Cristo e Confúcio

POR QUE SE TORNARAM ELES CRISTÃOS? YANG TING YUN, LI CHICH TSAO EHSUKUANGCHI

Willard J. Peterson*

Xu Guangqi (Paulo), pregador. Extraído de: DU HALDE- The general history of China, vol,1. p.476. AH/LR 60

Questionar a razão de eles se terem tornado cristãos não tem como objectivo obter uma respos-ta concreta; tal como interrogações análogas, como por exemplo: o porquê do envolvimento de Ku Hsien Cheng (1550-1612) e Pan Lung (1562-1626) no renascimento da Academia Tung Lin, na mesma época em que alguns dos seus contemporâneos se cristianizavam.

O íntimo de Yang Ting Yun (1557-1627), Li Chih Tsao (1565-1630) e Hsu Kuang Chi (1562-1633) não seria completamente acessível, mesmo que fossem sujeitos a toda espécie de interrogató-rios. Os elementos disponíveis não nos permitem analisar qualquer experiência religiosa profunda pela qual tenham passado.

Este ensaio também deixa de lado o proble-ma teológico e sociológico de, em vez de terem sido convertidos, terem sido eles a fazer a sua ade-são. A questão é extraída, aqui, do contexto da his-tória intelectual chinesa.

O "porquê" da indagação é um apelo a uma resposta que seja explanativa, uma resposta que dê sentido histórico à conduta de alguns homens, há cerca de quatrocentos anos. O pronome utilizado é directo: "eles" -- Yang Ting Yun, Li Chih Tsao e Hsu Kuang Chi são bem conhecidos pela crítica como os três pilares do Cristianismo na China.1

Há muitas razões para os referir em conjun-to. Nasceram entre um intervalo de oito anos e morreram entre um de seis. As suas casas encontra-vam-se nas proximidades de Chiangnan, a região económica mais avançada e intelectualmente mais activa dos finais da dinastia Ming.

Eram homens muito cultos, que obtiveram o grau mais alto nos exames do funcionalismo públi-co, chin shih, entre os trinta e os quarenta anos de idade. Todos eles trabalharam no governo por um período superior a 10 anos e ascenderam a cargos relativamente elevados. Tinham segurança financei-ra; publicaram obras próprias, para além de partici-parem na tradução e publicação de livros, em Chi-nês, de missionários jesuítas. Com estes três exem-plos, estamos no centro da experiência literária dos ensinamentos cristãos no início do século XVII.

Pode parecer supérfluo definir o que signifi-ca "tornarem-se cristãos", mas o Professor Jacques Gernet, no seu interessante livro Chine et Christianisme, afirma que os chineses, no século XVII, não percebiam claramente o Cristianismo e eram apenas aparentemente cristãos. Aqui não está em causa o ponto de vista de Gernet. A questão pode ser reformulada. Por que se envolveram tanto no Cristianismo? Para o nosso objectivo, é sufici-ente seguir o critério dos missionários dos finais da época Ming: aceitaram basicamente que Yang, Li e Hsu eram cristãos.2

Apesar de não haver evidência directa, sem ambiguidades, do testemunho dos próprios Yang, Li e Hsu terem sido baptizados -- o que é aceite, naquele contexto, como definição de "tornar-se cristão" -- missionários relataram que eles o fo-ram. E passaram a usar os nomes que lhes foram dados a partir do momento que se baptisaram.Eles, e os seus críticos, diziam que tinham seguido a Sheng Chiao [Religião Sagrada] e o Tienchu chihtao [Caminho do Senhor do Céu]. De-senvolveram esforços para viver segundo os princí-pios pregados pelos missionários e para influenciar outros a aceitar os mesmos princípios. Induziram familiares próximos a receber o baptismo. Mais genericamente, as manifestações públi-cas do seu contínuo compromisso para com os mis-sionários e para com o que por estes era ensinado, na China, permite-nos chamar-lhes "cristãos".

COMO É QUE YANG TING YUN SE TORNOU CRISTÃO

Os passos que levaram Yang a "tornar-se cristão" são descritos na narrativa sobejamente co-nhecida da sua vida, normalmente intitulada Yang Ting Yun hsien sheng chao hsing shih chi [Mani-festações do incomparável carácter de Yang Ting Yun].3 A narração foi escrita por Ting Chih Lin, depois da morte de Yang, em 1627.

Ting diz, num pós-escrito, que ouviu muitas vezes Giulio Aleni (1582-1649)4 falar de Yang; e é claro que Aleni conheceu Yang. Estiveram juntos em Hangzhou e trabalharam juntos na Chih fang wai chi [Relato sobre países que não figuram no Departamento de Registos], impresso em 1623.

Por que a sua amizade começou uns anos após Yang ter sido baptizado, em 1611, Aleni não faz a Ting uma descrição, em primeira mão, dos factos que conduziram a esse acontecimento. Além disso, é óbvio que a descrição se destina ao público em geral. Mostra como Yang se tornou cristão, com a esperança manifesta, expressa no pós-escrito de Ting, de que fosse seguido por outros.

O que se segue é basicamente o parafrasear dos estágios de Yang, anotados por Aleni e Ting. Comentários directos são também parenteticamente intercalados pelo autor do presente trabalho.

A narrativa começa, convencionalmente, com a informação sobre o nome de Yang, a sua terra de origem (Hangzhou), o seu carácter ilustre, gosto pelo estudo e desejo de ser bom. Em 1592, Yang torna-se um chin shih e ocupa vários cargos na província e na Capital. (Yang é, desta maneira, descrito aos leitores da narrativa como um homem de sucesso dos finais do século XVI, princípios do século XVII).

Em 1609, (aos 53 anos), Yang demite-se da Superintendência da Educação, em Nanquim, e regressa a Hangzhou, onde se devota à leitura. É admirado pelo governador provincial, que lhe faculta fazer palestras sobre Taohsueh [Neo-confucionismo] num local aprazível do Lago Ocidental.

Xu Guangqi (Paulo), acompanhado pela filha, Cândida. Extraído de: DU HALDE -- Description de la Chine, vol. 3, p. 121. AH/LR 49.2

Como muitos dos seus contemporâneos, que também estavam interessados em reviver o vigor intelectual dos ensinamentos de Cheng Chu, Yang organiza um grupo de estudo chamado Chenshih She [Sociedade da Verdade]. Ao mesmo tempo que se vai tornando conhecido pelos seus esforços em nome do Neoconfuncionismo, apoia os monges budistas, que lhe incutiam a doutrina Chan, e con-tribui para o restabelecimento de templos budistas.

Yang aprendera já alguma coisa sobre o "Caminho do Senhor do Céu", que Matteo Ricci tinha explanado em Beijing, mas "não o tinha en-tendido". (Temos aqui um apanhado do envolvimento intelectual e religioso de Yang, em 1610 e 1611).

Pela primeira vez em anos, fora da superin-tendência, ele ia promovendo, activa e publicamen-te, o aspecto moral de autodesenvolvimento do Neoconfuncionismo. Também não estava apenas interessado pela doutrina budista, apoiava-os, espe-cialmente numa altura em que o monge Chu Hung (1535-1615) obtinha enorme sucesso promovendo a formação de sociedades budistas laicas e revigo-rando a ordem monástica do templo de Yun Chi, próximo a Hangzhou 5. Nesta altura, Yang enca-rava seriamente os valores morais e religiosos e estava a par dos ensinamentos cristãos.

(No passo seguinte, Yang virou-se subita-mente para os ensinamentos cristãos). No quarto mês de 1611, o amigo de Yang, Li Chih Tsao (que fora baptizado por Ricci, em Beijing, na Primavera do ano anterior), demite-se do gabinete em Nan-quim, para acompanhar o pai doente. Li, convida os dois jesuítas, Lazzaro Cattaneo (1560-1640) e Nicolas Trigault (1577-1628), para o acompanha-rem de volta a Hangzhou.

