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RELAÇÕES DIRECTAS ENTRE MACAU E O BRASIL UM SONHO IRREALIZÁVEL? (1717-1810)

António da Silva Rego*

1. INTRODUÇÃO

Tendo-se conhecido em Malaca, em 1509, por ocasião da viagem de Diogo Lopes de Sequeira a esta cidade, Portugueses e Chineses entenderam-se amistosamente, como bons comerciantes que eram.

A partir de 1511, data da ocupação de Malaca por Afonso de Albuquerque, Portugueses e Chineses, ignorando até certo ponto o rigor das leis chinesas relativas ao contacto com estrangeiros, puderam encontrar-se periodicamente, ora num ponto, ora noutro, de antemão combinado, ao longo do extenso litoral da China.

Em 1522 a ilha do encontro foi Shangchuan aportuguesada para "Sanchoão" e até para "S. João", e que ficaria célebre por nela ter falecido em princípios de Dezembro S. Francisco Xavier que esperava ser clandestinamente introduzido no imenso reino chinês.

Daí a dois anos, em 1554, Leonel de Sousa consegue assinar em Cantão um acordo comercial. Estreitam-se desta forma as relações entre Portugueses e Chineses.

Por esta altura, um atrevido pirata Zhang Si Lao mantinha em constante insegurança o litoral em que negociantes portugueses e chineses navegavam. Acordam uns e outros na luta contra o inimigo comum que, por fim, é derrotado. Em vista desta colaboração, conseguem os Portugueses insinuar-se mais e mais no ânimo de todos. A partir de 1555, encontram-se já em Macau. São estas as linhas gerais do estabelecimento dos Portugueses em Macau.

Trata-se, portanto, de estabelecimento puramente comercial, estabelecido no dorso do imenso reino chinês, com o conhecimento e necessária aprovação das suas autoridades. Se exercício de força houve, por parte dos Portugueses, desenvolveu-se contra o inimigo comum, não contra a autoridade local.

Como entreposto comercial, depende Macau, logo de início, dos seus navios, das suas viagens, da iniciativa dos seus habitantes. Japão, Goa e Malaca, constituem a princípio os principais portos de apoio económico. Depois, com o rodar dos anos, minúsculo porto estende os seus tentáculos, a atingir as principais regiões asiáticas: Manila, Cochinchina, Java, Timor, Sião, Madrasta, Surrate, Bombaím. Ceilão... Os Macaenses oferecem artigos chineses: sedas, artefactos, chá, louças, etc. Em retomo, compram tudo quanto possa interessar aos comerciantes chineses, preferindo, acima de tudo, a prata.

Quanto ao governo, desenvolve-se necessariamente segundo as circunstâncias locais. Por um lado, havia a realidade chinesa a impor-se. Por outro, havia também elos patrióticos e sentimentais que não podiam esquecer-se. Tudo principia, pois, pela eleição de um chefe.

Sendo Macau a principal base do comércio nipónico, do qual dependia aliás a sua vida, não admira que o comandante da nau anual do Japão ocupasse, logo de início, lugar de preeminência. Ao lado deste capitão-mor ou do porto, há também um capitão da terra, igualmente eleito pelos habitantes. O primeiro parece ter sido Diogo Pereira, grande amigo de S. Francisco Xavier, e que teria ocupado tal posto até 1587. Além destas duas personalidades, nota-se ainda a presença de mais unidades necessárias à pequena república, tais como juiz, ouvidor, conselheiros.

Em Maio de 1582 chega a Macau, vindo das Filipinas, o Pe. Alonso Sanchez enviado pelo governador desta possessão espanhola, Don Pedro Ronquilho de Peñalosa, portador da notícia da união pessoal da coroa portuguesa à de Castela. A sua missão, de carácter diplomático, é coroada de pleno êxito, pois Macau reconhece, oficialmente, a Filipe II, com a condição, porém, de representar perante os Chineses os interesses comuns, de forma a não provocar desconfiança quanto à mudança de regime.

Isto, obviamente, não impediu que os Chineses viessem a conhecer a mudança operada.

Em 1585, após magna reunião dos seus babitantes, surge a Cidade do Nome de Deus na China, acentuando-se o carácter democrático do estabelecimento. Elegem-se todos os cargos necessários à administração local: juiz, vereadores, procurador da cidade e escrivão da câmara. O vice-rei da Índia, D. Duarte de Meneses, aprova a medida, e Filipe I de Portugal concede à nova cidade as prerrogativas de Évora, antes já autorgadas à cidade de Cochim, na Índia.1

Por carta régia de 1607, o vice-rei da Índia é autorizado a nomear para Macau um capitão-governador. Passam-se, porém, bastantes anos antes do envio do primeiro, na pessoa de D. Francisco de Mascarenhas, que toma posse em 17 de Julho de 1623. As suas atribuições eram bem claras. Em termos modernos, o capitão-governador ou capitão-mor seria o "comandante militar" da colónia.2 Administração civil continua assim na mão dos Macaenses.

Entra-se, desta forma, no século XVII, em que, apesar de tudo, Macau sofre, naturalmente, as consequências de união de Portugal a Espanha (1580-1640). Mantém-se, todavia, a prosperidade até 1639, data em que se perde o comércio japonês. Termina, pois, aqui o primeiro período da história macaense. Sem o comércio do Japão e, pouco depois, sem a navegação de Manila, possessão espanhola e, por conseguinte, fiel à sua mãe-pátria, os Macaenses são obrigados pelas circunstâncias a alargar o seu horizonte económico e a estender ao largo e ao longe o alcance dos seus navios.3

O fim principal deste estudo é examinar o sonho macaense, observado em princípio do século XVIII, de se estabelecer o comércio livre e directo entre Macau e os portos do Brasil.

Vive-se, neste século, e em pleno, a doutrina do pacto colonial. A navegação comercial obedece a rígidas regras que se não podem ignorar. As colónias têm de se voltar inteiramente para as suas metrópoles. Ora Macau dependia, em primeiro lugar, de Goa e, depois, evidentemente, de Lisboa. Os interesses de uma e de outra antepunham-se necessariamente aos do minúsculo enclave.

Que desejava Macau? Apenas o seguinte: autorização para poder enviar, directamente, a portos brasileiros os seus navios, portadores de mercadoria oriental, sem serem obrigados a pagar os devidos direitos em Lisboa. Afinal, este sonho só se concretizará em 1810, com a Família Real no Brasil.

A fim de se compreender melhor este problema, estuda-se em primeiro lugar a situação de Macau perante a China - servidões inevitáveis. É necessário, com efeito, ter sempre em vista esta condicionalismo extremamente delicado. Examinam-se a seguir, embora muito sinteticamente, alguns aspectos da vida de Macau ao longo de todo o século XVIII.

O sonho Macau-Brasil insere-se necessariamente dentro desta evolução. Segue-se o desdobinar do problema básico deste estudo, iniciado logo nos inícios do século, e terminado em 1810. Finalmente, impor-se-á uma conclusão.

2. MACAU PERANTE A CHINA SERVIDÕES INEVITÁVEIS

O estabelecimento dos Portugueses em Macau não podia, de forma alguma, contrariar quaisquer manifestações de oposição oficial chinesa. Seria estulto, portanto, basear a presença portuguesa em Macau em qualquer acto de conquista.

Os Macaenses conheciam perfeitamente a situação em que se encontravam, não só perante as autoridades algo distantes, de Cantão, como também perante as mais vizinhas. As de Pequim encontravam-se demasiadamente longe, para a elas poderem recorrer com normalidade. Impunha-se, necessariamente, o respeito da jerarquia.

A princípio parece terem os Macaenses tentado a prática de alguma agricultura na ilha de Xiangshan (Anção) mas esta iniciativa não teve seguimento. Se ela convinha aos Portugueses, não agradava aos Chineses. A estes convinha, sim, manter o insignificante estabelecimento comercial sob sua directa e total subalternidade. Quanto aos mantimentos necessários a Macau, viriam da China.

Os Macaenses teriam o mar à sua disposição para, por seu intermédio, concorrerem para o bem-estar comum, isto é português e chinês.

Não é de admirar, portanto que, bem depressa, os Portugueses experimentassem os inevitáveis inconvenientes de tão íntima convivência com os seus vizinhos e padroeiros.

Com a sua experiência, ganha na Índia e noutras paragens asiáticas, haviam aprendido que o dinheiro tinha de ser usado com certa liberalidade.

Não se tratava de "suborno", considerado à europeia, mas sim de simples oferta ou dádiva, destinada a inclinar a vontade alheia para a consecução de qualquer objectivo.

Partindo da evidência de que Macau dependia inteira e absolutamente da China, para a sua vida, fácil é compreender a gradual imposição de algumas servidões que, uma vez aceitas, pesariam de futuro sobre a vida citadina. Duas sobressaem neste contexto: o pagamento de um foro pelo chão ocupado e, mais tarde, o estabelecimento do próprio código penal chinês.

a) O foro do chão

Segundo velha tradição macaense, haveria uma "chapa de oiro", passada pelo próprio rei da China, a sancionar a doação de Macau aos Portugueses, a fim de aqui poderem comerciar com os seus vassalos. Mas tal chapa terá desaparecido.

Os Macaenses iam todos os anos a Cantão por ocasião da sua feira ou comércio.

Pagavam naturalmente os direitos locais e ofereciam certa quantidade de prata destinada às autoridades. Estas, naturalmente, aceitavam de bom grado esta oferta ou "peita". Em 1571 ou 1572, o intérprete macaense Pedro Gonçalves, ao entregar a oferta ou pagamento costumado, empregou inadvertidamente, ou quiçá propositadamente, a palavra foro perante o Aitao, ou principal governador. Este aceitou-o, afirmando que seria reservado para o tesouro régio.

Com efeito, parece natural que, no princípio, não houvesse qualquer imposição do foro do chão. A presença dos comerciantes portugueses interessava, sem dúvida, aos Chineses. Convinha-lhes adquirir as apreciadas mercadorias estrangeiras, sem grande esforço. Tinham até empenho em que os Portugueses se sentissem bem no minúsculo território cedido. Por outro lado, também lhes interessava que eles não "abusassem" (se esta palavra se pode aqui empregar!) da hospitalidade concedida, tornando-se economicamente altivos.

Eis como um manuscrito da Biblioteca da Ajuda, de Lisboa, narra o acontecimento:

"E se algum quizer saber a antiguidade e solemnidade deste foro, passou assim: desde o tempo que foi entregue este porto e península aos Portuguezes, logo além dos direitos ou ancoragens, pagarão certa quantia de prata com título de foro; mas por alguns annos não se punham no thezouro de el-rei; porque como os Portuguezes o entregavão ao Aitão por ser principal governador, e protector desta terra, elle a consumia e gastava, e por isso se chamava a peita do Aitão, e durou isto por espaço de alguns dez ou doze annos; athe que no anno de 71 ou 72, hindo os Portuguezes á feira, e sahindo os Mandarins, como costumavão, á porta grande vestidos de vermelho para receber os direitos que levavão os Portuguezes, depois em sinal de respeito conforme a sua uzança de os Mandarins lhes darem hum boyão de vinho e alguns bolos, como era costume, disse hum Pedro Gonçalves que servia de Girubaça, e era mestiço, fallando com o Aitao:como também aqui trazemos os quinhentos taeis que paga a Cidade de foro; o Aitao, como se disse aquillo diante dos outros Mandarins, vendo que corria perigo seo estado, acodio logo que esses entregasse ao Leencei, porque são para o thezouro del-rei por serem do foro que a cidade paga: e desde este tempo cá ja 10 annos se paga e enthezoura para el-rei, e como não he de direitos, nem de campos, nem vargeas, se não do sitio que se occupa a cidade, claro está que he foro do sitio, e ella tem senhorio delle, como os Chinas que pagão foro do sitio e terras que possuem, e se alguem duvidar desta historia pregunte a verdade della a António Garcez que se achou prezente e está vivo."4

Daí em diante, o foro de 500 taéis seria pago quase ininterruptamente. Era o "foro do chão". Mais tarde, aumentaria até 1.000 taéis. Recorde-se que tael é peso e não moeda. Se se quiser, é uma moeda de conta, variando bastante de localidade para localidade. Equivalia, mais ou menos, a 37,5 gramas.

Há notícias que este foro foi perdoado em 1650, 1652, 1685, 1686 e 1687 pelas autoridades chinesas.5

Não há dúvida que o pagamento deste foro não podia deixar de pesar significativamente não só sobre a afirmação de independência do estabelecimento, mas também sobre o próprio orçamento local.

Bastas vezes foi esta questão posta nas reuniões do Senado.

b) O direito penal chinês em Macau

A imposição e cumprimento do direito penal chinês, em Macau, na hipótese de morte violenta de algum chinês, foi sempre ressentida pelos habitantes, mas raras vezes se puderam eximir a isso.

