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EDIÇÕES NO TRIMESTRE

Se o futuro pertence à maior Memória, pode confortantemente dizer-se que o Livro (o dinamismo editorial em curso em Macau) é um das obras culturais de maior pregnância futurante e, no presente mesmo, da mais interessante valia patrimonial.

Macau, como entidade histórica, foi tendo essa consciência de forma dispersa no tempo, mais consciente da sua identidade a partir do Século XIX tardio, pelos contributos dos investigadores e escritores de vocações várias. Daí para cá, a dedicação amorosa de historiadores foi-lhe completando um esboço biográfico que, suficiente à delineação de um cabal retrato histórico, não chega a definir-lhe a inteira personalidade. Louvados, aqui, o P.e Manuel Teixeira, Charles Boxer e o P.e Benjamim Videira Pires, entre outros. Mas, no vasto universo antropo-etnográfico, as fecundíssimas investigações de Ana Maria Amaro (quanto desse trabalho por publicar ainda!) e a profundidade e a autenticidade culturais do que tem vindo a publicar - são rari nantes no campo do necessário levantamento da Alma macaense.

Muito ainda há que investigar e publicar e, depois das obras de maior fôlego, profundidade e erudição, passar às formas menores ou mais acessíveis da divulgação - para que um global projecto editorial possa, para além de obra histórica e de serviço à Cultura, insinuar-se elemento homogeneizador de uma identidade comunitária e conformador de uma Alma colectiva.

O horizonte próximo do passamento da Administração portuguesa para mãos chineses tem sido o catalizador recente de um surto editorial verdadeiramente invulgar, que a definição inadiável de uma estratégia cultural virá disciplinar, na hierarquização de autoridades e categorias e na ordenação de prioridades. E, subentende-se e espera-se, no reforço da autenticidade cultural.

De qualquer forma e em geral, o Livro agora editado em Macau - reactualizador da Memória, ou inédita síntese que a remoça ou potencia futurantemente - adquire verdadeiro valor patrimonial que nenhuma, autêntica, política cultural pode ignorar, subalternizar ou deixar cair em situações oblíquas.

Durante o trimestre (parece que o Verão, ao contrário do que acontece na Europa, não refreia aqui o caudal editorial) o Sector Editorial do ICM não abrandou o ritmo, tendo lançado a público cerca de uma dezena de títulos, de valia e género vários, mas de registar em individualidade onde alguns títulos sobressaem para ficar.

Assim, o mês de Julho abriu com chave de ouro, ao ser lançada a reedição do "Património Arquitectónico de Macau", obra já esgotada por solicitação extraordinária, e agora republicada em versão trilingue (Português, Chinês e Inglês). "Best-seller" de Macau (nos indicadores da Livraria Portuguesa) o livro é um belo "álbum de família" de cidade e da sua memória, numa sucessão de imagens em narrativa cinematográfica, pelos ritmos e planos, enfoques e enquadramentos de abordagem, que vão das perspectivas urbanas às fachadas, e dos interiores ao realce do pormenor decorativo.

Arquitectura chinesa, igrejas, palacetes, herança da art deco, jardins, património perdido e património recuperado, preenchem o sumário temático de um livro que, tombo de imagens do património construído da cidade, existente, destruído e restaurado, ganha ele próprio dimensão patrimónial, à luz do que acima se disse.

Com direcção gráfica e artística de Carlos Marreiros, co-autor com Francisco Figueira desta oportuna e valiosa obra, esta reedição, enriquecida nos complementos em línguas chinesa e inglesa, veio inexplicavalmente desfalcada do texto introdutório do Arq. Carlos Marreiros sobre arquitectura corrente de Macau, que figurava na 1a edição.

Outra edição assinalável foi o álbum "Tanegashima - Ilha da Espingarda Portuguesa", uma das componentes culturais que constituiram o programa de participação de Macau nas celebrações anuais do Festival da Espingarda, em Tanegashima, comemorativas da introdução da pistola e do mosquete no Japão. Belíssimo álbum de imagens, quase o filme sequencial e pormenorizado daquele acontecimento na descrição fotográfica de Leong Ka Tai, o livro tem coordenação de Gonçalo César de Sá e abre com um texto de Avelino Rodrigues, explicativo das cerimónias, e evocativo dos antecedentes históricos e da memória da presença portuguesa no Japão. Edição trilingue, em Português, Japonês e Inglês.

Para acompanhar o lançamento do livro no Japão foi editada paralelamente uma colecção de postais ilustrados, selecção de algumas das melhores imagens colhidas por Leong Ka Tai na reportagem do Festival.

Sairam ainda durante o mês três livros, pode dizer-se, três "clássicos", da história da presença portuguesa no Oriente.

"Macau - Materiais para a sua história no século XVI", de Jordão de Freitas, título indicativo de ensaio sobre os primeiros contactos luso-chineses, teve a sua 3a edição, depois de já publicàdo no "Archivo Histórico Português" (vol. III, 1910) e posteriormente na revista "Mosaico" (Julho/Setembro de 1955) com um prefácio de António Nolasco da Silva, que a actual versão também integra.