Quando Yang vai apresentar condolências pela morte do pai de Li, conhece Cattaneo e Trigault e congratula-se por ficar a saber mais so-bre a religião deles. Quando vê uma imagem de Chu [Senhor], dirige-se a ela com respeito e sente--se como se estivesse na presença de um tachu [grande senhor], que lhe dá uma ordem.

Convida então Cattaneo e Trigault para o vi-sitarem na sua própria casa. (Embora aqui não haja uma indicação clara do porquê da sua atracção por eles, estava profundamente interessado no que os missionários tinham para ensinar).

(Disposto a aprender mais), Yang afasta-se de todas as outras preocupações, para se concentrar no aprofundar dos fundamentos do Tienhsueh [Ensinamento do Céu]. Cattaneo e Trigault fala-ram-lhe acerca da Graça do Senhor e de outros pre-ceitos de sua religião.

Percebe que as dez mil coisas do Céu e da Terra são criadas e continuadas por Tienchu [Se-nhor do Céu]. Confessa aos missionários que o Se-nhor do Céu é para ser servido como o Senhor das dez mil coisas no Céu e na Terra, mas pergunta que mal poderá existir em servir também Buda.

Aceita a resposta dos missionários a esta pergunta. Noutras conversas, pergunta porque é que o omnipotente Senhor do Céu suportou tais sofrimentos, quando desceu para viver como um homem, e expressa a sua opinião de que é falta de respeito pelo Senhor do Céu falar desses sofrimen-tos. Mais uma vez os missionários explicam as ra-zões de tudo isto e ele as aprova.

Um dia, Trigault e um chinês convertido de Guangdong, chamado Chung Ming Jen (também chamado Chung Nien Chiang), a quem os jesuítas apelidaram Irmão Sebastião (1562-1622), explica-ram o significado dos ritos cristãos a Yang mas, finda a explanação, julgaram que ele não acreditara completamente que o Senhor do Céu estaria pre-sente no pão sagrado da comunhão. Com uma certa agitação, Yang disse: "Como é que sobre isso pos-so cogitar? O amor do meu Senhor pelo mundo é ilimitado. (A ideia de) Sua Graça descer para expi-ar os (pecados) do mundo não advém de uma dou-trina irreflectida, portanto como poderia voltar a ter dúvidas disto?". Então, assume o compromisso de ser um servidor do Senhor. (Resumindo, ele estava pronto a crer).

Quando Yang expressa o seu desejo de ser baptizado, Trigault não autoriza. A razão é que, para além de uma esposa, Yang tem uma concubina, que é a mãe de seus dois filhos. Hesita sobre o que fazer e discute o assunto com o seu amigo Li (que, como vamos ver daqui a pouco, teve o mesmo problema). Yang diz que a atitude do missionário o confunde completamente: ele, um ex-funcionário de alta patente, pronto a servi-los, mas não o permitem, porque não pode ter concumbinas! Os monges budistas, assevera Yang, certamente não actuariam assim.

"É precisamente por isso, explica Li, que os missionários do Ocidente não se podem comparar com os monges. A hsichiao [religião ocidental] tem as suas normas, recebidas do Senhor do Céu. Segui-las, é virtude, negligenciá-las, é punível; a diferença é clara. Como poderiam os missionários consentir-te fazer o que desejas, pergunta Li, quan-do as regras o proibem? Os missonários querem salvar os outros, mas não querem fazer concessões para te receber. Querem transformar este mundo degenerado, mas não se atrevem a desonrar as re-gras da sua religião. Se sabes que estás errado e não te queres corrigir, continua, qual é o teu inte-resse em segui-los?"

Subitamente, Yang desperta. Altera os seus hábitos antigos, manda embora a concubina e adopta as regras da religião. Os missionários verifi-cam a sua sinceridade e ele é baptizado no sexto mês de 1611, com o novo nome, Miguel.6

(Yang tornou-se cristão e os escritos de Ting Chih Lin demonstram que ele viveu os últimos anos da sua vida (1611-1627) a trabalhar, conjunta-mente com os missonários jesuítas, em prol do Cristianismo. Seguem-se alguns exemplos desses empreendimentos, descritos por Ting).

Yang, anteriormente, mantinha uma estátua de bodhisattva, no átrio de sua casa; este átrio foi transformado numa capela para os missionários. Sua mãe era uma budista pia e não o escutava acer-ca da religião ocidental. Durante anos, ele preocu-pava-se e rezava. Quando tinha cerca de sessenta anos (e a mãe, oitenta), comia frugalmente e, por esta razão, ficou extremamente magro. Perante as constantes interrogações da mãe, desfeito em lágri-mas, disse, certa vez, que se sentia culpado por ela estar iludida por hsiehshoo [falsos ensinamentos] e rejeitar a chengchiao [verdadeira religião]. Se a mãe caísse no sofrimento eterno, o filho não pode-ria obter a redenção. Ao compreender a amargura do filho, ela finalmente entendeu, disse acreditar e recebeu o baptismo. Yang, então, construiu uma igreja e passou a apoiar os missionários (a quem também acolheu, por sua conta e risco, durante as proibições anti-cristãs iniciadas em 1616).

Como uma alternativa às sociedades laicas budistas, que se limitavam a libertar peixes e pás-saros vivos comprados no mercado, Yang organiza uma sociedade de caridade para ajuda aos necessi-tados. Fang sheng hui [As sociedades para a liber-tação da vida], na altura, eram populares em Hangzhou, em grande parte graças à inspiração do monge Chu Hung7. Quando Aleni lhe diz que é bom socorrer os pobres e os doentes, mas que tam-bém deveria ter compaixão pelos angustiados, Yang começa a dispender dinheiro e esforços na impressão de livros sobre "ensinamentos do Céu". Ele próprio escreve Tai i hien [Em lugar da dúvida] e outros pequenos livros para esclarecer "o cami-nho do Senhor do Céu". (Resumindo, ele torna-se um pilar da Igreja, na China).

POR QUE É QUE YANG TING YUN SE TORNOU CRISTÃO

Yang não se apresenta como tendo passado por qualquer crise ou desgaste na sua aproximação ao Cristianismo. O que se pode inferir da descrição da sua vida é que ele e muitos dos seus contempo-râneos estavam preocupados com o que lhes pare-cia ser a difusão de uma moral decadente.

Talvez isto estivesse associado com a sua demissão do governo, em 1609, quando a teimosia do Imperador, a desordem partidária no tribunal e a burocracia minavam a segurança. Os seus esforços, em nome do Neoconfucionismo, são a prova de uma grande preocupação com os valores e o desejo de restaurar a ideia do "bem", numa sociedade à deriva. O que parece claro na vida de Yang é que ele procurou identificar o "bem" desde que organi-zou a Sociedade da Verdade.

Apareceu a oportunidade para ele o encon-trar no Neoconfucionismo; presume-se que isto era o tema dos livros que leu assiduamente, quando voltou para Hangzhou. Também o procurou nos ensinamentos dos monges budistas, a quem ele dera contributos. Ambos lhe falharam.

O afastamento de Yang do Neoconfu-cionismo e Budismo aconteceu, quando ele visitou o seu amigo Li, no quarto ou quinto mês de 1611. A narrativa não diz, mas fontes ocidentais8reve-lam-nos que Li encorajou seu amigo Yang a abra-çar o Cristianismo.

