Crónica Macaense

COMO VI LUÍS GONZAGA GOMES

Túlio Tomás

Luís Gonzaga Gomes. Arquivo Histórico de Macau.

Luís Gonzaga Gomes é um dos raros exemplos de pes--soas que dedicam toda a sua actividade, desinteressada-mente, a cultivarem-se a si próprios, e a procurarem repartir com os outros as suas próprias experiências culturais, sem reservas de qualquer espécie. Ele era, por exemplo, um melómano, e entendeu fazer em Macau, pacientemente, que se criasse um ambiente propício, e até entusiasta, de receptividade às grandes criações musicais, e gastou muitas horas, tiradas ao seu descanso e aos seus trabalhos literários para, através dos microfones da rádio local, elaborar e comentar programas de música de concerto. Foi um expoente autêntico da cultura de raiz macaense, e foi a sua terra a grande inspiradora dos seus escritos. Foi pedagogo: iniciou a sua carreira ensinando em escolas, mas o seu magistério nunca mais terminou, mesmo quando ele passou a desempenhar funções que o afastaram da presença de classes organizadas, em bancos de escola. Podiam ser seus discípulos todos os que dele se quisessem aproximar e escutar o muito que tinha para transmitir, e de que, de modo algum, era avaro.

Era, aparentemente, um homem concentrado e de poucas falas: pensava muito mais do que falava. Mas quando confiava no interlocutor e o sentia receptivo, abria as comportas do seu pensamento, e era um prazer escutá-lo. Observador finíssimo, sabia perfeitamente distinguir a mediocridade ou a vulgaridade do pensamento honesto dos outros. Nunca senti que ele abusasse da sua superioridade intelectual ou dos seus vastos conhecimentos para diminuir os outros; pelo contrário, quando lhes sentia as fraquezas, desde que estas se apresentassem com simplicidade, e sem a arrogância dos medíocres que querem fazer-se valer, apagava-se e usava um tom de conversa que servisse a ambossem cair no comezinho. Com ele, havia sempre assunto de conversa; ele era capaz de tirar do nada assunto para um agradável bate-papo.

Lembro-me, com saudade, das muitas vezes que o encontrei, quase pelo fim da tarde, vinha ele de casa para o seu gabinete de trabalho, no segundo andar do edifício Sir Robert Ho Tung, onde instalara a sede do Círculo de Cultura Musical, a cuja delegação de Macau presidiu durante alguns anos. Por acaso, o ponto de encontro era quase sempre o mesmo: em frente da Associação Comercial. Abrigá-vamo-nos do sol ou da chuva sob o ressalto protector do edifício da C. E. M. e conversávamos, às vezes por mais de uma hora, que a mim parecia escassos minutos. Ali me confiou ele muito do que pensava acerca de manifestações culturais verdadeiras, falsas e flutuantes, como as costelas, e fazia-o com uma finura de observação e de expressão verdadeiramente modelares. Mesmo nas suas mais íntimas confidências sobre o que pensava a respeito de pessoas nunca era rude, mesmo que as pessoas não lhe mereces--sem muita consideração: entendia que havia no mundo lugar para todos, e sem problemas, desde que cada um se pusesse no seu. Não fazia alarde da sua obra nem dos seus trabalhos nos lugares que ocupava: satisfazia-se com a consciência de ter feito algo de útil aos outros. Nunca o senti "movido de prémio vil", nem era frequentador de meios onde se fizessem ou desfizessem reputações -- que os há em toda a parte. Também nunca o vi à busca de publicidade, que o seu valor, aliás, merecia. Alguns recém-vindos a Macau ouviam falar de Luís Gomes como de um mito, mas nem todos o procuravam para conhecerem o homem que, realmente, vivia para a Cultura, muito antes que esta tivesse caído à rua, e misturado com uma ganga que nada tem a ver com ela, mas que muitos guardam como se fossem autênticas pepitas.

