A Acomodação

HISTÓRIA DA ACUPUNCTURA E MOXIBUSTÃO
e sua disseminação pelo Mundo

Fernando Costa Silva*

"Os que muito dizem nada sabem, os que muito sabem nada dizem" Lao Tze

Após "séculos de silêncio", verifica-se nos nossos dias, paralelamente a um desenvolvimento técnico e científico nunca antes atingido, um reavivar do interesse pelo mais ancestral processo terapêutico de que há conhecimento - a Acupunctura e Moxibustão. Sendo um ramo especial, é talvez o mais importante no campo da Medicina Tradicional Chinesa, não só pelas suas inúmeras aplicações como também pela grande vantagem da ausência de efeitos colaterais nefastos. Sendo uma ciência e ao mesmo tempo uma arte, caracteriza-se por possuir profundos substratos teóricos (simplicistas e empíricos), várias técnicas de manipulação e uma vasta aplicação clínica.

Segundo as teorias cosmogónicas, a Acupunctura e Moxibustão representam a expressão mais forte da Medicina Tradicional Chinesa. Cada vez mais aceite pelas populações ocidentais, a Acupunctura é hoje parte integrante da medicina alopática mundial em todos os países desenvolvidos e, embora um longo e sinuoso caminho ainda exista para percorrer, o dia da "clarificação dos espíritos" de todos quantos a "blasfemam" e mistificam, ou dos que com consciência e idoneidade a praticam, em breve chegará.

Cerca de 8.000 anos passados, é às portas do século XXI que a Acupunctura sofre a maior disseminação da sua longa história.

Inúmeros estudos de investigação em literaturas médicas tradicionais e achados arqueológicos, demonstram que a acupunctoterapia era já aplicada durante os sistemas comunais de clãs das sociedades primitivas da Idade da Pedra, pensando-se que tenha surgido por volta dos séculos LX-L A. C. (anos 6.000-5.000 Antes de Cristo), estando a Moxibustão relacionada com o aparecimento do fogo.

Numerosos livros históricos referem-se a lendas relacionadas com a origem da Acupunctura e Moxibustão, tais como, "Diwang Shiji" (Os Séculos dos Imperadores), "Zhenjiu Jiayi Jing" (Clássico de Acupunctura e Moxibustão), escritos durante o século III, "Beiji Qianjin Yaofan" (Mil prescrições de ouro para emergências) e "Xinxiao Beiji Qianjin Yaofan", datando dos séculos VII e XI respectivamente, e "Lu Shi" (História dos Caminhos) do século XII. Nomes como Fu Xi (o primeiro agricultor da história chinesa), Tai Hao (chefe da famosa tribo Yi - província de Shandong - da Idade da Pedra, que manufacturou a primeira pedra Bian) e Huang Di (o célebre Imperador Amarelo) encontram-se frequentemente relacionados com as origens da Acupunctura e Moxibustão, representando alguns deles figuras ilustres de clãs da Idade da Pedra.

Nas sociedades primitivas quase todos os utensílios eram de pedra e de acordo com literaturas escritas entre os séculos V A. C. e I A. D. também os instrumentos para a práctica da Acupunctura eram feitos de pedra (pedra Bian). Em "Zuozhuan" (Comentário aos anais da Primavera e do Outono) escrito no ano 550 A. C. por Zang Sun, pode ler-se: "o sofrimento pela doença custa mais que a picada com a bian"; também em "Shuowen Jiezi" (Dicionário analítico dos caracteres) escrito em 100 A. D. por Fu Wen, existem referências às bian como sendo pedras extremamente pontiagudas, utilizadas para tratar ("puncionar") doenças. Quan Yuanqi, um dos mestres da acupunctura (500-600 A. C.), refere-se igualmente à nomenclatura utilizada pelos seus predecessores para classificar os diferentes tipos de "agulhas": 1. agulhas de pedra; 2. pedras bian; 3. pedras pontiagudas. Pode pois concluir-se que a história da Acupunctura remonta ao início da Idade da Pedra. Achados arqueológicos no distrito de Duolun (Mongólia Interior) e de Ri Zhao (Shandong) evidenciam pedras Bian que datam daquele período.