O que se pode concluir, da narrativa, é que Yang dispertou seu interesse, quando se apercebeu como Li -- de volta a Hangzhou com Cattaneo e Trigault, depois de ter sido baptizado em Beijing, no ano anterior -- confiou tanto nos missionários. Este é o único contexto que nos é dado sobre a reacção de Yang perante uma imagem do Senhor. Se é correcto supor que ele buscava uma convicção moral, podemos concluir que, ao perceber que o seu amigo Li a tinha, quis descobrir mais sobre a origem dessa convicção.

Há cinco aspectos principais do desenvolvi-mento da compreensão de Yang sobre o Cristianis-mo, na narrativa.

Primeiro, à medida que ele lia e discutia com Cattaneo e Trigault, percebia que o Senhor, cuja imagem tanto o afectara, era o Senhor do Céu, aquele que está por trás de todos os dez mil fenómenos do reino do Céu e da Terra; este Senhor não é do Ocidente, mas situa-se fora de qualquer tempo e espaço.

Segundo, explicavam-lhe que o Senhor do Céu era um e o único Senhor. Qualquer argumento sobre Buda "apoiando o Céu e envolvendo a Terra" era afastado como estúpido, por não reconhecer a omnipotência do Senhor do Céu. Os missionários diziam que os Budistas eram culpados de qualquer coisa parecida como lesa-majestade, de uma pessoa querer ser o seu próprio imperador ou rei.

De acordo com a narrativa, Cattaneo e Trigault disseram-lhe: "Os Budistas querem vene-rar os seus próprios corações e naturezas (como origem do conhecimento) e negam a omnipotência de Shangchu [Senhor do Alto]".

A acusação dos missionários, de que os Bu-distas faziam fé nos seus próprios corações e natu-rezas como base para os seus valores (e isto é cer-tamente uma referência aos ensinamentos domi-nantes de Chan, na época), pode ser alargada até aos finais do Neoconfucionismo Ming, especial-mente aos seguidores da escola Wang Yang Ming, na qual existia uma tendência parecida de tsun te hsing [venerar a natureza moral]. A questão era se o coração ou essência de cada um seria onde os valores de cada um se baseavam, ou então, se exis-tiria uma fonte externa. Os missionários insistiam exclusivamente na última.

Terceiro, em resposta à ideia de Yang, de que era falta de respeito falar dos sofrimentos do Senhor do Céu, os missionários explicaram que um dos atributos do seu Senhor "é ser muito bom" e preocupar-se com todos os seres humanos. Isto foi manifestado ao vir à Terra "expiar os pecados de todos os povos de todos os tempos". A questão, para Yang e para os leitores da narrativa, é que esta parte externa de conhecimento é uma fonte moral e é acessível aos humanos.

Quarto, assim que Yang percebeu isto, não teve necessidade de continuar a interrogar-se; pôde, imediatamente, compreender o significado do pão sagrado. Não foi por acidente que, dez anos depois, quando escreveu sobre questões doutrinais, intitulou sua obra Em lugar da dúvida. A dúvida, claro, é o oposto da certeza ou da ver-dade, a qual, segundo parece, foi o que ele pensou estar a abraçar.

Quinto, Yang aprendeu através da obstina-ção dos missionários, relativamente ao episódio da concubina, que as leis morais não permitiam transi-gências; era preciso submeter-se a elas. Não eram ditadas por humanos e sujeitas a interpretações mo-mentâneas, conforme dada altura ou lugar. Vinham do Senhor do Céu.

Se Yang é visto como perseguindo, de facto, uma fonte externa determinada de valores morais, como alternativa ao relativismo e introspecção que prevaleciam entre os seus contemporâneos, então é explicável ter entendido as ambiguidades comple-xas do "Céu" e do "Senhor do Céu", descritas pe-los missionários. Foi precisamente quando ele pas-sou do entendimento à submissão a esta "autorida-de maior", que pôde ser baptizado e se tornou um cristão.

Todo o processo foi completado num perío-do de cerca de dois meses.9

O CAMINHO DE LI CHIH TSAO PARA A CRISTANDADE

Li levou perto de nove anos. Foi baptizado em Beijing, no início de 1610, cerca de dois meses antes de Matteo Ricci (1552-1610) ter morrido.10 Em contraste com Yang, que apenas tivera um breve contacto directo com os missionários, nos dois me-ses que antecederam seu baptismo, Li visitara Ricci em 1610 e, por ele, desenvolvera forte admiração e consequente relacionamento. O próprio Ricci des-creve o início desta relação, como se segue:

"Li Wo Tsun [i. e. Li Chih Tsao] é da cidade de Hangzhou, na província de Chiang. Quando cheguei pela primeira vez a Beijing, ele era um alto funcionário do Tribunal do Trabalho e era um doutor de grande inteligência. (Muito bem cotado no exame de chin shih de 1598, Li era apelidado de "doutor" pelos jesuítas, tal como outros chin shih o eram). Na sua Juventude fez uma "Descrição de toda a China", com as quinze províncias representadas em grande pormenor. Pensou que era o mundo inteiro. Quando viu o nosso mapa-múndi, percebeu como a China era pequena comparada com o mundo todo.

Com a sua grande inteligência, facilmente percebeu as verdades ensinadas por nós sobre a extensão e esfericidade da Terra, os seus polos, os dez (concêntricos) céus, a vastidão do Sol e das estrelas comparadas com a Terra, e outras coisas que outros achavam tão difícil de acreditar. Daí gerou uma estreita amizade entre nós e, quando os deveres do seu gabinete o permitiam, ele gostava de aprender mais sobre este conhecimento (questa scienciá)"'.11

Anos mais tarde, Li relembra: "Em 1601, quando Ricci veio (a Beijing), fui, com vários colegas, visitá-lo. Pendurado na sua parede estava um mapa-múndi, com linhas bem desenhadas de graus (longitude e altitude). Ricci disse: 'Foi este o caminho que percorri vindo do Ocidente'".12

De certa forma, o mapa apontava o caminho de Li "para" o Ocidente. O seu interesse pelo mapa cresceu ao ponto de Ricci ter reconhecido o mérito da sua ajuda, o que resultou numa versão alargada do mapa a ser impresso em 1602.13

Por seu turno, a estima de Li por Ricci e pelas novas ideias do Ocidente aumentaram. Trabalharam juntos em livros de aritmética, astronomia e instrumentos14 e, em 1607, Li escreveu um prefácio para uma publicação revista de Tienhsueh shihi [Verdadeiro significado do ensinamento do Céu], sob o novo título Tienchu chiao [Verdadeiro significado do Senhor do Céu].

Tendo uma atitude crítica sobre o Budismo e o Neoconfucionismo, Li foi especialmente solidário com a Tienchu chiao [Religião do Senhor do Céu], que ele achou ter muito em comum com os clássicos.15

A admiração crescente por Ricci está perfeitamente patente no prefácio dos Chijen shihpien [Dez ensaios sobre o homem aperfeiçoado], de Ricci, 1608. Nestes ensaios, Ricci recorda discussões sobre questões de religião e moral, com oito entrevistados chineses, incluindo Li e Hsu Kiiang Chi.

Li escreveu, no prefácio, que, quando conheceu Ricci, julgou-o um ijen [homem estranho]; alguém que tinha passado por todo o tipo de peripécias, para fazer a tremendamente longa viagem para a China, e que era amigo e generoso para com os outros, sem pedir nada em troca. Vendo que ele não se tinha casado, nem tinha nenhum cargo, que pensava apenas em ser virtuoso e em servir a Shangti [Divindade do Alto], Li considerou Ricci um homem de conduta independente.