Quando algum chinês era assassinado, quer por outro compatriota seu, quer por algum macaense ou estrangeiro, o culpado devia ser entregue à justiça chinesa, a fim de lher ser aplicada a pena última, ou de ser justiçado mesmo em Macau. Nestes casos, os mandarins vinham a Macau, a fim de se informarem in loco do acontecido e assistiam ainda à execução do criminoso, quando ela se realizava na cidade. A sua interpretação era invariavelmente a mesma: o criminoso tinha de morrer, não se admitindo, em geral, diminuição de culpabilidade.

Uma rápida leitura da terceira série dos Arquivos de Macau, iniciada em 1964, revela significativos exemplos desta interferência na soberania portuguesa de Macau.

c) Os "privilégios" de Macau

As histórias de Macau e a documentação existente referem, quase constantemente, o cuidado que os Macaenses tinham em desejar manter os seus "privilégios". Os mandarins chineses a cada passo lhos prometiam, principalmente, quando se viam acossados pelos piratas. Estas promessas, porém, eram geralmente frustadas. A contínua referência macaense aos "privilégios" manifesta claramenta a subordinação de Macau à arbitariedade dos seus vizinhos. Não se tratava de conseguir o reconhecimento de "direito", mas, sim de privilégios".

Um notável testemunho desta dependência encontra-se numa carta que o bispo D. Alexandre da Silva Pedrosa Guimarães (1772-1789), e governador da colónia de 25 de Junho de 1777 a l de Agosto de 1778, escreveu à Câmara. Em 5 de Agosto de 1777 oficiara-lhe ela a pedir parecer "sobre a assistência dos Estrangeiros nesta Cidade".6

Tratava-se de assunto de extrema importância, pois os vice-reis da Índia insistiam habitualmente na expulsão dos estrangeiros, como sendo prejudiciais. O bispo-governador respondeu três dias depois, em 8-8-1777.

Três razões havia para se excluirem os estrangeiros de Macau, segundo a tese defendida por Goa, então governada por D. José Pedro da Câmara (1774-1779): a) os estrangeiros arruinavam o comércio da cidade, pois sua presença concorria para a carestia dos géneros e dos mantimentos; b) os moradores não lucravam nada com a residência destes estrangeiros na cidade: c) os seus costumes corrompiam os naturais.

O bispo-governador aceita a validade das razões apresentadas, podendo aplicar-se aos estrangeiros em geral, devendo, porém, exceptuar-se os "corpos das Companhias..." istoé os componentes das tripulações dos navios que frequentavam o porto de Cantão. E, à boa maneira escolástica, distribui a argumentação por oito motivos:

1. A cidade de Macau tinha sido obrigada, havia mais de 10 anos, por ordem do imperador chinês, a receber tais estrangeiros. Não havia, portanto, motivo para se alterar agora a atitude então adoptada.

2. "He o segundo estarmos em huma terra precaria consentidos hà duzentos e vinte e dous annos, vivendo em boa Armonia, e com subjeição nos delictos a justiça do Imperador, havendo algum reo de morte feito em china..."

3. "He o terceiro não podermos rezistir com forças a qualquer ordem, que se houve de não cumprir, porque os chinas existentes nesta Cidade, são perto de vinte e dous mil, e todos os christãos de Macao assim velhos, como mossos, e crianças de peito, pretos e brancos de hum, e de outro sexo não chegarão a seis mil, e muito fracos: e o Imperador em hum instante meterá nesta Cidade de improviso tantos Chinas, que lançando cada um sȯ sapato neste rio farà intupir a barra, como elle referio a respeito dos moradores de Macao, quando perante elle os quizerão malquistar..."

Quer dizer: a cidade encontrava-se inteiramente à mercê de qualquer capricho dos Chineses.

4. As nações que comerciavam com a China, por intermédio de Cantão, lucravam em manter os seus agentes ou sobrecargas na China, enquanto os seus navios vinham e regressavam, podendo assim preparar, convenientemente, as cargas destinadas ao próximo embarque. Estes agentes, não podendo residir em Cantão, vinham naturalmente para Macau.

5. Os Chineses, mercadores de Cantão, tinham já em suas mãos muito dinheiro das nações europeias, com as quais comerciavam. Interessavam-se, portanto, também eles, em que os sobrecargas europeus residissem em Macau.

6. Os Chineses e o próprio imperador desejavam também conservar o comércio europeu, e assim "mais quererão a existência dos Estrangeiros do que livrar os moradores de Macao de quaesquer opressoens, que nȯs lhe reprezentarmos, respondendo a tudo que temos Leis, e justiças, para nos conservarmos..."

7. Os Chineses sabiam muito bem que os Macaenses não podiam substituir os outros mercadores europeus que frequentavam Cantão. Não valia, pois, a pena ofendê-los.

8. Convinha, finalmente, não perder de vista o facto de que os sobrecargas das Companhias movimentavam mais de 40.000 taéis. A sua ausência, portanto, não poderia deixar de ser sentida em Macau.

Discorrendo ainda sobre o assunto, recorda o bispo-governador que o imperador da China "hè Senhor directo de Macao, que lhe paga hum foro, e nȯs apenas temos o dominio util: A terra não se obteve por que digo por conquista, e assim a nossa rezidencia não hè firme, ad nutum sim..."

E mais baixo continua o seu melancólico raciocínio:

"Onde não há forças o direito se perde, e foi a razão por que perdemos Portugal. Nós não temos forças, nem direito; logo hè melhor sofrer, e recorrer, a quem possa dar as providencias..."7

3. MACAU NOS SÉCULO XVIII

O século XVII for a verdadeiramente agitado em Macau. Após o ataque holandês de Junho de 1622, rechaçado com pesadas perdas para o invasor, tudo parecia indicar nova época de prosperidade.

A concorrência holandesa no Japão imprimiu, porém, nova tonalidade às esperanças que no horizonte despontavam. A perseguição geral decretada em 1614 atingira apenas o cristianismo. Com o decorrer dos anos, intensificara-se paralelamente o comércio holandês no Japão. Em 1639, concretizaram-se os presságios: o Japão resolvera rejeitar o comércio português. Não necessitava dele.

O martírio dos embaixadores macaenses enviados ao Japão em 1640 revelou as verdadeiras dimensões da crise. Terminara, efectivamente, o comércio entre Macau e o Japão.8

Em 10 de Setembro de 1640, antes portanto da revolução nacional deste ano, resolveram os Macaenses enviar um navio a Lisboa, a fim de alertar a metrópole sobre a gravidade da situação.

As relações entre Malaca e Macau encontravam-se também seriamente ameaçadas, e os Holandeses eram já os senhores indiscutíveis dos estreitos de Singapura. Concluia-se do exame desta conjuntura " não poder conservar-se esta Cidade, sem ter viagens, e Portos aonde levar as fazendas que se comprão aos Chinas, e como não se comprando as ditas fazendas em Cantão, logo hé força que os mercadores naturaes as levão a vender ao inimigo da Europa, com o qual ficara o dito rebelde (i. e. os Holandeses) entroduzido neste comercio da China, e Japão..." Seria a ruina de Macau.9

Corriam, na verdade, bem contrários os ventos sobre Macau.

Em 1641, Malaca foi ocupada pelos Holandeses, dificultando-se enormemente as comunicações entre Goa e Macau. Em virtude da revolução de 1640, o porto de Manila, antes bem amigo, transforma-se em inimigo. Em 1668, os Chineses apertam o cerco económico à depauperada colónia, estabelecendo dentro dela a famigerada alfândega chinesa ou Ho Pu.

A embaixada enviada à China, chefiada por Manuel Saldanha (1667-1670) produz notável influência nas relações luso-chinesas. Os mandarins de Cantão observam, talvez com surpresa, que Pequim recebera extremamente bem o embaixador português, como representante de país amigo, e não "tributário", segundo se consideravam genericamente as nações estrangeiras.

Entra-se, desta forma, em rápida análise de século XVIII, podendo encarar-se-lhe os seguintes aspectos: religioso, diplomático, político-administrativo, económico e problemas finais.

a) Aspecto religioso

Macau fora, desde o início, a principal base missionária destinada à evangelização da China. No século XVII conseguiu o cristianismo penetrar profundamente tanto nas camadas populares como nas élites chinesas. Deve-se este facto à forma como os missionários se apresentaram, dispostos à prática da mais generosa política de adaptação missionária. Os jesuítas portugueses foram autênticos modelos neste esforço de achinesar o cristianismo, a partir das suas bases. Os jesuítas franceses seguiram, embora em escala mais reduzida, o exemplo dos seus correligionários. Ao findar o século, com a chegada de novos missionários, menos preparados para continuar este rumo, coincide o irromper de uma questão que se desdobraria em trágicas sequelas.

Trata-se da questão dos ritos chineses. A mentes europeias parecia quase inofensiva, mas a inteligências chinesas assumia importância extrema. Eram três as suas principais manifestações: qual o culto que os Chineses prestavam a Confúcio? Como se devia classificar o seu culto dado aos antepassados? E, finalmente, como exprimir, em chinês, o nome de Deus?

A Santa Sé julgou conveniente enviar um legado seu a fim de estudar o assunto in loco, esperando solucionar as diferenças metodológicas dos diversos missionários. O legado escolhido, Mons. Charles Thomaz Maillard de Tournon, partidário do rigorismo, defendido em geral pelos missionários não-portugueses, condenou os ritos e, por isso, não apradou aos Chineses, acabando por ser expulso.

Não agradou também em Macau, onde a questão dos ritos chineses era considerada com muito mais compreensão. Acabou o legado pontífico por se envolver em escandalosas quezílias com o próprio bispo D. João do Casal e com as autoridades civis. O papa Clemente XI aprovou a condenação em Novembro de 1704. Elevado à dignidade cardinalícia, faleceu Mons. De Tournon em Macau em 1710.

Esta questão teve como consequência a expulsão dos missionários da China.

Clemente XI (1700-1721), porém, endureceu mais ainda, ao publicar a bula Ex illa die, de 19-3-1715. A questão dos ritos, apesar de tudo, continuou bem acesa, permanecendo divididos os missionários: os do Padroado Português favoreciam a adaptação, ao passo que os da Propaganda Fide permaneciam fiéis aos seus princípios.

Perante isto, o próprio Clemente XI, reconsiderando o passado, enviou novo legado à China, Monsenhor Mezzabarba, em 1720. Mais diplomata do que o falecido de Tournon, tentou o possível por se insinuar no ânimo das autoridades chinesas. O imperador Kangxi, porém (1661-1722) não lhe prestou grande atenção.

Em face disto, Mons. Mezzabarba retirou-se de Pequim no ano seguinte, em 1721. Em Novembro deste mesmo ano publicou em Macau umas instruções relativas à candente questão: os missionários deviam acatar as instruções da Santa Sé. A fim de aliviarem a consciência dos cristãos chineses que, perante a exigência de centenários costumes, se debatiam entre sérios escrúpulos, Mezzabarba explanou em oito concessões ou faculdades, o caminho a seguir. Ao abandonar Macau, levou consigo os restos mortais do Card. de Tournon.

Esta tentativa não logrou resultados papláveis. Anos mais tarde, em 1742, Bento XIV (1740-1758), pela bula Ex singulari, repõe toda a questão no pé em que o falecido Card. de Tournon a deixara. E assim permaneceriam os "ritos chineses" até 8-12-1939, altura em que Roma, revendo o processo, publica uma libertadora instrução sobre tão delicado assunto.10

É fácil imaginar a repercussão que o evoluir destes acontecimentos produziu em Macau. Anos de verdadeira angústia, de esperança, ao longe surgida, mas logo frustada.

Kangxi faleceu em 1722. Seu sucessor Yong-zheng, verificando que bastantes missionários permaneciam ainda na China, publicou novo édito de expulsão em 1723. Foram apenas exceptuados os jesuítas, tanto franceses como portugueses, mercê da sua valia científica, permanecendo em Pequim. O imperador Qianlong, subido ao poder em 1735, manteve a perseguição ao cristianismo.

E, para cúmulo, Clemente XIV (1769-1774), pressionado por diversas potências, suprimiu a Companhia de Jesus em 1773. Em Portugal, já ela havia sido expulsa em 1759, cumprindo-se a ordem em Macau em 1762.

Foi necessário, portanto, recomeçar. Os lazaristas portugueses receberam a difícil missão de substituir os jesuítas na China. Justo é confessar que se desempenharam da tarefa com todo o entusiasmo. Mas... tinha passado, sem dúvida, a hora da simpatia chinesa pelo cristianismo.11

b) Aspecto diplomático

Fez-se atrás referência à embaixada de Manuel Saldanha. Anos volvidos, perante a perseguição anticristã, sempre crescente após a subida ao poder de Yong-zheng (1722), julgou o Senado macaense que se devia tentar nova embaixada com o fim de dissipar a antipatia imperial não só contra os cristãos, mas também contra os estrangeiros em geral. D. João V aprovou a ideia.

