Artes

PINTURAS DE GUANGDONG DO MUSEU LUÍS DE CAMÕES*

Helen Chan

[Seóng-Kun-Tcháu]Shang Kuan-chou/Shang Guan Zhou 上官周,"Paisagem" (1699)/"Paisagem com Figuras [Humanas]""山水人物", Tinta e cor sobre papel em rolo.90 x 70.2 cm.

Em 1931, a antiga colecção de objectos de arte chinesa do Dr. Manuel da Silva Mendes (ō 1876-+|1931) foi adquirida pelo Museu Luís de Camões. Residente de longa data em Macau, o Dr. Manuel da Silva Mendes foi um entusiasta coleccionador com particular interesse pela cultura chinesa e pela filosofia taoísta. Além de cerâmicas do centro de Shiwan [Seac-Wan em cant. - N. E.; 石灣] em Guangdong, a sua colecção contém diversas pinturas chinesas, a maioria das quais executadas por artistas de Guangdong. A Primeira Parte deste catálogo fará referência a esses artistas e às suas obras, enquanto a Segunda Parte incidirá sobre outros artistas e pinturas da colecção.

O interesse pelas colecções de arte de Guangdong surgiu provavelmente durante a dinastia Ming, tendo florescido nos reinados de Jiaqing 嘉慶 e Daoguang 道光 dos finais da dinastia Qing1.

De acordo com algumas fontes escritas, existiam setenta e um coleccionadores de Guangdong durante as dinastias Ming e Qing2, na sua maioria especializados em caligrafia e pintura. Com excepção de seis catálogos, editados no último período Qing3, escasseiam as informações sobre estas colecções. De uma forma geral a maioria das colecções publicadas incluíam apenas um pequeno número de pinturas de Guangdong4. Outros coleccionadores de Guangdong, bem como conhecedores de arte de outras províncias, também preservaram algumas pinturas de Guangdong5. Nos finais do período Qing, por exemplo, Pan Zhengheng 潘正衡, de Panyu [ 番禺], apreciou grandemente os trabalhos de Li Jian 黎簡. Diz-se que Pan Zhengheng encheu o seu estúdio com caligrafias e pinturas de Li e que baptizou esses aposentos com o nome do seu artista favorito6. No entanto, esses coleccionadores interessaram-se apenas pelas pinturas de artistas consagrados, não generalizando as suas colecções a obras de outros artistas menos conhecidos ou considerados.

No seu Wanmu Caotang Cangshumu (萬木草堂藏书目), o coleccionador Kang Youwei 康有为 (ō1858-+|1927) registou trinta e oito pinturas de quinze artistas de Guangdong7, as quais não eram mais que uma pequena parcela da sua própria colecção de pintura chinesa. Infelizmente Kang não possuía um profundo conhecimento do desenvolvimento da pintura de Guangdong em geral e não foi capaz de reconhecer, sob a assinatura Mo Chi 墨遲, o famoso pintor Zhang Ruzhi 張如芝 (†1824) que utilizou esse pseudónimo8. Até aos primórdios da República não existiram coleccionadores suficientemente conhecedores que, de forma sistemática, tenham adquirido pinturas de Guangdong. Diversas razões explicam este facto sendo, uma delas, a relativa insignificância da pintura de Guangdong quando comparada com a herança de magnificência da generalidade da pintura tradicional chinesa9. Por outro lado, parece mais razoável pensar que a escassez de registos escritos sobre a pintura de Guangdong tenha dificultado extraordinariamente aos coleccionadores uma perspectiva geral do desenvolvimento artístico de Guangdong, tornando quase impossível o planeamento sistematizado de colecções.

Durante os primeiros tempos da República, coleccionadores de Guangdong tais como Liang Qichao 梁啟超 e Ye Gongchuo 葉恭綽 preservaram pinturas dos seus conterrâneos10. Em 1927, Wang Zhaoyong 汪兆鏞 de Panyu 番禺 publicou o seu Lingnanhua Zhenglue (嶺南畫徵略; doze chuan ou capítulos) em Xangai, o primeiro livro na história da pintura de Guangdong escrito por um autor local. Neste livro, Wang refere quatrocentos e cinquenta e oito pintores de Guangdong, desde a dinastia Tang até à dinastia Qing. A partir dessa altura, a evolução da pintura de Guangdong tem vindo a ser progressivamente melhor compreendida. Em 1961 o Lingnanhua Zhenglue foi reeditado em Hong Kong com um suplemento. Esta última edição refere seiscentos e sete pintores de Guangdong relativos ao mesmo período11.

Em 1934 foi organizada, em Nanjing, a Segunda Exposição Nacional de Arte. De entre os dois mil trabalhos aí expostos, seiscentos eram de artistas de Guangdong. Esta exposição foi provavelmente um instrumento determinante no florescimento de um interesse mais profundo pela pintura de Guangdong, já que foi precisamente a partir dessa iniciativa que se multiplicaram as colecções e os coleccionadores de pintura de Guangdong. O Sr. Jian Youwen 簡又文 iniciou por essa altura a sua abrangente colecção (actualmente exposta na Art Gallery da Universidade Chinesa de Hong Kong)12. A colecção do Museu Luís de Camões, no entanto, teve a sua origem bastante mais cedo — no momento em que o Sr. Jian Youwen começava a sua colecção, já a do Museu tinha sido concluída. A colecção do Museu Luís de Camões tem sido, até hoje, preservada intacta.

Em 1940, naturais da Província de Guangdong — que residiam nessa época em Hong Kong — organizaram na, então, Biblioteca Fung Ping Shan (actualmente Fung Ping Shan Museum da Universidade de Hong Kong) uma exposição de trabalhos artísticos de Guangdong. Foram expostas perto de quinhentas pinturas, representando cento e sessenta e dois pintores de Guangdong. Uma publicação em três volumes que incluía estudos sobre este estilo regional, foi nessa altura editada como registo permanente da referida exposição13. Desde então têm sido levadas a cabo, em Hong Kong, diversas exposições sobre a pintura artística de Guangdong, sobre as quais foram publicados diversos catálogos ilustrados14, que passo a referir cronologicamente:

Guangdong Mingjia Shuhua Xuanji ( 廣東名家書畫選集): Uma exposição de caligrafias e pinturas de famosos artistas de Guangdong (compreendendendo trabalhos artísticos pertencentes a diversas colecções privadas de Hong Kong e Macau), 1959.

Guangdong Ming Huajia Xuanji ( 廣東名家書畫選集 ), Guangdong, 1961.

Su Liupeng Handbook: Uma exposição de pinturas de Su Liupeng 蘇六朋 organizada pelo City Hall Museum andArt Gallery, Hong Kong, 1964.

Renshan Handbook: Uma exposição de obras de Su Renshan 蘇仁山 organizada pelo City Hall Museum and Art Gallery, Hong Kong, 1966.

— YOUWEN, Jian, Su Renshan Eccentric Genius Of Guangdong: His Life AndArt ( 画壇怪傑蘇山): Uma exposição de obras de Su Renshan, co-organizada pelo Centre of Asian Studies e pelo Fung Ping Shan Museum da Universidade de Hong Kong, 1970. A maioria dos trabalhos expostos foi seleccionada da colecção do Sr. Jian Youwen 簡又文.

— RYCKMANS, Pierre, La Vie et l'Oeuvre de Su Renshan. Rebelle, Peintre et Fou, 1814-1849(?), publicada pela Universidade de Paris, 1970. Este livro não é um catálogo da exposição, mas um estudo sobre a vida e a obra de Su Renshan baseado em pesquisas apoiadas pelo Centre of Asian Studies da Universidade de Hong Kong. Foi publicado em dois volumes, o segundo dos quais contém cento e setenta e nove pinturas do artista, de colecções públicas e particulares de todo o mundo.

Paintings by Guangdong Masters during the Ming and Qing Periods: Uma exposição de pinturas 'paisagistas' por mestres de Guangdong dos períodos Ming e Qing, organizada pelaArt Gallery, Instituto de Estudos Chineses, Universidade de Hong Kong, 1973.

Guangdong Painting: Uma exposição de pinturas de Guangdong organizada pelo City Hall and Art Gallery Museum, Hong Kong, 1973.

Ao todo, foram mostrados ao público, através destas exposições, duzentos e dezassete pintores diferentes de Guangdong. É no entanto de lamentar que alguns dos catálogos não ilustrem todas as pinturas então expostas, o que dificulta a percepção do estilo de muitas das pinturas. É apenas através das ilustrações dos catálogos que podemos ter acesso a setecentas e cinquenta e duas pinturas de Guangdong, representando cento e cinquenta e quatro artistas — trinta e três do período Ming, cento e nove do período Qing e treze dos tempos modernos. Destes artistas, apenas noventa e dois estão registados no Lingnanhua Zhenglue15.

É evidente que o número de artistas cujos trabalhos sobreviveram até hoje é demasiado pequeno.

No Museu Luís de Camões existem duzentas e dezasseis pinturas, representando o trabalho de quarenta e três artistas de Guangdong. Dois deles são da dinastia Ming e todos os outros da dinastia Qing.

O quadro que se segue é uma listagem dos pintores de Guangdong da colecção do Museu Luís de Camões.

PINTURAS CHINESAS NO MUSEU LUÍS DE CAMÕES

PINTOR

style='mso-bidi-font-weight:normal'>PINTOR

style='mso-bidi-font-weight:normal'>LOCAL DE NASCIMENTO

style='mso-bidi-font-weight:normal'>CRONOLOGIA

Lin Liang

林良

lang=EN-US>

Nanhai

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>南海

ō1416-† 1480

Zhang Mu

張穆

Dongwan

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>東莞

ō1607-†1686 depois

Lin Jian

黎簡

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

ō1747-†1799

Guo Shi

郭適

lang=EN-US>

Ahunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

†1794

Xie Lansheng

谢蘭生

Nanhai

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>南海

ō1760-†1831

Xioang Jingxing

能景星

Nanhai

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>南海

ō1791-†1856

Zhao Ziyong

招子庸

Nanhai

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>南海

ō1793-†1846

Huang Bi

黄壁

Chaoyang

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>潮陽

s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XVIII

Chen Wang

陳汪

Nanhai

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>南海

s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XVIII

Li Xiangguang

李翔光

Xinhui

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"Times New Roman"'>新会

s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XVIII

Li Qi

黎奇

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XVIII

Liang

Shu

梁樞

lang=EN-US>

Shunde

顺德

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depois

do sèc.XIX

L

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>~_#u Xiang

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吕翔

Shunde

顺德

lang=EN-US>

depois

do sèc.XIX

L

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lang=EN-US>

吕培

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

depois do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

He Shen

何深

lang=EN-US>

Shunde

顺德

lang=EN-US>

depois

do sèc.XIX

Li

Ruwei      

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>黎如緯

Shunde

顺德

lang=EN-US>

ō1811

Su

Renshan

蘇仁山

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Shunde

顺德

lang=EN-US>

ō1814-†1849/50

Du Heng      

杜衡

Panyu

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>番禺

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

Yu Qilin       

余啓璘

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

Jiang

Lian     

蒋蓮

lang=EN-US>

Xiangshan

香山

lang=EN-US>

Meados

do sèc.XIX

Luo Yang     

羅阳

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

De Kun       

德坤

Guangdong

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>廣東

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

Su Liupeng    

蘇六朋

Shunde

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>顺德

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

Yu Ling       

余菱

lang=EN-US>

Guangdong

style='font-family:宋体;mso-ascii-font-family:"Times New Roman";mso-hansi-font-family:

"Times New Roman"'>廣東

Meados do s

style='font-size:12.0pt;mso-font-kerning:0pt'>èc.XIX

lang=EN-US style='font-size:12.0pt;font-family:宋体;display:none;mso-hide:all;

mso-font-kerning:0pt'> 

 

Ju

lang=EN-US> Chao

居巢

Panyu

番禺

†1889

Ju

lang=EN-US> Lian

居廉

Panyu

番禺

ō1828-† 1904

Ming Binglin

明炳麟

Nahai

南海

Meados

lang=EN-US> do s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

Deng Ruqiong

鄧如瓊

Nahai

南海

Meados

lang=EN-US> do s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

Meng

lang=EN-US> Erzhu

蒙爾著

Panyu

番禺

Meados

lang=EN-US> do s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

He Zhong

何翀

Nanhai

南海

Meados

lang=EN-US> do s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

Wu Deyi

伍德彝

Nanhai

南海

†1921 depois

Cui Qin

崔芹

Panyu

番禺

ō1845-†1914

Wu Xuezao

伍學藻

Shunde

順德

Fins do s

class=spelle>èc.XIX

Wang Pu

汪浦

Panyu

番禺

Fins do s

class=spelle>èc.XIX

Luo

lang=EN-US> Anxian

羅岸先

Panyu

番禺

Fins do s

class=spelle>èc.XIX

Li Kui

李魁

Xinhui

新會

Meados

lang=EN-US> s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

style='font-size:12.0pt'>-

-fins do

class=spelle>s

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

Guan

class=spelle>Weixi

關蔚熙

lang=EN-US>Nanhai

style='font-family:宋体'>南海

fins do

s

style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

lang=EN-US>Ju Qing

居慶

lang=EN-US>Panyu

style='font-family:宋体'>番禺

fins

do s

style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

Luo

lang=EN-US> Qing

羅清

Panyu

番禺

fins do s

class=spelle>èc.XIX

Su

class=spelle>Fensheng

蘇逢聖

lang=EN-US>Shunde

style='font-family:宋体'>順德

fins do

s

style='font-size:12.0pt'>èc.XIX

lang=EN-US>Liang Yuwei

梁于渭

lang=EN-US>Panyu

style='font-family:宋体'>番禺

†1913

lang=EN-US>Rong Zuchun

容祖椿

class=spelle>Dongwan

 

style='font-family:宋体'>莞

ō1871-†1943

Liu Luanxiang

劉彎翔

Guangdong   

       廣東

fins do s

class=spelle>èc.XIX

lang=EN-US style='font-size:12.0pt'>-

-

class=spelle>inìcio do sèc.XX

 

Com a possível excepção da existência, desconhecida, de algumas colecções na China Continental, a antiga colecção de Jian Youwen, actualmente na Art Gallery da Universidade Chinesa de Hong Kong, é a mais importante colecção de pinturas de Guangdong. Contendo mais de um quarto dos pintores de Guangdong divulgados, a colecção do Museu Luís de Camões é, seguramente, a segunda mais importante.

É inquestionável o valor de muitas obras desta colecção. Embora os pintores Ming estejam muito pouco representados, mais de metade dos artistas conhecidos da dinastia Qing estão incluídos na colecção do Museu. Quatro deles, Chen Wang 陳汪, Li Xiangguang 李翔光, Guan Weixi 關蔚熙 e Su Fengsheng 蘇逢聖, nunca tinham tido os suas obras expostas ou divulgadas.

Duas áreas do Delta do Rio das Pérolas foram centros de desenvolvimento da pintura de Guangdong16. As prefeituras de Panyu [番禺], Shunde [順德] e Nanhai [南海], por um lado e as províncias [sic] de Dongwan [東莞], Xiangshan [香山] e Xinhui [新會], por outro lado. Os pintores representados na colecção do Museu Luís de Camões são oriundos destes dois centros, particularmente de Shunde e Nanhai.

As paisagens são, tradicionalmente, o mais importante tema na pintura chinesa, seguindo-se os temas de pássaros-e-flores, sendo relativamente secundário o destaque dado à pintura figurativa. Contudo, o grosso da colecção do Museu é constituído por pinturas 'figurativas', revelando a preferência do seu primeiro dono, o europeu Dr. Silva Mendes. O grande número de exemplares de pinturas 'figurativas' sobre temas taoístas, por Su Liupeng 蘇六朋, reflecte o interesse do Dr. Silva Mendes pelo taoísmo.

Na colecção do Museu Luís de Camões, setenta e seis pinturas são de Su Liupeng 蘇六朋, e trinta e quatro de He Zhong 何翔. Su foi um destacado pintor 'figurativo' activo durante a era de Daoguang [道光] e He, contemporâneo de Su, foi bastante apreciado como pintor de 'pássaros-e-flores'. Se bem que não exista ainda um estudo global aprofundado sobre os estilos destes dois pintores, a colecção do Museu revelar-se-á certamente de valor inestimável quando semelhante estudo vier a ser feito.

PINTURA 'PAISAGISTA'

As mais antigas pinturas 'paisagistas' existentes na colecção do Museu Luís de Camões são trabalhos de Li Jian 黎簡17 (ō1747-†1799) 18 e a maioria das outras pinturas 'paisagistas' relacionam-se estilisticamente com os trabalhos de Li. Pintor e calígrafo, Li Jian é também tido como um dos "Quatro Grandes Poetas de Lingnan"19. Pouco tentado pelas honras da vida oficial e social, preferiu dedicar-se à pintura. O Lingnanhua Zhenglue atribui a Li Jian dois estilos: um deles, frio, desolado e remoto, à maneira de Ni Zan 倪瓚, da dinastia Yuan; o outro, luxuriante e espontâneo — um revivalismo do estilo clássico de Dong Yuan 董源, que Li recriou a partir das pinturas de Wu Zhen 吳鎮, da dinastia Yuan. De acordo com Xie Lansheng 謝蘭生 — um pintor de Guangdong da geração que se seguiu20— na sua meia-idade, o mestre admirou também profundamente o estilo de Shi Tao 石濤.

Na colecção do Museu existem sete pinturas 'paisagistas' de Li Jian, quatro das quais datadas21. Das sete pinturas22, três são extremamente significativas para o estudo do desenvolvimento do estilo pictórico de Li Jian: "Primavera em Guangdong" (“嶺南春色”), "Estudando num Barco na Primavera" (“春溪讀書圖”) e "Ouvindo os Pinheiros numa Ravina Isolada" (“幽壑聽松”).

"Primavera em Guangdong", datado de 1785, quando Li Jian tinha trinta e cinco anos, é um exemplo do primeiro estilo, ermo e frio. A data e o local inscritos na pintura coincidem com a biografia de Li Jian23. A árvore capoca é uma das espécies da região de Guangdong que Li Jian tanto descreveu nas suas obras poética24 e pictórica25. Xie Lansheng 謝蘭生 escreveu que o primeiro artista de Guangdong a pintar capocas foi Li Jian26. Diz-se que, em 1781 e 1782, Li Jian completou duas composições com o título "Montanhas Verdes e Capoca Vermelha" (“碧嶂紅棉”), ambas infelizmente perdidas27.

"Primavera em Guangdong" é, assim, um exemplo único deste género de pintura. A composição "Primavera em Guangdong" está dividida em duas partes. No primeiro plano vêm-se um promontório, duas capocas e uma enorme rocha. Entre a rocha e as árvores estão duas figuras esquivas. Para lá do rio, um socalco intermédio entrelaça-se com a montanha do plano de fundo, formando a segunda parte. Esta composição dividida em duas partes é semelhante ao desenho de Ni Zan e de outros mestres do último período Yuan, embora as paisagens Ni Zan raramente incluam figuras humanas28.

O posicionamento de figuras humanas entre elementos de dimensões bastante maiores é uma particularidade do estilo pictórico do período Ming29. A forma inusitada do rochedo do primeiro plano — semelhante às pinturas dos literatos Ming — é outra das características do período Ming onde este tipo de rochas, por fazer lembrar os jardins de pedras ornamentais, se tornou gradualmente popular. Com efeito, mesmo o plano intermédio é uma reminiscência do estilo de Shen Zhou 沈周 da dinastia Ming30. A partir desta pintura torna-se evidente que, por volta de 1875, Li Jian combinou o estilo de composição Ni Zan com o seu genuíno interesse pela pintura Ming para criar o desenho "Montanhas Verdes e Capoca Vermelha". Estes elementos Ming não foram, aparentemente, notados pelo autor de Lingnanhua Zhenglue.

Uma posterior pintura 'paisagista' de Li Jian, "Paisagem Pintada para Caoting" (“贈草亭山水畫"), acabada em 179531, aproxima-se ainda mais do estilo de Ni Zan. No primeiro plano da pintura, um promontório com um pequeno pavilhão redondo com alguns bambús, enquanto o plano intermédio representa uma extensão de águas tranquilas e, o plano de fundo, algumas montanhas arredondadas e árvores distantes. A paisagem, fria e desolada, é representada com traços de ténue textura. Na composição pictórica, na técnica da pincelada e no sentimento que exprime, a postura aponta para a dimensão que Li Jian, nos seus últimos anos, alcançara através da essência de Ni Zan.

"Estudando num Barco na Primavera", datada de 1790, foi executada no estilo hao de Dong Yuan 董源32, Beiyuan 北苑, popularizado em Jiangnan durante as cinco últimas dinastias. Desde a dinastia Ming, as paisagens de Beiyuan passaram a ser consideradas como um estilo ortodoxo. Com efeito, nos meados da dinastia Qing, a maioria dos suas obras entrou para a colecção imperial. Depois disso, embora tenha continuado a angariar a admiração do público em geral, o seu estilo de pintura não tornou a ser amplamente estudado ou imitado.

Na sua pintura, Li Jian usou traços com a textura de fibra de cânhamo para definir a sombra e a luz de montanhas e rochedos; grandes e pequenas manchas de tinta para representar musgo e arbustos distantes. O plano intermédio, o ribeiro ziguezagueante e as montanhas brumosas já não se relacionam com o estilo Ni Zan. As manchas de tinta e as pinceladas com textura de fibra de cânhamo são de facto técnicas distintivas de Dong Yuan33. O ziguezagueante ribeiro no centro da pintura é um detalhe característico que aparece frequentemente nos longos rolos horizontais atribuídos a Dong Yuan34. Nesses rolos, os riachos serviriam provavelmente para enfatizar a profundidade da cena pictórica. Mas, nas pinturas de Li Jian, parece ser mais um expediente de que o pintor se socorria para coordenar o plano intermédio com a montanha distante. Apesar de o próprio Li Jian ter declarado que a pintura fora executada no estilo de Beiyuan, com excepção das características acima referidas, não há outras próprias de Dong Yuan. A composição, em particular com a sua montanha extremanente distante e cercada por uma núvem pairante que sela inteiramente o espaço de fundo, está próxima da fórmula Song do Norte, mas não contém a atmosfera impositiva do seu protótipo35 nem, tão pouco, é semelhante ao ping yuan ( 平遠, nível de profundidade) das composições de Dong Yuan36.