Plano do templo dedicado a Shangdi, Senhor do Céu. Extraído de: DU HALDE — Description de Ia Chine, vol. 3, p. 6. AH/LR 49.2

A seguir, pensou ser Ricci um homem muito culto, com artes especiais [po wen yu tao shu chihjen], por que venerava o que era certo e opu-nha-se a falsos ensinamentos, era aplicado no aprender, memorizava textos com imensa facilida-de e muito sabia sobre metafísica, astronomia, geo-grafia, geometria e aritmética -- assuntos sobre os quais os confucionistas [ju], em gerações anterio-res, não tinham sido claros.

Agora, em 1608, depois de conhecer Ricci há quase dez anos, Li percebe que, quando está para fazer algo e isso está de acordo com as pala-vras de Ricci, então sabe que deve fazê-lo e se não estiver, então sabe que o deve rejeitar. Por isso, Li reconhece em Ricci um chihjen [homem aperfeiçoa-do]. O homem aperfeiçoado, escreveu Li, é compa-tível com o Céu, mas não é estranho [i] aos outros homens.16

O leitor do prefácio de Li pode entender que, com este grau de identificação com Ricci, ele esta-va pronto para ser baptizado, em 1608. Provavel-mente estaria, mas Ricci disse, numa carta escrita na Primavera desse ano, que ele não podia ser cris-tão, devido a um "certo obstáculo".17 Nos seus diários dessa altura, Ricci escreveu sobre Li: "Ele está bem instruído sobre matéria da nossa Fé Sa-grada e estaria pronto a ser baptizado, se os padres não tivessem descoberto o obstáculo da poligamia, do qual ele promete livrar-se".18

Quando, em 1611, Yang foi confrontado com este mesmo obstáculo -- ter uma concubina, bem como uma esposa -- consultou Li e, como atrás se disse, recebeu o conselho directo de que devia abandonar a concubina. Li, por outro lado, no início de 1610, ainda não tinha sido baptizado, qualquer que fosse a sorte das suas concubinas.

A nossa fonte, sobre o que então ocorreu, volta a ser Aleni.19 Ele disse que, quando Li fi-cou gravemente doente, em Beijing, sem ninguém da família perto de si, foi tratado dia e noite, duran-te semanas, por Ricci. Quando a doença atingiu um ponto critico, Li fez seu testamento e pediu a Ricci para executá-lo. Ricci estimulou-o a aceitar a Fé, durante esta grave circunstância. Ao contrário de Yang, Li passava por uma grande crise pessoal, quando foi baptizado. Recebendo o nome Leão, doou cem taéis de prata para uso da Igreja e, com a ajuda do Grande Senhor, conseguiu recuperar-se. Entretanto, Ricci morreu em Maio desse ano.20

Depois do desaparecimento de Ricci, Li manteve o seu compromisso para com a Fé. Na Primavera de 1611, convidou Trigault e Cattaneo para irem a sua casa, em Hangzhou. Lá, como já vimos, provavelmente estimulou o interesse de Yang pelo Cristianismo.21 Sobre Li, podemos encontrar na narrativa da vida de Yang o que se segue: "Quando a doença do pai se agravou muito, ele (Li) entregou-lhes os assuntos relacionados com os preparativos fúnebres (à Igreja e, em parti-cular, aos missionários).22 Aparentemente foi esta confiança que inspirou Yang.

Quando o período de luto acabou, em 1613, Li voltou à sua carreira de funcionário, nela progre-dindo durante os sete anos seguintes. Simultanea-mente, continuou a estar envolvido na tradução e publicação de livros religiosos e sobre matemática. Os seus esforços culminaram, em 1628, com a pu-blicação de Tien hsueh chu han [Primeira colectâ-nea de escritos sobre o ensinamento do Céu]. In-cluía quase todos os livros importantes dos missio-nários, impressos na China até aquela altura. Dezanove títulos ao todo, além de dois de sua auto-ria. Nos anos anteriores à sua morte, Li também foi útil, envolvendo oficialmente os missionários jesuí-tas em reformas dos calendários, patrocinadas pelo Imperador, baseadas nas teorias ocidentais recente-mente introduzidas.

A ATRACÇÃO PARA LI CHIH TSAO

Por que é que Li se tomou cristão? O teste-munho "público", aqui esboçado ao de leve, permi-te duas conclusões que a crítica, por diversas vezes, vem demonstrando. A primeira conclusão que se pode tirar é que ele e uns quantos homens de letras, daquele tempo, podem ter sido atraídos pela "ciên-cia" (termo não muito bem definido nestes contex-tos) trazida para a China, pelos missionários.23 Trigault deu uma das primeiras definições desta in-terpretação, quando observou que todos os estudos e publicações de matemática e astronomia, feitos por Li e Ricci, "não eram o interesse principal do Padre Mateus, embora tenham servido como uma forma de sedução, para atrair Leão [Li Chih Tsao]para a rede do pescador".24

A segunda conclusão é que Li, como muitos outros, foi atraído ao Cristianismo pela força de carácter de Ricci. D'Elia chegou a estas duas con-clusões, quando observou que três amigos de Li, que escreveram notas, impressas na versão do mapa-múndi de 1602, também elogiavam "a ciên-cia e a virtude de Ricci".25 Os três tinham obtido graus mais elevados, antes ou na mesma altura que Li e, como funcionários na capital, tinham visitado Ricci e estado interessados no mapa; contudo, não se converteram.

Por conseguinte, não se entra em contradi-ção se observarmos que eles apenas fizeram recuar um passo à questão inicialmente colocada. Por que é que Li foi tão atraído pela ciência ocidental e por Ricci, tendo passado para lá dessa atracção toman-do-se cristão?

De acordo com ambos, quando Li encontrou o missionário em Beijing pela primeira vez, em 1601, o que o impressionou foi o mapa-múndi. Ricci reconheceu-lhe o mérito de ele ter um vigo-roso interesse pela geografia, com a implicação de tal interesse ser o motivo da reacção ao mapa. Mas Li não parece fazer referência a isso, mesmo no seu prefácio de 1623 para o Relato sobre países que não figuram no Departamento de Registos, e é dig-no de nota que esta tão importante contribuição para a expansão do conhecimento chinês da geo-grafia do mundo fosse o resultado da colaboração de Aleni e do não aritmético Yang, e não de Li.

Em 1601, Li estava mais fascinado pelo novo modelo do mundo do que pela geografia dos países do mundo. Não lhe era difícil aceitar a existência de muitos países até aí desconhecidos na China. O mapa-múndi ou, mais objectivamente, a bidimen-sional representação de uma esfera, a que os missio-nários chamavam Terra, desafiava a suposição chi-nesa de que a Terra era um quadrado plano, sob um tecto ou um céu envolvente. Foi a isto que Ricci se referiu, quando disse que Li facilmente entendeu o que outros acharam tão difícil acreditar.

Li sublinhou, no seu prefácio de 1623, que, depois de ver o mapa em 1601, fez cálculos para confirmar se a Terra era uma esfera do tamanho que Ricci dizia e se era uma esfera situada no meio da grande esfera dos céus.26 Ricci registou no mapa de 1602 que Li possuía, tratar-se de wan shih pu ko yi chih fa [uma lei eterna e imutável] que os graus de latitude e longitude deveriam corres-ponder a caminhos orbitais nos céus e ele devotou um ano a fazer cálculos para aprofundar este mode-lo ou princípio [Li].27

Na sua própria anotação, impressa no mapa de 1602, Li relacionou o material do mapa com precedentes chineses sobre a ideia de uma Terra redonda, dividida em graus, e expressou a sua acei-tação tanto sobre o conceito de uma Terra esférica, maior do que anteriormente se concebia, como so-bre o modelo associado dos céus.28 Talvez fo-mentado por ele, o mapa impresso em 1602 levou um aditamento; não apenas de pequenos mapas dos hemisférios norte e sul, com os polos no centro, mas também de pequenas figuras mostrando os nove céus concêntricos, caminhos orbitais no globo celeste e as posições relativas do Sol, Lua e Terra, para criar as sombras de um eclipse.

