Influência Portuguesa na Música da Ásia

ALESSANDRO VALIGNANO FAN LI-AN 范禮安 (1539-1606) ESTRATEGA DA MISSÃO JESUÍTA NA CHINA

Edward J. Malatesta, S. J.*

Padre Valignano. Reitor do Colégio de Macerata, foi nomeado visitador das missões jesuítas situadas para além do cabo da Boa Esperança. Aportou a Macau em 1578 e ao Japão em 1579. Foi provincial da Índia entre os anos de 1583 e 1587, regressando, a seguir, ao Japão. Veio a falecer em Macau, em 1606.

Na época moderna, foi confiada a Mateus Ricci 利瑪竇 a missão de estabelecer o Catolicismo na China e de ser o pioneiro, a um nível superior, do intercâmbio cultural entre a China e o Ocidente. Contudo, Ricci não teria ido para a China, em rumo à capital, nem teria alcançado notável sucesso se não fosse um outro Jesuíta italiano do século XVI, Alessandro Valignano.1

Em Agosto de 1571, Ricci entra para a Ordem no noviciado de Sant'Andrea al Quirinale em Roma. Dado o facto de Fabio de Fabbii, Mestre dos Noviços, se encontrar doente, Valignano, que era ministro da casa, substituiu-o temporariamente. Durante alguns meses, Valignano e Ricci viveram na mesma comunidade.

Em Agosto de 1573, depois de Valignano ter completado os seus estudos teológicos, foi confessor e Reitor do Colégio de Macerata, terra natal de Ricci. O Padre Geral Mercurian indicou-o como Visitador, detentor de autoridade sobre todas as missões jesuítas nas Índias Orientais que, na altura, se estendiam de Goa ao Japão.2 Nos seus diários, intitulados Della Entrata della Compagnia di Giesú e Christianità nella Cina, Ricci menciona Valignano, pela primeira vez, quando dá um panorama das várias tentativas que foram levadas a cabo para introduzir o Cristianismo na China. Ele apresenta Valignano como aquele que revivificou o esforço de introduzir a fé cristã nesta zona, esforço esse que tinha sido largamente reduzido devido aos obstáculos que diariamente aumentavam.3 Valignano chegou a Goa a 6 de Setembro de 1574. Depois de ter visitado a Índia, entre 1575 e 1577,4 chega a Macau pela primeira vez em Setembro de 1578. Viria a estabelecer-se em Macau durante dez meses até navegar para o Japão a 7 de Julho de 1579.

Os Portugueses estavam em Macau desde 1557, mas em 1573 foi erigido um muro que os separava da China continental. Os europeus em Macau referiam-se a uma missão para a China como uma "impresa desperata".5 Contudo, durante a sua primeira estada no enclave português, Valignano "veio a entender bem a nobreza e grandiosidade desse Reino governado na paz e na prudência, e ficou persuadido que gente talentosa e diligente como essa não recusaria a entrada a alguns Jesuítas, homens bons, que sabiam a sua língua e conheciam a sua literatura...".

Assim, Valignano determinou a ida de alguns padres para Macau para estudarem Chinês.6 Ele próprio disse que a sua decisão tinha resultado do "desejo de tentar, de alguma forma, abrir aquela porta [da China], a qual até à data se tinha mantido tão fechada, e de ter alguns padres a viver lá."7

Valignano escreveu ao Provincial da Índia, Rodrigo Vicente, pedindo-lhe que enviasse Bernardino de Ferraris a Macau para preparar o trabalho na China. Mas o Reitor de Cochim não podia ser dispensado. Em sua substituição, escolheram Michele Ruggieri 羅明堅 que chegou a Macau a 20 de Julho de 1579, exactamente duas semanas após Valignano ter partido para o Japão.8 Posteriormente, nesse mesmo ano, Ruggieri escre-veu a Valignano pedindo-lhe firmemente que Mateus Ricci, com quem ele tinha viajado para a Índia, se lhe juntasse para com ele se debruçar nos estudos chineses. Valignano acedeu e Ricci, que se encontrava no seu terceiro ano de estudos teológi-cos, recebeu as ordens de Valignano cerca de 15 de Abril de 1582. A 26 de Abril pôs-se a caminho, chegando a Macau a 7 de Agosto.9

Não possuímos as instruções escritas que Valignano preparou para Ruggieri, no que se refere à adaptação cultural, contudo temos as directrizes que ele determinou, resultantes das consultas no Japão.10 A 12 de Fevereiro de 1582, Valignano acrescentou ao texto original, ao memorial para os Superiores do Japão, a sugestão de que fossem destinados quatro escolásticos, em Macau, para se dedicarem apenas ao estudo da China e da sua literatura, uma vez que sem conhecimento da língua seria impossível tentar, com eficácia, converter a China. Desde o princípio, Valignano ordenou que Ruggieri e Ricci não tivessem outras ocupações senão o estudo do Chinês. Mais tarde, quando teve conhecimento dos grandes progressos deles, repetiu essa ordem, na margem do Sumário Japonês, acrescentando que eles deveriam ter os seus próprios professores, uma casa separada, e todas as condições de que necessitassem.11

Ricci relata-nos que, durante a segunda visita de Valignano a Macau (9 de Março - 31 de Dezembro de 1582), "uma das suas principais ocupações foi o empreendimento na China."12 Estabeleceu a Confraternidade do Nome de Jesus com regras e directrizes para o seu funcionamento. Do conjunto dos membros fariam parte chineses e outros cristãos asiáticos, mas nenhum português. O director teria de ser um dos padres que se dedicavam ao estudo da China. Indicou Ricci para ser o primeiro director.13 Quando o Vice-Rei das províncias de Kuangxi e Guangdong (Cantão) or-denou que o Bispo e Capitão de Macau compareces-se à sua presença em Zhaoqing 肇慶, Valignano substituiu o Bispo por Ruggieri com a esperança deque este pudesse permanecer na China, contudo ele foi forçado a voltar.14 Mais tarde, quando o Vice-Rei, com o desejo de obter dádivas preciosas, convi-dou os Jesuítas a fundar uma igreja e uma casa na China, Valignano enviou Ruggieri e Pasio 巴范濟. Permaneceram aí quatro ou cinco meses, obtendo permissão para que Ricci se juntasse a eles. Todavia, quando o Vice-Rei perdeu o seu cargo, viram-se obrigados a regressar a Macau.15

Valignano, contente por saber que Ruggieri e Ricci estavam estabelecidos em Zhaoqing e que os seus esforços estavam a atingir bons resultados, deu passos decisivos no sentido de os ajudar. Nomeou Duarte de Sande 孟三德 como Superior da missão; este reportar-se-ia directamente ao Provincial da Índia e ao Vice-Provincial da China e do Japão. Junto com ele, enviou António d'Almeida 麥安東. Chegaram a Macau no fim de Julho de 1585; pouco depois da sua chegada, primeiro de Sande e seguidamente d'Almeida receberam permissão dos oficiais chineses para entrar na China.16 Valignano obteve, a dada altura em 1585 ou 1586, do Vice-Rei da Índia, Duarte de Meneses, fundos suficientes para sustentar os Jesuítas na China. Seriam pagos por Malaca e o acordo foi confirmado, em regime perpétuo, pelo Rei Filipe II. O Vice-Rei ofereceu ainda presentes à nova casa e à igreja.17 Valignano continuou a seguir de perto os avanços e recuos da missão na China. Ao ter consciência de que os padres em Zhaoqing precisavam de ganhar maior estima dos funcionários e dos letrados e que não poderiam permanecer na China, em segurança, sem a permissão do Imperador, Valignano decidiu, durante a sua terceira visita a Macau (28 de Julho de 1588 - 29 de Junho de 1590), solicitar uma embaixada papal ao Imperador. Valignano propõe a sua ideia numa longa carta enviada ao Geral a 10 de Novembro de 1588. Ele esperava que a visita bem sucedida dos quatro embaixadores japoneses a Roma, ainda fresca na memória de todos, pudesse influenciar a Santa Sé a enviar uma representação ao Imperador. Pretendia mesmo sacrificar um dos seus poucos ho-mens na China a ir apresentar pessoalmente o seu pedido ao Papa, e com este objectivo enviou Ruggieri a Roma. As sucessivas mortes de quatro Papas e outros obstáculos dissuadiram finalmente o Geral de ir mais longe com este projecto.18