A densidade de documentação e fontes no pequeno volume de páginas será uma das razões explicativas do esgotamento deste livro, "útil para o Século XVI" na avaliação do P.e Manuel Teixeira.

A "Ásia Sínica e Japónica", do arrábido José de Jesus Maria, releva como obra de investigação, exposição e metodologia científica na historiografia portuguesa. Escrito "desde o anno de 1740 athé o de 1745", em Macau, em manuscrito de 351 páginas de texto, foi encontrado em 1899 pelo director da revista Ta-SSi-Yang-Kuo, J. F. Marques Pereira, que principiou a anotação e a impressão do texto em números da sua revista.

Mais tarde, depois de ter encontrado o manuscrito em 1939, o Prof. Charles Boxer iniciou a sua publicação anotada no "Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau".

Foi feita uma separata desse volume em 1941; a primeira parte do segundo volume, anotada também por José Maria Braga, foi publicada na revista "Renascimento"; o 2° volume inteiro foi impresso em Macau (Imprensa Nacional) em 1950.

Tem este livro, entre outras valias, a de repositório dos documentos e códices mais antigos do Leal Senado, entretanto destruídos.

Esta oportuna reedição foi feita pelo ICM em co-edição com o Centro de Estudos Marítimos de Macau, para assinalar a estadia no Território do historiador Charles Boxer.

Pela mesma razão, foi também re-editada, em co-edição das duas Instituições do Território, a obra de C. Boxer "The Great Ship from Amacon", fundamental para o conhecimento do comércio com o Japão.

"Macau, os seus vizinhos, o Senado, os Capitães-mores, os Jesuítas, os mercadores e o papel que cada um deles desempenhava na grande aventura que o comércio do Japão provou ser, bem como as dificuldades por que passaram os portugueses com os seus aliados ocasionais - os espanhóis - e os holandeses, seus rivais no mar, e em menor escala os inglesses, são de tal modo apresentados que o leitor tem a sensação de estar a observar um filme conduzido por um grande realizador que conhece intimamente todos os seus actores e deles retira o máximo partido" (Contra-Almirante Manuel Vilarinho, no prefácio).

Em Agosto e Setembro, sairam a público algumas obras de menor substância que as anteriores, mas mesmo assim assinaláveis.

Em co-edição com a "Associação para a reconstrução e instalação da Casa-Memória de Camões em Constância", o ICM editou "Vergel de Amor - Elegias de Luís de Camões comentadas por Manuel de Faria y Sousa", coordenada e cuidada ortograficamente pela escritora e jornalista Manuela de Azevedo. A elegia, com as anotações de M. Faria y Sousa explicativas da flora mencionada por Camões, é precedida por nota alusiva à "mitologia das plantas", seguida da versão em ortografia actual (tradução do espanhol do Séc. XVI) e é ainda complementada com comentários à "flora camoniana", ao "Sistema planetário ptolemaico" e com 3 sonetos de Camões dedicados a Dinamene, sua amada chinesa.

"Actas do Seminário - Ciência Náutica e Técnicas de Navegação nos Séculos XV e XVI", é outra edição do ICM, organizada pelo Departamento de Formação e Investigação, e preenchida com os textos das comunicações apresentadas no Seminário pelos especialistas portugueses e chineses. Sobre esta publicação, remetemos o leitor para o texto do Dr. Aníbal Mesquita Borges e do Dr. Manuel Bairrão Oleiro, atrás publicado, e que comodamente nos serve de recensão crítica e descritiva da obra.

Foi ainda publicada simultaneamente, em duas diferentes edições, em português e em inglês (sendo a edição em inglês a original), o livrinho do P.e Manuel Pintado "A Voz das Ruínas" ("The Voice of the Ruins"). É a encantadora história de S. Francisco Xavier, "os seus trabalhos e feitos milagrosos, particularmente em Malaca, onde permaneceu durante cinco períodos da sua vida".

"Contos e lendas de Macau"

Paralelamente, o ICM (Gabinete de Projectos Especiais) lançava publicamente em Julho a primeira parte de uma nova colecção de literatura infantil, inspirada em temas da tradição popular e cultural de Macau - a colecção "Contos e Lendas de Macau".

Depois do lançamento em Lisboa, foram apresentados em Macau os primeiros seis volumes da colecção: "Um estranho barulho de asas", "O Templo da Promessa ","As mãos de Lam Seng", "Uma voz do fundo das águas", "As árvores que ninguém separa" e "O que sabem os pássaros" da autoria da já consagrada e galardoada autora de textos de literatura juvenil Alice Vieira, e ilustrados por Lok Tai Tong, artista e professor de Belas Artes da Universidade de Xangai, e pela pintora macaense Evelyn Poon.

Foi ainda anunciado que os seis volumes seguintes a editar, no âmbito desta colecção, seriam de autoria de António Torrado, e também inspirados no "quotidiano do Território ou adaptados de lendas contadas em artigos de jornal ou colectâneas de textos", prosseguindo "uma abordagem inédita da temática de Macau".

De alguns dos primeiros títulos foi feita uma edição inglesa para divulgação nos Estados Unidos e em Hong Kong.

desde a p. 128
até a p.