Claro que o material pelo qual Li interessa-va-se enquadra na rubrica "ciência" e Ricci regis-tou nos seus diários que, em 1601, Li pensou apren-der mais sobre questa scientia (que foi anterior-mente traduzida por "este conhecimento"). "Este conhecimento", com o qual Li andou ocupado du-rante anos, pode ser rotulado mais objectivamente de "ensinamento do Céu". Se é chamado de ciên-cia, então perde-se uma ambiguidade importante, por que aprendizagem celestial também era uma forma alternativa de referir as ideias religiosas introduzidas pelos missionários. Que não era ne-cessária nenhuma delimitação, continua a ser im-plicitamente reconhecido em 1628, quando Li pu-blicou escritos "científicos" e religiosos, sob o títu-lo Ensinamento do Céu. 29

Yang solucionou a sua procura por "uma fonte de valores morais determinada do exterior", aceitando o Céu e o Senhor do Céu. Sob uma orientação intelectual bem diferente, a procura de Li de "uma lei imutável", em pequena escala, levou-o, através de números e cálculos envolvendo os céus, à conclusão de que havia "mentes e princípios semelhantes nos mares orientais e ocidentais"30 e ao desejo de aceitar o eterno e universal "Senhor do Céu".

A admiração de Li por Ricci cresce a passos quase comparáveis ao seu maior entendimento do Céu e culmina vendo Ricci como sendo "compatí-vel com o Céu". Como Li atesta, Ricci manifestava virtude e segurança. Se as suas capacidades morais fossem acessíveis aos outros, tal como a si, teriam de ser retratadas como vindas da disciplina de sub-missão ao Céu. Li pode não ter deixado as suas concubinas, ou pode não ter-se submetido às leis morais, até enfrentar a morte; contudo, por muito que ele e Yang contrastem em personalidade e ori-entação intelectual, encontram no ambíguo "Céu" uma fonte de saber e uma fonte de disciplina que era externa e universal. Li indicava isto, ao retirar do Chuang Tzu o termo Chihjen [homem aperfei-çoado] para referir-se a Ricci.

O termo perpassa por todo o texto do Chuang Tzu e é aplicado, na maior parte dos casos, em contextos adequados; mas dois são especial-mente apropriados para a percepção que Li tem de Ricci em associação com o Céu. No primeiro capí-tulo do Chuang Tzu, lê-se: "o homem aperfeiçoado não tem ego" [chihjen wu chi]. Isto contrasta com a antiga preocupação do século dezasseis, dos reinos egocêntricos "interiores". E, no capítulo final do Chuang Tzu, há esta definição: "Ele, o que não se afasta da verdade, é chamado de homem aperfeiçoa-do" [Pu li yu chen wei chih chihjen].31 Li apreciava que a virtude de Ricci, bem como a sua ciên-cia, fossem baseadas fora do seu próprio "eu" e também fora da sua própria sociedade.

O BAPTISMO DE HSU KUANG CHI

Hsu sentiu-se fortemente atraído por Ricci, tal como Li, mas o missionário não parece ter tido um papel muito preponderante nos acontecimentos que levaram ao seu baptismo, em Nanquim, em 1604. No entanto, os diários de Ricci são a princi-pal fonte para a história.32

Hsu nasceu em Xangai, em 1562. O pai era comerciante, por vezes bastante pobre. A mãe era de uma família local de letrados e é retratada, no elogio fúnebre que Hsu dedicou a si, em termos fortemente morais.33 Quando Hsu passou nos exames da pre-feitura, em 1581, com vinte anos, foi-lhe imediata-mente preparado um casamento.34

Hsu falhou quatro tentativas sucessivas no exame provincial trienal e, em 1592, a mãe morreu. Depois do luto, reprovou novamente, em 1594. Em grande desespero, segundo Ricci, Hsu foi para sul, para Guangdong, onde se sustentou ensinando em Shuzhou. Lá, visitou a capela católica, recentemen-te construída, e mostraram-lhe uma pintura do Sal-vador. O seu anfitrião era Cattaneo.

No ano seguinte, 1597, voltou a fazer os exa-mes provinciais. Desta vez, o chefe dos examinado-res era o famoso letrado Chiao Hung (1541-1620), profundamente envolvido com o Budismo.35 Hsu ficou em primeiro lugar mas, na Primavera seguinte, reprovou no exame metropolitano.

Ricci escreveu que, anos mais tarde, Hsu atri-buiu o seu primeiro fracasso no exame de chin shih à intervenção divina, porque, se tivesse passado em 1598, não teria tido oportunidade de estar com os padres. Provavelmente, teria arranjado uma concubina, o que era prática comum entre os novos chin shih, e teria tido relutância dela se separar pois, nessa altura, só tinha um filho.36 Assim, a "inter-venção divina" do seu fracasso salvou-o do "obstá-culo" que tanto Yang como Li tiveram mais tarde.

Em 1600, no seu caminho de Xangai para Beijing, Hsu parou em Nanquim, encontrando Ricci pela primeira vez. Falaram sobre Fé, de que Hsu já possuia algum conhecimento. Mas, como Hsu tinha pressa, conforme afirma Ricci, aprendeu apenas um pouco sobre como servir "ao Criador do Céu e da Terra e Autor de todas as coisas".

Ricci escreveu que, pouco depois do encon-tro, Hsu sonhou que estava num templo com três capelas. Numa, viu uma estátua que, disse uma voz, era Deus Pai [Iddio Padre]; noutra, uma está-tua coroada, dizendo-lhe a mesma voz ser Deus Filho [Iddio Figliuolo]; a terceira capela estava va-zia. Hsu prestou homenagem às duas estátuas e de-pois acordou. Só percebeu o sonho anos mais tarde, quando o instruíram nos mistérios da Santíssima Trindade. Como os padres o tinham advertido para não acreditar em sonhos, não disse nada sobre o seu, até 1605 quando, por acaso, Ricci mencionou que, por vezes, Deus revela coisas através dos so-nhos. Nessa altura, ele contou sua experiência.37

Na Primavera de 1601, em Beijing, Hsu re-provou pela segunda vez no exame de chin shih.38 No Inverno de 1603, foi de Xangai para Nanquim. Ricci permanecia em Beijing, quando Hsu foi ter com João da Rocha, S. J. (1565-1623), que lhe mostrou a capela da missão, onde reveren-ciou uma representação da Virgem e o Menino. A seguir, ficaram a falar sobre religião até o cair da noite, quando voltou para o seu alojamento, levan-do consigo cópias manuscritas da Doutrina cristã [Dottrina cristiana] e do Catecismo [Catechismo], que leu durante a noite.