Existem, no entanto, três pinturas conhecidas de Li Jian que se relacionam com o estilo de Dong Yuan. A mais antiga, "Cópia Livre da "Montanha Nublada" de Dong Yuan"37 (“擬北苑雲山圖”), é datada de 1781.

"Ao Abrigo da Chuva na Montanha de Verão, Segundo Dong Yuan"38 (“夏山奔雨圖”) foi executada em 1790, o mesmo ano de "Estudando num Barco na Primavera". Infelizmente desconhece-se o paradeiro do dono de "Ao Abrigo da Chuva na Montanha de Verão, Segundo Dong Yuan" e "Estudando num Barco na Primavera" permanece como o único exemplo da fase intermédia, durante a qual Li Jian se dedicou ao estudo de Dong Yuan.

Em 1793, Li Jian concluiu "Montanhas de Verão antes das Chuvas"(“ 夏山欲雨圖 ”) um exemplo do seu estudo posterior sobre o estilo antigo dos mestres. Após este período, deixou-se absorver pelo estudo das pinturas de Shi Tao e a influência de Dong Yuan deixou de ser visível39.

Estas paisagens, pintadas por Li Jian quando tinha entre trinta e cinco e quarenta e sete anos de idade, são pedras basilares do seu estudo sobre o estilo paisagístico de Dong Yuan. A primeira "Cópia Livre da "Montanha Nublada" por Dong Yuan" é a menos refinada: a textura de fibra de cânhamo das pinceladas e as manchas de tinta são mecânicas. A evolução intermédia, manifesta em "Estudando num Barco na Primavera", é mais elegante. O cenário da grande montanha, como fundo desta pintura, é comparável ao de "Cópia Livre da "Montanha Nublada" por Dong Yuan", no entanto, nenhuma das imagens é o verdadeiro reflexo dos conceitos de Dong Yuan40. A composição de "Montanha de Verão Antes das Chuvas" é mais próxima de ping yuan (平遠), o método da perspectiva de Dong Yuan41. O movimento contínuo da imagem é conseguido através da interposição de camadas de terra e extensões de água. Contudo, a paisagem é caracterizada por uma outra particularidade: os vários socalcos de montanhas que não são, em absoluto, motivos de Dong Yuan.

Durante a dinastia Qing, não foram preservadas quaisquer pinturas de Dong Yuan. E Li Jian, que não viajou para além das províncias de Guangdong e Guangxi, poderá nunca ter visto nenhum exemplar autêntico. Talvez por se ter apercebido da dificuldade em encontrar exemplos genuínos das obras Dong Yuan e Ni Zan, Li Jian tenha abandonado o estilo clássico na sua meia idade, dedicando-se ao estilo de Shi Tao 石濤. Deste mestre, não só coleccionou pinturas, como se concentrou também na imitação e interpretação das suas obras-primas42. "Ouvindo os Pinheiros numa Ravina Isolada", existente no Museu Luís de Camões, é um exemplo muito próximo do estilo de Shi Tao.

Shi Tao desenvolveu detalhadamente duas teorias de composição: fenjiang sandie (分疆三疊) que siginificava que o plano da imagem deveria estar dividido em três níveis: terra, árvores e montanhas43; ejieduan (截斷), que consistia num método através do qual a parte mais bela da cena pictórica era intencionalmente isolada e ampliada44. O trabalho de Li Jian "Ouvindo os Pinheiros numa Ravina Isolada" segue exactamente estes princípios. Duas figuras atravessando o primeiro plano, uma fileira de pinheiros na zona central e duas montanhas mais distantes, com uma extensão de água, infinita e indefinível, do lado direito da imagem; algumas partes da cena pictórica são bastante maiores e descritas em detalhado pormenor, enquanto as áreas menos importantes são cobertas por núvens numa manifestação exacta do método jieduan. As texturas utilizadas por Li Jian para representar as montanhas e rochedos deste tipo de pintura 'paisagista', são traços juanyun (捲雲, lit.: "núvens em movimento") característicos de Shi Tao45. Mas como "Ouvindo os Pinheiros numa Ravina Isolada" é pintado sobre seda, não tem as qualidades suaves e difusas dos trabalhos de Shi Tao, habitualmente executados sobre papel46. Apesar de não estar datada, a pintura não deverá ser anterior à meia-idade de Li Jian, quando viria a ficar absorvido pelo estilo de Shi Tao.

Na folha de um álbum datado de 1794, o próprio Li Jian analisou o seu estilo, inscrevendo o seguinte comentário:

"Estudei a arte da pintura ao longo de quarenta anos. Alcancei um determinado grau de evolução quando tinha trinta anos. Por essa altura, dei graças a mim mesmo por algumas importantes conquistas. Quando estava nos meus quarenta, reexaminei os trabalhos executados nos meus trinta anos. Dos trabalhos que me tinham então parecido extremamente satisfatórios, sentia agora vergonha. Nos anos mais recentes consegui realmente alcançar algo de que me congratulo: as minhas composições estão mais próximas da natureza, e a definição da tinta harmoniza-se com a realidade do mundo corpóreo. Quanto mais visionário e transcendental eu for, mais probabilidades terei de ser suficientemente afortunado para conseguir produzir tais qualidades, embora saiba que não é a vontade que as controla. Em quase dois meses, entre a Primavera e o Verão, completei este álbum. Foi originalmente concebido à maneira de Dong Yuan e Wu Zhen 吳鎮. Poderá haver diferenças no sombreado da tinta, mas o conceito geral pode ser visto como uma combinação destes dois mestres [...] no ano cíclico de jiayin [甲寅,1794], o vigésimo quarto dia do quarto mês, er qiao (二樵)"47.

Os pintores He Shen 何深, Lü Xiang 吕翔, Liang Shu 梁樞, Xie Lansheng 謝蘭生, Xiong Jingxing 熊景星, Ming Binglin 明炳麟, Li Ruwei 黎如緯, e Luo Yang 羅陽, cujos exemplares de pinturas se encontram preservados no Museu Luís de Camões, sofreram em muitos aspectos a enorme influência de Li Jian. "Paisagem no Estilo de Li Tang" (“仿李唐筆意山水”), de He Shen — aluno de Li Jian —, é de facto bastante próxima de "Montanha de Verão Antes das Chuvas", do seu professor, tendo muito poucas características das paisagens de Li Tang, habitualmente definidas por uma textura de traços cortantes. Lü Xiang e Liang Shu foram contemporâneos de Li, de quem terão recebido influência devido aos encontros com ele mantidos para discutirem poesia e pintura48. Xie Lansheng, uma geração mais novo que Li Jian, melhorou notavelmente a sua arte pictórica depois de Li lhe ter recomendado as pinturas de Shi Tao49. Ming Binglin é um outro pintor que, nos seus últimos anos, seguiu o estilo de Li Jian50. O estilo de Li Ruwei é mais complexo e nele podem ser detectadas as influências, quer de Li Jian, quer de Xie Lansheng. A pincelada e a monocromática pintura 'paisagista' de Xiong Jingxing é forte e dignificante, comparada com o trabalho de Gong Xian 龔賢, de Chin-ling, um antigo mestre Qing. Em geral os primórdios do estilo Qing tiveram pouca influência na pintura 'paisagista' de Guangdong, por isso, este exemplo de Xiong Jingxing é raro e digno de nota.

Ao contrário do aclamado Li Jian, de meados do período Qing, Li Kui 李魁, em finais do mesmo período, é um talento esquecido e cuja importância foi negligenciada ao longo de muito tempo. Em 1940, na exposição dedicada a temas culturais de Guangdong — uma das mais significativas exposições do género alguma vez realizada — na qual estiveram representados cento e sessenta e dois artistas de Guangdong, Li Kui não foi incluído51. Tido como artesão, as suas pinturas acabariam vendidas a preços muito baixos52. Foi apenas em 1950, com a publicação do livro Guangdong Mingjia Shuhua Xuanjii (廣東名家書畫選集), que foi pela primeira vez publicada a reprodução de uma das suas obras53. Mais recentemente, o valor e as qualidades artísticas de Li Kui têm vindo a ser progressivamente mais bem aceites e reconhecidos54.

Sabe-se muito pouco sobre a vida de Li Kui. Para além do sucinto registo em Lingnanhua Zhenglue (嶺南畫徵略) conhece-se apenas um outro esboço biográfico mais detalhado, inserido num artigo de Li Fanfu: Qingmo Huaren Doushan ( 清末畫人李斗山[Li Doushan: Um Pintor dos Fins [da Dinastia] Qing)55.

De acordo com estas fontes. Li Kui estudou pintura com o artista de Guangdong, Zheng Ji 鄭績, de Xinhui. Mais tarde tornou-se um pintor profissional, especializado em pinturas murais. Viveu até longa idade e, a julgar pelas pinturas datadas do Museu Luís de Camões e por outros trabalhos datados e publicados, o período activo de Li Kui terá durado aproximadamente entre 1832 e 1871 ou 189956.

A colecção do Museu Luís de Camões possui quatro paisagens de Li Kui, três das quais datadas. A obra sem data, intitulada simplesmente "Paisagem" (" 山水巨軸"), está assinada por "Doushan laoren" [斗山老人: "O Velho da Montanha Dou"] e terá sido provavelmente pintada depois dos seus cinquenta e cinco anos de idade57. As quatro pinturas de Li Kui, por ordem cronológica, são:

"Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros" (“松陰草蘆”), datada de 1832;

"Paisagem no Estilo de Wang Ming" (“仿王叔明山水”) pintada no ano cíclico de renyin (壬寅), possivelmente 1842;

"Contemplando a Queda de Água" (“觀瀑圖”)pintada no ano cíclico de bingwu (丙午), possivelmente 1846-184758; e

"Paisagem", possivelmente um dos seus últimos trabalhos.

Inovador, Li Kui não seguiu regras fixas. A sua composição e técnica do pincel, variam extraordinariamente e dá grande ênfase às qualidades atmosféricas e transcendentes da paisagem59.