Os caciques de Cantão tentaram, através de acusações caluniosas, reconduzir os Jesuítas a Macau. Contudo, autoridades amistosas conse-guiram que o julgamento fosse favorável e o perigo foi ultrapassado. Valignano ao ouvir as acusações, "mandou rezar várias Missas, e orações contínuas a Deus para os libertar. Quando teve conhecimento do feliz resultado, agradeceu à Divina Majestade e fez uma grande celebração com todos os padres".19

Em Novembro de 1588, Valignano, para en-corajar os missionários da China, alterou a transferência do Japão para a China do Padre Francesco de Petris 石方西 que era homem de talento, e que já se encontrava em Macau. Começou imediatamente a estudar Chinês e chegou a Zhaoqing em Dezembro de 1591, pouco depois da morte de d'Almeida, que aconteceu a 17 de Outu-bro. Petris vem a falecer dois anos depois, a 5 de Novembro de 1593.20 A perda destes dois compa-nheiros em tão curto espaço de tempo deixou Ricci "bem assai malancolico".21

Provavelmente por volta do princípio de Abril de 1589, em grande parte devido à hostilidade dos bonzos locais e do próprio Vice-Rei, os padres foram ameaçados de expulsão de Zhaoqing. Ricci enviou um mensageiro para relatar estas notícias a Valignano que ainda se encontrava em Macau. Ricci disse-lhe que considerava oportuno ceder durante al-gum tempo e transferir a residência para Nanhua ou para outro lugar que o Vice-Rei concedesse. O Visitador discordou inicialmente. Eles deveriam de-fender a sua causa, tentar permanecer em Zhaoqing e não aceitar de forma alguma outro lugar. Se fa-lhassem, deveriam então voltar a Macau onde havia trabalho suficiente para todos. Felizmente o intendente das Regiões Ocidentais enviou Ricci a Macau com o objectivo de conseguir para os mandarins de Pequim a compra de tecidos de cor escarlate e outros bens europeus. Valignano rece-beu-o afectuosamente e depois de discutirem o as-sunto, decidiram que, se não fosse possível perma-necer em Zhaoqing, os padres deveriam obter per-missão para irem para outro local.22

Em Agosto de 1589, os Padres de Zhaoqing receberam novamente ordens de expulsão para Ma-cau. Quando chegaram a Cantão, escreveram a Valignano e a outros confrades, avisando-os quetinham sido mandados embora e que no prazo de dois ou três dias estariam em Macau.23 Contudo, no dia seguinte à chegada a Cantão, o Vice-Rei enviou um grupo de homens (mensageiros) para os chamar de volta a Zhaoqing, onde lhes foi permitido que se mudassem para Shaozhou 韶州. A 9 de Setembro, Ricci escreveu a Valignano comunicando-lhe o que tinha acontecido. Em resposta às boas notícias, Valignano mandou um mensageiro "com cartas cheias de afeição, nas quais ele consolava os padres pelas atribulações anteriores, regozijando-se com eles pelos bons resultados que Deus começava a dar, aconselhando-os a permanecerem na China a todo o custo. A sua fama tinha-se espalhado por toda a Cristandade porque as notícias desta missão tinham sido transmitidas ao Rei de Espanha e ao Papa e como tal tomava-se necessário não desapontar todos aqueles que nela depositavam esperanças. Pelo fac-to de Deus os ter feito passar por essas atribulações em Zhaoqing, eles poderiam estar certos, de acordo com a forma como Deus agia, que iriam colher bons frutos".24Três anos mais tarde, durante uma visita a Zhaoqing, Ricci recebeu confirmação da chegada de Valignano a Macau pela quarta vez (24 de Outubro de 1592 - 15/16 de Novembro de 1594). O Visita-dor pediu a Ricci que se deslocasse a Macau a fim de tratar de vários assuntos sérios relativos à Missão, e para submeter o seu pé a tratamento médico, onde tinha sido gravemente ferido durante uma tentativa de roubo à residência. Ricci disse-nos que de facto tinha tratado de muitas coisas favoráveis à promoção da Missão na China, mas os médicos portugueses nada puderam fazer com o seu pé.25

A estima crescente que Valignano devotava a Ricci tomou-se notória pelo que ele escreveu no Catálogo de Fevereiro de 1593: "Ele é um homem de grande inteligência, juízo e prudência, de boa educação, virtuoso e um excelente trabalhador, de quem Nosso Senhor se serve, neste momento, e de quem se irá servir muito mais com o decorrer dos tempos." E numa carta escrita ao Geral, pela mesma altura: "Ele é um homem instruído, virtuoso e prudente, e apesar de ainda não ter tido experiência de administração, parece apto a dirigir uma casa ou colégio."26

Durante essa mesma quarta visita, Ricci in-formou Valignano da necessidade de abandonar a aparência e os modos dos bonzos e adoptar o estilo dos letrados. Desde Outubro de 1583 eles rapavam o cabelo e vestiam-se como bonzos.27 Deveriam agora deixar crescer o cabelo e a barba, vestir rou-pas adequadas para visitarem e receberem letrados e funcionários, e eventualmente irem para outra Província onde o ar fosse mais puro com a vanta-gem de terem uma residência adicional. Valignano concordou com todas estas propostas e encarregou-se de informar o Geral e o Papa. Consequentemen-te, durante a segunda metade de 1594, Ricci come-çou a deixar crescer a barba e, em Maio de 1595, apareceu pela primeira vez com o vestuário dos letrados e de barba e cabelo comprido. Ao mesmo tempo, os Padres começaram a usar as cortesias formais da classe dos letrados autodenominaram-se "Pregadores instruídos" 道人.28

Valignano, que desde 24 de Setembro de 1595 tinha sido libertado da responsabilidade sobre a Índia, permanecendo no entanto Visitador do Japão e da China, queria durante a sua quinta estadia em Macau (20 de Julho de 1597 a 14 de Julho de 1598) desenvolver o trabalho na China antes de partir para o Japão. Dado que não existia qualquer esperança de uma embaixada papal à China 29, decidiu fazer o que podia apenas com os meios de que dispunha. Nomeou Ricci Superior da China e encourajou-o a estabelecer residência em Pequim de forma a cair nas boas graças do Imperador. Valignano enviou presentes a Ricci para que este os levasse para a Corte. Ricci deveria informar o Superior de Macau que, por sua vez, providenciaria tudo o que fosse necessário. Valignano nomeou Manuel Dias 李瑪諾 para este cargo pelo facto de ele ser tão dedicado às coisas da China. Valignano fez do procurador do Japão também procurador da China.30

Em 1601, morre Piero Gomez, Vice-Provinci-al da China e do Japão. Foi substituído por Francesco Pasio, o qual tinha sido membro da Missão na China. Como homem dedicado a esta Missão continuou a protegê-la cada vez mais.

Em 1602, o Visitador nomeou Valentino Carvaglio Reitor do Colégio de Macau que, por sua vez, enviou Manuel Dias para visitar as casas da China. Os Padres da China ficaram tão contentescom a sua presença que pediram a Valignano que o transferisse para a China permanentemente, o que ele fez em 1603.31

Depois da comunidade se estabelecer em Pequim, foi necessário mudar de lugar várias vezes. Os padres tiveram de gastar muito dinheiro, contudo nunca conseguiram um lugar adequado para uma capela. Devido à perda de navios e a outros obstáculos, Valignano não conseguiu o que pretendia, nomeadamente, enviar fundos que permitissem a compra de uma residência adequada que pudesse ser mantida numa base estável.32 A 27 de Agosto de 1605, celebraram finalmente a inauguração de uma residência com 40 quartos, adquirida recentemente. Valignano ficou especial-mente contente com estas novidades e ordenou que enviassem dinheiro, o mais rapidamente possível, para pagar as despesas e para adquirir mobiliário adequado. De Ursis relata que Valignano esperava, com a chegada do navio vindo do Japão, poder man-dar os fundos necessários, mas em caso de urgência também estava disposto a vender os cálices da sa-cristia.33

Quando Valignano chegou a Macau para aquela que seria a sua última visita (10 de Fevereiro de 1603 - 20 de Janeiro de 1606), ficou satisfeito por saber que a Missão na China tinha progredido. De facto, Ricci deu a entender que Valignano tinha vindo por já ter ouvido falar do promissor crescimento da Missão.34 Ricci considerou que tal empreendimento tinha sido uma dádiva milagrosa. Valignano pretendia acompanhar esta obra de perto porque considerava que o campo estava aberto para uma grande conversão, que de modo algum seria inferior a todas as que se tinham levado a cabo desde o início das pregações dos apóstolos até aos nossos dias, incluindo a do Japão.35 Ricci enviou Cattaneo 郭居靜 e Dias a Macau para relatarem a situação a Valignano que, ao tomar conhecimento que o progresso alcançado era superior ao que ele tinha ouvido, decidiu dar assistência de todas as formas possíveis.