Confiou-se a embaixada a Alexandre Metelo de Sousa Menezes. O jesuíta António de Magalhães desempenhou, nesta altura, o papel que outro jesuíta, Adão Schall, tinha representado na embaixada de Manuel Saldanha. Sousa Manezes foi solenemente recebido em audiência em 28-5-1726, cumprindo-se à risca o complicado cerimonial. Não se abordou concretamente qualquer problema, seguindo-se ainda nisto a exigência da melindrosa etiqueta chinesa.

A perseguição, porém, continuou.

Passam-se anos. Em 1736, os Chineses impõem a presença em Macau de um seu mandarim, investido de verdadeira autoridade. O Senado reage, naturalmente, acomodam-se as negociações, adiando-se a resolução efectiva de tal presença até 1797.

Mas eis que em 1749 se aperta mais o controlo chinês, estabelecendo-se abertamente o código penal chinês na cidade. A autoridade portuguesa, impotente, nada pode fazer. Se até então a justiça era mista, reservando-se os Chineses os casos em que eram directamente envolvidos, exercem-na agora totalmente. Havia, porém, uma particularidade: o código chinês fora imposto, não em nome do imperador, mas sim no do vice-rei de Cantão.

É nestas circunstâncias que se organiza nova embaixada a Pequim. O embaixador Francisco de Assis Pacheco de Sampaio chega a Macau em 23 de Janeiro de 1752. Após laboriosa preparação, em que mais uma vez a corte de Pequim declara não ser Portugal "tributário" da China, parte a luzida embaixada para Pequim. É novamente um jesuíta, o Padre Agostinho Hallerstein, que se encarrega de trabalhar nos bastidores, a fim de assegurar à embaixada o possível êxito. A audiência realizou-se em 4-5-1752.

Pode parecer à primeira vista, terem sido nulos os efeitos deste esforço diplomático, enviado por Macau e a expensas suas. Não pensavam assim os Macaenses, profundos conhecedores da psicologia chinesa.

Os vice-reis de Cantão não podiam impedir tais representações em Pequim, onde, certamente, os interesses da colónia seriam subtilmente defendidos. Não era contra Pequim e a autoridade central que se queixava Macau. Era contra os mandarins vizinhos e contra as autoridades cantoneses. As embaixadas iam aparentemente a Pequim para saudar os imperadores. Na realidade, porém, o seu fim era outro: lembrar que em Macau havia uma pequenina colónia de estrangeiros amigos e inofensivos que, a cada passo, eram vítimas de indevida opressão, por parte de vulneráveis e corruptas autoridades.12

c) Aspecto político-administrativo

Como atrás se viu, o governo político-administrativo de Macau encontrava-se confiado ao Senado; o militar ao capitão geral-governador. Com o andar dos anos, porém, regista-se explicável tendência, por parte dos capitães-governadores, para se arrogarem cada vez maior responsabilidade na governança local. O Senado, por seu lado, sem força material em que se apoiar, limita-se a afirmar os seus direitos e privilégios.

O século XVIII principia mal, sob este aspecto, segundo se depreende de rápido folhear das Efemérides da História de Macau, por Luís G. Gomes, (Macau, 1954). Logo em 1700 o governador e capitão-geral Diogo de Melo de Sampaio anula as eleições do Senado (p. 6). Em 1710 regista-se grande escândalo, provocado pelo governador Diogo de Pinho Teixeira, cujo governo, iniciado em 1706, terminaria neste ano de 1710 (pp. 34, 38, 93, 103, 107, 119, 123, 128, 153). Sucede-lhe Francisco de Melo e Castro, a quem D, Rodrigo da Costa aconselha a não interferir nas atribuições do Senado. Este, reconhecido, agradece o gesto (p.34).

A contrastar com estes aborrecidos incidentes, situa-se o governo de António de Albuquerque Coelho (1718-1719), que agrada plenamente aos Macaenses.

Outros incidentes há, infelizmente, mas sem se poderem comparar com os de 1710, agora referidos, e de 1709, quando o ouvidor mandou prender o procurador do Senado, caso inédito na história de Macau (p. 224).

Durante o resto do século nota-se a continuação de certos atritos entre o Senado e os capitães-governadores e os ouvidores. O primeiro, representante da população e por ela eleito, defende interesses permanentes. Os segundos, vindos de Goa, sentem alguma dificuldade em compreender a particular circunstância da vida local.

Não se conclua, porém, que o Senado era isento de faltas. Macau é meio pequeno, muito pequeno, prestando-se facilmente à intriga, à maledicência, ao predomínio de alguns sobre os restantes. Há sobre isto um testemunho insuspeito: uma carta do vice-rei Francisco José de Sampaio e Castro (1720-1723), de 18-5-1721, a estranhar certa resolução do Senado, que havia proibido alguma navegação a chalupas dos moradores, reservando-a apenas para navios maiores. O vice-rei insurge-se contra esta resolução, "não só injusta, mas prejudicial ao comum dessa Cidade... porque o commercio he permittido igoalmente a grandes e piquenos..."13

Seja como for, as queixas acumuladas contra a actuação do Senado em exercício, acabariam por encontrar eco não só em Goa, mas também em Lisboa. Daqui o acumular de antipatia contra a instituição em si mesma, e não limitada às pessoas que, em determinada circunstância, ocupam o cargo de senadores.

Entre todas avulta uma acusação que atinge quase sempre o alvo: a da subserviência aos mandarins. Acusação fácil, para quem não sente as responsabilidades que sobre o Senado impendem.

Chega-se ao ano de 1783. Os diversos apelos contra o Senado de Macau tinham, em boa verdade, chegado a Lisboa. Terminara o governo de D. José(1750-1777) e do seu quase omnipotente valido, Marquês de Pombal. Martinho de Melo e Castro, na pasta da Marinha e Ultramar, debruça-se sobre o problema de Macau. Consulta a documentação que pode obter, assim como as pessoas certamente mais aconselhadas. Nos Apontamentos, e notícias para a instrução, que se deve formar em Goa, ao bispo de Pekin, sobre os negócios relativos ao dominio de Macáo, lê-se:

"O Dominio que a Coroa de Portugal tem sobre o importante Estabelecimento de Macáo, não lhe provem de alguma Graça, ou Cessão, que os Imperadores da China fizessem dele a esta Coroa; mas provem do Direito da Conquista, que as Armas Portuguezas fizeram daquela Colónia."14

É assim que principiam estes Apontamentos...

Com esta mentalidade, não admira que o Senado de Macau tenha sofrido frontal ataque por parte do dinâmico ministro. Noutro documento seu, intitulado Instrução para Dom Federico Guilherme de Souza, governador e capitão geral da Índia lavra ele a sua opinião relativa ao Senado macaense:

"O Senado da Camera daquele importante dominio, composto na mayor parte de Degradados, que ali se refugiaram, ou de outros similhantes a eles, todos ignorantissimos em materias de Governo, e sem outras vistas mais, que as de procurarem a sua fortuna por meyo da Navegação e do Commercio, só cuidam em fazer menos cruel a tirania dos Mandarins, com humiliaçoens serviz, com dadivas, que constantemente lhes oferecem talvez extorquidas da Real Fazenda: e submetendo-se a quanto eles querem, sem lhes importar couza alguma, que diga respeito ao decoro da Nação Portugueza, nem ao inconstestaval Direito de Soberania, que a Coroa de Portugal tem naquelle Dominio..."15

É este um dos mais violentos e autorizados ataques jamais feito à acção do "Leal Senado" de Macau. "Leal", declarado por D. João IV, e "Leal", declarado anos depois, em 1810. Testemunho violento e autorizado, sem dúvida, mas explicável apenas pela crassa ignorância em que laborava Martinho de Melo e Castro.

Eis, portanto, o Senado de Macau inculpado de tudo quanto de mal acontecia na colónia! Impunha-se, portanto, segundo a sua opinião, reduzir a jurisdição do Senado à pura administração local, reservando ao capitão-governador, não só a política militar, mas também os negócios de relação com os Chineses e a administração financeira.

Outro abuso, segundo Martinho de Melo e Castro, era a ausência de um ouvidor que, sendo antes de carreira, era agora exercitado por um leigo. O Senado era portanto culpado pela perda de todos "os privilegios, izenções e liberdades", antes concedidas pelos imperadores.16 Quanto à adminsitração financeira, o mesmo ministro alimenta ideias verdadeiramente ofensivas para o Senado, atribuindo a puro descuido seu, o estado a que as finanças haviam chegado. A grande medida salvadora a adoptar seria o estabelecimento de uma alfândega em Macau, a obedecer a todos os regulamentos específicos e técnicos observados noutras colónias.

Em súmula: havia seis "providências" a adoptar quanto a Macau:

I. Cuidadosa escolha do governador que poderia ser revocado, quando não cumprisse os seus deveres; após o triénio, poderia ser rconduzido por mais três anos, caso a sua administração se impuzesse.

II. Conferir mais autoridade ao governador, dando-lhe mais tropa, para se fazer respeitar.

III. Seria o governador, e não o Senado, a lidar com os Chineses.

IV. Estabelecimento de alfândega régia em Macau.

V. Nomeação de bispos portugueses para a China.

VI. A câmara de Macau devia prestar rigorosas contas dos rendimentos da Fazenda Real.17

Martinho de Melo e Castro argumentava, como bom europeu regalista, que os mandarins, causadores da opressão em que Macau vivia, tendo procedido contra as ordens imperiais, seriam facilmente chamados à ordem, desde que o seu procedimento irregular fosse superiormente detectado. Ignorava, portanto, qual a verdadeira situação de Macau.

Partindo destas premissas, ordenou que se procedesse, com o máximo segredo e eficiência, no sentido de se diminuir a autoridade do Senado, realçando-se em contrapartida, a do capitão-governador. Na fragata de guerra que levaria a Macau o bispo de Pequim, embarcariam também uma companhia de sipaios e um destacamento de artilharia, dois juízes da Relação ou dois oficais da Fazenda encarregados de examinar escrupulosamente as contas do Senado. Devia este ser emprazado a apresentar os seus livros de contabilidade. Ao mesmo tempo procurar-se-iam diligentemente as "chapas" ou cartas de privilégios chineses.

O governador e outros oficiais procederiam à instalação da alfândega, apesar dos obstáculos que, certamente, encontrariam por parte do Senado. Aqueles que se opusessem a tais medidas seriam presos e enviados para Goa, a bordo da mesma fragata, acompanhados dos seus respectivos processos.18

Todo este rigor tem apenas a desculpa de ter sido inspirado quer por ignorância, quer por deficiente informação.

d) Aspecto enconómico

Como se afirmou já, dependia Macau do comércio marítimo. Os seus mercadores compravam artigos chineses e transportavam-nos a diversos portos, onde eram normalmente vendidos.

Até 1639, a principal viagem era a do Japão. Mercê da concorrência holandesa, perdeu Macau este importante quase-monopólio, encerrando-se assim o período de prosperidade, de que tinha sido idubitável usufruidora.19

Não obstante este grave golpe, logo seguido por outros já referidos, reagiram os Macaenses o melhor que puderam. A vida citadina decorria sempre suspensa dos seus interesses económicos. As actas da sua câmara "nesta cidade do nome de Deus de Macau na China", ocupam-se quase invariavelmente dos mesmos assuntos: relações com os Chineses, imposições dos mandarins vizinhos, dificuldades, viagens, sempre viagens: Manila, Sião, Madrasta, Cochinchina, Java, Bombaim, Surrate, Goa, etc., etc.

Os mercadores, donos de embarcações, não gozavam de plena liberdade quanto aos seus movimentos. Havia a "pauta de viagens", proposta por Macau e sujeita à aprovação de Goa, com antecedência de alguns anos. Evidentemente, esta pauta podia ser alterada, mediante graves ocorrências. Na impossibilidade de certo navio não poder realizar a sua viagem, marcada nesta pauta, tinha de ser substituído. Havendo tempo, propunha-se a Goa tal substituição.

Uma das mais lucrativas viagens, após a perda do comércio nipónico, era a de Timor, por causa do sândalo. Esta viagem, todavia, dependia das condições de segurança encontradas no arquipélago de Solor e Timor. Recorde-se que só em 1665 se nomeou um representante do poder central, com o estabelecimento dos Portugueses em Lifau, capital portuguesa até 1769, data em que se trasladou para Dili. Pode afirmar-se ainda que, durante todo o século XVIII, a situação do arquipélago ofereceu quase sempre certa instabilidade, o que não podia favorecer o tráfico normal com Macau.20

As viagens para a Índia não se podiam realizar também, sem autorização de Goa. Macau enviava apenas o número de navios que lhe era indicado, e não mais. Para a Cochinchina e outros destinos, acontecia a mesma limitação. A navegação macaense obedecia, portanto, ao princípio de que devia aproveitar tanto à Índia como a Macau.