No dia seguinte, compareceu perante Rocha, já com algumas partes dos textos decoradas, pedin-do-lhe maiores esclarecimentos. Como tinha que re-gressar a Xangai por altura do ano novo, pressionou Rocha a iniciar imediatamente o processo do baptis-mo. Rocha disse-lhe que deveria ir ter com ele, uma vez por dia, para ser instruído nos oito dias remanes-centes de estadia em Nanquim. Hsu foi não uma, mas duas vezes ao dia e, quando Rocha não se en-contrava livre, era iniciado na doutrina por estudan-tes chineses que lá se encontravam. No oitavo dia, foi baptizado, passando a chamar-se Paulo e, no mesmo dia, foi ter com a família em Xangai.39

No caminho para Beijing, na Primavera de 1604, Hsu voltou a fazer um desvio a Nanquim, onde esteve com Rocha e ouviu missa todos os dias.40 Quando chegou a Beijing, contactou Ricci e recebeu dele a comunhão. Passou o exame de chin shih e entrou para a carreira oficial, onde foi promovido de compilador Hanlin a secretário principal. 41 Simultaneamente, começou a traba-lhar, próximo a Ricci, na tradução e publicação de obras sobre matemática e astronomia.42 De for-ma ora mais ora menos generosa, Hsu apoiou e promoveu a Igreja na China nos trinta anos seguin-tes, tanto através de sua fortuna pessoal, como de sua influência política e intelectual. Tornou-se, como Ricci declarou, um "grande pilar" para o Cristianismo na China.43

Os eventos anteriores, extraídos na sua maio-ria de diários de Ricci, dizem-nos muito sobre a conversão de Hsu ao Cristianismo. Primeiro, a jus-taposição da sua sorte nos exames com as etapas de seu interesse pelo Cristianismo, sugerem que um Hsu inseguro encontrou alguma confiança nos ensinamentos dos missionários. Segundo, parece que ele persuadia a si próprio mais do que o persua-diam. Terceiro, antes do baptismo, em 1604, parece não ter sido a ciência ou o carácter de Ricci a força atractiva, embora seja claro ter ficado intrinsicamente ligado a ambos. Então, por que é queHsu tomou a iniciativa de procurar o baptismo?

O QUE HSU KUANG CHI DESCOBRIU

No verão de 1604, depois de ser baptizado em Nanquim e de se tornar um chin shih em Bei-jing, Hsu escreveu um pós-escrito para a brochura de Ricci, intitulada Erhshihwu yen [Vinte e cinco discursos].

Hsu começou por recordar que, quando viaja-va pelo Sul, pode contemplar respeitosamente uma imagem do Senhor do Céu, que havia sido trazida da Europa. A seguir, recordou ter já visto um mapa-múndi impresso, tomando conhecimento da existên-cia de Ricci. Teve oportunidade de encontrá-lo em Nanquim e, simpático às suas ideias na generalida-de, considerou-o um cavalheiro e erudito (Note-se, aqui, a base para as duas conclusões: a atracção pela ciência e pelo carácter de Ricci).

Pouco tempo depois, Ricci foi oferecer pre-sentes ao Imperador, em Beijing, sendo tratado como convidado de Estado. Por isso, toda a gente conhecia o missionário e todas as individualidades ansiavam ser-lhe apresentadas. Quando familiariza-ram-se com suas ideias, julgaram-nas tanto agradá-veis como originais. Quando o próprio Hsu aprofundou-se nas ideias mais importantes de Ricci, percebeu que as que de início tinham atraído os lei-tores eram apenas refugo. E, esta brochura, escreveu Hsu, era apenas uma ínfima fracção desse refugo.

Hsu disse aos leitores, no seu pós-escrito, que o estudo de Ricci focava todos os assuntos, mas que o conceito principal era servir, contínua e abertamente, a Divindade do Alto. Todas as emo-ções e desejos bem como palavras e acções irrelevantes deviam ser varridas, quando se procura o que é chamado "um corpo que recebeu o todo".

Hsu vasculhou tudo o que os missionários disseram e procurou uma única palavra que não estivesse de acordo com o grande ensinamento de ser leal para com quem governa e que não estivesse de acordo com o preceito da piedade filial, ou ain-da uma palavra apenas que não fosse benéfica para a mente dos indivíduos ou para o bem da socieda-de. Não encontrou nenhuma.

Escreveu que, durante toda a vida, tivera tendência para o cepticismo, mas isso foi como que uma nuvem a diluir-se. Não podia haver dúvida. Quando ele próprio conseguiu esclarecer outros, baseando-se naquelas teorias, era o mesmo que va-guear em abismos profundos. Não podia haver dú-vida. Assim, arranjou coragem e pediu para ser-vir.44 No pós-escrito, resumiu o processo da sua decisão de se tomar cristão.

Alguns anos depois, no seu prefácio para Ricci e na tradução de um livro escolar de geometria, Hsu disse, aos seus leitores, o que para eles desejava:

"A minha pressa (Ricci) de transmitir o as-pecto menos importante (dos seus preceitos, nesta tradução) vem do desejo de pôr primeiro o que é fácil de acreditar, fazendo com que outros se en-volvam nestes textos, percebam o exemplo destas ideias e entendam que se pode acreditar e não duvi-dar deste estudo."45

Frisou que só o aspecto menos importante do estudo de Ricci envolve "investigar e aprofundar", enquanto o que é mais importante im-plica "cultivar e servir o Céu".46 Ele esperava que os leitores do livro de geometria passassem do aspecto menor do "ensinamento do Céu" de Ricci para os seus mais importantes aspectos morais e religiosos. Podemos concluir que o próprio Hsu ti-nha avançado de forma semelhante.

"A manifesta procura da "certeza" é coerente com os três pontos extraídos dos eventos que leva-ram ao seu baptismo. Ele procurava algo e encon-trou-o noutro sítio que não na "ciência" ou no ca-rácter de Ricci.

Uma frase de Hsu tornou-se um lema em muita da literatura sobre ele.47 Aparece como: Pu ju i fo [Completa o Confucionismo e desaloja o Budismo], tendo implícito o Cristianismo ou o ensinamento ocidental. Vale a pena citar a frase no contexto em que Hsu a usou, num prefácio que escreveu em 1612. Depois de elogiar Ricci e seus ensinamentos, mais ou menos à maneira do pós--escrito de 1604, escreveu:

"Já disse muitas vezes que a sua (ou nossa) religião pode, certamente, "completar o Confucio-nismo e desalojar o Budismo" e que o restante (dos ensinamentos) também possui um certo tipo de aprendizagem envolvendo "investigação e apro-fundamento de princípios" (a frase principal para Cheng Chu, do Neoconfucionismo)48 para que, sempre que haja uma interrogação, fora ou dentro do reino da sociedade humana, ou sobre um princí-pio dos dez mil assuntos (no reino social do ho-mem), ou ainda sobre as dez mil coisas (no reino do Céu e da Terra), possam responder sem cessar, com explicações extremamente pormenorizadas e, quando se pensar que acabaram, seja por meses ou anos, sinta-se cada vez mais a necessidade e a imutabilidade de suas teorias."49

O que Hsu descobriu foi um modo de apren-der o ensinamento do Céu que, tal como os missio-nários exemplificavam, juntava uma valiosa qualida-de e disciplina aos valores morais que ele herdou da sua tradição. O Ensinamento do Céu era o corpus de um certo conhecimento baseado não na mente de alguém, mas no mundo externo resumido na palavra Tien (Céu). Ao mesmo tempo, o conhecimento não estava sujeito a sanções da autoridade, mas a uma confirmação própria feita através da investigação.

POR QUE SE TORNARAM ELES CRISTÃOS?

Hsu Kuang Chi, Li Chih Tsao e Yang Ting Yun aproximaram-se do Cristianismo de formas di-ferentes, mas todos encontraram nele uma discipli-na moral baseada numa fonte universal externa. Tal como muitos dos seus contemporâneos, eles podem ser compreendidos como à procura de novas bases intelectuais para fortificar valores tradicionais que, era bem claro, tinham sido corroídos.

Ao contrário da maioria dos seus contempo-râneos, que não se cristianizaram, Hsu, Li e Yang tiveram o Ensinamento do Céu ao seu alcance e acharam as suas respostas persuasivas. Contudo, como Hsu implicitamente confessou, a escolha de-les foi natural.