Dias deixou Macau em meados de Fevereiro de 1604 com dois novos escolásticos. Valignano transferiu sete escolásticos de Macau e prometeu mais quando o próximo navio chegasse da Índia, em Julho ou Agosto daquele ano.36 Valignano provi-denciou ainda que o procurador do Japão e da China enviasse todos os anos dinheiro e outros bens ne-cessários para que os missionários não tivessem de deixar o seu trabalho a fim de arranjarem o que precisavam para as suas casas.37 Valignano ofereceu muitos presentes às igrejas e casas, aos mandarins e a outros amigos. Deu permissão a três chineses, nascidos de pais cristãos, para entrarem na Companhia. Começaram o noviciado a 15 de Agosto de 1605.38

Talvez o mais importante tenha sido o facto de ele ter aprovado a política que Ricci instaurou relativamente aos rituais chineses.39 Modificou o governo da Missão dando mais poder ao Superior Geral (Ricci) que, a partir daquele momento, não teria de se submeter ao Reitor de Macau, mas sim directamente ao Vice-Provincial da China e do Japão e indirectamente ao Provincial da Índia. Ficou decidido em conselho, primeiro em Nagasaki a 10 de Janeiro de 1603 e depois em Macau a 20 de Julho e a 20 de Outubro, criar a Vice-Província da China e do Japão, ficando independente da Província da Índia.40

Ricci queria libertar-se do cargo de Superior. Os seus conselheiros opunham-se a esta vontade, mas aliviaram a tarefa nomeando Manuel Dias Reitor das três residências de Shaozhou, Nanchang e Nanking.41

O Padre Lazzaro Cattaneo partiu da China para Macau no fim de 1602. Valignano queria que ele aí ficasse por motivos de saúde e também para que se empenhasse nas conversões em Macau e nas aldeias circundantes. Para facilitar o contacto com os chineses, ele usava o cabelo comprido e vestia-se como os missionários da China. O Catálogo de 1603 registava-o como protector dos cristãos, contudo nesse ano houve apenas seis baptismos e o tempo demonstrou que a sua administração rendeu poucos frutos. Em Julho de 1606, ele voltaria à China com de Ursis. Ricci nomeou-o para Nanking e de Ursis para Pequim.42

Vinte e três anos após ter mandado Ricci para a China, Valignano preparava-se para a sua primeira visita ao Império do Meio. A sua inten-ção era viajar com o Padre Cattaneo, o qual planea-va voltar nos princípios de 1606. Todavia, a 11 de Janeiro, pouco depois de ter determinado a data dasua partida, enquanto esperava a chegada de um navio vindo do Japão que deveria trazer o dinheiro e outros presentes que ele pretendia levar para a China, Valignano sofreu um sério ataque de uremia, problema que o incomodava havia alguns anos. A 17 e 18 desse mês, escreveu o seu testa-mento. Veio a falecer por volta das seis horas da manhã. Ricci, numa carta ao Geral, falava de Valignano como "o pai desta missão, cuja perda nos deixa orfãos e não sei com quem poderá Vossa Paternidade restabelecer a missão".43

No manuscrito que ele começou a preparar nos finais de 1608 44, e no qual trabalhou até Feve-reiro de 1610, três meses antes da sua própria mor-te, 45 Ricci dedicou um pequeno capítulo à memó-ria de Valignano o qual intitulou "Dalla Morte del P. Alessandro Valignano visitatore della Cina e Giappone e Primo Fondatore della Impresa della China".46 Valignano recebeu também manifesta-ções de louvor de outros Jesuítas que o admiravam grandemente. Ele foi considerado "o pilar da Ín-dia",47 "um anjo de Deus para todos".48 Até mesmo Francisco Cabral, com quem o Visitador tinha tido divergências tendo-lhe retirado o cargo de Provin-cial do Japão, teve de admitir a grandeza de alma que caracterizava Valignano.49 Aliado ao facto de falar do seu superior e amigo como "o primeiro fundador do empreendimento na China", Ricci intitulava-o "o primeiro autor da missão" nos as-suntos que diziam respeito às comunidades de cris-tãos novos, além de saber dar as ordens adequadas relativamente a qualquer assunto, que fazia com grande determinação.50

Tal como Xavier, ele tinha querido entrar na China, para o bem de tantas almas, mas ambos morreram à porta desse reino sem terem podido concretizar os seus sonhos.51 Na hora da morte, o Padre Alessandro demonstrou a afeição que dedicava a esta missão. Ele, que sempre se tinha preocupado com que a Missão da China fosse devidamente apoiada, ordenou que, depois da sua morte, dois outros membros da Companhia se juntassem ao Padre Cattaneo quando este voltasse para a China. Na mesma altura, o próprio Valignano tinha planeado ir visitar, pela primeira vez, a China continental. Valignano doou à China todas as coisas que tinha trazido do Japão, incluindo pinturas sagra-das, vestes litúrgicas e outras coisas do género, que possuía para uso pessoal.52Quando Valignano chegou a Goa em 1574, o Japão tinha um Jesuíta japonês e vinte Jesuítas eu-ropeus. Não existiam Jesuítas na China, a qual ain-da se encontrava fechada. À data da morte de Valignano existiam no Japão cerca de 130 missio-nários, dos quais praticamente metade eram japo-neses. Além disso havia um clero secular indígena, 300 catequistas, 190 guardas de igrejas, um total de algumas 900 pessoas que se dedicavam ao trabalho pastoral da igreja. O Japão tinha dois colégios, um noviciado jesuíta, algumas 20 residências e cerca de 300 igrejas e capelas. À semelhança do colégio de Macau, havia colégios em Nagasaki e Arima; outros colégios começavam a aparecer em Omura e Miyako. Oito anos após a morte de Valignano, existia um milhão de cristãos japoneses, dos quais cerca de 750.000 estavam em áreas que eram da responsabilidade dos Jesuítas. Na China, havia re-sidências em cinco cidades, servidas por quinze Je-suítas, cinco dos quais eram Chineses, para cuida-rem de mais de 1.000 convertidos e para evangelizar os não cristãos.53

Qualquer um subscreve a opinião de D'Elia: "Valignano não só fundou a Missão da China; ele sustentou-a, ajudou-a e guiou-a; ultrapassou as dificuldades que constantemente bloqueavam o caminho, dedicou-lhe homens de extraordinário talento, providenciou assistência financeira, e finalmente deu-lhe directrizes tão sábias que possibilitaram a entrada de Ricci no Império, o qual impressionou, de uma forma inquestionável, a alta sociedade do Império do Meio."54

A extraordinária contribuição de Valignano pode ser, em parte, atribuída aos seus dotes de observação, avaliação e capacidade de decisão; à sua capacidade de organizar, dirigir e inspirar. Ele tinha uma enorme capacidade de prever grandes empreendimentos e de trabalhar neles com paciência e prudência. Era firme, contudo delicado, na forma como governava e por isso era altamente considerado pela maior parte dos seus subordinados. Mas, seguramente, a raiz mais profunda da sua for-ma de comportamento era a sua fidelidade ao Cha-mamento Jesuíta.

Numa carta dirigida exclusivamente ao Padre Geral Aquaviva, a qual lhe enviou de Cochim a 14 de Dezembro de 1584, transmitia uma visão particular da sua vida interior.55

IGNATIUS DE LOYOLA (1491-1556) E AS MISSÕES ESTRANGEIRAS

Logo após a sua conversão, Ignatius (Inácio) visitou a Terra Santa, onde ele esperava viver à imagem de Cristo, na pobreza e na humildade, ao serviço do Evangelho de todas as formas possíveis. Quando o peregrino começou a acreditar que não era vontade de Deus que ele permanecesse em Jerusalém, pensou muito no que havia de fazer, e decidiu finalmente estudar durante algum tempo para poder dar uma grande assistência espiritual aos outros.56 Talvez em Barcelona, mas de certeza em Alcala,57 outros começaram a juntar-se a ele para serem instruídos. Na sua cela da prisão de Salamanca, decidiu continuar os seus estudos em Paris. Ao mesmo tempo pretendia manter os discípulos que tinha e procurar outros que partilhassem das suas ideias.58

Padre valignano--jesuíta italiano, organizador das Missões do Padroado Português do Oriente.