O século XVIII é assim marcado por quase contínua decadência. O afastamento dos missionários da China e a afluência a Cantão de barcos doutras nacionalidades afectaram profundamente a prosperidade macaense.

Em 1726 tinham sido nomeados procuradores de Macau em Lisboa o Dr. João Marques Bacalhau e Pedro Vicente Velho. Da correspondência entre eles e o Senado, entre 1736 e 1737, verifica-se que o porto de Batávia se encontrava fechado pelos Holandeses e que o de Surrate não podia igualmente ser frequentado por navios macaenses. Este caso era particularmente sentido em Macau, porque tal proibição viera de Goa, favorecendo apenas Ingleses e Mouros.21

Havia em Lisboa, em 1741, a Companhia Real das Sedas que, a fim de incrementar o seu comércio, lançou a ideia de se formar em Macau uma sua sucursal ou, melhor, uma nova companhia aliada. Duraria 16 anos, sendo gerida por directores e administradores.

Poderiam nela ser admitidos, como accionistas, quantos nela estivessem interessados. A Companhia de Lisboa poderia enviar à China, todos os anos, os navios que desejasse, sendo estes equiparados às naus da Índia. Ser-lhe-ia vedado, todavia, o comércio do Brasil. Uma das concessões mais importantes era: "Que a Companhia poderá mandar nos seus Navios toda a prata necessária para a sua negociação, não sendo em moeda deste Reyno".22

No reinado de D. José (1750-1777) continua a mesma situação. Em 1753 funda-se em Lisboa a Companhia do Comércio Oriental. Dois anos mais tarde, é a vez da Companhia do Grão Pará e Maranhão, e em 1759 cria-se a Companhia de Pernambuco e Paraíba.23 Quer dizer: Macau acaba sempre por sofrer a concorrência doutras empresas. Note-se que a nau da Companhia do Comércio Oriental estava autorizada a comerciar com a Índia. Os Macaenses verificam assim quase perdidos os portos do Malabar, Goa e Surrate. A nau da Índia, de tonelagem superior, podia transportar a carga de dois navios pequenos.

Em 5-11-1755, o Leal Senado recorda que em 1726, por ocasião da embaixada de Alexandre Metelo de Sousa e Menezes, havia em Macau mais de 20 navios. Presentemente, em 1755, "apenas existem sete Navios, e Chalupas, e destes ficarão fora três nesta Monção".

E mais: a Fazenda Régia não gastava nada com Macau; os seus moradores, vivendo apenas do comércio, pagavam o sustento do bispo, do tribunal, do presídio, do governador, etc. A decadência era tal que contavam-se apenas seis moradores que podiam viver em abundância. Pelas ruas, não faltavam mulheres a pedir esmola. Nas fortalezas não havia munições. Os conventos encontravam-se sem rendas. Não havia tropa suficiente. A cidade endividada lutava com o seu orçamento desequilibrado.

Perante esta alarmante situação, o bispo D. Frei Hilário de Santa Rosa veio a Lisboa expor à Corte o que na realidade se passava. O Senado propunha a isenção de várias despesas, a supressão de alguns cargos, incluindo o do próprio cirurgião.24 Por outro lado, é necessário não perder de vista que um alvará régio de 10-6-1755, havia aberto a todos os moradores da Ásia Portuguesa, portanto também a Macau, o comércio de Moçambique.25

e) Problemas finais

Resta, nesta fugidia síntese, mencionar o recrudescimento da pirataria no litoral chinês ao findar do século, vendo-se Macau directamente envolvido neste verdadeiro redemoinho. Este levantamento, chefiado por Zheng Yi, distinguia-se dos antecedentes, por não se contentar com a riqueza, isto é com o roubo. Estes piratas, com efeito, oriundos não só da China, mas também da Cochinchina e Formosa, pretendiam derrubar a própria dinastia.

Por falecimento de Zheng Yi, sucedeu-lhe na chefia sua mulher que, manifestando extraordinárias qualidades pessoais, galvanizou à sua volta todos os sequazes de seu defunto marido. Formaram-se assim duas divisões navais, comandada por Zhang Baozai, a ostentar a sua bandeira vermelha, e outra por Guo Podai, orgulhosa de estandarte preto.

Concretizaram-se as suas ameaças. Em 1792, o mandarim de Xiangshan solicitou a colaboração portuguesa. O Senado aproveitou-se da ocasião para negociar o seu auxílio mediante o reconhecimento dos "antigos privilégios". Com efeito em 29-12-1792, o Senado escreveu para Goa a participar o pedido das autoridades chinesas relativo armamento de duas embarcações para combate aos piratas. O governador tinha-se manifestado pela afirmativa, mas o Senado propusera outra forma de colaboração: os mandarins poderiam fretar os navios por sua conta, e a cidade forneceria o armamento e o pessoal.26

Os piratas não se contentavam em atacar apenas a navegação imperial. Macau tornava-se, para eles, objecto de natural cobiça. Urgia, portanto, preparar a cidade contra qualquer eventualidade. Se antes, a fortificação de Macau podia constituir motivo de fácil suspeita, por parte dos mandarins vizinhos, agora, pelo contrário, era a ocasião propícia para se meter dentro dela toda a tropa que se desejasse. Havia, com efeito, o receio de que os piratas, num golpe de audácia, tentassem a expulsão dos Portugueses. Seria o fim.

Em 31-12-1805 escreveu o Senado uma aflita carta ao Príncipe Regente a participar que, apesar de Goa ter enviado alguma assistência, não bastara para as necessidades. Houvera até necessidade de se venderem alguns barcos, não preparados para o combate. Com o produto desta venda, comprara-se um navio novo, o Ulisses, de teca, já preparado para receber o conveniente armamento.27

Como se não bastasse a ameaça dos piratas, complica-se mais ainda a situação de Macau. Sob pretexto de possível ocupação da cidade pelos Franceses, os Ingleses pretendem ocupar Macau. Não havia sinais alguns de ameaça francesa. A única ameaça, e bem real, era a dos piratas. A ll de Setembro de 1808 surge na rada de Macau uma flotilha britância, chefiada pelo almirante Drury. Não vem defender Macau contra os piratas bem próximos, mas sim contra os Franceses, bem distantes. Tem ordens superiores para desembarcar os seus homens e de ocupar posições estratégicas. O governador, Bernardo Aleixo de Lemos Faria e o Senado opõem-se, quanto podem, ao desembarque.

Arrastam-se as negociações longas e difíceis, nas quais participa também o ouvidor Miguel de Arriaga Brum da Silveira. O almirante inglês insiste: tem de cumprir as ordens recebidas. A 21 deste mês de Setembro assina-se uma convenção, segundo a qual se permite o desembarque inglês, sujeito embora a várias condições.

Uma vez em terra, os marujos britânicos envolvem-se, em breve, em questiúnculas com a população chinesa. Os mandarins vizinhos, de Qian Shan e de Xiangshan, e o próprio vice-rei de Cantão manifestam-se abertamente contra a presença inglesa em Macau. Mais: Cantão ameaça enviar em exército contra Macau. Perante esta inesperada perspectiva, os Ingleses resolvem reembarcar. E, sempre utilitários, conseguem que Arriaga interceda por eles junto das autoridades chinesas, a fim de revogar o édito chinês que proibira o seu comércio em Cantão.

E tudo termina bem: os Ingleses reembarcam em 18 de Dezembro e, dias depois, em l de Janeiro de 1809, Cantão declara novamente a concessão de liberdade ao comércio inglês.

Afasta-se assim a ameaça inglesa. Resta ainda a dos piratas. Vivem-se, naturalmente, meses e meses de angústia. Novamente, Macau respira fundo. Os piratas são totalmente desbaratados em 21-1-1810. Meses depois, em 26-5-1810, o Senado, ao escrever para Goa, compraz-se em recordar que a esquadra portuguesa, com 6 navios apenas, derrotara 270 e tantas "embarcações guarnecidas de groça artelharia, fazendo dois Corpos hum de 17 mil homens e outro de 8000...".28

Eis o quadro em que se situa e desenvolve o sonho macaense ao longo do século: relações económicas livres e directas com o Brasil.

4. IDEAL DE MACAU AO LONGO DESTE SÉCULO: COMÉRCIO LIVRE E DIRECTO COM O BRASIL

a) O condicionalismo vigente

Como se viu, a navegação macaense limitava-se, a princípio, a portos asiáticos. A dura experiência, amontoada até fins do século XVII, mostrara ser necessário alargar os horizontes. E surge assim o desejo de se estabelecer carreira normal com portos do Brasil, mas em regime de navegação livre, em ser necessário passar por Lisboa, a fim de aqui pagar os devidos direitos.

O Senado, ao formular este pedido a D. João v (1706-1750), propusera-se enviar a Lisboa, como seu procurador, o respeitado bispo diocesano D. João do Casal (1690-1735) a fim de advogar a sua causa. Respondendo em 15-3-1707, afasta el-rei esta hipótese, alegando a não-conveniência de tal deslocação.

Quanto à navegação livre para o Brasil, observa-se a mesma atitude negativa, indicando-se o prejuizo que de tal viagem resultaria para a alfândega real de, "em se privar dos direitos das fazendas que vem a ella da China...". Além disso, o comércio brasileiro, segundo a opinião régia, pouco renderia.29

Esta resposta, contudo, não convenceu o Senado. Continuou a enviar de vez em quando um representante seu ou procurador a Lisboa, assim como o tinha em Goa. Em 1709 encontra-se em Lisboa André Lopes de Lavre, que se refere ao enviado de Macau, Gaspar Franco da Silva, e que apresentara a el-rei o dilema: ou se queria conservar Macau, ou, então, dir-se-ia melancolicamente que ali foi Macau, como Mombaça e Ceilão... Lopes de Lavre refere-se também à decisão régia de se não permitir o regresso directo do Brasil a Macau. Quer dizer: a navegação Macau-Brasil continuaria, como antes.30

Gaspar Franco da Silva expusera, com realismo, a situação de Macau. Uma das causas da decadência da cidade era a obrigação imposta por Goa de os seus navios pagarem direitos, pelo simples facto de navegarem "nos seus mares", mesmo "sem entrarem em Goa". Desejavam, portanto, os Macaenses ser isentos de tal dever. El-rei manifestou-se da seguinte forma, em carta de 30-12-1709:

"Me pareceo dizer-vos, que sobre o poderem navegar as vossas embaraçoens para os portos do Brasil deste Reyno, e da Azia, vos tenho concedido esta liberdade..."

Sugere ainda el-rei a formação de uma companhia de homens de negócio, formada por metropolitanos e macaenses. Refere-se mais ao facto de os navios macaenses serem obrigados a pagar direitos a Goa só pela sua passagem pelo Índico. Atendendo à circunstância de Macau ter sido privada da viagem de Manila, e de a viagem de Solor e Timor se encontrar também embaraçada por alterações locais, afirma:

"Hey por bem de ordenar ao V. Rey desse Estado não consinta que obrigeum as embarcaçoens desse porto que passão pelos mares de Goa, a que paguem taes direitos, com declaração porem, que isto se entenderá em quanto se não logre a paz com a Coroa de Castela, e se não restituem esses moradores aos interesses antigos, e se passeficão as ditas Ilhas, por que tornando tudo ao primeiro ser, e se estabelecer o negocio sem nenhum embaraço, neste cazo pagarão os taes direitos como estava em estilo, de que me pareceo avizar-vos para terdes a rezolução, que Fui Servido tomar nesta materia..."31

Por outras palavras: os navios estavam, de facto, obrigados por "antigo estilo" a pagar direitos a Goa, só por sulcarem mares, considerados seus, para efeitos fiscais, muito embora não entrassem no seu porto. Exigências da política económica então vigente! A concessão régia, sob este aspecto, constituía apenas uma excepção, durando até à próxima paz com a Espanha, isto é, em 1715. Note-se, contudo, a concessão de os navios macaenses poderem navegar para os portos da Ásia e do Brasil. Tratava-se de viagens habituais, obedecendo às praxes em vigor, e não de "navegação livre".

Há, porém, certa diferença quanto ao comércio Macau-Brasil. Com efeito, a carta régia de 15-3-1707 inclinara-se para dissuadir os Macaenses de tal comércio, ao passo que a de 30-12-1709 lho patenteia abertamente.

Macau, portanto, continuaria sob directa dependência de Goa, tanto sob o aspecto administrativo - que se impunha evidentemente -como sob o ponto de vista económico -já menos compreensível.