Publicação gentilmente autorizada pelos editores. Do origi-nal: East meets West: the Jesuits in China, 1582-1773 / ed. por Charles E. Ronan, S. J. e Bonnie B. C. Oh. -- Chicago: Loyola University, 1988. -- Pp. 129-52.

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NOTAS

1 Mateus Ricci apelidou Hsu Kuang Chi de grande pilar da cristandade chinesa. Cf., D'ELIA, Pasquale M., S. J., e. d. -- Fonti ricciane: documenti originali concernenti Matteo Ricci e a storia delle prime relazioni tra l'Europa e la Cina, 1579-1615, Roma, 1942-1949, vol. 2, p. 308, nota 712. Para material biográfico sobre Yang Ting Yun, Li Chih Tsao e Hsu Kuang Chi, ver notas apropriadas em D'Elia, bem como os seguintes trabalhos: (a) HSU Tsung Tse -- Ming Ching chien yeh su hui shih i chu ti yao [Uma bibliografia com anotações de traduções e escritos jesuítas nos fins do período Ming, início do período Qing], Taipei 1958; (b) YANG Chen O -- Yang Ting Yun hsien sheng nien pu [Narrativa cronológica da vida de Yang Ting Yun], Shanghai, 1944; (c) FANG Hao -- Li Chih Tsao yen chiu [Pesquisa sobre Li Chih Tsao], Taipei, 1966; (d) LO Kuang -- Hsu Kuang Chi chuan [Biografia de Hsu Kuang Chi], Hong Kong, 1953; (e) LIANG Chia Mien -- Hsu Kuang Chi nien pu [Narrativa cronológica da vida de Hsu Kuang Chi], Shanghai, 1981. E também os artigos sobre estes letrados chineses em: HUMMEL, Arthur W., ed. — Eminent Chinese of the Ching period (1644-1912), Washington, D. C., 1943-1944, vol. l, pp. 316-19,452-54; vol. 2, pp. 894-95. Para a ortografia dos nomes dos missionários, ver: DEHERGNE, Joseph, S. J. -- Répertoire des jésuites de Chine de 1552 à 1800, Roma, 1973. Resumos pormeno-rizados dos sítios exactos da actividade missionária, obtidos através de pesquisa de muitas das primeiras fontes ocidentais, podem ser consultados em: DEHERGNE, Joseph, S. J. -- Les chrétientés de Chine de la période Ming (1581-1650), "Monumenta serica", Bonn, (16) 1957, pp. 1-136.

2 GERNET, Jacques -- Chine et Christianisme: action et réaction, Paris, 1982, pp.46-47. Gernet sublinha que alguns missionários, sobretudo Niccolȯ Longobardi, S. J. (1565-1655), expressaram dúvidas sobre se as pessoas que tinham sido baptizadas tinham de facto sido bem instruídas na Fé. Note-se que as opiniões atribuídas a Longobardi, que é frequentemente citado, chegam-nos numa versão que parece ter passado pelas mãos do Franciscano António de Santa María Caballero (1602-1669), antes de ser publicada em Francês, em Paris (1701), como contribuição para a Questão dos Ritos. Idem, pp. 19-20. Ver também: DEMIÉVILLE, Paul -- The first philosophic contacts between Europe and Chi-na, "Diogenes", (58) Verão 1967, pp. 94-95.

3 TING Chih Lin -- Yang Ting Yun sjien sheng chao hsing shih chi [Manifestações do espantoso carácter de Yang Ting Yun], Paris, Bibliothèque Nationale, Courant 3370. Trata-se de uma cópia do que parece ser uma recente impressão Ming, deste trabalho. Segue-se esta versão.

4 Fang Ho, nota introdutória, in: YANG Chen O -- Op. cit., p. 2. Fang diz ter Aleni feito a narrativa a Ting, que a pôs sob forma escrita. Ver informação sobre Yang Ting Yun em: HUMMEL -- Op. cit, vol. 2, p. 894.

5 CHUN Fang Yu -- The renewal of Buddhism in China: Chu-hung and the late Ming synthesis, NewYork, 1981, pp. 23-28.

6 YANG Chen O -- Op. cit., p. 26. Cf., FANG Hao -- Op. cit., p. 36.

7 CHUN Fang Yu -- Op. cit., pp. 76-90.

8 YANG Chen O-- Op. cit., p. 27.

9 Idem, p. 26. Cf., FANG, Hao -- Op. cit., p. 36; D'ELIA-- Op. cit., vol. 3, p. 13, nota 3; em relação ao ano de baptismo de Yang. E também: HUMMEL -- Op. cit., vol. 2, p. 894; onde o baptismo é datado de 1612. GOODRICH, L. Carrington; FANG Chao Ying, ed. -- Dictionary of Ming biography: 1368-1644, New York, 1976, p. 33; traz a data de 1613. GERNET, Jacques-- La politique de conversion de Matteo Ricci et l' évolution de la vie politique et intellectuelle en Chine aux environs de 1600, "Archives des sciences sociales de religiones", (36) 1973, p. 86. Gernet observa que Yang Ting Yun, baptizado com 54 anos, passou quase sem transição da fé budista para a cristã.

10 FANG Hao -- Op. cit., p. 30.

11 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, pp. 168-71, nota 628. Para uma versão ligeiramente diferente, ver: TRIGAULT, Nicolas, S. J., ed. -- De christiana expeditione apud Sinas, Romae, 1615, pp. 435-36. Ver também a tradução do último trabalho de: GALLAGHER, Louis J., S. J. -- China in the sixteenth century: the journals ofMatthew Ricci, 1583-1 610, New York, 1953, p. 397.

12 Li Chih Tsao, prefácio, in: ALENI, Giulio -- Chih fang wai chi, 1623; publicado, in: LI Chih Tsao, compil. -- Tien hsueh chuhan [First collection of writings on learning from heaven]; reimpressa por: WU Hsiang Hsiang, ed.-- Zhongguo shih hsueh tshung shu [Colectânea de estudos históricos chineses], Taipei, 1965, vol. 23, la, p. 1269.

13 Ver nota preliminar de Ricci no mapa de 1602, reprodu-zido e publicado sob o título Li Ma Tou kun yu wan kuo chuan tu [Mapa completo da miríade de nações da Terra, de Mateus Ricci], Beijing, 1936.

14 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, pp. 173-78, nota 631; TRIGAULT -- Op. cit., pp. 436-37; GALLAGHER -- Op. cit., p. 398.

15 FANG Hao -- Op. cit., pp. 22-23.

16 Li Chih Tsao, prefácio, in: RICCI, Matteo -- Chihjen shihpien [Dez ensaios sobre o homem aperfeiçoado]; publicado, in: LI Chih Tsao, compil. -- Op. cit., la-2a, pp. 101-3. Li estava a fazer uma alusão, tal como o título de Ricci, ao capítulo do Chuang Tzu intitulado "Grande e vunerável professor", onde Confúcio define o "homem aperfeiçoado" como sendo aquele que é "aperfeiçoado para os outros, mas compatível com o céu". Cf., Chuang Tzu, "Harvard - Yenching Institute Sinological Index Series", Beijing, 1947, [18/6/73]. O Chuang Tzu é um texto atribuído ao filósofo Chuang Tzu do século IV a. C.

17 D'ELIA -- Op. cit., vol 2, p. 178, nō 3, notas 631-32.

18 Idem, ibidem. Trigault foi menos simpático com Li sobre a questão das suas concubinas. Ele comentou: "Parece que o homem teve mais rapidez em reconhecer a verdade do que coragem para aceitá-la". Cf., TRIGAULT -- Op. cit., p. 437; GALLAGHER -- Op. cit., p. 398.