Apesar de ter tentado seguir o estilo dos quatro mestres da dinastia Yuan — Ni Zan 倪瓚 Wang Meng 王蒙 e Wu Zhen 吳鎮— a sua "Paisagem no Estilo de Wang Ming" ("仿王叔明山水"), oferece muito poucas indicações do estilo dos mestres Yuan60. As suas pinturas reflectem mais a influência do seu professor, Zheng Ji. "Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros" é disso um exemplo. A paisagem é composta por dois pinheiros e um telheiro debaixo do qual dois homens sentados tocam e ouvem música. A montanha, pálida e elegantemente esculpida, no plano de fundo, contrasta harmoniosamente com a profundidade e elementos escuros da zona central. No seu Menghuanju Huaxue Jianming (夢幻居畫學簡 明, 5 chuan), Zheng Ji instruiu:

"Para pintar uma cena rústica de montanhas e rochedos, as árvores e as rochas devem ser apresentadas de forma a sugerir uma atmosfera extensa. Os elementos arquitectónicos devem ter a cobertura macia do colmo e paredes de bambú. Podem ser representados sobre as margens do rio ou por entre pinheiros altos. Apenas um ou dois habitantes da montanha devem ser vistos a passar e não deverá em absoluto existir qualquer traço de carruagens ou cavalos. Poderá haver um pescador solitário por debaixo de um penedo ou de um salgueiro, ou poderão existir alguns pássaros cantando perto de um pavilhão desabitado ou de uma ponte. Isto deverá provocar pensamentos de um outro mundo nas mentes de quem possui a pintura"61.

Se este registo literário for comparado com a apresentação pictórica "Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros", não é difícil perceber a relação entre as paisagens de Li Kui e as teorias de arte de Zheng Ji.

Uma outra pintura 'paisagista' de Li Kui, "Contemplando a Queda de Água", é composta de tal modo que o conjunto de toda a imagem é definido sem qualquer espaço em branco. Este tipo de composição é certamente único, mas corrresponde exactamente a uma outra pintura 'paisagista' de Zheng Ji62. Sobre este tipo de cena pictórica, sólida e viril, Zheng Ji escreveu:

"Se a intenção é tornar a paisagem poderosa e sólida, o trabalho do pincel deve ser curvo e forte. Os traços sobrepõem-se uns aos outros. Repete-se esta técnica de pincel uma e outra vez. Deve ser usada tinta seca mas escura. Aplica-se depois uma aguada de tinta para os contrastes. Embora não sejam necessários demasiados elementos secundários, devem contudo ser suficientes para sustentar o completar da composição. Precipícios e pinheiros altos ou quedas de água e um pavilhão, são elementos que sugerem verticalidade63."

Acerca do método para dar a impressão de movimento de uma queda de água agitada ou turbulenta, Zheng Ji escreveu:

"Ao representar uma queda de água deverão existir três a quatro cascatas. A formação rochosa de cada cascata deve variar. O curso da água vira-se da direita para a esquerda; por vezes é longo e por vezes é curto. Por vezes quebra-se, outras é contínuo. A cascata superior e a inferior estão sempre intimamente associadas. Sempre que se vejam pedras dentro da água, estas devem parecer emergentes. Uma metade exposta acima da água e a outra submersa. Por isso em águas claras e inquietas, pinte-se algumas pedras negras, grandes e pequenas."64

"Contemplando a Queda de Água" é uma obra da meia idade de Li Kui mas a influência da teoria de Zheng Ji estendeu-se até aos seus últimos anos, como se pode ver pela paisagem existente no Museu Luís de Camões com a assinatura "Doushan laoren". A parte mais visível desta paisagem é dominada por três árvores frondosas por detrás das quais se vêem, de um lado, uma pequena ponte sobre águas turbulentas e, do outro, casas com telhados de colmo e pinheiros altos. As longas margens do rio ligam-se à montanha e continuam até alcançarem o pavilhão no socalco de uma pequena montanha. Elevações longínquas erguem-se por detrás e pequenos barcos de pesca navegam as águas do rio.

Acerca da composição de grandes paisagens, Zheng Ji comentou:

"Se a paisagem fôr para parecer profunda e vasta, o trabalho de pincel deve ser forte e pesado. Cada traço deve ser desenhado com energia gerada pelo movimento circular. À medida que avança deixá-lo tornar-se dinâmico e fresco. A tinta deve ser escura e seca. A composição deve ser grande e separada em unidades associadas. Deve ser bem controlada, como um cavalo dos céus que voe livremente e páre por vontade65.

Se o caminho não é acessível, é porque está obstruído e, consequentemente, a pintura é desarticulada. Nesses casos, deverão existir pontes de ligação à terra separada pelas águas. Se o caminho estiver escondido por uma rocha, deixe-se uma área indefinida que possa sugeri-lo. O caminho pode rodear uma casa ou enredar uma floresta e parecer desligado aqui e além. Figuras na imagem podem passar discretamente. Para mim é este o significado de acessível."66

Li Kui praticou não só a técnica mas também a filosofia de pintura adoptadas pelo seu professor. Ambos concordavam na necessidade de captar o espírito atmosférico e o ritmo da cena. O próprio Li Kui asssim o manifestou, explicitamente, na inscrição para a sua "Paisagem no Estilo de Ni Zan" (“仿雲林山水軸”):

"A maioria das vezes, as pessoas dispendem muito tempo na preparação da tinta e do pincel. Observam insistentemente os seis princípios, que são tratados tão rigidamente como as regras militares. Não se apercebem que, se houver muita tensão a envolver estas leis, elas aprisionarão o espírito criativo. Nestes casos, o artista facilmente se esquecerá da ideia temática da pintura. Quando a uma pintura falta o tema central, esta está longe de ser natural. Como pode um trabalho sem sentido ter qualquer qualidade transcendental? "67

Zheng Ji disse também:

"Apesar de a pintura ser uma arte menor, continua a ser necessário o controlo da tinta e a técnica do pincel, de modo a compreender a forma, ideia e espírito do tema em mente. É isto que para mim significa adquirir a essência. Nunca dependam apenas da cópia de outras pinturas. Atrevam-se a não se sentirem satisfeitos nem a auto congratularem-se com o que está meio acabado."68

O Lingnanhua Zhenglue refere que Li Kui seguiu o estilo de Shi Tao e criou composições 'paisagistas' invulgares69. Mas as notáveis pinturas de Shi Tao haviam já sido introduzidas entre os artistas de Guangdong por Li Jian e Xie Lansheng nos princípios do século XIX70. Não é por isso surpreendente encontrar elementos de Shi Tao nas composições excêntricas de Li Kui. Por outro lado, a influência de Zheng Ji nas suas paisagens há muito que vinha sendo neglicenciada, aspecto este que gostariamos de destacar.

PINTURA 'FIGURATIVA'

A pintura 'figurativa' de Guangdong inclui retratos, gongbi shinü(工筆仕女)-pinturas de cenas da vida das classes mais abastadas e elevadas à maneira gongbi, e pintura de figuras, baimiao (白描) e xieyi (寫意)71. A colecção de pintura 'figurativa' de Guangdong do Museu Luís de Camões, é composta pelos três tipos:

— Pintura shinü que segue a tradição de Tang Yin 唐寅 e Qiu Ying 仇英, da dinastia Ming; e Fei Danxu 費丹旭 e Gai Qi 改琦, da dinastia Qing;

— Pintura 'figurativa' xieyi de Su Liupeng 蘇六朋; e

— Figuras com cenas 'paisagistas' no estilo de Hua Yan 華喦.

A pintura chinesa shinü tem uma longa história. A pintura em seda do período dos Reinos Combatentes (481-221 a. C.) — do qual se encontraram diversos vestígios através de escavações arqueológicas feitas em Changsha — é o mais antigo exemplo do género conhecido72.

Desde esses tempos que a pintura shinü continuou a desenvolver-se com características distintas entre cada período. Na dinastia Ming o modelo de senhoras nas pinturas shinü de Tang Yin e Qiu Ying tendia a ser refinado e longilíneo. Os artistas da dinastia Qing continuaram a desenvolver o estilo dos seus predecessores e criaram uma imagem agradável mas extremanente delicada. Esta imagem feminina gozou então de grande popularidade e tornou-se a inspiração orientadora na evolução da pintura 'figurativa' da dinastia Qing.

Jiang Lian 蔣蓮, um qualificado pintor de figuras de Guangdong, activo em meados do século XIX, está representado no Museu Luís de Camões com "Retrato de Senhora" (“白描仕女”), no estilo de baimiao, pintado num leque circular. Esta pintura é importante para compreender o desenvolvimento da pintura shinü de Guangdong. A imagem — um cuidadoso retrato de uma bonita senhora com um rosto delicado em forma de amêndoa, olhos oblíquos, sobrancelhas longas e finas e pequenos lábios vermelhos — dispensa absolutamente qualquer cenário de fundo. Na composição e pincelada, o trabalho aproxima-se de um certo tipo de pintura shinü de Tang Yin73, enquanto o modelo da figura é semelhante ao de Fei Danxu do distrito de Jiangnan74. Para delinear a figura, Jiang Lian usou não só a tinta mas aplicou também uma leve aguada nas vestes, uma técnica que remonta à aguada baimiao de Li Tang 李唐, da dinastia Song do Sul75. O famoso "Colhendo Fetos" (“採薇圖”) de Li Tang pertencia já à colecção do século XIX do colecionador Wu Rongguang 吳榮光, em 1825-182676, quando Wu pediu a Jiang Lian para fazer alguns trabalhos de restauro numa outra imagem77. Não é desprovido de realismo supor que Jiang Lian tenha aproveitado a oportunidade para estudar "Colhendo Fetos" de Li Tang e que tenha, desse modo, ficado inspirado pela técnica do mestre.

Enquanto "Retrato de Senhora" representa um tipo distinto da pintura shinü, de Guangdong dos finais da dinastia Qing, é também representativo de uma fase particular do desenvolvimento artístico de Jiang Lian. "Retrato de Senhora" foi pintado no ano cíclico de gengyin (庚寅)[1830-1831]. O estilo é como Xie Lansheng observou:

"Jiang começou a retratar figuras. Estudou todas as possíveis formas existentes.

Estava então no auge da sua vida. Sendo hábil, conseguia facilmente seguir o estilo de Tang (Yin) e de Qiu (Ying)"78.

Duas outras pinturas de Jiang Lian do Museu Luís de Camões, "Bodhisattva Avalokitesvara no 190" (“第一百九十尊觀音像”) e "Figuras Debaixo de uma Árvore" (“樹下人物圖”), datadas de 1836 e 1837, respectivamente, são tratadas facilmente e com muita liberdade. Consta que Jiang Lian construíu o seu estúdio em Guangdong na sua velhice e prometeu pintar três mil imagens do Buda Sakyamuni e Bodhisattava Avalokitesvara como forma de se redimir dos seus pecados79. Como é evidente, os trabalhos acima referidos são desse período80.

Sobre as datas de nascimento e morte de Jiang Lian não se chegou ainda a uma conclusão mas uma inscrição em "Figuras com um Qin" (“琴歌圖”), do monge De Kun 德坤, existente no Museu Luís de Camões, poderá ajudar a iluminar este problema. Escrita em 1884 por Hu Daoren 壺道人, que tinha então setenta e cinco anos de idade, a inscrição revela que, antes da sua morte, Jiang Lian estava gravemente doente. Quando Jiang morreu, antes dos cinquenta anos, este autor estava então nos seus vinte anos. Deduz-se por issso que, ao pintar "Bodhisattva Avalokitesvara", em 1836, Jiang teria cerca de quarenta anos de idade, e estava já perto da morte. Daí que o termo "velhice" possa ser interpretado como o período próximo do fim da sua vida. Pintado seis anos antes de "Bodhisattva Avalokitesvara", o estilo de "Retrato de Senhora" é diferente e pode ser visto como um dos trabalhos da juventude de Jiang.