Tornando à Companhia comercial, acima referida, sugerida por el-rei, na carta citada, sabe-se que o procurador macanese Gaspar Franco da Siva participara nos reparativos para a sua criação. Propusera ele que tal companhia fosse aberta a quantos nela desejassem participar. O provedor e deputados da Mesa do Espírito Santo da Pedreira, dos homens de negócio, a cujo exame foi sujeita a proposta, concordou. Havia, com efeito, estrangeiros que desejavam negociar com a Índia como com Macau, e convinha estar alerta a tal respeito. A nova companhia, confirmada por alvará régio de 3-1-1710, poderia comerciar com os portos brasileiros, segundo as condições correntes. Esperava-se que, logo na primeira monção -portanto em Março de 1710 - partisse nau da Companhia para o Oriente.

A condição 7 era bem clara:

"Com condição que os Administradores desta Companhia poderão mandar vender em qualquer porto do Brazil donde forem as ditas Naus vindas de Macao, as fazendas que lhes parecer, manifestandose na Alfandega de V. Magestado ao provedor & Officiaes della, de que mandarão certidão á Caza da Índia, para nella se pagarem os direytos a V. Magestade na forma atraz referida de dez por cento, & as mais miudezas, que costumão pagar na dita Caza, & por esta condição somente se obrigão a sua importancia nesta Cidade."32

Parece ter sido bastante reduzida a actividade desta Companhia. Com efeito, em 1715, dois catalães, João e Paulo Martins requereram a concessão de nova companhia para os portos do Oriente, desde o Cabo de Comorim até às Molucas e Japão, pelo prazo de 5 anos. Um dos motivos alegados era que a Companhia de Macau, concedida à Mesa do Bem Comum do Comércio, pelo período de 10 anos, se podia considerar extinta.

Este pedido foi examinado na Mesa do Bem Comum do Comércio em 23-5-1715. O seu parecer foi negativo, chamando-se particularmente a atenção para o facto de a Companhia de Macau ainda se não encontrar extinta.

A Casa da Índia, consultada, proferiu igualmente parecer negativo em 17-8-1715, observando que, depois de se ter descoberto oiro no Brasil, não faltavam estrangeiros a pedir autorização para a frequência dos seus portos.

Continua portanto a navegação Macau-Brasil sujeita à legislação geral.33

b) 1710. Macau pede

Anos volvidos, encontra-se em Lisboa, em 1719, como procurador do Senado, o Pe. Frei António dos Prazeres, dominicano, a fim de expor a el-rei a triste situação da cidade de Macau, e a solicitar os meios mais apropriados para lhe poder acudir. A principal calamidade era a falta de comércio. Pediam os Macaenses a faculdade de enviar navios, com mercadorias da China, "a todos os portos, e terras de Africa, America e Portugal", pagando evidentemente os direitos devidos à Coroa.

O Pe. Frei António dos Prazeres, ao partir de Goa, dirigiu-se para o Brasil, chegando à Baía em 20-11-1717. Após alguma demora neste porto, continuou viagem para Lisboa, aonde chegou em fins de 1718, apresentando imediatamente a Sua Majestade o memorial, de que era portador.

Antes de mais, havia uma circunstância que se não podia olvidar. O velho imperador Kangxi dava sinais de não poder durar muito tempo. O Senado, em carta de 26-12-1717, expusera a perigosa hipótese de poder haver luta entre os pretendentes ao Trono. Convinha, por conseguinte, preparar a cidade para enfrentar qualquer eventualidade. Solicitava-se assim um socorro de 50 soldados, 100 espingardas e 500 barris de pólvora.

O Conselho Ultramarino examinou cuidadosamente o assunto. Dividiram-se as opiniões, e "muitos forão de parecer que se perdia a Cidade de Goa, concedendose a Macao o que pedia".

Quanto ao socorro militar solicitado, o Conselho Ultramarino concordou com o número de soldados e de espingardas, reduzindo, porém, para 300 o dos barris de pólvora. Esta resolução é datada de 25-1-1719.34

Perante a gravidade da situação ordenara el-rei a constituição de uma junta, constituída por três antigos vice-reis da Índia.

Um deles, D. Rodrigo da Costa, vice-rei de 1707 a 1712, manifestara-se naturalmente mais a favor de Goa do que de Macau. Em 4-4-1719, dirigiu uma carta ao Senado, na qual se confessa pezaroso "pela lastimoza reprezentação que me fazem do mizeravel estado a que chegou o Povo dessa Cidade, a quem sempre dezejei opulentissimos augmentos não deixando de lhos procurar em tudo o que me tem sido possivel...". E, como bom cortesão, afirma que el-rei tinha deferido "tudo o que se faz possivel com a sua costumada grandeza...". Ao findar, refere-se com louvor ao enviado Pe. António dos Prazeres.35

Após estas consultas, respondeu el-rei à cidade de Macau em 11-5-1719. Segundo esta importante fonte, eram os seguintes os pedidos macaenses:

i). Faculdade de enviar navios, com mercadorias chinesas, "a todos os portos e terras de Africa, America e Portugal", pagando os direitos reais. Em resposta, concede el-rei autorização para "cada anno a este Reyno, pelos portos do Brazil, como faz a Companhia..." durante 5 anos, mas com proibição de carregarem fazendas para Angola, de levarem ouro ou prata, tanto do Reino como do Brasil, e de venderem fazendas em Goa. Além disso, devia o Senado enviar também a Goa dois barcos por ano afim de esta cidade não perder os seus direitos, devendo até tais navios partir de Macau, antes dos dois destinados quer ao Reino, quer do Brasil.

ii). Envio de nova embaixada à China. Concorda el-rei, nomeando até para tal missão D. Francisco Alarcão Sotto Mayor, com a condição, porém "que a despeza de tal embaixada a hade fazer essa Cidade..."

iii). Pedira o Senado que a Corte se interessasse na remoção das dificuldades postas pelos Holandeses, quanto à frequência do porto de Malaca, exigindo pesados direitos de ancoragem. Promete el-rei envidar o possível neste sentido.

iv). Solicitara o Senado isenção do pagamento da côngrua ao bispo da cidade. Escrever-se-ia, sobre esta matéria, ao vice-rei da Índia.

v). Quanto à pólvora e munições pedidas para as fortalezas de Macau, dar-se-iam instruções ao vedor-geral da Fazendo, de Goa, para as vender "pelos preços que correrem nos Meus Armazens..."

vi). O Senado tinha pedido a faculdade de apresentar uma lista tríplice dos capitães das fortalezas macaenses, da qual sairia a nomeação régia de um. Sobre isto, ordena el-rei que "deve praticar o que he de estillo..."

vii). Desejava o Senado poder "nomear pessoa de Macáo para Governador da ilha de Solor, e Timor..." Declara el-rei "que não tem lugar defferir-se a vossa reprezentação..."36

Por seu lado, o Pe. Frei António dos Prazeres enviou de Lisboa duas cartas ao Senado, uma del 1-5-1719, e outra de 15-3-1720, a dar conta da sua actuação na Corte.

Refere-se a primeira à sua viagem e às suas diligências no sentido de conseguir o que o Senado desejava. Já em Lisboa, recebera nova carta da Cidade, sobre a urgente necessidade do socorro militar, tendo ele elaborado imediatamente novo memorial. A este propósito, não deixa de apresentar certa curiosidade a forma como os soldados tinham sido recrutados. Haviam-se colocado editais a convidar voluntários e, ao mesmo tempo, tinham-se dado ordens "para se prenderem alguns vadios...", visto ter havido poucos voluntários.

Referindo-se à embaixada à China, menciona o facto de o Senado não ter de despender coisa alguma, pois o escolhido, D. Francisco de Alarcão, oferecera-se para pagar tudo à sua custa.

Sobre a proibida importação de prata, não significava isto obstáculo de monta, visto não a haver no Reino, sendo necessário mandá-la vir de Castela, embarcando-a a seguir para Macau, o que aliás era permitido. Além do mais, havia lei geral a proibir a saída de moeda do Reino.

A propósito da côngrua do bispo de Macau, el-rei tinha enviado ordem ao vice-rei e ao Conselho da Fazenda de Goa, a fim de aliviarem o Senado de tal encargo.

Sobre navios macaenses apresados, informa:

"Manda passar ordens apertadas para se restituirem os Navios tomados assim em França como em Mogor e juntamente passar officios para abordar com a Companhia de Olanda sobre as ancoragens; o que já no tratado das pazes estava concordado e por culpa dos Padres do Oratorio se não tem assinado."

A segunda carta, de 15-3-1720, menciona os mesmos assuntos.37

Sobre a constituição da embaixada, convém lembrar que, afinal, houve alteração na escolha do embaixador, recaindo ela em D. Alexandre Metelo de Sousa e Menezes, cujo fim patente seria saudar o novo imperador, após o falecimento de Kangxi.

Em conclusão: foram praticamente nulos os resultados conseguidos pelo Pe. Frei António dos Prazeres. O "sonho macaense" permanece na região dos sonhos.

c) 1732. Macau insiste

Em 14 de Dezembro de 1732, realizou-se no Leal Senado de Macau uma sessão, para a qual foram convidados, além do capitão-governador (António Moniz Barreto), os prelados das diversas Religiões, os "homens bons" e as principais individualidades. Estava em jogo o futuro da colónia. Justificava-se a expectativa.

A situação era grave, a decadência bem evidente, o deficit temeroso. As "fintas" ou derramas que, de vez em quando, se poderiam lançar sobre os moradores, não chegariam sequer para as despesas ordinárias. Segundo vinha ditando a experiência, o comércio com os diferentes portos asiáticos vinha decaindo de ano para ano. O sândalo de Timor não rendia já o lucro de antes. Os restantes portos, frequentados pelos navios macaenses, encontravam-se em conjuntura semelhante.

Perante este horizonte nada pormetedor, urgia lançar mão de novas medidas. A ideia básica seria tentar concretizar o velho sonho: impetrar a el-rei D. João V (1706-1750) a faculdade de Macau poder enviar, anualmente, um navio ao Brasil, sem ser obrigado a passar por Lisboa, para o pagamento de direitos, e de poder, no regresso, trazer prata. Era isto o que mais se desejava. Esperava-se despacho favorável a este pedido, tanto mais que a Cidade se encontrava depauperada pelas despesas havidas com a embaixada à China.38

Foi esta iniciativa aprovada, e pode imaginar-se com que entusiasmo e esperença. A resposta de Lisboa, porém, não for a favorável. Mantinha-se a negativa de antes. Como não ficariam os Macaenses, ao verem frustrado um plano em que tinham depositado todo o seu optimismo?

Na reunião de 14-10-1733 foi novamente o assunto ventilado, com o máximo interesse, na presença das autoridades civis e eclesiásticas e mais convidados. O bispo D. João do Casal (1690-1735), não pôde comparecer, por doença.

Nesta magna sessão resolveu-se insistir no pedido:

"... e se fação forças para cometer a Viagem do Brazil, porque alem de ter varios Portos de grandiozo contrato, são terras nossas, e temos tambem a certeza de que os Moradores daquellas partes anciosamente dezejão de que desta terra haja barcos que para aquelles Portos naveguem, adonde dizem não só que querem entrar com Cabedaes, mas que tambem interessarão no Barco que for..."39

Esta passagem indica, segundo parece, que já teria havido contactos entre Macaenses e Brasileiros. Não deixa de assumir certa ternura a referência à união entre as duas parcelas, tão separadas no espaço, e tão unidas pelo sentimento - "são terras nossas". Os Brasileiros poderiam dizer o mesmo: "Macau é terra nossa".

A grande esperança despositada no Brasil referia-se à prata: "... basta só que tragão o seu producto em prata...". O navio de certo levaria produtos orientais e traria prata. Tanto bastava. Não se faz referência a quaisquer produtos a importar.

Quanto à realização desta viagem, havia uma realidade a impor-se: onde estava em Macau o único morador capaz, de por si só, se arriscar a tal empresa? Havia, porém, a possibilidade de alguns se unirem em sociedade. O que era necessário era "repetir com nova supplica a sua Magestade, que Deus guarde, livremente de poder hum Barco nosso ir, e vir áquelles Portos, e trazer o seu producto em prata, que são hoje os que se achão mais opulentos como todos sabem...".

Acrescia ainda outro motivo. É que el-rei desconhecia a trágica situação de Macau. Em recente carta régia, de 24-3-1732, dirigida à câmara de Macau, baseando-se certamente em antiga informação, referira-se-lhe neste temos:"... e porque essa Cidade se acha augmentada com cabedaes..." para justificar a ordem dada à mesma câmara de dar ao bispo coadjutor D. Eugénio Trigueiros, O. S. A. a quantia de 4.000 cruzados. Ora, a verdade era totalmente diversa: a câmara encontrava-se tão empobrecida que não podia cumprir esta ordem.40

Mas, havia mais: o vice-rei da Índia, D. Pedro Mascarenhas, conde de Sandomil (1732-1741), havia proibido recentemente o transporte de sândalo da Índia para Macau. Tinha ele sido informado que este facto prejudicaria o comércio do sândalo de Timor. A intenção era boa, mas com a abundância de navios estrangeiros, os Macaenses seriam os únicos a sofrer com tal medida. Tanto mais que, em virtude desta mesma ordem, o barco de Macau, em viagem para Timor, estava proibido de aportar a Batávia. Esta viagem, sendo directa, só prejudicava a cidade. Impunha-se portanto, defender em Lisboa os verdadeiros interesses de Macau.