De acordo com algumas fontes antigas, era intenção do grupo de sete amigos, quando pronunciaram os seus votos em Paris em 1534, irem para a Terra Santa e aí permanecerem para sempre; se não pudessem lá ficar, voltariam a Roma e apresentar-se-iam ao Papa.59 Segundo outros, incluindo Favre, que apresentou a petição ao Papa, era intenção deles, desde o início, permanecer apenas durante algum tempo na Terra Santa e seguidamente voltar à Europa. Um texto de Simon Rodriguez a Mercurian, datado de 25 de Julho de 1577, dizia que as opiniões se dividiam e que o plano deles era deliberar sobre o assunto quando chegassem a Jerusalém e depois seguir a opinião da maioria. A guerra entre os turcos e os venezianos impediu-os de navegar e como tal foram para Roma. Continuavam a manter o desejo de ir a Jerusalém, o que levou o Papa Paulo III a dizer-lhes: "Porque desejam tanto ir para Jerusalém? Itália é uma boa e verdadeira Jerusalém se pretenderem concretizar alguma coisa na Igreja de Deus". E assim ofereceram-se para ir para onde quer que o Papa os enviasse. Esta deci-são influenciou o conteúdo das Regras do Instituto, a criação da legislação da Ordem, onde se faz men-ção explícita a tal disposição.

"Além do vulgar compromisso dos três votos, ficamos obrigados, através de um voto especial, a cumprir o que quer que os presentes e futuros Pontí-fices Romanos possam ordenar no que concerne ao progresso das almas e propagação da fé; e para irmos sem subterfúgios ou desculpas para qualquer província por eles escolhida -- quer lhes agrade en-viar-nos para o seio dos turcos ou de outros infiéis, mesmo aqueles que vivem na região chamada as Ín-dias, ou para o meio dos heréticos, ou cismáticos, ou qualquer dos fiéis."60

Em Maio de 1539, após terem decidido formar uma ordem religiosa, os companheiros determinaram unanimemente que se algum indicasse ao Superior ou à Companhia o desejo de ir para terra de infiéis e se o Papa deixasse o assunto à decisão dessa pessoa, a pessoa em causa deveria passar dez dias em exercício espiritual para saber qual o espírito que o guiava, em conformidade com as palavras da Escritura "Testa os espíritos para te certificares se vêm de Deus" (1J n4,1).61 Além disso, concordaram que todos os que solicitassem entrar na Companhia, independentemente do talento que possuíssem, deveriam estar preparados para fazer um voto de obediência ao Papa e para irem para missões em terras de infiéis.62

À luz destas experiências, Granero foi levado a concluir que a ideia da missão [no sentido de se ser enviado por autoridade legítima da Igreja para se ocupar de trabalho apostólico] não foi apenas uma ideia chave de Ignatius e dos seus companheiros nas origens da Ordem. A ideia da missão nasceu do desejo de fazer missões no estrangeiro. Posteriormente, conclui que a Companhia era de facto, oficial e juridicamente, uma Ordem missionária, contrariamente às Ordens anteriores.63

Em 1540, mesmo antes de o Papa ter dado a sua aprovação definitiva à nova família religiosa, o Rei D. João III de Portugal solicitou missionários para a Índia. Ignatius enviou Simón Rodriguez para Lisboa. A 16 de Março, Xavier deixou Roma em substituição de Bobadilla que se encontrava doente. A 27 de Julho de 1540, Paulo III publicou um Brevepontifício, nomeando os dois Padres seus núncios.64 O Rei reteve Rodriguez em Portugal e assim, em 1541, Xavier, Pablo Camerte e Francisco Mansilhas foram os primeiros membros da Companhia a navegarem para o Extremo Oriente. A 10 de Outubro de 1549, a primeira missão da Ordem tomou-se uma Província; até à data só Portugal e Espanha tinham sido Províncias.66

Entre 1547 e 1555 houve um breve esforço missionário no Congo. Ignatius desejava estabelecer uma missão no Norte de Àfrica e de ir para lá ele próprio. Só conseguiu, ao princípio, enviar dois padres como capelães militares durante curtas estadias, contudo conseguiram baptizar alguns sarracenos.67

No dia 1 de Abril de 1549, chegaram ao Brasil seis Jesuítas com o novo governador Tomas de Souza. Quatro anos mais tarde, Ignatius fez do Brasil a sexta Província da Ordem.

O maior interesse de Ignatius era a Etiópia por causa da expectativa de reestabelecer a união com Roma. As maiores instruções relativas a uma missão escritas por ele foram as dirigidas aos padres envolvidos na missão da Etiópia.68

Na segunda parte do seu notável livro sobre a actividade missionária e métodos de Ignatius, Granero trata, com referências abundantes às fontes de origem, os princípios que guiaram o fundador na suas decisões relativamente às missões da Ordem recentemente estabelecida.69 Inácio manteve um delicado equilíbrio entre obediência ao Papa e cooperação com o Rei de Portugal. Ele insistiu nas qualidades que os missionários deveriam ter e no treino que deveriam receber, especialmente no que diz respeito à aprendizagem das línguas dos povos que iriam servir.70 Contrariamente aos que procedi-am rapidamente aos baptismos, Ignatius insistiu sempre numa instrução cuidada na fé. Por este moti-vo recomendou a criação de colégios para jovens, mesmo para crianças, assim como na criação de cen-tros de catecúmenos (noviços).

A prescrição das regras sobre a escrita regular entre subordinados e superiores produziu efeitos im-portantes no que diz respeito à informação da Euro-pa sobre o trabalho das missões.71

Ignatius, que foi o introdutor e promotor de muitas obras de caridade e beneficiência em Roma,estava convencido que poderia obter os mesmos bons resultados com estas obras nas terras das mis-sões. Encorajou a formação de um clero nativo e de uma hierarquia nativa, tal como a aceitação de nati-vos na Companhia de Jesus, exigindo contudo apti-dão e experiência comprovada.72 Recomendou que alguns estudantes indígenas fossem estudar para Portugal e Roma. Ainda durante a vida de Ignatius, foi enviado por Xavier, para Portugal, um japonês de nome Bernardo. Ignatius chamou-o a Roma e re-cebeu-o na Companhia. Destinado a estudar em Co-imbra, o novo candidato veio a morrer pouco após o seu regresso a Portugal.73

A liderança que Ignatius deu à Ordem, nas missões estrangeiras tal como na Europa, era caracterizada pela fidelidade aos princípios básicos e pela flexibilidade em se adaptar às circunstâncias. Ele está na origem dos esforços de abertura da Companhia.74

O espírito missionário estava enraízado na Ordem quando chegou a altura de o fundador deixar a cena. Quando Ignatius morreu, em 1556, a Companhia contava com 1100 a 1200 membros. 156 destes encontravam-se em missões no estrangeiro:122 no Extremo Oriente, 26 no Brasil, 8 no Congo. Nessa altura tinham navegado da Europa 81 homens com o destino às missões:

1541 Xavier e outros dois para as Índias;

1545 3 para as Índias;

1546 9 para as Índias;

1547 4 para o Congo;

1548 10 para as Índias;

1549 6 para o Brasil;

1550 4 para o Brasil

1551 12 para as Índias

1553 2 para o Congo, 5 para as Índias e 7 para o Brasil;

1554 2 para as Índias;

1555 12 para as Índias;

1556 15 para as Índias;75

Outros 75 entraram na Companhia nos territó-rios onde se encontravam as missões. Também por volta de 1556, seis Jesuítas foram martirizados nas missões no estrangeiro: Padre Antonio Criminale, Cabo Comorin, 1549; Padre Nuno Ribeiro, Amboina,1549; Padre Pablo del Valle, Panicale, 1552; Padre Luis Méndez, Cabo Comorin, 1552; Irmãos Pedro Correa e Juan de Souza, Brasil, 1554.76

Algumas semanas antes da morte de Ignatius, Nadal escreveu-lhe uma carta, "Todos sa-bemos que existem duas coisas desejadas na Com-panhia: Cochinchina e a Alemanha".77 Ignatius via as missões como lugares onde se podia imitar a pobreza de Cristo. Em resposta às descrições das privações sofridas na Europa, Ignatius aconselhava a pensar nos nossos irmãos nas Índias, que supor-tam mais privações que nós.78 Cedo se tomou hábi-to escrever ao Geral em Roma, pedindo para se ser enviado para uma missão e um dos motivos mais frequentemente invocados era o desejo de imitar Cristo mais de perto na pobreza, humildade e sofri-mento.