A escola de pintura shinü de Jiangnan foi também popular nos finais da dinastia Qing, em Guangdong.

As pinturas shinü de Du Heng 杜衡 e Wang Pu 汪浦 partilham certas características que são comuns à escola de Jiangnan: minúcia; fino trabalho de pincel; cores luminosas; e um plano de fundo elegante e muito decorativo. Du Heng e Wang Pu eram imigrantes de Jiangsu que, antes de se mudarem para Guangdong, poderão ter adoptado alguns elementos do estilo de Fei Danxu. De qualquer forma, o seu estabelecimento em Guangdong promoveu a transmissão do estilo de Jiangnan, o qual continuou a desenvolver-se e a ser evidente em Guangdong nos últimos tempos da dinastia Qing. "Aguardando o Nascer da Lua" (“桐陰佇月”), de Luo Anxian 羅岸先, é um bom exemplo deste estilo.

Apesar de não ter muito peso na evolução da pintura de Guangdong, "Oito Cavalos" (“八駿圖”) de Du Heng, é um exemplo significativo das qualidades deste pintor — evidenciadas na representação de animais — que importa mencionar.

Existem no Museu muitas e variadas pinturas 'figurativas' xieyi, da autoria de Su Liupeng. Su Liupeng foi um proeminente pintor 'figurativo' de meados do século XIX que teve por tutor o monge De Kun 德坤, do templo de Baoji no Monte Luofu [羅浮山寳積寺]. Artista bastante produtivo e com interesses vastos, representou diversos episódios históricos, cenas e tipos sociais, desde altos dignatários a figuras do povo. As suas pinturas reflectem ainda um especial interesse por temas taoístas, sobre os quais chegou mesmo a escrever diversos livros81.**

O estilo de pintura de Su Liupeng é extremamente complexo. Altamente dotado, foi igualmente capaz de pintar em grandes dimensões ou miniaturas, com uma qualidade refinada e distinta. Sob sua influência, a sua concubina Yu Ling 余菱, e o seu neto Fengsheng 逢聖 foram ambos pintores também qualificados. As pinturas preservadas no Museu Luís de Camões revelam que, entre 1822 e 1858, o seu estilo variou bastante. Por vezes essas variações são óbvias mas, na maioria dos casos, são muito subtis.

De 1822 a 1840 o seu estilo de pintura associa-se ao de Shangguan Zhou 上官周 e ao de De Kun 德坤. O pintor de figuras Shangguan Zhou, fujianense, pintou cento e vinte retratos de oficiais chineses. Em meados do século XVII, quando visitou Guangdong, levou consigo esses retratos. Em 1743 reproduziu-os em forma de livro, o popular Wanxiaotang Huapu82 (晚笑堂畫譜). As figuras desse livro são delineadas com tiesimiao [ 鐵絲描 ] i. e., "traços lembrando apertados fios metálicos". As duas pinturas de Shangguan Zhou pertencentes à colecção do Museu Luís de Camões revelam, no entanto, outros tipos de traços por ele usados: um com início e ponto de viragem fortes, e um final fino mas firme — a forma que caracteriza dingtou shuwei miao [釘頭鼠尾描], que significa "linhas simples, em forma de uma unha e cauda de rato"; a outra, de forma semelhante mas mais enérgica e ritmada, deixando áreas brancas e indefinidas por entre alguns traços. Embora apresentem diferentes estilos na representação dos drapeados, podemos observar idênticas técnicas de pincelada tanto nas pinturas de De Kun, como nas de Su Liupeng. As pregas das figuras de De Kun são normalmente unidas e suaves, enquanto as de Su Liupeng são firmes e mais espaçadas.

De 1840 a 1850, enquanto Su Liupeng continuava a explorar os estilos de Shangguan Zhou e de De Kun, praticando também a pintura com o dedo, começou simultaneamente a interessar-se pela pintura 'figurativa' da dinastia Ming. Su Liupeng tinha obviamente estudado a arte de Tang Yin. Um álbum do Museu, datado de 1845, contém uma pintura que é claramente feita no estilo de Tang Yin, "Figuras no Estilo de Tang Yin" (“倣唐解元意”). Um ano antes, Su tinha produzido uma enorme composição, "Ouvindo o Qin"83 (“ 聽琴圖 ”), uma reminiscência também do estilo de Tang Yin. A composição do rolo "Oferecendo Vinho" (“進酒圖”), datada de 1856; assemelha-se a "Figuras no Estilo de Tang" (“倣唐人人物圖”) de Tang Yin, pertencente à colecção do Palace Museum de Taipé.

Durante este período Su Liupeng imitou também o estilo de Wen Zhengming 文徵明, da Dinastia Ming. No mesmo álbum, uma pintura em forma de leque redondo "Erudito num Pinhal no Estilo de Wen Zhengming" (“ 松林消夏圖 ”), está datada de 1848. Executadas com lanyemiao [ 蘭葉描 ], as pequenas figuras nesta pintura são semelhantes às figuras existentes em certas paisagens de Wen Zhengming84. Dois anos mais tarde, Su criou uma alteração do mesmo traço num belíssimo retrato do grande poeta Tao Yuanming ( 陶淵明像: "Retrato de Tao Yuen Ming").

Aparentemente, antes de ter estudado as pinturas dos mestres da dinastia Ming, Su Liupeng havia já adquirido um conhecimento profundo de pinturas mais recentes.

Depois de 1851 Su Liupeng continuou a pintar em todos os estilos diferentes que tinha previamente aperfeiçoado dando ênfase igual a cada um dos estilos. Estas diversas facetas do estilo de Su Liupeng reflectem os seus superiores poderes de associação e criatividade. Tanto quanto se pode verificar através das suas pinturas na colecção do Museu, as influências de Shangguan Zhou e De Kun são deveras relevantes.

O terceiro tipo de pintura 'figurativa' de Guangdong pertencente à colecção do Museu Luís de Camões está intimamente ligado a algumas pinturas de Hua Yan 華喦 da escola de pintura de Yangchou. Hua Yan (ō1682-†tdepois 1762), pintor e poeta, natural de Fujian, viveu em Yangchou. Em Jiangnan não era considerado particularmente notável como membro da escola de Yangchou mas, em Guangdong, as suas pinturas conquistaram grande admiração85. A pintura 'figurativa' de Hua Yan, normalmente incorporada em elementos paisagísticos tais como algumas árvores e rochedos, é elegante, ténue e tranquila. As figuras, delineadas a tinta, são cuidadosamente desenhadas; pregas e drapeados são representados por escassas linhas. Os traços faciais destas figuras são levemente delineados por finas pinceladas86. De todas estas qualidades, a mais notável, e única, é pobimiao87 [破筆描]— as pinceladas lineares são executadas de modo tão staccato que as linhas resultam interrompidas.

He Zhong 何翀, Cui Qin 崔芹 e Luo Anxian 羅岸先, dos finais da dinastia Qing, seguiram todos o estilo da pintura 'figurativa' de Hua Yan. Existe no Museu uma composição intitulada "Figuras em Paisagem no Estilo de Hua Yan" (“仿華秋岳山水人物”, 1879) pintada por He Zhong, que — à excepção do drapeado mais complicado — é um verdadeiro exemplo do estilo de Hua Yan, quer na composição, quer na técnica. No primeiro plano da pintura as únicas representações são árvores — o motivo principal — e pequenas rochas secundárias. Dois homens idosos conversam animadamente no plano intermédio da cena pictórica, enquanto o plano de fundo revela discretamente a encosta de uma montanha. Esta composição é provavelmente o protótipo de "Figuras numa Cena Primaveril no Estilo de Hua Yan" (“ 擬解弢館春景人物 ”), de Cui Qin, aluno de He Zhong. Cui Qin seguiu rigorosamente a técnica de pintura paisagística do seu professor e, na representação de figuras humanas, a sua imitação pobimiao, de Hua Yan, foi ainda mais admirável. A colecção do Museu contém ainda outras pinturas de Cui Qin semelhantes à composição acima mencionada.

Luo Anxian e He Zhong foram contemporâneos. Pinturas 'figurativas' por Luo Anxian, na colecção do Museu, incluem as acima mencionadas "Aguardando o Nascer da Lua" e uma pintura em forma de leque à maneira de Hua Yan, datada de 1867. Esta composição não é comparavel à técnica de composição de Hua Yan na pintura 'figurativa' e mostra, sobretudo, que Luo Anxian não percebeu o estilo de Hua Yan.

PINTURA DE 'PÁSSAROS-E-FLORES'

Tanto quanto possam mostrar as evidências pictóricas que sobreviveram, as pinturas de 'pássaros-e-flores' de Guangdong têm uma longa história. No Museu Luís de Camões não existem muitos exemplos desta categoria, no entanto a colecção cobre trabalhos que vão desde Lin Liang, 林良, do século XV, até Liu Luanxiang, 劉鸞翔, dos tempos modernos.

Lin Liang foi o criador do estilo 'pássaros-e-flores' em tinta monocromática durante a dinastia Ming. O seu mérito artístico ultrapassou a sua origem provinciana e foi capaz de manter uma importante posição na história da pintura chinesa. O modo de utilizar o pincel é livre e vigoroso e a representação dos pássaros é realista e natural. A composição consegue uma certa beleza no desenho, cheio de variedade.

Em "Pavões" (“孔雀圖”), o corpo e a longa cauda do primeiro pavão formam uma linha diagonal que se une a uma outra linha, arbitrária, definida pelo corpo inclinado do segundo pavão e a silhueta do penedo formando um 'V'. Do cimo do penedo desce um ramo de pinheiro, paralelo à posição do primeiro pavão, destacando a importância do tema. Todos este movimentos diagonais criam uma composição rítmica que se toma graficamente atraente.

Lin Liang foi um mestre do desenho. Os pontos de foco de duas outras composições "Patos numa Margem de Salgueiros" (“蘆岸水禽”) e "Águias na Neve" (“雪鷹圖”) estão colocados no centro da pintura, formando 'composições centralizadas'. "Patos numa Margem de Salgueiros" é dividida longitudinalmente. No lado direito existe um conjunto de canas que crescem da direita para a esquerda enquanto, no lado esquerdo, outro conjunto de canas cresce da esquerda para a direita. Os dois canaviais formam um eixo que separa os dois patos, um de cada lado da imagem. Este método de utilizar um elemento vertical para separar os motivos principais entre os lados direito e esquerdo da composição é repetido no rolo "Águias na Neve". Duas águias, de frente uma para a outra, são separadas pela interposição de uma árvore seca. Em termos de composição, esta é mais simétrica do que "Patos numa Margem de Salgueiros".