"Huangdi Neijing" (Tratado de Medicina Interna do Imperador Amarelo) diz que a Acupunctura teve a sua origem na costa oriental da China, numa região de pescadores durante a época das sociedades primitivas, tendo-se a Moxibustão originado no Norte, numa região onde as populações viviam da caça e se protegiam do frio com o fogo.

Coincidindo com a introdução da escravatura na China durante os períodos de "Xia", "Shang", "Zhou do Poente", "Primavera" e "Outono" (séculos XXI A. C. - III A. C.), surge a Era do Bronze e com ela a progressiva substituição das bian de pedra por bronze Bian. Objectos recentemente descobertos (ossos e conchas de tartaruga) com origem aproximada entre os séculos XIII A. C. e VIII A. C., evidenciam inscrições hieroglíficas sobre a prática da Acupunctura com agulhas de bronze e tratamentos com Moxibustão. Referências a médicos acupuncturistas então famosos, como Yi Huan, Yi He (séc. VI A. C.), Qin Yueren (séc. V A. C.), são frequentemente encontradas. Em "Zuozhuan", escrito há cerca de 2.500 anos, relata-se a morte do imperador Jing (581 A. C.) após ter sido tratado por Yi Huan: "a doença penetrou profundamente no Gao Huang ("ravina vital") não podendo a Acupunctura e Moxibustão ser benéficas". Durante este período surge a teoria filosófica de Yin-Yang (a "harmonia Tauista dos opostos") e dos Cinco Elementos (Fogo, Terra, Metal, Água, Madeira); termos como Qi (energia vital), Jing (meridianos), Shen (rim), Pangguang (bexiga), Xin (coração), Fei (pulmão), etc., começam a ser utilizados na clínica quotidiana; o estudo do "pulso" ganha cada vez mais entusiastas e a teoria da adaptação ambiencial do corpo humano (equilíbrio harmonioso entre Homem e Natureza), começa a ganhar forma.

Entre o período dos Estados Guerreiros e a Dinastia Han do Poente (475 A. C. - 21 A. D.) estabeleceu-se e fortificou-se o sistema feudal na China. Durante este período, o aumento da força laboral e as alterações ocorridas no sistema social promoveram o aprofundamento dos conhecimentos médicos e farmacológicos de então, que passaram de um estádio de empirismo para o campo teórico, tendo o aparecimento das agulhas metálicas favorecido a disseminação e evolução da Acupunctura.

Os três Imperadores lendários: Fu Xi, Shan Nang e Huang Di (Fresco do Séc. XVIII-1798).
"Jingluo" (Meridianos - Sinarterias), "Yizong Jinjian Cijiu Xinfa Yaojue" - "Acupunctura, o Espelho de Ouro da Medicina", (1739-1742).

Em 1968, na região de Macheng (província de Hebei) durante as escavações de um túmulo da Dinastia Han do Poente (113 A. C.), entre outras relíquias, encontraram-se 5 agulhas de prata e 4 de ouro, que revelaram as formas e dimensões das agulhas de então.

Escrito há mais de 2.400 anos, sob a forma de diálogo entre o imperador Huang Di (um dos três lendários grandes imperadores da China - Fu Xi, Shan Nang e Huang Di) e o seu primeiro ministro Chi Po, "Huang-di Neijing" tornou-se um marco na história da civilização Chinesa, sendo o maior tratado histórico de medicina hoje existente. Constituído por dois volumes, "Lingshu" (Portão Misterioso) e "Suwen" (Assuntos Importantes), contém a teoria de Yin-Yang, dos Cinco Elementos, ZangFu (vísceras ocas e maciças), Jingluo (canais e colaterais), Mente e Espírito, Qi (energia vital), San-gue e Fluidos Corporais, Cinco Emoções, etc., referindo-se a Acupunctura e Moxibustão como principais técnicas terapêuticas. Durante o mesmo período foram também escritos "Shi Yi" (Anais Históricos), "Huangdi Bashiyi Nanjing" (Tratado imperial de 81 problemas difíceis) e "Mingtang Kongxue Zhenjiu Zhiyao" (Catálogo dos principais pontos de Acupunctura e Moxibus-tão), hoje desaparecidos.