Para Ignatius, este último critério era para qualquer escolha apostólica a maior glória de Deus. Numa das suas cartas, ele afirmava "La ida de aquellos Padres que van a la Índia, será para mucha gloria de Dios".79 Por essa razão, ele via as missões no estrangeiro com olhos de fé, como um empreendimento que dependia no seu sucesso da graça de Deus e da orientação do Espírito Santo. Dizia-se que "o Padre Ignatius mantinha as mis-sões com as suas orações".80 Ele encorajou os seus súbditos, que se encontravam tão dispersos, a pro-curar orientação nas regras da Ordem, mas também na consagração do Espírito Santo, a Sabedoria Eterna que certamente os guiava.81 Pelo facto de possuirem a mesma visão da fé, em virtude do que ele entendia ser um grande bem espiritual, Ignatius chamou Xavier à Europa para, pessoalmente, lhe dar informações sobre as missões no estrangeiro, inspirar outros a servi-la e ajudar na selecção de candidatos aptos.82 Todavia, Xavier havia falecido sete meses antes da carta ser escrita. A morte soli-tária de Xavier na ilha de Shangschuan e o seu desejo não cumprido de entrar na China viria a ins-pirar gerações de missionários a seguirem o seu exemplo.83

CONCLUSÃO

Valignano e Ricci encontraram-se pela pri-meira vez em 1571 no noviciado de Sant'Andrea em Quirinale, Roma. Viram-se pela última vez no Colé-gio de São Paulo em Macau, a dada altura entre Outubro de 1592 e Março de 1594. Em 1583, ao entrar na China, Ricci iniciou o que Jonathan Spence muito acertadamente chamou "a sua ascensão a Pequim".84 Passaram-se entretanto vinte e três anos. Valignano exausto devido a frequentes viagens e às preocupações com a administração, terminou a sua peregrinação em Macau. Durante um quarto de século, Valignano e Ricci raramente se viram, mas mantiveram-se muito unidos na Companhia de "amigos em el Señor"85 (amigos no Senhor) ao aplicarem, em diferentes locais, o mesmo método na realização da mesma missão. Durante os quatrocentos e cinquenta anos que se seguiram à criação da Companhia de Jesus por Ignatius, o peregrino, e os seus nove companheiros, muitos outros responderam a um chamamento semelhante e todos atenderam ao conselho de Ignatius de "ter Deus ante os seus olhos e depois a natureza desta Instituição, que ele abraçou e que por assim dizer, é um caminho para Deus".86

A política de abertura que Valignano enge-nhosamente formulou e que fortemente impulsio-nou, foi prudentemente aplicada e pacientemente desenvolvida por Ricci na China. Uma das raízes desta política são, sem dúvida, os estudos humanísticos que, no século XVI, caracterizam a educação dada pela Companhia de Jesus aos seus próprios membros e aos estudantes que frequenta-vam as suas escolas. Valignano e Ricci foram am-bos moldados na cultura clássica greco-romana, cujo espírito pode ser resumido nas frases "o Ho-mem é a medida de todas as coisas",87 e "Homo sum; humaní nihil a me alienum puto" (Sou um homem; nada do que é humano me é indiferen-te).88

Mas o próprio Ignatius, que foi o arquitecto do plano de estudos que guiava o empenho educa-cional da Ordem,89 viu estes estudos como meios importantes para alcançar o fim que ele e os seus companheiros procuravam: "A maior glória de Deus". Os meios mais importantes, e sempre indis-pensáveis, eram a virtude, especialmente a carida-de, uma pura intenção do Serviço Divino, o zelo sincero pelas almas e a familiaridade com Deus nos exercícios espirituais da devoção.90 Para Ignatius, oúltimo meio mencionado é a base de todos os ou-tros. Os exercícios espirituais, que Ignatius define como "todo o método de exame de consciência, de meditação, de contemplação, de oração mental e oral, e de outras actividades espirituais..."91 eram fundamentais na forma de vida de Ignatius. O úni-co trabalho escrito por ele e publicado durante a sua vida foi uma tradução em Latim dos seus Ejercicios espirituales (Exercícios espirituais) em 1548. Este pequeno trabalho contém sugestões para uma experiência espiritual que, em circunstâncias ideais, se destina a durar cerca de um mês. É exigi-do a todos os Jesuítas que durante o seu treino fa-çam duas vezes um retiro de um mês no espírito destas directrizes: primeiro, pouco depois de entra-rem na Ordem durante o curso do noviciado, e de-pois, após terem completado os estudos normais, durante o período final de treino chamado a tercei-ra provação.92 Adicionalmente, espera-se que cada Jesuíta, todos os anos, passe oito ou dez dias con-secutivos em exercícios espirituais semelhantes. O centro da experiência espiritual proposta por Ignatius é a contemplação da vida de Cristo tal como ela é narrada nos evangelhos, com atenção particular para Cristo quando viajava pela Palestina pregando em "sinagogas, aldeias e cidades"93. Quando a pessoa, totalmente embrenhada nos exer-cícios espirituais, chega ao ponto crucial de fazer ou re-examinar as fundamentais decisões que influ-enciaram a vida, Ignatius dá uma sugestão muito importante àqueles cujo coração deveria ter sido cativado pela pessoa e exemplo de Cristo. Como resposta ao convite, Cristo dirige-se a todos os cris-tãos para estarem com ele na sua missão de salva-ção de todas as pessoas. Aqueles que fazem os exercícios são aconselhados não apenas a oferece-rem-se inteiramente a este empreendimento como também a preferir, na partilha do trabalho, asseme-lharem-se a Cristo na sua pobreza e humilhação.94

Não existem dúvidas que, para os autores dos Evangelhos Sinópticos, a pobreza e a humildade caracterizam a vida de Jesus de Nazaré desde o seu nascimento até à sua morte. O autor contemplativo do quarto Evangelho entende que o estilo de vida que Jesus abraçou não é senão a continuação da condescendência inerente à própria Encarnação: "A Palavra tornou-se carne e armou a sua tenda entre nós. (Jn 1,14)". A verdadeira presença de Deus no seio da família humana como um de nós é um 'admirabile commercium', uma adaptação do Incriado ao Criado, do divino ao humano. Deus ajuda a raça humana para que a raça humana o possa ajudar. "Não vos chamarei mais servos... Chamar-vos-ei amigos... Vocês não me escolheram, mas eu escolhi-vos... (Jn 15, 15-16) o amor supremo não é outro senão este, o dar a sua própria vida pelos amigos". (Jn 15,13).