As pinturas acima referidas representam aves tranquilas. "Águia Capturando uma Presa" (“鷹攫圖”) é um exemplo da representação que Lin Liang faz de pássaros em acção. Esta pintura, cheia de drama, ilustra o momento trágico em que uma águia captura uma cerceta e levanta voo alto com a vítima. A composição está dividida em duas secções. O quadrante esquerdo superior ilustra a águia a capturar a cerceta. No quadrante direito inferior, a cerceta e outro pássaro, assustados, escondem-se por entre folhas de lótus e salgueiros. Pode ver-se uma diagonal ligando os salgueiros, do canto superior direito, às folhas de lótus e lentilhas de água, do canto inferior esquerdo. Estas linhas dividem a ave triunfante com a presa, na secção superior, do aterrorizado par de animais, na secção inferior. Mais uma vez, outra linha diagonal pode ser formada ligando a águia predadora a um rebento de lótus, junto à cerceta. Esta diagonal serve de ligação entre os quadrantes superior esquerdo e inferior direito. As testemunhas da tragédia, a cerceta e o outro pássaro, observam estáticos e com horror o inimigo e a sua presa. A ligação entre as secções superior e inferior é destacada por estas fortes associações. Estas relações invisíveis e as linhas divisórias contribuem para um maior interesse pictórico, enquanto os salgueiros e o ritmo da água em movimento denotam um ambiente de difícil sobrevivência. Partindo das evidências da sua pintura, Lin Liang não estudou somente a anatomia dos pássaros, mas tentou igualmente dramatizar a situação real das suas vidas, dando por isso mais um contributo à categoria da pintura de 'pássaros-e-flores'88.

Depois de Lin Liang, as mais importantes pinturas de 'pássaros-e-flores' da colecção do Museu, são trabalhos de He Zhong, 何翔, da dinastia Qing. He Zhong, activo nos finais do século XIX, preservou o estilo xieyi que, no sentido mais lato, é a continuação da tradição estabelecida por Lin Liang. He Zhong usou três composições básicas diferentes nas suas pinturas de 'pássaros-e-flores'. A primeira é a combinação de duas linhas principais, vertical e horizontal, que se juntam num ponto, à direita ou à esquerda da pintura. Estas linhas são habitualmente representadas na forma de um tronco de árvore e ramos, nos quais estão pousados alguns pássaros. Raramente existe um cenário de fundo.. O segundo tipo de desenho, dividido sempre entre uma secção superior e outra inferior, é muitas vezes executado em rolo vertical. A composição e os motivos da parte superior assemelham-se ao primeiro tipo mas, a parte inferior, normalmente representando a margem de um rio ou um canto de jardim, é diferente. O terceiro tipo é, habitualmente, uma representação de uma cena limitada de jardim com pouco investimento na profundidade. O estilo de He Zhong foi bastante influente: as pinturas de 'pássaros-e-flores' de um artista posterior, Guan Weixi 關蔚熙, por exemplo, são muito idênticaàs do segundo tipo de composição de He Zhong.

He Zhong foi provavelmente contemporâneo, em finais do século XIX, de dois outros pintores de 'pássaros-e-flores', os irmãos Ju — Ju Chao, 居巢 e Ju Lian, 居廉. No entanto, o estilo dos irmãos Ju deriva da técnica meigu [沒骨; lit.: sem contorno] de Song Guangbao, 宋光寳 e Meng Jinyi, 孟觐乙, de Jiangnan, muito diferente da técnica de He Zhong.

Existe no Museu uma colecção de pinturas de flores por Wu Deyi 伍德彝, que foi aluno de Ju Lian. Julgando no entanto pelo que mostra a sua pintura, o protótipo poderia ter sido definido antes de Ju Lian, pelo menos com Lü Pei 吕培, em princípios do século XIX e talvez, mesmo, por Chen Chun, 陳淳 (ō 1483-†1544), da dinastia Ming. A pintura mostra um vaso de narcisos colocado em frente a um contrastante e sólido jardim de pedra. Por detrás da pedra, alguns ramos de bambú sugerem a dimensão de profundidade. Esta composição é quase exactamente a mesma que "Os Três Amigos" (“三友圖”), de Lü Pei89 吕培, mas provavelmente derivada de Chen Chun90. Criado em finais do século XV, o desenho foi popular na dinastia Ming e nos primórdios da dinastia Qing, tornando-se gradualmente um padrão. Wang Guxiang, 王轂詳 (ō 1501-†1568), Chen Jiayan 陳嘉言 (finais do século XVI) e Wang Wu 王武 (ō1632-†1690), pintaram idênticas composições91. Em finais do século XIX, este tipo de composição ainda era preservado embora apenas em Guangdong.

Um dos aspectos importantes da pintura de Guangdong é o da preservação dos estilos clássicos, quando a corrente contemporânea no resto da China tende a abandoná-los. Nas pinturas 'paisagistas', os artistas de Guangdong perpetuaram o estilo azul e verde num período em que as paisagens monocromáticas predominavam em toda a China. Um outro exemplo da conservação de estilos antigos é o da técnica especial em pinturas de 'pássaros-e-flores', denominada shuanggou [ 雙鉤 ], que consistia em contornar os elementos pictóricos representados em franca oposição à técnica meigu, mais popular. Na colecção do Museu este tratamento especial do bambú shuanggou pode ser notavelmente observado em "Bambús e Pássaro" (“ 竹雀圖 ”) pintado por Liu Luanxiang, 劉鸞翔, em finais do século XIX princípios do século XX. Os primeiros pintores de Guangdong, tais como Jiang Lian 92, Su Liupeng e He Zhong, também pintaram deste modo o bambú. A técnica foi introduzida na dinastia Song. Zhang Xun 張遜, da dinastia Yuan e Xia Chang 夏昶, da dinastia Ming, praticaram ambos esta técnica mas, a partir da dinastia Qing, tomou-se quase uma arte perdida. Apenas alguns membros da escola de Yangchou, tais como Jin Nong93 金農, Luo Pin 羅聘 e Hua Yan 華喦, continuaram a privilegiar a técnica shuanggou94. Estes pintores, ou os seus pupilos, eram bem conhecidos em Guangdong e foi possivelmente através deles que a técnica clássica se transmitiu a Guangdong, onde foi mantida e perpetuada.

CONCLUSÃO

Apesar de Lingnanhua Zhenglue conter biografias de várias centenas de pintores de Guangdong, apenas pouco mais de uma centena de conjuntos de datas de nascimento e morte destes artistas está listada no suplemento, enquanto períodos activos de muitos artistas importantes continuam incertos. As pinturas datadas da colecção do Museu poderiam servir de grande auxílio para estudiosos, não só como evidências primárias para a compreensão do desenvolvimento individual de cada artista mas, também, como linha orientadora para a realização dos seus registos biográficos.

Estas peças datadas revelam ainda que as pinturas da colecção do Museu são maioritariamente obras de artistas de Guangdong. Em particular as pinturas de Li Jian, Jiang Lian, Su Liupeng, Li Kui e He Zhong, por se tratarem de valores preciosos para qualquer pesquisa sobre as suas vidas e obras.

Deveria também ser levada a cabo mais investigação sobre a transmissão e adaptação dos estilos de Jiangnan, em Guangdong, durante a dinastia Qing. As perfeituras de Panyu, Shunde e Nanhai foram centros artísticos em Guangdong. A colecção do Museu oferece provas significativas de que a zona em que se inserem estas três prefeituras foi particularmente uma importante zona de reprodução e aperfeiçoamento dos estilos de Jiangnan e que foi a partir deste centro que os estilos se espalharam à restante província de Guangdong. Pintores de Jiangnan que visitaram a região ou nela se estabeleceram, tais como Du Heng e Wang Pu, de Jiangsu, o monge De Kun, de Jiangxi, Shangguan Zhou, de Fujian e Song Guangbao e Meng Jinyi, de Jiangnan, acabariam por influenciar outros pintores da área de Guangdong, quando os seus trabalhos eram procurados por coleccionadores de Guangdong.

A pintura de Guangdong da dinastia Qing pode, de um modo geral, ser dividida em duas correntes evolutivas principais 95. Pintores conservadores, no entanto dotados e letrados, cujos trabalhos se caracterizam por traços de pincel correctos e precisos e um sentido requintado da cor e do desenho, aproximam-se do estilo de pintura tradicional de outras partes da China. Li Jian, Xie Lansheng e Liang Yuwei, foram pintores paisagísticos representativos dessa corrente mais conservadora. As elegantes figuras nas pinturas de Du Heng, Wang Pu e Jiang Lian, bem como os estudos monocromáticos de 'pássaros-e-flores' de Zhang Jinfang, Lü Xiang e Huang Danshu, e as pinturas no estilo meigu dos irmãos Ju, devem todas ser incluídas nesta tradição.

Simultaneamente, outros pintores desenvolviam um estilo de Guangdong diferente, cheio de vitalidade e cores locais. As composições livres e destemidas deste grupo contêm a variedade e a excentricidade que não existem na escola mais tradicional. Este grupo está particularmente bem representado na colecção do Museu com trabalhos de Su Liupeng, De Kun, Su Renshan, Li Kui, He Zhong, Cui Qin e Luo Anxian. A colecção será também de um auxílio incalculável para quaisquer estudos de investigação sobre este estilo ecléctico.

Tradução do original inglês de Raquel Carmona;

transcrição em pinyin da romanização original

por Zeng Yongxiu; revisão de texto

de Joaquim Leal.

[Sou-Lôk-P'âng] Su Liupeng 蘇六朋

*Texto publicado: Helen Ho Chan & Chuang Chan, A Catalogue of Chinese Paitings in Museum Luis de Camoes, Macau, HK, Univ. Hong Kong, 1977, pp.7-25.

**SU LIUPENG 蘇六朋 (meados do séc. 19) - também conhecido por CHEN Qin 枕琴 [zi] e ZEN Daoren 怎道人 [hao], natural de Shunde (順德), celebrizou-se não só como pintor "figurativo" mas, também, como "paisagista". Interessaram-lhe principalmente os temas específicos das modalidades clássicas da pintura chinesa. Foi discípulo do Monge De Kun e, ocasionalmente, seguiu o estilo de Tang Yin e Huang Shen. SU Liupeng é ainda autor de "pinturas com os dedos" de grandes dimensões.

NOTAS

1XIAN, Yuqing 冼玉眷, "Guangdong Zhi Jianshangjia" « 廣東之鑒賞家 » in Guangdong Wenwu Zhanlanhui [ 廣東文物展覽會 ], ed., "Guangdong Wenwu"«廣東文物», Hong Kong, Zhongguo Wenhua Xin Cihui 中國文化新詞匯, 1941, chuan 10, parte 3, pp. 982-997.

2Ibidem.

Xian Yuqing registou, no seu artigo, cinquenta e nove coleccionadores de Guangdong. Ver: WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Lingnanhua Zhenglue « 嶺南畫徵略» + Liangnanhua Zhenglue Bukao, Hong Kong, Commercial Press, 1961 [Edição revista] — Onde o autor lista mais doze autores.

Ao todo conhecem-se setenta e um coleccionadores de arte de Guangdong dos períodos Ming e Qing.