Entre a Dinastia Han do Nascente (256 A. C.) e o Período dos Três Estados (25 A. C.), procedeu-se à sumarização e compilação de todos os conhecimentos da medicina Tradicional Chinesa. Hwa Tuo, estudioso do "fenómeno de propagação dos estímulos ao longo dos meridianos de Acupunctura" e autor de "Zhenzhong Jiuci Jing" descobriu inúmeros pontos (hoje chamados "Hwatuo Jiaji") e foi o pioneiro da anestesia com Acupunctura, combinando esta com ervas medi-cinais. Também famoso na época, Zhang Zhongjing descreve em "Shanghan ZabingLun" (Tratamento de doenças febris causadas pelo frio) as várias técnicas de Acupunctura e Moxibustão então usadas, e vários tipos de tratamentos com ervas medicinais.

Durante as Dinastias Jin, Norte e Sul (215 A. D.- 581 A. D.), enquanto o país era assolado por guerras e se encontrava no caos económico e político, a Acupunctura continuou o seu progresso e evolução, quer pela sua utilização no tratamento de várias patologias, quer através da publicação de numerosas obras, tanto originais como de compilação. Vários compêndios e diagramas ("Yance Tu" - diagrama em decúbito lateral; "Mintang Tu"- diagrama dos meridianos e pontos de Acupunctura) foram publicados. Entre 256 A. D. e 260 A. D. o famoso médico Huangfu Mi elaborou "Zhenjiu Dacheng" (Compêndio de Acupuntura e Moxibustão), constituído por enxertos de livros anteriores, como "Huangdi Neijing" e "Mintang Kongxue Zhenjiu Zhiyao", sendo dividido em 12 volumes de 128 capítulos, com referência a mais de 300 pontos de Acupunctura.

Os diferentes tipos de "pulso" (Diagrama do Séc. III).
Diagrama do meridiano Shaoyin, mostrando os 27 pontos de acupunctura que dos pés atingem os rins.

Com o sistema feudal das Dinastias Sui e Tang (581 A. D. - 907 A. D.), a China entrou num período de prosperidade cultural e económica, tendo o governo dos Tang, em 627 A. D. - 649 A. D., ordenado a Zhen Quan a revisão e actualização de todos os grandes tratados de Acupunctura então existentes. Entre 650 e 652 A. D., Sun Simiao compilou "Beiji Qianjin Yaofan" (Mil prescrições de ouro para emergências), "Qianjin Yifan" (Mil prescrições suplementares para emergências) em 680 A. D. e "Mintang Sanren Tu" (Diagrama das três figruras) em 682-685 A. D., onde era possível observarem-se os 12 meridianos principais, os 8 meridianos secundários e cerca de 650 pontos de Acupunctura. Durante este período outras obras de valor foram aparecendo. Assim, durante o reinado Tang, em "Guzhengbing Yinfang" (Moxibustão em doenças mortais) escrito por Cui Zhiti, era possível referenciar-se a Tuberculose Pulmonar e seu tratamento. "Xinji Beiji Jinjing" (Novas terapêuticas com Moxibustão para emergências), o primeiro livro da história do homem a ser impresso manualmente, data de 862 A. D.. Ainda durante a Dinastia Tang, fundou-se o 1° Colégio Médico Imperial, com 4 departamentos de especialidades médicas, 1 departamento de farmacologia e 1 de Acupunctura e Moxibustão, sendo constituído por um doutor em Acupunctura, um professor, 10 instrutores, 20 técnicos auxiliares e 20 alunos.

Durante o Período dos Cinco Estados e Dinastias Song, Yin e Yuan (907-1368), a técnica de impressão tornou-se popular, permitindo a disseminação e desenvolvimento da Medicina Tradicional por toda a China. Com o apoio do Governo Song do Norte, o célebre médico acupuncturista Wang Weiyi reviu as localizações dos Jingxue (pontos pertencendo aos meridianos de Acupunctura) e as suas relações com os orgãos Zang (vísceras maciças) e Fu (vísceras ocas), tendo em 1026 A. D. publicado um "Manual Ilustrado dos Pontos de Acupunctura e Moxibustão"; em 1027 mandou moldar duas figuras de bronze (ainda hoje existentes em museus de Nanjing e de Beijing) com 1,80 metros de altura, onde era possível observar a relação interna entre os vários órgãos, e a distribuição superficial dos pontos e meridianos de Acupunctura. Em 1341 (Dinastia Yuan), Hwa Shou dedicou-se a inúmeros temas de investigação sobre pontos e meridianos, tendo publicado os resultados do seu trabalho em "Shisi Jing Fahui" (Melhor conhecimento dos 14 meridianos), sendo o pai da actual "Teoria dos Meridianos e Colaterais".