Foram estes os assuntos principais versados nesta reunião. A resolução respeitante a Timor foi "que se recorresse a Sua Majestade, pedindo o favor de nos conceder licença, para desta Cidade poder mandar Barcos para os ditos Portos, sem ser necessario passar a Corte de Lisboa a pagar os Direitos Reaes, os quaes poderão ser pagos nos mesmos Portos, em que fizerem escalla, e juntamente a graça de podermos trazer prata do producto das fazendas, visto não haver nelles Genero, de que se possão tirar utilidade...".41

A ideia que el-rei fazia de Macau - "porque essa Cidade se acha augmentada com cabedaes" -deve ter produzido forte impressão nos Macaenses. Seria afinal esta a razão por que os pedidos da Cidade não encontravam eco favorável em Lisboa. Faltava na Corte quem advogasse os interesses locais.

Na reunião do Senado, em 27-10-1733, o vereador João Baptista Monteiro recordou o facto e propôs que se enviasse alguém a Lisboa "a supplicar aos Reaes péz de Sua Magestade o remedio mais eficáz, que se encaminhe a conservação desta sua Cidade tão esclarecida com o Nome Portuguez, quanto invejada pelas Naçoens Estrangeiras...".42 Era necessário, com efeito, informar el-rei quanto à verdadeira situação da China. O imperador mostrava-se hostil ao cristianismo. Passados eram os anos, de 1644 a 1722, durante os dois primeiros reinados da dinastia manchu, em que o cristianismo era visto com certa simpatia. Presentemente, a perseguição era nítida.

Era, pois premente o envio de um navio ao Brasil "na forma da licença de El-Rei Nosso Senhor que se acha neste Senado, visto não termos athé agora alcançado a outra, que pretendemos para o effeito das conveniencias, que na proposta passada lhes foi apresentada...".

Debateu-se esta proposta e consideraram-se as suas vantagens: em primeiro lugar, situava-se o serviço de Deus; a seguir, o serviço de el-rei e, em terceiro lugar, "o aumento da conservação desta Cidade".

O Senado, porém, não se encontrava em condições de poder arcar, só, com tal despesa. Seria necessário ouvir também os mercadores chineses interessados, os padres jesuítas e outras personalidades ainda.

Impunha-se a convocação, portanto, de nova reunião magna. Realizou-se ela em 5-11-1733. Surgiu, com efeito, uma proposta concreta: a do mencionado vereador João baptista Monteiro. Impunha, todavia, algumas condições: a) que lhe fosse conferida a categoria de embaixador ou de enviado, considerando principalmente que ele era cavaleiro-fidalgo; b) poder associar-se um substituto, à sua escolha, atenta a hipótese de falecer durante a sua enviatura; c) necessitava ainda de levar consigo a precisa bagagem, devidamente acondicionada: d) ter a seu serviço e de seu substituto, três moços. A viagem iniciar-se-ia em Cantão, a bordo de um navio inglês.

Esta importante acta termina da seguinte forma:

"Estas são finalmente as circunstâncias de que careço para ultimamente me determinar, e sendo por Vossas Mercês concedidas, agora mesmo com brevidade possivel me preparo para o meu embarque, porque o tempo vai sendo pouco, e o negocio não permite demoras. Vossas Mercês rezolvão neste particular, e que se faz precizo a concluzão della, que da minha não faltarei a tudo o que por este Senado me for documentado para sua instrucção: e requeiro a Vossas Mercês Senhores Senadores, que desta minha rezolução se faça termos, para que a todo tempo conste, que eu como Leal Vassallo do meu Rei, e Senhor, me animo a fazer este Serviço, e não faltarei em couza alguma do que aqui rellato, ficando por conta de Vossas Mercês as mais deligencias, que na minha determinação se rellata. - João Baptista Monteiro. - Não houve efeito - Moura.

Está conforme - Jozé Joaquim Barros. Dito Escrivão."43

A forma algo abrupta como termina esta acta presta-se a vária interpretação. Deve ter havido discussão à volta da proposta do vereador Baptista Monteiro. Por fim, teria sido ela abandonada, pois as actas seguintes mencionam o seu nome, com ainda presente em Macau. O "sonho" continuava irrealizável.

A personalidade de João Baptista Monteiro, tal como se poderá possivelmente concluir desta acta lida a tantos anos de distância, parece ser a de um homem algo alardeador de si mesmo. Apesar de a sua oferta ser bastante generosa, não teria conciliado a aprovação do Senado. Não se explicaram os motivos.44 Seria este "cavaleiro-fidalgo", julgado indigno de ser juiz dos orfãos, embora por pouco tempo, digno de ser "embaixador" ou "enviado" à Corte de D. João V?

Os Macaenses não desanimaram. Em 1735 encontram-se na capital portuguesa, e como procuradores do Senado, o Dr. João Marques Bacalhau e Pedro Vicente Velho, já atrás mencionados. Em 18-12-1735, enviou-lhes o Senado algumas lembranças, a fim de se proporem na Corte. São elas, em súmula: queixas contra os ouvidores, vindos de Goa; autorização para os navios macaenses poderem navegar para Surrate, tendo sido vedada esta viagem, a pedido de Goa. Quem mais lucrava com isto seriam mouros e Ingleses.

Quanto ao Brasil, escreve-se o seguinte:

"Não tem este Senado achado athé o prezente a rezolução, que pertendia sobre a Viagem do Brazil, pois se nos faz odioza com as condiçoens, com que nos foi concedida, e só nos será facil o faze-la aliviando-se-nos a pensão de irmos ao Reino, pelos atrazos que disso se segue..."45

Esta passagem é bem clara. O Senado é sincero: a condição de os navios macaenses, destinados ao Brasil, terem de ir a Lisboa, a fim de aqui pagarem os direitos régios, era "odioza".

d) A Revolução Francesa. Seus efeitos

Arrastam-se os anos e continua o condicionalismo de subordinação completa aos interesses de Goa. É o dualismo colonial em funcionamento. As colónias podem arrumar-se, quase relativamente, duas a duas, segundo os interesses que as condicianam. Nesta perspectiva, Angola dependia do Brasil: a Guiné, de Cabo-Verde; Moçambique de Goa; Macau, de Goa também; Timor, de Macau.

Macau adapta-se à árdua vida que as circunstâncias lhe impunham. Nisto... estoira a Revolução Francesa. D. Maria é profundamente abalada na sua saúde pelo acontecimento. Em fins de 1791, a triste notícia derrama-se por todo o país. D. João, príncipe do Brasil, assume as funções régias, em nome de Rainha, até 15 de Julho de 1799, quando concorda em tomar o nome de Regente. Vem a guerra. Mergulha o país em confusão, mal preparado como estava, para participar em operações europeias. Em 6-6-1801, os tratados, em Badajoz, com a Espanha e com a França, assinados sob pressão, estonteiam o pobre Portugal. Deste tratado com a Espanha, resta-nos ainda a lembrança-saudade de Olivença.

Continua o turbilhão: o bloqueio continental; o tratado de Fontainebleau, de 27-10-1807, a partilhar o pobre Portugal (repita-se) entre a Inglaterra e a Espanha, e a patentear a impotência e o escárnio dos tratados internacionais. E seguem-se as invasões francesas. A Família Real consegue embarcar para o Brasil em 29-11-1807.

O ultramar português é governado a partir do Brasil, transformado em metrópole. Tropas estrangeiras pisam e violam o solo nacional. O povo, naturalmente, revolta-se. Os Ingleses recordam-se da velha aliada e acorrem à península. Os anos vão pesada e penosamente deslisando sobre o brio e a impaciência dos Portugueses. É esta a atmosfera que se respira na metrópole, no Brasil e, mais adelgaçada, no restante ultramar.

e) A Corte Portuguesa no Brasil e a realização do velho sonho macaense

Entretanto, mal chegada a família real à Baía, em 22-1-1808, pensa-se em orientar por novos rumos a velha monarquia portuguesa. Daí a poucos dias, em 27-1-1808, uma carta régia patenteia os portos brasileiros a toda a navegação amiga, e pagamento de direitos convidativos.

Em Setembro deste ano D. Rodrigo de Sousa Coutinho, conde de Linhares, é nomeado plenipotencário régio para negociar um tratado de comércio com a Grã-Bretanha, regida por Jorge III. O tratado é longamente estudado, assinando-se finalmente em 19-2-1810. Uma sua leitura, desapaixonada, sugere talvez que foi a Inglaterra quem mais com ele lucrou.46

É neste contexto que se insere o decreto a coincidir com a concretização do velho sonho macaense: o comércio livre e directo com o Brasil. Não se trata, portanto, de um privilégio concedido por graça régia, à cidade de Macau. É antes a consequência lógica da medida logo tomada pela família régia, após a sua chegada ao Brasil, quando se declaram abertos os portos brasileiros ao comércio de nacionais e de nações amigas.

Tem a data de 13-5-1810. Ei-lo:

"Tendo em consideração aos Serviços feitos pelos Officiaes do Senado da Camara e mais habitadores da Cidade de Macáo na China, e mostrando a sua fidelidade não só em mandar a este Porto (Rio de Janeiro) hum Navio, com o fim de felicitar-Me por occasião da Minha feliz chegada a este Estado; mas muito principalmente pelos esforços, com que repellirão os Piratas, que ameaçavão invadir aquella Colonia, além de terem prestado soccorros pecuniarios à Capital dos Meus Estados da Índia: e querendo promover a prosperidade daquella Cidade: Hei por bem Determinar que sejão isentos dos Direitos de Entrada nas Alfandegas do Brasil os Generos e Mercadorias da China, que se exportarem direitamente para os Portos deste Estado, e pertencerem aos Meus Vassalos Portuguezes, ou por sua conta forem carregados em Navios Nacionaes; ficando outrossim independentes da navegação para Goa, e sendo porem obrigados a enviar para alli annualmente o Barco das Vias, que faz a correspondencia com a Metropole. O Conselho da Fazenda o tenha assim entendido e o faça executar com os despachos necessarios.

Palacio do Rio de Janeiro em 13 de Maio de 1810.

Com a Rubrica do Principe Regente".47

Eis realizado o velho sonho de Macau: comércio livre e directo com o Brasil. Neste mesmo dia, 13-5-1810, concede o Príncipe Regente à cidade de Macau o título de "Leal".48

Mas... antes de volvido um mês, publica-se em 2-6-1810 uma carta régia a limitar o alcance do decreto supra:

"... Sou servido, para evitar qualquer intel-ligenca que se queira dar de uma maior extensão desta Graça, Mandar-vos declarar: que ella se limita simplesmente a respeito dos generos que forem pertencentes aos meus Vassallos que residem nessa Colonia e transportados em seus Navios, construidos nos Estaleiros dos Meus dominios da Azia, não comprehendendo portanto este favor a qualquer Navio, ou propriedade nacional indistinctamente, mas unica e singularmente aos que ficam já indicados: o que assim Me pareceu participar-vos para vossa intelligencia, e para que assim o façais constar a todos os Mestres de Embarcaçoens Portuguezas, que ahi aportarem, a fim de que saibão que lhes não é transcendente a disposição daquella Graça, e que conseguintemente os effeitos que trouxerem, deverão pagar os direitos que se achão estabelecidos nas respectivas Alfandegas."49

Há nesta carta régia a cláusula que só navios portugueses e construídos nos "Estaleiros dos Meus domínios da Azia..." gozariam de tal concessão. Visa-se nesta medida a favorecer a construção naval da Índia Portuguesa, notabilizando-se nesta altura os estaleiros de Damão. Acontecia, porém, que os navios possuídos pelos habitantes de Macau não se encontravam, em grande parte, nestas condições.

O decreto, apesar de tudo, foi recebido com geral satisfação e júbilo. Para a viagem inaugural escolheu-se o navio Ulisses, já atrás mencionado. Tinha sido comprado e, por conseguinte, não podia gozar da graça mencionada na carta régia. Como não havia tempo para se mandar construir um navio em Damão, o Senado oficiou em 30-12-1810, à Secretaria de Estado dos Negócicos Estrangeiros, pelo navio Carolina, enviado a Lisboa com carga diversa, como sedas tecidas, chá, etc. a solicitar autorização, por uma só vez, e a título excepcional, para utilizar o Ulisses. 50

No mesmo sentido oficiou ao conde dos Arcos, governador e capitão general da capitania da Baía, expondo as mesmas razões. O navio era superiormente comandado por Manuel Pereira. Este ofício é datado de 16-3-1811, pouco tempo antes da partida.51

Não descurou também o Senado a participação do acontecido ao vice-rei da Índia, conde de Sarzedas, D. Bernardo José Maria de Lorena (1807/1816). Por este ofício sabe-se que, a princípio, se pensara em associar nesta viagem todos quantos desejassem participar na mesma. Considerando-se, porém, alguns inconvenientes, resolvera-se que a carga fosse toda por conta do Senado, associando-lhe apenas o morador Manuel Pereira, visto o mesmo Senado lhe haver confiado a direcção da empresa. Do porto da Baía, dirigir-se-ia o Ulisses para Calcutá, "e empregar ali os fundos realizados em generos proprios de emportação em China...".52

E, impelido por esta esperança, lá partiria o Ulisses, a inaugurar novo período da história de Macau. Concretizara-se enfim o sonho brasileiro dos Macaenses, que principiara a acenar-lhes lá da lonjura dos princípios do século XVIII.