O "espírito de abertura" que animou a pró-pria vida de Jesus deve ser a fonte e o modelo da forma como os Cristãos se relacionam com os indi-víduos, comunidades e culturas. Esta forma de pro-cedimento operava no modelo do apóstolo Paulo, que se tornou todas as coisas para todas as pessoas, de forma a poder salvar algumas (1 Cor 9,22). Des-de o primeiro século até ao momento presente, as igrejas cristãs viveram mais ou menos com sucesso o espírito de abertura que tinham relativamente às outras culturas. Os inúmeros caminhos que Jesus contemplou nas devoções privadas celebradas na liturgia cristã, e representadas na arte e literatura sacra, testemunham de certa forma o que foi uma preocupação intensa e continuamente presente.95 Nos seus primórdios, durante os últimos dois ter-ços de século XVI e no primeiro terço do Século XVII, a Companhia de Jesus, especialmente por parte dos seus fundadores e alguns ilustres mem-bros como Valignano, Ricci e de Nobili, aplicou o espírito de abertura penetrando nas outras culturas com abertura, receptividade e amor. Estes esforços pioneiros nos tempos modernos ajudaram, sem dú-vida, a preparar a grande abertura a outras culturas, o que caracterizou a Igreja Católica durante os anos subsequentes ao Segundo Conselho do Vaticano (1962-1965). Os documentos do Conselho referem--se frequentemente à cultura.96 Todos estes textos salientam a necessidade da Igreja de apreciar a di-versidade cultural e de se expressar em função dos valores positivos que tal pluralidade oferece. Existe presentemente um crescimento de literatura teoló-gica e missiológica relativamente aos resultados da inculturação.97 A Companhia de Jesus contemporâ-nea deseja permanecer fiel à inspiração do seu fun-dador e ao melhor que foi legado pelos seus mais ilustres membros durante os 450 anos de tradição. Ao mesmo tempo, a Companhia, com o objectivo de responder às necessidades desafiantes dos nos-sos dias, procura prolongar e contribuir para espó-lio/riqueza crescente de novas formas contem-ponâneas de pensamento e sacerdócio cristãos.98 Por exemplo, os Jesuítas da Índia, com base na sua larga herança cultural, estão a contribuir de uma forma muito significativa para a liturgia e medita-ção cristãs.99 Na América Latina e na América Cen-tral, independentemente das ameaças e perigos a que estão expostos, os Jesuítas lutam pela condição dos pobres e têm contribuído para a criação de uma nova ordem económica através dos seus ensinamentos, escritos e sacerdócio relativamente aos refugiados, desprotegidos, explorados e oprimi-dos.1100Nos Estados Unidos, os Jesuítas tentam for-necer respostas, através de palavras e acções, inspi-radas nos valores cristãos, para problemas como a influência da tecnologia no desempenho,101 solida-riedade para com os pobres,102 formas contemporâ-neas de pensamento.

Aquilo que Alessandro Valignano e Matteo Ricci enfrentaram e aplicaram durante o último quarto do século XVI e nos primeiros anos do século XVII, procuram enfrentar e aplicar nestes últimos anos do século XX aqueles que são seus herdeiros: nomeadamente a tradição de abertura exercitada na simplicidade, humildade e amor que vem do fundador da Ordem Jesuíta e fundamentalmente do Fundador da Igreja Cristã, cujo nome tem a Companhia.

APÊNDICEALESSANDRO VALIGNANO1539 - 1606

1539 Fevereiro, nasce em Chieti, em Abruzzi, Reino de Nápoles.

1557 Doutor em Leis em Pádua; volta a Chieti, depois vai para Roma, esperando ter a protecção do Papa Paulo IV, que enquanto Arcebispo de Chieti (1504-1524;1537-1550) se tinha tomado amigo de seu pai, Giovanni Battista.

16 de Maio, recebe a tonsura na catedral de Chieti; no mesmo mês as autoridades da cidade conferem--lhe a responsabilidade da abadia de San Stefano del Casale.

1559 Morte de Paulo IV; Valignano toma-se conselheiro do Cardeal Sittico di Altemps, sobrinho do novo Papa.

Posteriormente volta a Pádua.

Toma-se cónego.

1562 Valignano envolve-se numa aventura amorosa desagra-dável; desde o fim deste ano até Março de 1564, fica detido na prisão em Veneza.

1563 15 de Dezembro, suplica aos chefes do "Consiglio dei Dieci", para ter uma audição no início de Janeiro com o objectivo de provar a sua inocência em resposta às calúnias levantadas por Franceschina Trona e outros perseguidores.

1564 7 de Março, sentença contra Valignano.

1566 29 de Maio é recebido na Companhia por Francisco Borgia.

1567 18 de Maio, faz os primeiros votos; é enviado para o Colégio Romano para estudar filosofia.

1570 Enquanto estuda teologia, serve como ministro do noviciado de Sant'Andrea al Quirinale.

1571 25 de Março, é ordenado sacerdote no Lateran (Latrão); de Junho a Setembro, visita Teramo, Ascoli, Loreto, Chieti.

Setembro, Mestre dos Noviços durante um curto espa-ço de tempo, enquanto Fabio de Fabii se encontra doente.

1572 Continua os estudos teológicos no Colégio Romano e é confessor na comunidade.

É enviado como Reitor do Colégio de Macerata.

1573 Agosto, é nomeado pelo Padre Geral Mecurian para ser Visitador de todas as Índias Orientais;

A 8 de Setembro professa os quatro votos perante o Geral em Sant'Andrea; a 11 de Setembro professa os cinco votos menores na igreja da casa das profissões.

20 de Setembro, deixa Roma.

26 de Setembro, navega de Génova.

1574 21 de Março, navega de Lisboa com outros 40 Jesuítas: 17 padres, 13 escolásticos, 10 irmãos.

9 de Agosto, parte de Moçambique, depois de ter ficadoaí apenas um dia.

1574 6 de Setembro, chega a Goa.

1575/

xz 1577 Visita a Índia.

1577 20 de Setembro, deixa Goa e parte para Malaca.

19 de Setembro, chega a Macau pela primeira vez.

1579 7 de Julho, deixa Macau e vai para o Japão, mas deixainstruções para aqueles que irão estudar Chinês.

25 de Julho chega ao Japão, que visita primeiro e ondedepois cria uma vice-província.

1582 20 de Fevereiro, parte para Macau com os quatro embaixadores japoneses que se dirigiam a Roma.

1583 7 de Abril, em Cochim, recebe a notícia que tinha sido nomeado Provincial da Índia.

10 de Novembro, fixa residência em Goa.

1587 Abril, sabe que é nomeado Visitador da Província da Índia pela segunda vez.

29 de Maio, os embaixadores chegam a Goa, à vinda daEuropa.

1588 22 de Abril c. deixa Goa com 16 missionários e os embaixadores japoneses.

28 de Julho chega a Macau pela terceira vez; Permanece aí até 29 de Junho de 1590 a aprender japonês.

1589 10 de Outubro, pede permissão a Roma para receber na Ordem quatro chineses de Macau.

10 de Novembro, volta a fazer a Roma o mesmo pedido.

1590 29 de Junho, Valignano parte de Macau para o Japão.

21 de Julho, chega ao Japão como Embaixador do Vice--Rei da Índia.

1591 Entram na Companhia os dois primeiros chineses de Macau.

3 de Março, é recebido por Hideyoshi.

1592 9 de Outubro deixa o Japão.

24 de Outubro chega a Macau; durante a sua quarta visita aprova a forma de procedimento de Ricci e aconselha-o a ir para Pequim.

1594 15/16 de Novembro, parte para Goa.

1595 4 de Março, chega a Goa.

24 de Setembro, termina o seu cargo de Visitador da Índia ( é sucedido por Nicoló Pimenta), mas continua como Visitador da China e do Japão de acordo com as ordens do Geral, de 17 de Janeiro de 1595.

1597 23 de Abril, deixa Goa pela última vez.

27/28 de Abril, chega a Cochim.

16 de Junho, chega a Malaca.

20 de Julho, chega a Macau pela quinta vez; submete o Colégio e a Residência de Macau à autoridade de um só Reitor; nomeia Ricci Superior da Missão da China; recomenda-lhe vivamente que vá para Pe-quim; aprova a tradução em Latim do catecismo chinês de Ricci.

20 de Dezembro, Acquaviva considera fora de questão a deslocação de uma embaixada papal a Pequim.

1598 14 de Julho, parte para o Japão.

5 de Agosto, chega ao Japão para a sua terceira e última visita.

1598 1-15 Dezembro, a Segunda Congregação da Vice-Pro-víncia da China e do Japão decide insistir numa embaixa-da papal.

1603 15 de Janeiro, deixa o Japão.

10 de Fevereiro, chega a Macau pela sexta e última vez; torna a Missão da China independente da de Macau.

10 de outubro, Valignano e os seus consultores decidem criar a Vice-Província da China e do Japão.

12 de Novembro, Valignano considera que o sucesso de Ricci excedeu tudo o que se poderia esperar.

1605 15 de Agosto, três chineses de Macau começam o seu noviciado em Pequim.

1606 20 de Janeiro, morre de uremia em Macau.