3WU Rongguang 吳榮光, CH'I-yuan, ed., Xinchou Xiaoxia Ji «辛丑銷夏記», 5 chuan, 1905; YE Menglong 葉夢龍, RONG Geng 榮庚, cópia manuscrita, Fengmanlou Shuhualu, 4 chuan, 1952; PAN Zhengwei 潘正緯, Meishu Congshu, ed., Tingfenglou Shuhuaji «聽風樓書畫記» 5 chuan, + Tingfenglou Shuhuaji Bukao, 2 chuan, vol.4, ser.7, 1947; KONG Guangtao 孔廣陶, San-shih-yu-san-wan-chuan-t'ang, ed., Yuexuelou Shuhualu «嶽雪樓書畫錄», 5 chuan, 1889; KANG Youwei 康有為, Wanmu Caotang Cangshuamu « 萬木草堂藏畫目», Xangai, Changxing shudian, 1918; LIANG Tingnan 梁廷楠, Tenghuating Shuhuaba « 藤花亭書畫跋», 4 chuan, [publicado por] Gu Delong Shi Zhongheyuan顧德龍氏中和園 [baseado na edição de Mingchenglou Congshu], [s. d.].

4ZHUANG Shen 莊申, Lun Shijiu Shiji Guangdong Shoucangjia suo Cang Zhi Guangdong Huihua «論十九世紀廣東收藏家所藏廣東繪畫 », in "Mingbao Yuekan" « 明報月刊 », (93) 1973, pp.34-35.

5WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Lingnanhua Zhenglue «嶺南畫徵略», op. cit. — Para pinturas de Lin Liang 林良, Wang Houlai 汪後来, Zhang Mu 張穆, Li Minhuai 黎民懐, Liu Jian 劉鑑, Huo Tao 霍韜, Hai Rui 海瑞, Li Suiqiu 黎遂球, Chang Jiayu 張家玉, Xue Shiheng 薛始亨, Chen Xuequan 陳學佺, Peng Ruiguan 彭睿瓘, Gao Yan 高儼, He Chengheng 何澄亨 , da dinastia Ming; Wu Wei 吳韋, Gao Tianchong 甘天竉, Zhang Ruzhi 張如芝, Huang Peifang 黃培芳, Huang Danshu 黃丹書, He Shen 何深, Mu De Kun 穆德堃, Xie Lansheng 謝蘭生, Mu Xiangrun 穆相潤, Lü Pei 吕培, Zhao Ziyong 招子庸, Huang Lezhi黃樂之, Liang Guoqi 梁國琦, Deng Tao 鄧濤, e Wu Dan 吳旦 da dinastia Qing.

6WANG Zhaoyong 汪净鏞, Lingnanhua Zhenglue «嶺南畫徵略», op. cit., vol. 5, p.8.

7KANG Youwei 康有為, op. cit.; — Ver o capítulo sobre pinturas da dinastia Qing.

8Idem.

9ZHUANG Shen 莊申, Some Observations on Guandong Painting [廣東歷代名家繪畫], City Museum & Art Gallery, Hong Kong, 1973, p.9.

10Caiyuan Bingsou [菜園病叟] in "Xutan Erjiao Shanren Huishi" [ 續談二樵山人繪事 ], Yilin Conglu, 藝林叢錄, vol. III, Commercial Press, Hong Kong, 1962, p.64.

11WANG Zhaoyong, op. cit..

12JIAN Youwen, 簡又文, " Guangdong Shuhua Qiancangji [廣東書畫鑑藏記]" (parte I), in "Guangdong Wenxian Jikan" “廣東文獻季刊” parte 2, n°4,1972, p. ll.

13Guangdong Wenwu Zhanlanhui [ 廣東文物展覽會], ed., Zhongguo Wenhua Xin Cihui «中國文化新詞匯 », in "Guangdong wenwu" «廣東文物», Hong Kong,1941.

14HU Shih, KAO Weng PRIEST, Alan, An Exhibition of Paintings by Kao Weng and Chang K' un-i, New York, The Metropolitan Museum of Art, 1944 — [Catálogo de pinturas de dois expoentes da escola de pintura de Lingnan].

15Aqueles que não estão registados no Lingnanhua Zhenglue «嶺南畫徵略» são, maioritariamente, pintores modernos.

16ZHUANG Shen 莊申, Some Observations on Guangdong Painting, op. cit., pp. 10-12.

17Li Jian 李簡 é tido como um expoente da pintura de Guangdong da dinastia Qing. Ver: LI Zhujin 李鑄晉, Landscape Painting in Guangdong During Ming and Ch'ing, in"Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch'ing Periods", [Exhibition Catalogue], Hong Kong, Institute of Chinese Studies/Chinese University of Hong Kong, 1973.

18SU Wenzhuo 蘇文擢, Li Jian Xiansheng Nianpu «黎簡先生年譜>>, Hong Kong, Chinese University of Hong Kong, 1973.

19WANG Zhaoyong 汪兆鏞, op. cit., Lingnanhua Zhenglue «嶺南畫徵略>>, chuan 5, p.3 — Biografia de Li Jian.

20XIE Lansheng 謝蘭生, Changxingxingzhai Shuhua Tiba «常惺惺齊書畫題跋>>, [último volume], p. 51-b.

21Uma das pinturas datadas é do décimo sétimo ano do reinado de Jiaqing (1812), quando Li Jian já havia falecido; sendo assim é bastante duvidosa a atribuição desta pintura.

22Uma das sete pinturas é no estilo de Huanghe Shanqiao (Wang Meng) 黃鶴山樵(王蒙). São muito raras as pinturas de Li Jian no estilo desse mestre. Mesmo o o Jian Xianshen Nianpu «黎簡先生年譜>> só regista uma dessas pinturas. Uma vez que a data inscrita na pintura foi posteriormente feita, seria necessária maior investigação para estabelecer a sua autenticidade.

Ver: SU Wenzhuo 苏文擢, op. cit., p. 124.

23Ibidem, p.65.

24Os poemas de Li Jian 李簡 sobre as capocas, escritos em 1782 e 1784, são apenas dois dos muitos exemplos das suas descrições literárias sobre esta árvore.

Ver: LI Jian 李簡, CH'EN-shih, ed. rev., Wubaisifengtang Shichao «五百四峰堂詩鈔>>, Guangdong, Ju-ya-t'ang, 1874, chuan 12, p.21-b, chuan 14, p.6-b.

25Em 1782 Li Jian pintou "Montanhas Verdes e Capoca Vermelha" ( “碧嶂红棉圖”) para Zhao Xihuang 趙希璜, como presente de despedida por ocasião do seu regresso a Huizhou. Num colofão a um poema inscrito nessa pintura, Li Jian escreveu:

"Por diversas vezes me tem sido pedido, por muitas pessoas de outras províncias, que pinte. Frequentemente lhes apresento a pintura "Montanhas Verdes e Capoca Vermelha". Nos últimos cinco anos dezenas de pinturas com este motivo têm atravessado as fronteiras de Guangdong."

Ver: LI Jian 李簡, op. cit., chuan 12, p.23.

26XIE Lansheng 謝蘭生, op. cit., chuan 1, p.33-b.

27Li Jian 李簡 pintou uma "Montanhas Verdes e Capoca Vermelha" para Lu Guanfu 陸貫夫, de Wuxian [吳縣]. No ano seguinte voltou a pintar outra para Zhao Xihuang 趙希璜, de Changning [常寜].

Ver: SU Wenzhuo 蘇文擢, op. cit., pp. 42,46.

28WEN Zhaotong 溫肇桐, Yuanji Sida Huajia « 元季四大畫家», Hong Kong, 1960, p.22.

29WEN Zhengming 文徵明 da Escola Wu, da dinastia Ming, interessava-se por este desenho.

Ver: SIREN, Osvald, Chinese Painting: Leading Masters and Principles, London - NewYork, 1956 - 1958, vol.4, ils. 205, 207, 209.

30SHEN Zhou 沈周, "Vista Ribeirinha com um Tocador de Qin" (“ 彈琴招月圓 ”), Abe Collection, Osaka Museum.

Ver: SIREN, Osvald, op. cit., vol.4, pp. 158-159; vol.6, plate[il.]183.

31SU Wenzhuo 蘇文擢, op. cit., p.131.

Ver: Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch 'ing Periods, [Exhibition Catalogue], Hong Kong, Institute of Chinese Studies/ Chinese University ofHong Kong, 1973, plate [il.]48 — Para uma ilustração desta pintura.

32Ibidem, p.101.

33BARNHART, Richard, Marriage of the Lord of the River, in "Artibus Asiae Supplementum", Ascona, (XXVII) 1970, p.37.

34Ibidem, p.20.

35Um exemplo é "Viajantes num Trilho de Montanha" (“谿山行旅圖”), por Fan Kuan 范寛, actualmente preservado no National Palace Museum, Taibei, Ver: SIREN, Osvald, op. cit., vol.3, plate [il.] 154; Editorial Committee of the Joint Board of Directors, National Palace Museum e National Central Museum, ed., Three Hundred Masterpieces of Chinese Painting in the Palace Museum, Taichung, National Palace Museum - National Central Museum, 1959, vol. 2, plate [il.]64.

36BARNHART, Richard, op. cit., pp.22-37.

37Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch'ing Periods, op. cit., plate [il.]41.

38Este rolo horizontal esteve na colecção de Ye Menglong 葉夢龍. Ver: YE Menglong 葉夢龍, RONG Geng 榮庚, [cópia manuscrita], op. cit., chuan 3, p.56; SU Wenzhuo 蘇文擢, op. cit., p.96.

39ZHUANG Shen 莊申, Yueji Shoucangjia zhi Cangpin Yu Qingchu Geren Zhuyi Huapai zhi Guanxi «粵籍收藏家之藏品與清初個人主義畫汳之關» [manuscrito].

40Li Jian poderá ter feito esta composição depois de algumas dúbias pinturas por Dong Yuan 董源. "Cópia Livre da "Montanha Nebulosa" por Dong Yuan" é eventualmente, uma cópia de tais paisagens.

Ver: Zhina Nanhua Dacheng «支那南畫大成», Tokyo, Kobunsha, 1936-1937, chuan 9, il.8.

41Guangdong Mingjia Huaji « 廣東名家畫集», Guangdong, Zhongguo Meishujia Xiehui Guangdong Fenhui, 1961, il.39.

42LI Zhujin 李鑄晉, op. cit..

43SHI Tao 石濤, ZHU Jihai 朱季海, anot., Shi Tao Huapu «石濤畫譜», Zhonghua Shuju Xianggang Fenju 中華書局香港分局, 1973, p.49.

44ZHENG Zhuolu 鄭拙盧, Shi Tao yanjiu « 石濤研究», Beijing, Renmin Meishu Chubanshe, 1961, pp.56,63.

45Em 1781, Zhang Jinfang 張錦芳 dizia, num poema escrito para Li Jian, que o trabalho de pincel de Li estava próximo do de Shi Tao.

Ver: SU Wenzhuo 蘇文擢, op. cit., p.41.

46ZHENG Zhuolu 鄭拙盧, op. cit., p.65.

47Li Jian, álbum de paisagens, em papel, com doze folhas. Ver: PAN Zhengwei 潘正緯, Meishu Congshu, ed., Tingfenglou Shuhuaji Bukao, op. cit., chuan 2, p.65.

48WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Lingnanhua Zhenglue « 嶺南畫微略», op. cit., chuan 6, p.18 — Biografia de Lü Xiang 吕翔.