Luís Gonzaga Gomes dirigiu uma instituição cultural de Macau que, embora modesta de recursos e, por isso, limitada na sua actuação, pode considerar-se predecessora do hoje já notável Instituto Cultural de Macau. Foi o Instituto Luís de Camões, ao qual deu todo o seu amor de homem culto e de investigador, cuja actividade mais perene foi a publicação de um "Boletim", cuja colecção é um precioso repositório cultural e que teve colaboração de importantes vultos da cultura internacional que nela deixaram valiosos trabalhos. Movendo-se num gabinete modestíssimo e dependências ainda mais modestas, no edifício Sir Robert Ho Tung, pôde, no isolamento que prezava, e com paciência de oriental, consumar uma obra que interes--sou altos espíritos da cultura internacional, os quais ligavam gostosamente os seus nomes ao nome grande do patrono. Numa altura em que alguns recém-vindos acusavam Macau de ser um deserto cultural (no que eles também seriam responsáveis pelo pouco interesse - a não ser da boca para fora - que a cultura lhes merecia) havia, se mais não houvesse, uma publicação cultural de categoria em qualquer parte do mundo. E para lhe manter o nível. Luís Gomes cor-respondia-se com gente grande do mundo cultural, e talvez fosse, até, mais conhecido em meios internacionais do que na sua própria terra, não porque esta o não prezasse ou não conhecesse a sua envergadura mental, mas porque a sua própria modéstia, isolamento e espírito sobretudo de estudioso, o afastavam das multidões e o faziam desinteressar-se da publicidade do seu próprio nome e feitos culturais.

Havia em Lisboa, no tempo dele, duas instituições notáveis para divulgação de boa música: o Círculo de Cultura Musical e a Sociedade de Concertos. Ambas contavam, nos seus corpos directivos, com pessoas de alto gabarito social e intelectual. Estavam abertas a toda a gente, e eram verdadeiramente democráticas: por quantias que, mesmo valorizadas ao nível inflacionário de hoje, seriam insignificantes, podiam ouvir-se artistas como Backhaus, Gieseking e Rubinstein, no piano; Suggia, no violoncelo; Thibaud, no violino; Elisabeth Schwarzkopf e Victoria de Los Angeles (foi em Lisboa que ela iniciou a sua triunfal carreira) no canto. Cito meia dúzia dos que mais me impressionaram (não posso esquecer o grande pianista Alfred Cortot, já muito velho e esborrachando notas ao piano, mas que ainda tirava do instrumento sonoridades que não voltei a ouvir), mas a lista de celebridades que as duas Instituições trouxeram a Portugal é vastíssima. E, mais ainda, havia delegações em cidades da província e do Ultramar, de modo que muitos desses artistas, quando não tinham outros compromissos que os obrigassem a partir depressa, eram ouvidos por auditórios afastados dos locais onde vai toda a gente. Tudo isso acabou, infelizmente, por circunstâncias variadas, entre as quais o envelhecimento e cansaço de alguns dirigentes carismáticos e as dificuldades de contratação de grandes executantes, que começaram a exigir cachets incomportáveis. Foi um período verdadeiramente notável de política cultural que se perdeu, e seria impos--sível reconstituir hoje, quando a Cultura se tomou um bem de consumo que desceu ao nível das máquinas de lavar e de outros electrodomésticos equivalentes - até descer a dar, como prémios, "magníficos" automóveis.