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NOTAS

1A investigação mais extensa sobre Valignano, até hoje, foi feita por Josef Franz Schütte, S. J. e Josef Wicki, S. J., quando estavam no Instituto Histórico Jesuíta em Roma. Schütte concentrou-se na experiência de Valignano no Japão. A sua primeira contribuição foi Alexandro Valignanos Ringen um die Missionsmethode in Japan, Juli-Dezember 1597. Roma, 1944. Em 1946 ele publicou esta obra em italiano sob o título II Cerimoniale per i Missionari del Giappone, edição crítica com introdução e notas dos "Advertimentos e Avisos acerca dos Costumes e Catangues de Jappao" de Valignano. Ele publicou depois, em 1951 e 1958 um trabalho de dois volumes entitulado Valignanos Missions grundsätze für Japan. Estes dois volumes foram traduzidos para inglês por John J. Coyne, S. J., com o títuloValignano's Mission Principles for Japan. Nesta tradução não figuram, no texto, nem os caracteres japoneses nem as 17 ilustrações contudo, foi reproduzido do original alemão, fotograficamente, a valiosa bibliografia de trabalhos publicados, fontes de arquivo e os escritos de Valignano. A lista dos escritos de Valignano inclui 9 documentos compostos antes da sua nomeação como Visitador e 428 textos subsequentes. O compilador diz que esta lista representa "apenas uma fracção da produção massiva que saía da incansável pena/caneta do Visitador". I, p.402. Numa carta ao Geral de Macau, de 1 de Janeiro de 1593, o próprio Valignano diz que, à data, detinha cerca de 1000 cartas para responder. Muitas destas ter-se-iam acumulado em Macau durante os seus dois anos de ausência em que visitou o Japão (29 de Junho de 1590 a 24 de Outubro de 1592). Valignano's Mission Principles I, p.6, n.4. Por vezes, no dia anterior à partida dos navios para a Europa, ele teria ditado cartas desde madrugada até à meia-noite. Uma vez ao escrever de Goa: "Confesso que normalmente vou para a cama por volta da meia noite e que me levanto às três da manhã." Ibid., p.40. Em 1968 Schütte publicou Introductio ad Historiam Societatis Jesu in Japonia 1549-1650; as referências a Valignano no Index preenchem 10 colunas e meia.

Em 1944, Wicki editou a Historia del Principio y Progres-so de la Compañia de Jesús en las Indias Orientales (1542-64) de Valignano, com uma extensa introdução e notas. Os trabalhos do século XVI ao século XX, que tratam de Valignano, estão listados nas páginas 43-45. Além disso, os 18 volumes dos Documenta India, editados por Wicki, contêm muitas das cartas de Valignano.

2 Tecnicamente, as suas responsabilidades também incluíam a missão para a Etiópia. Ele teria gostado de retirar os homens de lá. Contudo, foi incapacitado de o fazer. Schütte, Valignanos's Mission Principles for Japan, I, p. 177.

3 FR [Fonti Ricciane, editado por Pasquale D'Elia, S. J.]

4 A primeira actividade de Valignano como Visitador foi inspeccionar as missões dos Jesuítas na Índia. Viajou muito, observou tudo cuidadosamente e não hesitou em emitir directrizes. Entre 22 de Novembro e 8 de Dezembro de 1577, escreveu, durante a sua primeira estadia em Malaca (19 de Outubro de 1577 a fins de Julho princípios de Agosto), o Breviário (Summary) da Índia"um inestimável documento de mais de quarenta folhas." Cobre as impressões iniciais de Valignano na Índia, as suas actividades e decisões, ver Schütte, Valignano' s Mission Principles for Japan, I, pp. 92-180; "India" no Index do vol.2, do mesmo trabalho, pp. 346-347. No fim da sua visita, mais de 100.000 Cristãos Nestorianos, apelidados de Cristãos de S. Tomás, foram reintegrados na Igreja Católica. Ver Monumenta Nipponica, 1938, p.71.

5 Sobre expressões do pessimismo comum, ver FRI, pp. 142-423, n.1; sobre um resumo das primeiras tentativas de entrada na China, pp.139 ff. n.5.

6 FRl, pp. 140-147. Na sua HistoriadelPrincipio y Progresso de la Compañia de Jesús em las Indias Orientales, Valignano dedica três capítulos à China: 1ä Parte, ch.26: "the Great Kingdom of China and its Qualities" (O Grande Reino da Chinae as suas Qualidades), pp.224-228; ch.27:"the Position of the Emperor of China; of his Family Members and Mandarins, and on his way of Governing" (A Posição do Imperador da China; dos Membros da sua Família e Mandarins, e da sua Forma de Governar), pp. 245-256. Na primeira redacção do Sumário do Japão, Valignano estabelece o contraste entre Chineses e Japoneses; contudo, na segunda edição, ele substitui este contraste pela comparação entre os Europeus e os Japoneses. Schütte, Valignano's Mission Principles, 1, pp.286-287.) A forma como Valignano tratou a China de ve ser comparada com as observações mais extensas de Ricci no seu Della Entrata..., Lib. I, Cap. II-Iv, FRI, pp.7-132.

7 FR I, pp. 147, n. 1.

8 FR I, pp. 147-148.

9 FR I, pp. 157-159, II, p562, n.1.

10 Valignano visitou o Japão três vezes: 25 de Julho de 1579 - 20 de Fevereiro de 1582; 21 de Julho de 1590 - 9 de Outubro de 1952; 5 de Agosto de 1598 - 15 de Janeiro de 1603. Valignano, que sentia grande estima e afecto pelos Japoneses, foi devastado pela falta de adaptação dos missi-onários Jesuítas à Lingua Japonesa, cultura e hábitos. E ficava ainda mais perturbado pela forma insensível, e por vezes cruel, como alguns dos seus confrades europeus tratavam os Japoneses, incluindo os membros da Ordem. Ele próprio admitia estar bastante perplexo relativamente à forma de melhor resolver estes problemas. Diz-nos ainda que a luz surgiu durante a consulta que teve lugar na região do Bungo em Outubro de 1580. Ele viu isto como uma benção especial de Deus. A solução básica era que os Europeus se devotassem seriamente à adaptação e que preparassem colaboradores japoneses. A pergunta chave durante a conferência de Bungo, que foi seguida de outros encontros nas regiões de Miyako e Shimo, era a décima oitava: "Será apropriado observar todas as práticas e cerimónias dos bonzos?" Em todos os três encontros houve sempre uma resposta afirmativa.

Antes de deixar o Japão, como resultado Valignano redigiu as Resoluções datadas de 6 de Janeiro de 1582. Na Índia continuou as suas reflexões sobre o Japão. A 20 de Outubro de 1583, completou e assinou o seu "Sumario de las cosas que pertenecen a la Provincia de Jappón y al goviemo della." Em Outubro de 1581, no espaço de um dia e uma noite, Valignano escreveu uma obra notável de algumas sessenta páginas manuscritas, "Advertimentos e Avisos acerca dos Costumes e Catangues de Jappao". Os próprios japoneses encorajaram Valignano a produzir este guia das práticas culturais japonesas e ajudaram-no na redacção.

11 FR I, pp. l57-158, n.7.

12 FR I, p. l59.

13 FR I, p. l60.

14 FR I, pp.161-163.

15 FR I, pp.164-168.

16 FR I, pp.222-227.

17 FR I, p.224.

18 FR I, pp.248-252.

19 FR I, pp.252-256.

20 FR I, pp.256-257.

21 FR I, p.331.

22 FR I, pp.263-267.

23 FR I, pp.267-272.

24 FR I, p.289.

25 FR I, p.323.

26 FR I, p.323, n.7.

27 FR I, p. l45 n. b; 336, n.1.

28 FR I, pp.335-338.

29 FR II, p.7, n.3.

30 FR II, pp. 3-6.

31 FR II, p.256-257, 276.

32 FR II, p.351.

33 FR II, pp.352-353.

34 FR II, p.269.

35 FR II, pp.267-270.

FR II, pp. 270-271.

37 FR II, p. 271.

38 FR II, p.271. António Leitão, nome para o qual não temos os caracteres chineses e Dominic Qiu Liangbing 丘良稟, os quais foram recebidos por Ricci em Pequim. Emmanuel You Wenhui 游文輝, foi recebido por Dias em Nanking. Juntaram-se a outros dois que tinham entrado em 1591: Zhong Ming Ren 鐘鳴仁 e Huang Ming Sha 黃明沙. FR I, p.290, n.1.