Capa do "Huangdi Neijing Su Wen" - "Tratado de Medicina Interna do Imperador Amarelo" (Séc. XXA. C.?).

Diagrama dinâmico das cinco vísceras "Recueil de Taités Taoistes". 1615. Paris Bib. Nac.).

Devido ao progresso atingido, ainda durante este período começou a subdivisão da acupunctura, tendo-se vários médicos dedicado a campos específicos; inúmeros e preciosos trabalhos foram publicados, "Xiaoer Mintang Zhenjinjing" (Tratado de Acupunctura e Moxibustão pediátrica), "Jongju Shenmi Jinjing" (Tratamento secreto de abcessos e úlceras), "Beiji Jiufa" (Moxibustão em emergências médicas), etc., e várias técnicas de manipulação foram divulgadas, quer no aspecto terapêutico quer no campo da anestesia pré e per-operatória.

Até à Dinastia Ming (1368-1644), a Acupunctura atingiu o seu clímax, sendo o principal processo terapêutico em toda a China. Nomes como Chen Hui, Ling Yun e Yang Jizhou, tiveram uma importância fundamental na sedimentação de todos os conhecimentos até então obtidos e uma enorme influência na disseminação da Acupunctura pela Europa (França). É a esta dinastia que remontam os mais variados e completos trabalhos sobre o assunto, sendo possível nos nossos dias a consulta de vários trabalhos históricos como "Puji Fang" (Cura universal) e "Shenjiu Men" (Portão da Acupunctura e Moxibustão) escritos em 1406, "Zhenjiu Daquan" (Colecção completa de Acupunctura e Moxibustão) escrito no século XV por Xu Feng, "Zhenjiu Juying Fahui" (Actualizações em Acupunctura e Moxibustão) de Gao Wu (1529), "Zhenjiu Dacheng" impresso em 1601 e baseado no trabalho de Yang Jizhou (cujo original era proveniente da Dinastia Jin), "Zhenfang Liuji" (Seis volumes com prescrições de Acupunctura) escrito por Wu Kun em 1618, etc.. Procedeu-se também ao estudo comparativo das diferentes técnicas de manipulação e de moxibustão, seus resultados terapêuticos ("Zhenjiu Wendui" - Perguntas e respostas sobre Acupunctura e Moxibustão - escrito em 1530 por Wang Ji) e descobriram-se novos pontos de Acupunctura.

Com a implantação da Dinastia Qing, em 1644, começou o declínio desta técnica terapêutica multimilenar. Progressivamente substituída pela "jovem" medicina ocidental, a Medicina Tradicional Chinesa (e mais concretamente a Acupunctura) entra num período de proibicionismo que se prolongará por cerca de três séculos. Já com uma história de mais de 1.200 anos, é encerrado em 1822 o Colégio Médico Imperial (fundado no reinado Tang). Contudo, alguns trabalhos foram ainda publicados e, devido a alguns tocos de resistência conservadora, a Acupunctura não morreu por completo; assim, em 1742 Wu Qian escreve "Yizong Jinjian Cijiu Xinfa Yaojue" (Acupunctura, o espelho de ouro da Medicina) e Li Xuechuan, em 1817, publica "Zhenjiu Fergyuan" (As origens da Acupunctura e Moxibustão).

Após o início da Guerra do Ópio (1840), a China entrou num sistema semi-feudal e semi-colonial tendo ocorrido neste período a imposição e "legalização" da Medicina (alopática) ocidental. O que deveria ter sido uma "evolução bem-vinda", transformou-se em mais um dos processos de agressão do governo Qing contra o povo Chinês, passando então a utilizar-se a Acupunctura unicamente como método de tortura, sendo as suas agulhas denominadas "agulhas mortais".