Havia, aliás, outros indícios de benevolência régia. Um deles e bem manifesto, era a autorização, concedida em 18-5-1810 para se fundar em Macau uma "Caza de Seguro Mercantil":

"... debaixo dos principios adoptados pelas Naçoens Commerciantes, especialmente daquelles, que servirão de baze a organização das Cazas de Seguros de Lisboa, Bahia, e Rio de Janeiro..."".53

Os termos desta carta régia são extremamente favoráveis ao Senado e à população macaense. Todos os habitantes eram convidados a empregar as suas economias na obtenção de acções da dita Companhia ou "Caza de Seguro Mercantil", devendo o Senado formular o seu regimento, submetendo-o logo à aprovação régia.

Outro sinal, e bem claro, datado dois dias depois, em 20-5-1810, foi a equiparação dos Portugueses, naturais de Macau, aos Portugueses nascidos na Europa, para efeitos da ocupação de cargos de governo e administração pública.54 Esta decisão régia não favorecia apenas o natural desejo de igualdade entre uns e outros, mas abolia também, e principalmente, as razões que antes obstavam ao desempenho, por parte dos Macaenses, de determinados postos de governo e administração.

Mas, dez dias depois, em 30 deste mês de Maio, outra carta régia recorda as providências tomadas em 4-4-1783, e aplicadas à cidade de Macau pela rainha D. Maria I. Não mediavam muitos anos entre 1783 e 1810. Parece que tais "medidas" se não cumpriam com todo o rigor, pelo menos em parte, sinal que "talvez a esse Senado não tenhão sido até agora conhecidas em toda a sua extensão...".

Ora, como atrás se frisou, estas medidas ou providências tinham sido extremamente injustas para com o Senado. É verdade que se admitiam excepções pois lê-se nesta carta régia: "Ordenando-vos que todos os seus artigos se ponhão logo na mais inteira observancia excepto naquelles pontos em que ora Eu Houver por bem rezolver differentemente..."".55

Sendo assim, melhor teria sido não recordar sequer tal documentação!

5. CONCLUSÃO

Levou mais de um século a realização do velho sonho macaense, esboçado logo ao dobrar do século XVIII: o comércio directo com o Brasil. Significava isto o alargamento do horizonte comercial do velho burgo macaense. A conjuntura, porém, não favorecia tal desiderato. As peias burocráticas impediam voos de natural desenvolvimento.

Foi necessário que a Revolução Francesa abalasse os fundamentos da velha ordem europeia. É no Brasil que a Família Real exilada, perante novas realidades e novas exigências, após as lições colhidas na série de independências registadas nas duas Américas, do Norte e do Sul, se resolveu a adoptar um novo plano e "sistema geral de Comercio", extensivo a todo o espaço então português. O longo alvará de 4-2-1811, cujo exame ultrapassa o limite deste estudo, mas cuja leitura se recomenda, é bem claro a este respeito:

"Resolvi facilitar por meio das amplas concessoens, que por este Alvará liberalizo aos Meus fieis Vassallos o Comercio, e Navegação directa dos Mares da Índia, China, Enseadas, Rios, Ilhas, e Portos assim Nacionaes, como Estrangeiros do Cabo da Boa Esperança como tambem nos Portos de Portugal, Brazil, Ilhas dos Assures digo dos Açores, Madeira, Ilhas do Cabo Verde, Portos da Costa d'Africa Ocidental, e Ilhas adjacentes pertencentes a Minha Real Coroa, abolindo todas as restriçoens que por muitos annos obstruirão os Canaes da prosperidade."56

O estabelecimento de Macau experimentou, ao longo do século, as mais diversas vicissitudes. Nota-se nítida divergência no proceder registado entre os naturais de Macau e os adventícios vindos de Goa ou da metrópole. Estes não compreendiam o viver, forçadamente humilde, dos Macaenses, continuamente subordinados às exigências dos mandarins e da própria China. A ameaça da privação de alimentos, jogada com rara habilidade pelos mandarins, bastava para manter em compreensiva atitude os componentes do Senado. Para os adventícios, os culpados de tudo isto eram exactamente os senadores. Martinho de Melo e Castro, certamente influenciado pelos que de Goa o informavam, foi rudemente injusto para com Macau.

Julgava o Senado que lhe era necessário manter em Goa e em Lisboa procuradores seus, a fim de advogarem os seus interesses. Apesar disto, verifica-se que não conseguiram convencer os seus interlocutores de que a vida portuguesa em Macau tinha que ser o que era.

Apesar de todas as incompreensões, da campanha que vários capitães e ouvidores lançaram contra o Senado, soube este manter-se mais ou menos dentro das suas atribuições.

Lutavam pela sua existência, certos de que estavam no bom caminho e que a soberania portuguesa em Macau, tal como os Macaenses a entendiam, não correspondia à mentalidade que reinava em Goa e em Lisboa a seu respeito.

Quanto à China, parece manifesta a sua atitude. Os Portugueses são benquistos em Macau. Quando da tentativa inglesa para ocupar Macau, a China foi bem eloquente: admitia os Portugueses, mas não os Ingleses, estando até disposta a expulsá-los à força.

Atitude egoista, esta? Quem o ousará negar? Mas tinha sido sempre assim, desde a fundação da colónia.

E quanto aos Privilégios, é justo recordar que em 1783 havia ainda 5 privilégios concedidos a Macau.

Eram eles:

5. "O quinto Privilegio he, que as Naus de Guerra Portuguezas, não pagam Direito algum de Lotação ao Imperador: as das outras Naçoens, todas são medidas, e pagam o dito Direito."57

A leitura atenta destes Privilégios explica o empenho com que os Macaenses a cada passo os recordavam e a solicitude com que os Chineses a cada passo os afirmavam.

Perante isto, não se pode negar que Macau tenha gozado, ao longo dos séculos, de tratamento manifestamente preferencial.

(Publicado originalmente em: "Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa", Jul.-Dez. 1976, pp. [117]-52.)

Publicado in Revista de Cultura, N° 22, II Série, Janeiro/Março de 1995.

* Foi professor universitário. Licenciado em Ciências Históricas, Universidade de Lovaina, estudou a acção das missões portuguesas do Oriente. Professor ordinário do Instituto de Ciências Sociais e Política Ultramarina; director da Filmoteca Ultramarina Portuguesa; presidente do Centro de estudos Históricos Ultramarinos; procurador à Câmara Corporativa (como representante do episcopado ultramarino); vogal do Conselho Ultramarino; académico de número da Academia Portuguesa da História, da Academia das Ciências de Lisboa e da Academia Internacional da Cultura Portuguesa; director da VELBC (+).

NOTAS

1 TEIXEIRA, Manuel, Macau e a sua diocese, Macau, Agência Geral do Ultramar, 1940, vol. l, p. 80.

2 GOMES, Luís Gonzaga, Efemérides da história de Macau, Macau. Notícias de Macau, 1954, p. 88. Observe-se, porém, que os edis elegeram a Francisco Lopes Carrasco para "governador de guerra de cidade", em consequência das ameaças holandesas. Vide COLOMBAN. Eudore de, Resumo da história de Macau, refundido e aumentado por Jacinto José do Nascimento Moura, Macau, Tipografia do Orfanato da Imaculada Conceição., 1927, p. 26. Cf. PATO. Raimundo António Bulhão, dir., Documentos remetidos da India ou Livros das monções, Lisboa. Imprensa Nacional-Casa da Moeda. 1974, t. 5, passim.

3 BOXER, Charles Ralph, The Christian century in Japan, 1549-1650. Cambridge, University of California Press, 1951 - sobre os Portugueses no Japão.

4 REGO, António da Silva, A presença de Portugal em Macau. Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1946, p. 37. Segundo este documento, parece que os Portugueses de Macau consideravam "foro" os 500 taéis, pagos ao Aitao, embora este se apropriasse deles.

5 PIRES, Benjamim Videira, O foro do chão de Macau, "Boletim do Instituto Luís de Camões", Macau, l (4-5) 1967, pp. 319-34 - onde esta questão foi amplamente estudada. Pode também consultar-se: REGO, op. cit., pp. 36-43.

6 GUIMARÃES, Alexandre da Silva Pedrosa, Do bispo governador sobre a expulsão dos extrangeiros, "Arquivos de Macau", s. 3, 16 (4) Out. 1971, pp. 204-9.

7 Não se estranhe esta linguagem do bispo-governador. Era a realidade que aos moradores se impunha.

8 BOXER, Charles Ralph, ed., Embaixada de Macau ao Japão em 1640: relação contemporânea, Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1933. Os quatro embaixadores mártires foram Luís Pais Pacheco, Rodrigo Sanches de Paredes, Gonçalo Monteiro de Carvalho e Simão Vaz de Paiva. Foram 61 os degolados, além dos 4 embaixadores. Não se registou uma única apostasia, apesar de esforços envidados pelos Japoneses junto sobretudo dos escravos.

9 ASENTO, que se fes, sobre, que fosse hum navio em dereitura daqui a Portugal, "Arquivos de Macau", l (5) Out. 1929, pp. 251-2.

10 Abunda a bibliografia sobre a apaixonante questão dos Ritos Chineses. Macau viu-se profundamente envolvida na mesma.

11 A época, na verdade, tinha sofrido profunda mutação, não só na China, mas também na Europa.

12 Podem consultar-se:

BRAGA, José Maria; BOXER, Charles Ralph, compil, e anot.., Breve relação da jornada que fez a Corte de Pekim o senhor Manoel de Saldanha, embaixador extraordinario del Rey de Portugal ao Emperador da China e Tartaria (1667-1670) escrita pelo Padre Francisco Pimentel e documentos contemporâneos, Macau, Imprensa Nacional, 1942. SANTARÉM, Visconde de, Abreviada relação da embaixada que a serenissima magestade do senhor Dom João V Rei do Portugal mandou ao Imperador da China e Tartaria Yum Chim pelo seu embaixador Alexandre Metello de Sousa Menezes. Publicada a seguir à sua Memoria sobre o estabelecimento dos Portuguezes em Macau na China, Lisboa, Imprensa Nacional, 1879.

SAMPAIO, Francisco de Assis Pacheco de, Noticias das couzas succedidas na embaixada que levou á Corte de Pekim Francisco de Assiz Pacheco de Sampayo mandado pelo senhor Rey D. Jozé lo no anno de 1752, Lisboa, Livraria Pacheco, 1936.

Trata-se do relatório do próprio embaixador. O Visconde de Santarém publicou-o também na obra atrás mencionada sob o título Relatorio de Franciscode Assis Pacheco de Sampaio a El Rei D. José I dando conta dos sucessos da embaixada a que fôra mandado á Corte de Pekim no anno de 1752.

13 CASTRO, Francisco José de Sampaio e, Sobre não ser justo, o assento tomado pelo Leal Senado acerca da prohibição das chulapas desta Cid. e. p. a as viagens de Batavia, Timor, e Manilla, & "Arquivos de Macau", s. 3, 9 (3) Mar. 1968, p. 125.

14 CASTRO, Martinho de Melo e, Apontamentos, e noticias para a instrução, que se deve formar em Goa, ao bispo de Pekin, sobre as negócios relativos ao dominio de Macáo, in: INSTRUÇÃO para o bispo de Pequim e outros documentos para a história de Macau, pref de Manuel Múrias, Lisboa, Agência Geral das Colónia, 1943, p. 19.

15 CASTRO, Martinho de Melo e, Instrução para dom Federico Guilherme de Souza, governador e capitão general da Índia, in: INSTRUÇÃO para o bispo de Pequim e outros documentos..., p. 11. Publicado ainda nos "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, pp. 269-80.