Em Macau, onde havia uma delegação do Círculo, e devido a razões económicas, só passavam artistas de primeiro plano quando tinham contrato para Hong-Kong, e a viagem a Macau era apenas um salto. Mesmo assim, os concertos eram invariavelmente honrados com a presença dos governadores, e eram um agradável local de encontro de pessoas de diferentes camadas sociais (a inscrição no Círculo era, como em Portugal, muito acessível, e cumpria-se um útil preceito de igualização social através do interesse comum por uma manifestação cultural. Nos intervalos, e até à saída, tal como em Lisboa, convivia-se, trocavam-se impressões, emitiam-se opiniões, empíricas ou fundamentadas, e todos saíam contentes. Luís Gomes era sempre dos presentes, fazendo os seus comentários, comunicando com todos (bons tempos em que todos se conheciam em Macau!), mas isso era, para ele, só a primeira parte da noite. No alto do edifício Sir Robert Ho Tung havia uma ceia preparada para os artistas, e um convívio, para o qual Luís Gomes convidava um ou outro amigo. Tive o privilégio de ser convidado várias vezes para estes encontros, e conservo deles uma duradoura recordação. A ceia era muito íntima, informal, despretensiosa. Luís Gomes, que se obrigava a uma dieta rigorosíssima, comia o estritamente necessário para acompanhar os convidados. E havia sempre conversa animada e cheia de interesse. Luís Gomes, além de falar inglês e francês, entendia-se com o alemão e o italiano, de modo que a maior parte dos artistas podia conviver usando a sua própria língua, o que dava especial sabor a estes encontros. Já tarde, recolhia a casa sem se mostrar fatigado, e com especial contentamento espelhado no rosto. Quando convivia com artistas estava no seu meio. É que ele era também um artista, no sangue, e talvez que estes momentos representassem, para ele, uma remota aproximação do que teria sido a sua vida se tivesse sido um artista itinerante, como os que recebia. Não sei o que será hoje o segundo andar do edifício Sir Robert Ho Tung, mas não duvido que por lá vagueie ainda a sombra de Luís Gomes, que dele fez seu local de trabalho favorito. Pena será se não houver, no casarão a que ligou tanto da sua vida, algo que o relembre.

A obra escrita de Luís Gomes anda dispersa, parte dela esgotada, de modo que muitos que lhe conhecem o nome não lhe conhecem a obra, nem pelos nomes dos volumes publicados. Ora quando ele passou pelo "Notícias de Macau", jornal que deu, sem dúvida, algum alor à cultura local, aproveitou essa passagem para que se publicasse uma valiosa colecção de volumes, sobre temas ligados a Macau e ao Oriente, sendo sete, num total de vinte e três, de sua autoria. A chamada Colecção Notícias de Macau constitui, ainda hoje, um fundo precioso, e que ajuda a desmentir aqueles que, já na época, diziam ser Macau um deserto cultural - o que, na realidade, nunca foi, se atendermos ao seu isolamento e ao facto de a maior parte das pes-soas que teriam capacidade para se ocupar de temas culturais estava em Macau no desempenho de comissões de serviço, com tempo de estada limitado. A colecção a que me refiro, completamente esgotada - não sei se a Biblioteca do Governo a possuirá completa - bem merece, neste período de afã cultural, em que tanta coisa boa se tem publicado, e com grande dignidade, uma reedição. Aqueles que ouvem falar de Luís Gomes quase como personagem mitológico poderiam familiarizar-se com ele, e medir o valor deste lado do seu trabalho, na realidade multiface-tado. Há uma obra desta colecção reeditada, aliás com bastante bom gosto gráfico: Chinesices. Faltaria, portanto, publicar só mais seis, do conjunto dado à estampa, em boa hora, pelo "Notícias de Macau". Se outro valor não tivesse tido esta publicação, bastaria este fundo editorial para lho dar.

A escrita de Luís Gomes é clara, corrente e despretensiosa. Dotado como era para as línguas, possuía um vocabulário rico, e empregava até, de quando em vez, vocábulos pouco em uso, alguns de especial sabor clássico. Não tenho a pretensão de publicar uma lista completa da obra escrita de Luís Gomes, nem disponho de elementos para o fazer, mas lembro ainda a tradução do Ou Mun keik leok, republicada, também numa elegante edição, e um precioso Vocabulártio português-cantonense que ainda tive a sorte de encontrar num alfarrabista, e merece igualmente voltar a ser publicado.