Em 1912, com a implantação da República da China (1a República), a Acupunctura manteve-se estagnada, sendo unicamente utilizada nos meios rurais como "medicina do povo" e longe dos olhares dos "senhores do poder". Com as primeiras movimentações anti-governamentais, vislumbrava-se uma nova era para a prática desta terapêutica milenar. Inicialmente praticada nos campos revolucionários do então jovem Partido Comunista Chinês, rapidamente a sua utilização se reactivou em todas as regiões libertadas.

Zang-Fu (Vísceras maciças e ocas), in "Yance Tu" (Diagrama em decúbito lateral) - Séc. IV A. D..

Posição relativa entre as diferentes vísceras ocas e maciças, in "Qianjin Yifan Lingshu Suwen" - "Mil prescrições suplementares para emerências (Séc. VII A. D).

Em Outubro de 1944, após a palestra proferida por Mao Zedong na "frente unida dos trabalhadores", na região de Shaanxi-Gansu-Ningxia, numerosos médicos ocidentais (colaboradores dos jovens revolucionários) iniciaram a sua aprendizagem em Acupunctura e muitos foram os campos de investigação a que se dedicaram. Em Abril de 1945, no Hospital Internacional da Paz (região de Yan'nan), inaugura-se a la clínica de Acupunctura da "Nova Era", com o nome de "Clínica Dr. Norman Bethuman". Em 1947, na região militar de Jinan, publica-se o "Guia Prático de Acupunctura e Moxibustão" e, em 1948, inicia-se o 1° Curso de Acupunctura subsidiado pelo Ministério da Saúde do Governo Popular da China do Norte. Todos estes pequenos esforços contribuíram, como se de uma semente se tratasse, para a disseminação, promoção e compreensão das técnicas de Acupunctura e Moxibustão no mundo ocidental.

Após a libertação total e a fundação da República Popular da China, um dos lemas do novo Governo tem sido a "unificação das medicinas Ocidental e Tradicional Chinesa" razão porque, a partir de Outubro de 1949, a Acupunctura e Moxibustão conheceram uma promoção e popularidade sem precedentes. Em 1951 funda-se a Clínica Experimental de Acupunctura e Moxibustão, posteriormente chamada Instituto de Acupunctura e Moxibustão e, em 1955, Academia de Medicina Tradicional Chinesa.

Durante a década de 50, inúmeras organizações e instituições surgiram por toda a China, quer a nível de municípios, províncias ou de regiões autónomas, dedicando-se sobretudo a trabalhos de investigação sobre a farmacopeia e medicina tradicionais, tendo-se criado departamentos específicos para acupunctoterapia, quer em comunas quer nos grandes centros urbanos.

Até aos nossos dias, a "Acupunctura da Nova Era" sofreu três estádios evolutivos. Durante os anos 50, efectuou-se a sistematização da teoria básica da Acupunctura e Moxibustão, estudaram-se as suas indicações clínicas e actualizaram-se os conceitos da "Acupunctura histórica". Na década de 60, todos os grandes tratados foram profundamente revistos, procedendo-se à sua sumarização; estudou-se e comparou-se o efeito terapêutico em diferentes patologias, popularizou-se a aplicação da anestesia com Acupunctura e numerosos trabalhos de investigação sobre os mecanismos de acção sobre as diferentes vísceras e órgãos do corpo humano tiveram origem. A partir dos anos 70, aprofundou-se o estudo sobre as acções analgésica e anestésica, sendo incontáveis as conclusões surgidas até hoje no campo da cirurgia, anestesiologia, neuro-anatomia, fisiologia da analgesia, bioquímica, etc..

Presentemente (década de 80-90) pode-se dizer que a Acupunctura entrou no seu quarto estádio evolutivo. Cientistas e investigadores dos cinco continentes, debruçam-se atentamente sobre o "fenómeno de propagação dos estímulos ao longo dos meridianos" (referenciado pela primeira vez por Hwa Tuo, há mais de 2.000 anos) sem menosprezar os conceitos clássicos que, sendo ancestrais, se têm comprovado permanecerem actuais. Embora jamais seja possível substituir-se a peculiar "técnica das agulhas", numerosos ensaios a nível de terapias com laser e micro-ondas e estudos com agatermografia, têm lugar nos nossos dias.