39 FRII, p.273, n. l.

40 FR II, pp. 273-274.

41 FRII, p.274.

42 FR II, pp. 259-280, 362, 389.

43 FR II, p. 364, n. 4.

44 FR II, pp. clxvii-clxviii.

45 FR II, p. 469, n. 4; p.483, n.2.

46 Della Entrata della Compagnia di Giesú e Chrisitianità nella Cina, Libro V, Cap. IX, FR II, pp. 362-367.

47 FR II, p. 365, n.4,

48 Ibid.

49 FR II, p. 366, n.3.

50 FRII, p.221.

51 FR II, pp. 3365-366.

52 FR II, p. 367.

53 FR II, p.364, n.3.

54 FR I, p. xc.

55 Documenta Indica, XIII, pp. 696-701.

56 Autobiography, no.50.

57 Autobiography, nos 56-57.

58 Autobiograghy, no. 71.

59 Jesús Mará Granero, S. J., La acción misionera y los métodos misionales de San Ignacio de Loyola. Burgos, "El Siglo de las Misones," 1931, pp. 21-23.

60 Formula, no. 4 in Saint Ignatius of Loyota, The Constitutions of the Society ofJesus. Traduzido com uma Introdução e Comentário de George E. Ganss. S. J. Saint Louis, the Institute of Jesuit Sources (Instituto de Fontes Jesuítas), 1970, p.68.

61 Granero, p. 143.

62 Granero, p. 106. Mention of such obedience to the Pope occurs in the General Examen (A referência a tal obediência ao Papa ocorre no Exame Geral), c. 1, no. 5 e c. 4, no. 35; Const. pane V, c. 3, no. 3 e C; parte VI, c. 2, no. 13; parte VII, c. 1.

63 Granero, pp. 22, 10.

64 MonXav II, pp. 119-120.

Epistlgn I, pp. 187-188.

66 Epistlgn I, pp. 558.

67 Granero, pp. 50-51.

68 "Some suggestions which may help to bring the kingdoms of Prester John into union with the Catholic faith and Church" (Algumas sugestões que podem ajudar a unir os reinos do Preste João à fé e à Igreja Católica ). Ignatius a João Núnez Barreto, provavelmente a 20 de Fevereiro de 1555. Tradução inglesa in Letters of St. Ignatius of Loyola. Escolhido e traduzido por William J. Young. S. J. Chicago, Loyola University Press, 1959, pp. 381-390. Original espanhol em Epistlgn, VIII, pp. 680-690).

69 Granero, pp. 96-207.

70 Por exemplo, Ignatius encorajou o estudo de árabe, turco e da língua eslava a todos aqueles que eram mandados para regiões onde estas línguas eram faladas. Granero, p. 145; ver pp. 147-150.

71 Const., parte VIII, c. 1, no. 9; parte IX, c. 6; Ganss, pp. 292-293, 324-325.

72 Granero, pp.200-207.

73 Granero, pp. 182-183,206.

74 Ver Granero, pp. 188-193; Carta de Ignatius de 21 de Novembro de 1555, EpistIgn X, 176; Chronicon VI, 832.

75 Granero, pp. 82, 221 -225.

76 Granero, pp. 83-84.

77 2 July 1556, Epist Nadal I, 344.

78 Granero, pp. 92-93.

79 EpistIng V, p. 113.

80 Script. de S. Ign., II, p. 822.

81 Granero, pp. 171-172.)

82 28 de Junho de 1553, EpistIgn V, p. 150.

83 Em 1555, um ano antes da morte de Ignatius, Melchior Núñez conseguiu passar algum tempo em Cantão, parou em Shangchuan, e celebrou Missa aí, no local original do sepulcro de Xavier. Ver Polanco, Chronicon, V, 715-721; Orlandino, Lib. XV, num. 134, p.535). No que diz respeito a outras referências à China durante a vida de Ignatius, ver Xavier a Ignatius, Cochim, 29 de Janeiro de 1552, MonXav I, p. 667; Xavier a Ignatius, Goa, 9 de Abril de 1552, ibid., I, p.736 e II, p. 128. Ver Edward J. Malatesta, S. J.,"China Restores St. Francis Xavier's Original Burial Place" (A China recupera o local do sepulcro original de São Francisco Xavier), America, 3 de Dezembro, 1988, pp. 460-461.

84 Jonathan D. Spence, "Matteo Ricci and the Ascent to Peking", in Charles E. Ronan, S. J. and Bonnie B. C. Oh, Co-editors, EastMeets West. TheJesuitsin China, 1582-1773. Chicago, Loyola University Press, 1988, pp. 3-18.

85 Ver Javier Osuna, S. J., Friends in the Lord, traduzido por Nicholas King, S. J. London, 1974. the Way Series, 3.

86 Formula. 3. edição Ganss, p.66

87 Ver Plato, Theaetetus, 160d.

88 Terence, Heauton Timoroumenos, I, i, 25.

89 Ver George Ganss, S. J., Saint Ignatius' Idea of a Jesuit University, Milwaukee, The Marquette University Press, 1956.

90 Constitutions, no. 813. edição Ganss, p. 332.

91 Spiritual Exercises, no. 1.

92 Este último período de formação é um tempo de treino espiritual adicional, que consiste em exercícios espirituais, instruções e reflexões sobre o modo de vida dos Jesuítas, e outras práticas, frequentemente de natureza humilde, para testar a facilidade e capacidade dos Jesuítas para se dedicarem ao que é vulgar e difícil/penoso. É chamada a terceira provação porque antes se foi recebido formalmente no noviciado. Há uma primeira provação de 12 a 15 dias durante o qual o candidato foi hóspede da Comunidade Jesuíta. (Nos nossos dias, o objectivo deste costume é alcançado através de formas menos estruturadas de conhecimento/entendimento entre membros individuais e comunidades da Ordem. A segunda provação são os dois anos de treino espiritual que constituem o noviciado.

93 Spiritual Exercises, no.91.

94 Spiritual Exercises, nos. 97-98; 136-148; 156; 165-168.

95 Ver Jaroslav Pelik, an, Jesus through the Centuries. His Place in the History of Culture. New York, Harper & Row, 1985.

96 Por exemplo, "The Church Today" (Guadium et Spes), ch. 2, "The Proper Development of Culture."

97 Ver The Church and Culture since Vatican II. The Experience of North and Latin America. Editado por Joseph Gremillion. Notre Dame, University of Notre Dame Press, 1985. Louis J. Luzbelak, S. V. D., The Church and Cultures. New Perspectives in Missiological Anthropology. Maryknoll, Orbis Boos, 1989. Lamin Sanneh, Translating the Message. The Missionary Impacton Culture. Maryknoll, Orbis Books, 1989.

98 A Trigésima Segunda Congregação Geral da Ordem (2 de Dezembro de 1974 - 7 de Março de 1975) promulgou dois decretos (leis), que têm sido influentes na determinação da escolha e estilo dos ministérios sacerdotais jesuítas durante os últimos quinze anos: (Lei) Decreto 4, "Our Mission today: the service ofFaith and the Promotion of Justice" (A Nossa Missão Hoje: O Serviço da Fé e A Promoção da Justiça) e o Decreto (Lei) 5, "The Work of Inculturation and Promotion ofChristian Life." (O Trabalho de Inculturação e a Promoção da Vida Cristã).

99 Por exemplo, António De Mello, S. J., Sadhana: A Way to God (traduzido para 33 línguas); The Song of the Bird (Traduzido para 25 línguas); Wellsprings (traduzido para 15 línguas). Gujarat Sahitya Prakash, Anand, Gujarat 38801, Índia.

100 Por exemplo, Jon Sobrino e i suoi compagni dell'uca, II Martirio dei Gesuiti Salvadoregni. Roma, La Piccoloa editrice, 1990.

101 D. Ataudenmaier, S. J.,"United States Technology and Adult Commitment. "Studies in the Spirituality of Jesuits, 19/1, January 1987.

102 Joseph Tetlow, S. J., "The Transformation fo Jesuit Poverty. "Studies in the Spirituality of Jesuits, 18/5, November 1986.

Joseph A. Bracken, S. J., "Jesuits Spirituality form a Process Prospective. "Studies in the Spirituality of Jesuits, 22/2, March 1990.

(Conferência apresentada no IV Simpósio Internacional de História da Dinastia Ming, Universidade de Fudan, Xangai, Agosto de 1991).

*Director do Instituto Ricci, da Universidade de São Fran-cisco. Publicou artigos sobre a Questão dos Ritos e sobre os jesuítas: Boym, Criplet, Schall, Valignano e Verbiest; para além de ser responsável pela primeira edição em Chinês-Inglês de Tianzhu shiyi (O verdadeiro significado do Senhor do Céu), de Ricci.

desde a p. 50
até a p.