49ZHUANG Shen 莊申, Yueji Shoucangjia [...], op. cit.

50WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Liangnanhua Zhenglue Bukao, op. cit., p.17 — Biografia de Ming Binglin明炳麟.

51Guangdong Wenwu Zhanlanhui [廣東文物展覽會], ed., op. cit., chuan 1, parte.3, pp.12-19.

52LI Fanfu 李凡夫, Qingmo Huaren Li Doushan « 清末畫人李斗山», in "Yilin Conglu" « 藝林叢錄 », Hong Kong, Commercial Press, 1961, vl.3, pp.83-84.

53Guangdong Mingjia Shuhua Xuanji «廣東名家書画選集», Hong Kong, 1959, p.48 — Li Kui 李魁, "Paisagem", rolo vertical.

54Li Kui é apontado como um dos pintores paisagísticos mais representativos do seu tempo.

Ver: LI Zhujin 李鑄晉, op. cit.

55LI Fanfu 李凡夫, op. cit.

56Existe uma referência de que ele teria falecido aos setenta anos de idade mas, uma outra, refere que ele ainda pintava aos oitenta e oito anos.

"Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros" (松陰草盧), na colecção do Museu Luís de Camões, está datada de 1832. Além desta, existem ainda duas outras pinturas 'paisagistas' da autoria de Li Kui, datadas de 1871 e 1899, respectivamente. De 1832 a 1899 vai um período de sessenta e sete anos. Se Li Kui viveu de facto até aos oitenta e oito anos, o período entre 1832 e 1899 seria considerado o seu período mais activo.

Ver: LI Fanfu 李凡夫, op. cit., p.84; WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Lingnanhua Zhenglue «嶺南畫徵略», op. cit., chuan 10 — Biografia de Li Kui.

57Os trabalhos de Li Kui executados após perfazer cinquenta e cinco anos de idade estão habitualmente assinados "Doushan Laoren" 斗山老人.

Ver: LI Fanfu 李凡夫, op. cit.

58Calcula-se que o ano cíclico bingwu [丙午], desta pintura, seja 1906. No entanto, novas investigações sobre Li Kui mostram que será provavelmente necessário rever esta questão. De acordo com o que já se disse, os seus trabalhos mais antigos têm a assinatura de "Doushan Laoren" 斗山老人, mas "Contemplando a Queda de Água" (觀瀑圖) tem a assinatura de Li Kui e selos de "Doushan Shanren" e de "Gangzhou Huaren" (岡州畫人). Em segundo lugar, supondo que "Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros", datado de 1832, é o trabalho mais antigo do artista e que "Contemplando a Queda de Água", de 1906, é o seu último trabalho, o período de tempo que os separa é de setenta e quatro anos; e se Li Kui viveu até aos oitenta e oito anos de idade, então "Telheiro de Colmo sob Frondosos Pinheiros" seria o trabalho de um Li Kui com catorze anos de idade. Seria necessária investigação mais profunda para provar que um rapaz com a idade de catorze anos seria capaz de produzir uma pintura com a excelente qualidade desta. Em terceiro lugar, existe uma miniatura de uma "Paisagem" de Li Kui (pintada em metade de um leque circular) para Tan Yuan e reproduzida em Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch'ing Periods. Estilisticamente, a textura dos traços desta "Paisagem" parece-se com o grande rochedo que emerge da água em "Contemplando a Queda de Água". Embora não datada, a outra metade do leque tem uma inscrição, dedicada à mesma pessoa, mas da autoria de Xiong Jingxing 熊景星, falecido em 1856. A pintura 'paisagista' de Li Kui pintada no mesmo leque deverá ter sido pintada antes dessa data. Dado que o estilo de "Contemplando a Queda de Água" é tão próximo do desta paisagem, terá provavelmente sido pintada pela mesma altura. Assim, a data de "Contemplando a Queda de Água" não deverá ser mais tardia que 1856 e o ano cíclico bingwu poderia ser igualmente o vigésimo sexto ano do reinado de Daoguang 道光 (1846).

Ver: Guangdong Painting [Exhibition Catalogue], op. cit., plate [il.]80, p.134; Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch 'ing Periods, op. cit., plate [il.]119.

59Ibidem, plate [il.] 117 — Para uma inscrição de Li Kui na sua "Paisagem no Estilo de Ni Zan"

60Ibidem, ils.117-125.

61ZHENG Ji 鄭績, YU An-lan, Hualu Congkan, ed., Menghuanju Huaxue Jianming «夢幻居畫學簡明», Beijing, Renmin Meishu Chubanshe, 1962, vol.2, chuan 1, "Lunjing Pian".

62Landscape Paintings by Guangdong Masters During the Ming and Ch'ing Periods, op. cit., plate [il.]109.

63ZHENG Ji 鄭績, op. cit., chuan 1, "Lunyi Pian" « 論意篇 ».

64Ibidem, chuan 1, "Lunquan Pian" « 論泉篇 ».

65Ibidem, chuan 1, "Lunyi Pian" « 論意篇 ».

66Ibidem, chuan 1, "Lunji Pian" « 論忌篇 ».

67Ver nota n° 59.

68ZHENG Ji 鄭績, op. cit., chuan 1, Shanshui Zonglun Pian « 山水總論篇».

69WANG Zhaoyong 汪兆鏞, Lingnanhua Zhenglue « 嶺南畫徵略 », op. cit., chuan 10 — Biografia de Li Kui.

70ZHUANG Shen 莊申. Yueji Shoucangjia [...], op. cit.

71TAM, Laurence C. S., An Introduction to the Development of Guangdong Painting, in "Guangdong Painting" [Exhibition Catalogue], Hong Kong, City Museum & Art Gallery, 1973, pp.40-43.

72Esta pintura encontra-se actualmente na colecção do Museu Histórico de Beijing.

Ver: SIREN, Osvald, op. cit., vol.3, plate [il.]1.

73Ibidem, vol.6, plate [il.]231 — Tang Yin 唐寅, "Rougui Chang'e tu" “肉桂嫦娥圖”.

Ver: Editorial Committee of the Joint Board of Directors, National Palace Museum e National Central Museum, ed., Three Hundred Masterpieces of Chinese Painting in the Palace Museum, op. cit., vol.5, plate [il.]233 — Tang Yin 唐寅, "Figuras no Estilo Tang" “ 仿唐人人物圖”.

74HUANG Yongquan 黃湧泉, Fei Danxu «費丹旭», in "Zhongguo Huajia Congshu" « 中國畫家叢書», Xangai, Renmin Meishu chubanshe, 1962, p.20.

75SIREN, Osvald, op. cit., vol.3, plate [il.]251.

76Wu Rongguang 吳榮光 comprou "Colhendo Fetos" “採薇圖 ”, por Li Tang 李唐, em 1810.

WU Rongguang, op. cit., chuan 2, pp.15-19b.

77ZHUANG Shen 莊申, Luelun Wu Rongguang yu Guangdong Huajia de Guanxi «略論吳榮光與廣東畫家的關係», in "Dalu Zazhi" «大陸雜誌», chuan 47, n°. 5, Taibei, 1973, pp.8-14.

78XIE Lansheng 謝蘭生, op. cit., chuan 2, p.41-b.

79LI Lüan 李履庵, Lanxi Huaren Xiaozhuan « 欖溪畫人小傳», in Guangdong wenwu zhanlanhui 廣東文物展覽, ed., "Guangdong Wenwu" «廣東文物», op. cit., chuan 8, p.57 — Biografia de Jiang Lian 蔣蓮.

80De acordo com a inscrição do artista, "Figuras sob uma Árvore" (懈下人物) foi pintada no estúdio Yutong.

81ZHOU Chaohuai 周朝槐 et al, ed., Shundexian Xuzhi «順德縣續志», 24 chuan, 1929, chuan 20, p.17 — Biografia de Su Liupeng 蘇六朋.

82SHANGGUAN Zhou 上官周, Wangxiaotang Huazhuan «晚笑堂畫傳», Beijing, Renmin Meishu Chubanshe, 1959.

83Guangdong Painting [Exhibition Catalogue], op. cit., plate [il.] 102.

84SIREN, Osvald, op. cit., vol.6, plate [il.]207— Wen Zhengming 文徵明, "Árvore Luxuriante e Claras Primaveras" “ 茂松清泉”.

Ver: BARNHART, Richard, WAN Chi-wu et al, ed., Survivals, Revivals and the Classical Tradition of Chinese Figure Painting, in INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON CHINESE PAINTING - [Proceedings of the...], Taibei, National Palace Museum, 1970, p. 179 — Para uma breve reflexão sobre o estilo 'figurativo' de Wen Zhengming 文徵明.

85ZHUANG Shen 莊申, Some Observations on Guangdong Painting, op. cit., p. 12.

86HUA Xinluo 華新羅, Renwu Shanshui Huace «人物山水畫冊», Zhonghua Shuju 中華書局, 1933.

87Lin Shu 林紓, um companheiro conterrâneo de Hua Yan, descreveu assim esta pintura 'figurativa': "Nas suas paisagens "Xinluo Shanren" “新羅山人”gostava de representar figuras humanas no estilo pobi [破筆]. A delineação parece demasiado grosseira, como se ele não pudesse manipular o pincel. Apesar de tudo, depois de uma detalhada observação, as caracterizações mostram ser naturais."

88Lin Liang 林良, "Uma Águia Caçando Uma Ave" (秋鷹圖), National Palace Museum, Taibei, é semelhante a "Águia Capturando Uma Presa" 鷹攫圖.

89Guangdong Painting [Exhibition Catalogue], op. cit., plate[il.]18.

90Zhina Nanhua Dacheng «支那南畫大成», vol.3, p.232 — Chen Chun 陳淳, "Narcisos" “水仙圖”.

91Ibidem, p.36, 242 — Respectivamente: Wang Guxiang 王轂詳, "Narcisos" (“ 水仙圖 ”); e Chen Jiayan 陳嘉言, "Narcisos" (“ 水仙圖 ”). SIREN Osvald, op. cit., vol., plate [il.] 446-b — Wang Wu 王武, "Arbusto em Flôr e Narcisos Junto a um Jardim de Pedras" (“水仙、南天竹圖”).

92Guangdong Minghuajia Xuanji, il.49 — Jiang Lian 蔣蓮, "Bodhidharma" “達摩圖”.

93Shina Nanga Taisei, vol.1, p. 178 — Jin Nong 金農, "Bambú e Rocha “竹石圖”(1746).

94ZHUANG Shen 莊申, Luo Pin yu qi Guiqutu « 羅聘與其鬼趣圖», in "The Bulletin of The Institute of History and Philology", Taiwan, Academia Sinica, 44 (part3) 1972, p405-n —Acerca de Luo Pin 羅聘; Hua Xinluo Huaniaoce « 華新羅花鳥冊», Xangai, Wenming Shuchu po-li-pan-pu chih-pan, 1952, il.3 — Para a pintura de Hua Yan.

95TAM, Laurence C. S. 譚志成, op. cit., p.44.

desde a p. 227
até a p.