos selvagens em Kansuh e em Leaoutung, e para além da fronteira ocidental; são mais pequenos do que os domésticos. A pele é muito procurada para fazer roupas, e a carne (assim dizem os chineses) tem o mesmo sabor que a do cavalo vulgar.

Embora não se possa dizer que os chineses tenham levado a criação do cavalo a muito alta perfeição, a julgar pelos animais de triste aspecto e descuidados, com grandes nós nas caudas, que se vêem nesta parte do império, ainda assim não têm negligenciado a arte veterinária por completo.

A gora, temos à nossa frente o Má King, obra em quatro volumes in octavo que tem cerca de 400 páginas inteiramente dedicadas a este assunto; um quinto volume é dedicado à vaca e ao camelo. A obra foi escrita pelos irmãos Yu Yuen e Yu Hing nos princípios do Século XVII, no reinado de Wanli, e foi corrigida posteriormente por Tung Ke. Contém 112 gravuras, 150 canções e instruções para a preparação de 300 receitas. Divide-se em 4 partes.

A primeira parte consiste em 12 ensaios e outros tantos poemas, explicando o modo de "tomar o pulso" ao cavalo, que se encontra no peito; descrevendo-lhe as várias partes do corpo e contando histórias acerca do cavalo, transmitidas desde a antiguidade. Às vezes, os autores escolhem a forma poética para comunicar as suas investigações, e muitos dos ensaios são apresentados como diálogos para dar mais vivacidade a matérias enfadonhas.

A segunda parte faz o diagnóstico das 72 doenças que afectam o cavalo, incluindo instruções para localizar a parte atingida, através das pulsações.

A terceira parte contém 8 secções sobre os oito estados de saúde do cavalo (como frio, quente, vazio, maciço, etc.), com gravuras ilustrativas. Há também relatórios sobre as 74 conversas havidas entre Tung Ma, o revisor, e Yu Yuan, o autor, acerca do tratamento a seguir quando os sintomas são estes ou aqueles; e as razões de certas pecularidades do cavalo.

A quarta parte descreve os tipos de alimento que deve comer, entre os quais se mencionam vagens, ervas, cereais, chá, sopa e água; e remata com instruções para compor os remédios e o modo de os administrar.

Temos que nos limitar a dar os critérios deste autor acerca de um bom cavalo, mas pensamos, depois desta análise rápida do seu conteúdo, que o Má King terá alguns pontos interessantes para os bons conhecedores da arte veterinária:

"Há 32 características, entre as quais o olho é a pérola; depois, tem que se ver se a cabeça e as faces são bem proporcionadas, mas quem pretender distinguir um bom cavalo sem analisar os livros antigos, é como cego a entrar num caminho desconhecido. O olho redondo, como o guizo de um estandarte, de cor profunda; a pupila em forma de feijão e bem definida, com estrias brancas; a íris com cinco cores - o cavalo viverá muitos anos; o nariz desenhado como as linhas dos caracteres 公 kung e 火 ho - verá quarenta primaveras; a testa mais levantada do que os olhos; a crina macia com dez mil pêlos delicados; carnação das faces seca; orelhas como uma folha de salgueiro; pescoço como o da fénix ou do galo de cantar; boca grande e funda, com lábios que fecham como a tampa de uma caixa; incisivos e molares bem distanciados; a língua como uma espada de dois gumes e de boa cor; as gengivas não pretas: terá vida longa; magro de carnes, gordo de ossos; nunca arrancar se ouve barulhos, nem espantadiço com o que vê; cauda levantada é tida como bom sinal; cabeça inclinada e pescoço curvado, com três proeminências na nuca; tendões como os de um cervo; ossos das pernas pequenos e cascos leves; quar-tela bem arqueada; peito e espáduas largos, ligeiramente projectados; cabeça alongada e lombo curto; barriga flexível com os pêlos a crescer para cima; cascos fortes e maciços; joelhos altos com articulações simétricas; a carne dos quartos traseiros densa, dando-lhes a redondez de uma bola; omoplata como uma "pi-pá", e fémur inclinado; a cauda de pêlos macios, como um cometa lançado".

Assim nos dão os chineses as principais características de um bom cavalo.

desde a p. 34
até a p.