Quando Macau teve a sua autonomia, após 1974, eo Governo pensou em organizar novos programas de estudos, mais adaptados às condições locais, surgiu a ideia de dar, logo no ensino primário, noções de história de Macau. Nesse sentido, foi solicitado a Luís Gomes que escrevesse uma curta História de Macau, com esse objectivo. Ele tinha sido professor e, começado, até, pelo ensino primário, além de profundo conhecedor da história local: era a pes--soa ideal para tal obra. Infelizmente estava próximo do fim, e já um pouco inferiorizado pelos seus padecimentos, que não exteriorizava, mas que eram grandes. Cumpridor até ao fim, não recusou o trabalho encomendado (e cuja paga foi já recebida pela sua herdeira). Dadas as condições físicas em que trabalhou, a obra não terá sido do melhor que produziu; mesmo assim, acho que merece publicação. É, exactamente, a obra de um macaense ilustre, escritor e investigador, sobre a história da sua terra, e, na sua forma abreviada, de fácil leitura, informa sobre o correr dos quase quinhentos anos de convívio entre Portugal e a vasta China, nesta minúscula parcela do território continental. Se não se encontrar, nos arquivos do Instituto Cultural ou dos Serviços de Educação, nenhum exemplar deste último trabalho, ainda guardo preciosamente uma cópia, que estará sempre ao dispor do Instituto Cultural de Macau.

Ao longo da sua vida, e nunca perdendo contacto com instituições culturais nacionais e estrangeiras (ele tinha abundantíssima correspondência que se deve ter perdido, infelizmente, no descalabro cultural doméstico, a seguir à sua morte), organizou uma biblioteca preciosa, de onde constam espécies hoje raríssimas. A maior parte dos seus livros não era adquirida, acidentalmente, em passagens por livreiros ou alfarrabistas: ele informava-se cuidadosamente sobre as obras que valeria a pena comprar e locais onde isso seria possível. Para que esta biblioteca se não perdesse para Macau, como sucedera já com a do erudito Jack Braga, o Governador Garcia Leandro entrou imediatamente em contacto com a irmã e herdeira de Luís Gomes para aquisição de toda a biblioteca. Foram longas e difíceis as negociações: a senhora tinha caprichos, exigências, uma das quais era a de continuar a ter jurisdição sobre o local e utilização da biblioteca. Não era, evidentemente por mal: era só por não fazer a mínima ideia das regras mais elementares da Administração. Enfim, foi pos-sível chegar-se a bom termo, só depois da saída do primeiro motor da questão: o Governador Garcia Leandro. Mas ainda segundo a vontade deste, a biblioteca de Gonzaga Gomes ficou anexa ao Arquivo Histórico de Macau: entendia--se assim facilitar o trabalho de futuros investigadores, que encontrariam, no mesmo local, documentos e bibliografia específica, uma vez que a maior parte da biblioteca é constituída por obras sobre o Oriente e a China. É um pouco dele próprio que fica ligado a uma das mais importantes instituições culturais de Macau, e queira Deus que o futuro não lhe traga dias de tempestade, estilo Revolução Cultural.

No espólio de Luís Gonzaga Gomes ficou, ainda, uma valiosíssima colecção de discos e gravações em fita, que se deve ter deteriorado durante os anos em que esteve ao abandono. Foi sugerido a sua irmã que negociasse a sua passagem para a Rádio Macau, por exemplo, uma vez que ela, embora artista e também melómana (além do mais, executante) não só não utilizava esse material, como nem sequer tinha os desvelos de seu irmão para o conservar, mantendo-o, por exemplo, em ar-condicionado nos dias mais quentes e húmidos do ano. A resposta era sempre: "São, para mim, uma companhia!" Que objectar? A pobre senhora, profundamente desgostosa com o futuro traçado para Macau, não se importaria que todo o património fosse destruído, só para não cair em mãos que ela não consideras-se dignas de o usufruir. E, na sua amargura, e apesar de amar Macau profundamente, liquidou os seus bens e afastou-se da terra onde nascera e a que tanto se devotara nos seus tempos de actividade. Foi pena que o tempo a desgastasse a esse ponto, pois era pessoa muito inteligente, culta e mais dada à acção que à especulação. Não faço ideia se essa musicoteca terá ficado em Macau, ou se estaria, à altura, em condições de ser totalmente utilizável.