Dachang (cólon) - Shou Yangming Jingluo (meridiano Yang da "luz solar" do membro superior), à esquerda; Wei (estômago) - Zhu Yangming Jingluo (meridiano Yang da "luz solar" do membro inferior), à direita.

In "Qiajin Yifan Lingshu Suwen" - "Mil prescrições suplementares para emergências" (Séc. VII A. D.).

Shen (rim) - Shou Shaoyin Jingluo (meridiano Yin menor do membro inferior), à esquerda; Xin (coração) - Zu Shaoyin Jingluo (meridiano Yin menor do membro superior), à direita.

In "Qiajin Yifan Lingshu Suwen" - "Mil prescrições suplementares para emergências" (Séc. VII A. D.).

Pontos para Moxibustão (Gravura francesa do Séc. XVIII).

Hoje conhecida por "Medicina Han", foi no século VI introduzida na Coreia, através do envio de numerosos médicos acupuncturistas (reinado do Imperador Liangwu) para Baiji (541 A. D.), tendo-se em 693 A. D. conferido o primeiro título de Professor em Acupunctura. Foi também durante a Dinastia Jin, que se levou a Acupunctura e Moxibustão ao Japão, oferecendo o Governo Chinês (552 A. D.) ao Mikado, o "Grande Tratado de Acupunctura". No decorrer do século VII, enviou o Governo Japonês numerosos médicos para a China com a finalidade de que, conforme decretado em 702 A. D., fosse copiado o sistema médico chinês da Dinastia Tang; sendo, a partir de então, obrigatório o estudo da Acupunctura (denominada "Medicina Kampo") em todas as escolas médicas do país.

Com o intercâmbio cultural entre a China e os países do Sueste Asiático, a Acupunctura espalhou-se por todo o continente asiático. Foi no século XVI (reinado dos Ming) introduzida na Europa, tendo a França desempenhado um papel primordial na sua difusão e aceitação pelo mundo.

Após a fundação da República Popular da China (Outubro de 1949) e devido aos acordos de cooperação Sino-Soviéticos, foi a Acupunctura introduzida em todos os países de ideologia comunista. Com a acção dinamizadora de Mao Zedong e Hwa Ko Feng, a Acupunctura recobrou a merecida dignidade, sendo hoje os grandes institutos (colégios de Medicina) de Beijing, Nanjing e Shanghai os mestres do ensino da Acupunctura em todo o mundo.

Em 1975, a pedido da Organização Mundial de Saúde, iniciaram-se cursos de Acupunctura e Moxibustão (em chinês, japonês, espanhol, francês e inglês) com vista ao lema "saúde para todos no ano 2.000", tendo-se até hoje graduado cerca de 6.000 médicos de mais de 100 países, fundando-se em 1979 a "Associação Chinesa de Acupunctura e Moxibustão".

Constituída presentemente por médicos de cerca de 50 países, entre os quais Portugal (Macau), funda-se em Gotemburgo (Suécia), em Maio de 1985, a "Associação Internacional de Médicos Acupuncturistas" e, em 22 de Novembro de 1987, a "Federação Mundial das Sociedades Médicas de Acupunctura e Moxibustão" (WFAS).

Palpação do pulso direito (sexo feminino) "Xiaoer Mintang Zhenjinjing" - "Tratado de Acupunctura e Moxibustão pediátrica" (Séc. XIV).

Estatueta de bronze do Séc. XII. A Acupunctura era praticada há mais de 15 séculos. Os furos indicam os principais pontos de punção para obter no homem paciente o equilíbrio dos circuitos dos sopros vitais.

Significativa a antropomorfia hermafrodita da figura ("Museu do Homem", Paris).

*Lic. Medicina (Portugal); Doutorado Sc. (Sri-Lanka); A.M.E. (China); FPAIA (Suécia); Med. Acupuncturista do Hospital Conde S. Januário (Macau).

desde a p. 51
até a p.