19 FANG Hao -- Op. cit., p. 29. Fang faz notar que a biografia de Aleni sobre Ricci inclui a única antiga narrativa chinesa do baptismo de Li. ALENI, Giulio Aleni, S. J. [Ai-ju-lüeh] -- Tai hsi hsi tai Li hsien sheng hsing chi [The career of Ricci from the Far West], ed. Hsiang Ta, Beijing, 1974, p. 19.

20 Cf., FANG Hao -- Op. cit., p. 29; onde cita Aleni. Cf., D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 501, notas 926-27. A versão dos acontecimentos de Trigault parece estar em conflito com a de Aleni, porque Trigault mantém que Li encontrava-se doente, quando opróprio Ricci desapare-ce. Cf., TRIGAULT -- Op. cit., pp. 611, 614; GALLAGHER -- Op. cit., pp. 562,564. Um tael era uma unidade de valor; como unidade de peso, no final do período Ming, correspondia a 1,3 onças, aproximada-mente.

21 FANG Hao -- Op. cit., p. 36.

22 TING Chih Lin -- Op. cit, p. 3.

23 Para uma narrativa sumária das publicações jesuítas sobre "ciência", em Chinês, durante a época Ming, ver: PETERSON, Willard J. -- Western natural philosophy publisheed in late Ming China, "Proceedings of the American Philosophy Society", (117) August 1973, pp. 295-322.

24 TRIGAULT -- Op. cit., p. 437. Cf., GALLAGHER -- Op. cit., p. 398.

25 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 172, nō 3, nota 629.

26 Li Chih Tsao, prefácio, in: ALENI, Giulio -- Op. cit., lb-2a, pp. 1270-71.

27 Ver nota 13. Li, aparentemente, tentava relacionar os "campos" no Céu com os da Terra.

28 Idem, ibidem. Ver apontamento de Li Chih Tsao (Pací-fico central).

29 GERNET, Jacques -- Op. cit., 1982, pp. 93, 265. Ele traduz Tienhsueh como estudos celestes. Os livros, seis de matemática, quatro de astronomia e um sobre conser-vação da água, estavam agrupados numa secção chama-da: Chi pien [Compilações sob fenómenos concretos]. Os títulos sobre costumes, religião e geografia vêm sobre o nome: Li pien [Compilações de princípios].

30 Ver nota 28.

31 Chuang Tzu, Op. cit., [2/1/21] e [90/33/3].

32 Em adição ao resumo escrito por Ricci, tal como vem em: D'ELIA -- Op. cit., vol 2, pp. 250-55, notas 680-83; ver material suplementar em LO Kuang -- Op. cit.; e LIANG Chia Mien -- Op. cit. Com algumas variantes, a história também é encontrada em: TRIGAULT -- Op. cit., pp. 471-73; e GALLAGHER, Louis J., S. J. -- Op. cit., pp. 429-31.

33 Ver HSU Kuang Chi --Hsu Kuang Chi chi [Colecção de escritos de Hsu Kuang Chi], Beijing, 1963, pp. 527-28.

34 LIANG Chia Mien -- Op. cit., p. 44; LO Kuang -- Op. cit., p.6; D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 250, nº 3, notas 679-80. Pode-se concluir pela situação económica pou-co confortável da família de Hsu através dos tardios preparativos do casamento.

35 Ricci disse que Chiao Hung (de quem, por convenção, Hsu Kuang Chi era conhecido seguidor -- pelo facto de ter sido Chiao a passá-lo no exame provincial), mais tarde, tentou convencer Hsu a não seguir a fé dos missio-nários. Ver: D'ELIA-- Op. cit., vol 2, p. 489, nota 912.

36 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 252, nota 680. Por volta de 1604, quando Hsu passou o exame, o filho já lhe tinha dado dois netos. Idem, p. 253.

37 Idem, pp. 253-54, nota 681.

38 A história que Ricci conta sobre o nome de Hsu ter sido apagado, no último minuto, da lista de candidatos bem sucedidos, é confusa. Ver: Idem, p., 253, nota 680. Sem respeitar o testemunho de Ricci, Liang Chia Mien con-clui que Hsu não foi ao exame de 1601 e sugere como razão doença ou assuntos familiares. Ver: LIANG Chia Mien -- Op. cit., pp. 65, 67.

39 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, pp. 254-55, nota 682. Nenhum historiador, pelo que parece, foi capaz de encontrar um testemunho do próprio Hsu sobre estes acontecimentos. Ver: MOTOMI, Goto -- Min Shin shiso to Kirisuto-kyo [Pensamento Ming Qing e Religião Cristã], Tokyo, 1979, pp. 144-45. A narrativa da vida de Hsu, feita pelo filho, não menciona terem-se tornado seguidores da fé ociden-tal. Ver: HSU Kuang Chi -- Op. cit., pp. 55-63.

40 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 255, nota 683.

41 Idem, p. 308, nota 714. Também: LIANG Chia Mien -- Op. cit., p. 193; e Hsu Kuang Chi, in: HUMMEL -- Op. cit., vol. 2, pp. 316-19.

42 Ver: TRIGAULT -- Op. cit., p. 520; e GALLAGHER, Louis J., S. J. -- Op. cit., p. 476; onde é afirmado que Hsu sugeriu a estratégia de publicação de livros sobre ciência ocidental. Certamente que nenhum foi publicado antes de Hsu se ter envolvido com Ricci, mas Li Chih Tsao tinha trabalhado em matemática e astronomia pelo me-nos durante um ano.

43 D'ELIA -- Op. cit., vol. 2, p. 308, nota 712.

44 HSU Kuang Chi -- Pa Erhshihwu yen [Pós-escrito para os vinte e cinco discursos], in: HSU Kuang Chi -- Op. cit, pp. 86-87. Ver também: LI Chih Tsao, compil. -- Op. cit., pp. 325-27.

45 HSU Kuang Chi -- Ko chi ho yuan pen hsu [Prefácio para a impressão dos elementos de geometria], in: HSU Kuang Chi -- Op. cit, p. 75. Ver também: LI Chih Tsao, compil. -- Op. cit., pp. 1927-28.

46 Idem, ibidem.

47 O exemplo mais clássico é dado por Trigault: "A resposta dada pelo doutor Paulo, quando lhe perguntaram publica-mente o que considerava ser a base da lei Cristã, pode ser citada aqui, por ser muito oportuno. Definiu o assunto em quatro sílabas, ou melhor, em quatro palavras quando disse Ciue, Fo, Pu, Giu, significando: "acaba com os ídolos e completa a lei dos literatos'". TRIGAULT -- Op. cit., p. 489; e GALLAGHER, Louis J., S. J. -- Op. cit., p. 448. Em Trigault, as quatro palavras Ciue, Fo, Pu, Giu, provavelmente transliteradas (escrita chinesa). Também: GERNET, Jacques -- Op. cit., 1982, p. 94; DEMIÉVILLE, Paul -- Op. cit., pp. 89-90; e WANG Chung Min -- Hsu Kuang Chi, Shanghai, 1981, p. 25.

48 Ver: PETERSON, Willard J. -- Fang I Chih: Western learning and the 'Investigation of things', in: "The unfolding of Neo-Confucianism", ed. Wm. Theodore de Bary, New York, 1975, p. 377.

49 HSU Kuang Chi -- Tai hsi shiu fa hsu [Prefácio para os Métodos ocidentais do controlo da água], in: HSU Kuang Chi -- Op. cit, p. 66. Ver também: LI Chih Tsao, compil. -- Op. cit., pp. 1506-7.

*Professor de Estudos Asiáticos, na Universidade de Princeton. Entre suas várias publicações, inclui-se: Bitter Gourd: Fang I-chih and the impetus for intellectual change.

desde a p. 79
até a p.