Luís Gomes dirigiu a Biblioteca Nacional de Macau, como se chamava no seu tempo. Não possuo elementos que me permitam fazer comentários à sua actuação como bibliotecário, mas é caso para dizer, dadas as suas naturais tendências para a leitura e investigação, que seria, para ele, o local ideal de trabalho. A biblioteca ora nascida do interesse de um antigo e ilustre professor do Liceu Nacional do Infante D. Henrique, o Dr. Azevedo Gomes, que ainda tive o privilégio de conhecer em Angola, é um marco na história cultural de Macau, e de outra maneira não a poderia ter entendido Luís Gomes.

É curioso como a sua actividade foi tão variada dentro do campo da cultura local. Jornalista, no "Notícias de Macau", deixou neste jornal alguns valiosos artigos, que é natural por lá tenham ficado, sem figurarem em publicação mais duradoura. Se assim foi, convém que sejam reunidos em publicação mais duradoura, pois bem o merecem. Versam, sempre, temas ligados a Macau e à sua história, e são útil complemento das obras de maior fôlego que publicou. Volto a referir a notável colecção de obras que então se publicaram, e que é necessário reeditar, nesta época tão fértil, em Macau, de excelentes iniciativas editoriais, que, em alguns casos, ultrapassam já o que de melhor se faz em Portugal.

A sua acção como director da Rádio Macau revela bem o sagrado respeito que lhe merecia a cultura musical. Durante muito tempo, realizou, ele só, um programa de música de concerto (infelizmente, nesse tempo, já quaisquer pigmeus de música ligeira se davam ao luxo de se apresentarem em "concertos" apoucando a respeitabilidade que a palavra, tradicionalmente, trazia consigo), em que sempre fugia à banalidade - ao vulgar, para os que não concordarem com o galicismo que acaba de me escapar. Fugia aos lugares-comuns agradáveis às massas que apreciam ouvir dez, cem vezes, as músicas que mais lhes titi-lam os tímpanos e a sensibilidade fácil. Com ele, não seria possível ouvir o Pavarotti, pela milésima vez, cantar o Sole mio, ou qualquer outra insignificância do seu repertório. Além de seleccionar cuidadosamente os seus programas, e de dotar com obras de qualidade a discoteca da Rádio Macau, usava o seu próprio material, onde existiam algumas gravações históricas, de grande interesse. E ia fazendo os comentários que a sua grande cultura musical permitia. Era um programa de muito nível, que não sei se teria sido apreciado como merecia. Se o foi, deu nota alta à difusão da cultural musical em Macau. Programas destes constituem hoje uma espécie de "pobreza envergonhada": desde que a sociedade de consumo criou os discos de platina, prata e oiro, eles vão para a velha geração dos chanteurs de charme, ou para a sempre novíssima dos "rockistas" barulhentos até ao ponto de causarem traumatismos nervosos. Se o grande Stravinsky voltasse a este mundo e recomeçasse a compor, parece-me que não alcançaria, sequer, o mais modesto dos três metais preciosos.

A saúde de Gonzaga Gomes era débil. Estou certo de que o seu entusiasmo pelo trabalho cultural a dilatou para além do que os seus variados males teriam permitido se tivesse deixado ficar inactivo. Caiu rapidamente. Fui vê-lo duas vezes durante a sua curta estada no hospital. Da segunda, ao vê-lo encostado a almofadas, e, aparentemente, sem dificuldades respiratórias, disse-lhe, sem afectação, que o achava melhor. Ele só me respondeu, e repetiu: "Estou muito pior". E alongou-se no "muito", como para sublinhar o pressentimento que lhe ia na alma. Nessa mesma noite mor-ria. Mas só fisicamente. Começou uma nova vida para o seu nome, para a sua obra, para o seu exemplo. E um marco, e alto, na cultura de raiz local.

desde a p. 118
até a p.