16 INSTRUÇÃO para o bispo de Pequim... p. 2.

17 Idem, pp. 5 ss.

18 Para se avaliar o tom desta Instrução, leia-se parte do seu n° 35:

"Para executores das Providencias que ficam assim referidas, deve V. Sa nomear hum dos Ministros dessa Relação, que melhor lhe parecer, e hum, ou dous officiaes da Fazenda, ou Pessoas de fora mais inteligentes em Contas e Escrituração Mercantil: o dito Ministro, junto com o Governador de Macáo, que V. Sa tambem nomeará, no cazo que o que ali se acha, não tenha as circunstancias necessarias, para ser incumbido desta diligencia, ambos os referidos Governador e Ministro, logo que chegarem aquele Dominio, sem se demorar, nem se embaraçar com formalidades e cumprimentos de recepção, vizitas e outras Ceremonias inuteis e prejudiciaes, nem por modo algum aceitar Prezente pequeno ou grande do Senado, nem de Pessoa alguma de Macáo, façam convocar ao mesmo Senado, e lendo-lhe a Carta Regia, que será com esta, dirigida a V. Sa, Ordenem ao mesmo Senado, que logo lhes aprezentem os livros de Registo e Contas, com todos os mais Papeis e clarezas relativas ao Rendimento, e Capital da Real Fazenda, fazendo examinar tudo, pelos dous Officiaes da Fazenda assima indicados..."

Dir-se-ia, ao ler estas linhas, que se receava, por parte do Senado, alguma resistência de escândalo. Mostra isto que havia completa ignorância do ambiente macaense. Nada se registou de anormal. Cumpriram-se à risca as ordens régias. Bernardo Aleixo de Lemos de Faria foi o primeiro governador munido dos novos poderes. O Senado dobrou-se, como era natural, ao que vinha mandado. Os mandarins, porém, observaram o que se estava a passar. Os seus protestos não tardaram a surgir. Por fim, não houve remédio senão apelar para os bons serviços do Senado. Ver COLOMBAN, op. cit., pp. 91-5.

19 BOXER, Charles Ralph, As viagens de Japão e os seus capitães-mores: 1550-1640: subsídios para a sua história, "Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau", (448-51) Jul.-Out. 1941, pp. 85-98, 108-45, 199-210, respectivamente.

20 MATOS, Artur Teodoro de, Timor português: contribuição para a sua história, Lisboa, Universidade de Lisboa, Instituto Histórico Infante Dom Henrique, 1974 (Série Ultramarina).

21 Podem consultar-se:

LEMBRANÇA do Senado da Camara desta Cidade de Macáo p. a o S. r Ant. o Albuquerquer Coelho, seu Procd, or bastante, e geral em Goa, e aonde mais cumprir, feita neste anno de 1835 (sic), "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (5) Maio 1971, pp. 283-6.

SOBRE os requerimt. os remettidos pelo Senado a S. Mag. e. pedindo despacho, "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (5) Maio 1971, pp. 286-7.

SOBRE os previlegios do Senado, e remeça d'hum caixote, "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (5) Maio 1971, p.287.

LEMBRANÇA do Senado da Camara desta Cidade... p. a os Sures João Marques Bacalhao, e Pero Vict. e Velho..., "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (5) Maio 1971, pp. 287-9.

SOBRE o estado decadente desta cidade pedindo novam. te providencia, "Arquivos de Macau", s. 3, 15(6)Jun. 1971, p. 311.

SOBRE varios assumptos attinentes a esta cidade, "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (6) Jun. 1971, p. 314. INFORMAÇÃO dado pelo Senado a S. Mag. e acerca de differentes assumptos desta cidade, pedindo providencia, "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (6) Jun. 1971, pp.323-6.

22 UNIVERSIDADE DE COIMBRA, Biblioteca, Bases para a erecção duma nova Companhia das Sedas, na Cidade do Santo Nome de Deus de Macau. ms. 677, fls. 22, impresso.

23 [DECRETO, de 5 de Janeiro de 1759, a permitir à Companhia do Grão Pará e Maranhão mandar a sua nau Nossa Senhora da Atalaia a Macau], in: LEGISLAÇÃO antiga: 1755-1834, "Boletim do Conselho Ultramarino", Lisboa, (2) 1867, p. 20.

O "Diário..." desta negociação encontra-se no Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, onde tem o n° de cód. 138. Foi publicado em 1970 pela Agência Geral do Ultramar, sob o título Diário da Navegação de Macau 1759-1761. A primeira entrada é de 9-1-1759, e a última de 7-8-1761. Ao todo são 408 entradas.

24 SOBRE os menos assumptos do officio acima, p. a alcançar de S. Mag. e providencia, "Arquivos de Macau", s. 3, 16 (2) Ago. 1971, pp. 84-5.

25 Podem consultar-se:

SOBRE o soccorro para as embarcaçoens pedidas pelos Chinas, "Arquivos de Macau", s. 3,17 (2) Fev. 1972, pp. 93-4.

SOBRE o socorro de duas embarcaçoens pedido pelos Chinas, "Arquivos de Macau", s. 3,17 (2) Fev. 1972, pp.100-102.

26 Idem, pp. 100-102.

27 CARTA do Senado a Sua Alteza Real o Principe Regente Nosso Senhor, "Arquivos de Macau", s. 3, 17 (5) Maio 1972, pp. 274-6.

28 SOBRE a falta das pautas q'havia, "Arquivos de Macau", s. 3,17 (6)Jun. 1972, p. 314 ss. - a propósito do desembarque dos Ingleses em Macau. Sobre a vitória contra os piratas: CARTA do Ill. mo Senado, ao Ill. mo e Ex. mo S. r Conde V. Rey de Goa sobre, o rendimento dos piratas chinas & a, "Arquivos de Macau", s. 3, 18 (1) Jul. 1972, pp. 2-3.

29 CARTA regia sobre poderem os moradores de Macáo mandarem os seos navios á Goa comboiados por um nao de guerra, e nao a Brazil, e sobre outros assumptos que na mesma carta se refirem, "O Oriente Portuguez", Macau, l (6) 31 Maio 1892; reproduzida em: "Arquivos de Macau", s. 3, 9 (1) Jan. 1968, pp. 8-9.

Eis parte da carta régia de 15-3-1707:

"Officiaes da Camara da Cidade de Macáo. Eu El-Rey vos Envio muito saudar. Havendo visto a reprezentação que Me fizestes sobre a conveniencia que pode rezultar a esses moradores, e ainda a minha fazenda, o permitir-lhe que possão navegar as suas fazendas para o Estado do Brazil, visto se lhes haver prohibido a navegação e embarque dellas para Goa com a nao de guerra que daquelle porto vai todos os annos a China. Me pareceo dizer-vos que querendo esses moradores mandar a Goa os seus navios o poderão fazer livremente, e para se evitar o damno que poderão receber dos inimigos hirá hua nao de guerra em sua conserva; com declaração que serão obrigados a pagar o comboy della, e sendo cazo que não tenhão Navios seus para andarem nestas viagens, se ordena ao V. Rey que mande ao Cappitão que for na nao de guerra dê todo o lugar na ditta nao para esses moradores embarcarem a sua fazenda, pois não será razão que hindo-se a fazer o negocio a essa Cidade, em que assistem Meus Vassalos, deixem de lograr algumas conveniencias, se queira toda para os moradores de Goa, e mais particulares e no que respeita a licença que pedis para a navegação livre desse porto para os do Estado do Brasil. Me pareceo dizer-vos que de nenhuma maneira se deve permittir para que sobre o prejuizo que rezultaria a Alfandega de Goa, em se privar dos direitos das fazendas que vez a ella da China; ocorre que do Brazil não podem ter nenhum retomo, e verção (sic) por este caminho a fazer muito pouco negocio..." Eis bem nítida a posição de Lisboa. Manter-se-ia por mais de um século.

30 LAVRE, André Lopes de, Carta que André Lopes de Lavre escreveo a este Senado em 24 de Março de 1702* de Lisbôa junto com uma copia, *deve ser 1709, "Arquivos de Macau", s. 3, 13 (5) Maio 1970, pp. 288-9.

31 CARTA regia desobrigando as embarcações de Macau q. passassem pelos mares de Goa de pagarem direitos a dita Capital emquanto durasse a guerra com Castella, "O Oriente Portuguez", Macau, l (4) 17 Maio 1892, p. 4; reproduzida em: "Arquivos de Macau", s. 3, 9 (1) Jan. 1968, pp. 6-7. Deve recordar-se que Portugal estava em guerra com Castela, por causa da sucessão de Espanha. O conflito terminaria com o tratado de Utreque (1713), ficando Filipe V com a Espanha. A paz luso-espanhola foi assinada em 6-2-1715.

32 CONDIÇÕES da Companhia de Macau que sua Magestade concede por tempo de dezannos, Lisboa, na Officina Real Valentim da Costa Deslandes, 1710.

33 RUA, Virgínia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da, Os manuscritos do Arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil, Coimbra, Universidade de Coimbra, 1958, vol. 2, pp. 135-6, 148-50, 361-2, respectivamente.

34 CARTA regia sobre a faculdade de que pudesse mandar desta cidade dois navios annuaes ao Reino... "O Oriente Portuguez", Macau, l (10) 5 Jul. 1892, p. 4; reproduzida em: "Arquivos de Macau", s. 3, 9 (1) Jan. 1968, p. 10-11.

35 COSTA, Rodrigo da, Carta ao Senado de 4-4-1719, "O Oriente Portuguez", Macau. l (9) 21 Jun. 1892; reproduzido em: "Arquivos de Macau", s. 3, 9 (1) Jan.1968, p.9.

36 Vide nota 34.

37 PRAZERES, António, Carta do R. do P. e Fr. An. to das Prazeres, "Arquivos de Macau", l (6) Nov. 1929, pp. 347-9.

38 Até esta data tinha havido três embaixadas enviadas por Portugal à China: a primeira, atribuída a Tomé Pires, em meados do século XVI: a segunda (1667-1670), confiada a Manuel Saldanha: a terceira, chefiada por Alexandre Metello de Sousa e Menezes (1726-1727).

39 1733 - Termo sobre a proposta do vereador deste Senado acerca do mizeravel estado, em q'se acha esta cid. E, "Arquivos de Macau", s. 3, 3 (3) Mar. 1965, p.147.

40 Idem. Pp. 147-150. D. Eugénio Trigueiros, O. S. A. bispo coadjutor de Macau, de 1724 a 1735, e depois bispo titular, de 1735 a 1739.

41 Idem, p. 149.

42 1733 - Termo sobre a proposta do vereador João Bap. ta Monteiro, "Arquivos de Macau", s. 3, 3 (3) Mar. 1965, p. 151-3.

43 1733 - Termo sobre o Conselho feito em 27 de Outubro proximo passado, "Arquivos de Macau", s. 3, 3 (3) Mar. 1965, pp. 155-6.

44 1733 - termo sobre a suspensão do officio de juiz dos orphaons João Baptista Monteiro, "Arquivos de Macau", s. 3, 3 (3) Mar. 1965, pp. 135-6. Talvez se tivesse tomado em consideração o facto de o dito João Baptista Monteiro ter sido acusado de irregularidades pelo Doutor Desembargador Manuel de Macedo que tinha exonerado do cargo de Juiz dos Orfãos, levando-o a homiziar-se e a refugiar-se no colégio dos Jesuítas. Este acontecimento, mencionado na acta do Senado de 3-3-1733, devia ter porduzido bastante sensação na pacata cidade.

45 LEMBRANÇA do Senado da Camara desta Cidade... p. a os Snres João Marques Bacalhao, e Pero Vict. e Velho... "Arquivos de Macau", s. 3, 15 (5) Maio 1971, pp. 287-9.

46 CASTRO, José Ferreira Borges de. Collecção de tratados, convenções, contratos e actos publicos celebrados entre a Coroa de Portugal e as mais potencias desde 1640 até ao presente, Lisboa, 1857, t. 4, pp. 348-95. Nesta mesma data assinaram as duas potêncis outro tratado de "aliança e amizade", Idem, pp. 396-415.

A título de curiosidade, observe-se que ainda neste mesmo dia, 19-2-1810, se negociou uma convenção entre os dois países, a fim de se estabelecer uma carreira de paquetes "entre os dominios de Portugal e a Gran-Bretanha". Idem, pp. 416-23.

47 SOBRE a izensão dos direitos d'alfandega de Brazil, in: LEGISLAÇÃO antiga: 1755-1834, "Boletim do Conselho Ultramarino", Lisboa, (2) 1867, p. 300; reproduzido em: "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio. 1969, p. 285.

48 Idem, ibidem.

49 SOBRE a izensão dos direitos n'alf. a do Brazil, in: LEGISLAÇÃO antiga: 1755-1834, "Boletim do Conselho Ultramarino", Lisboa, (2) 1867, p. 302-3; reproduzido em: "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, p. 281.

50 RELLAÇÃO das I. As vias dos off. os que o Leal Senado da Camara da Cidade de Macáo dirige a Secretaria d'Estado dos Negocios ultramarinos pelo Navio Carolina: n° 17, "Arquivos de Macau", s. 3, 18(1)Jul. 1972, p. 36.

51 OFFICIO, que o Leal Senado direge ao Ill. mo e Ex. mo Snr Conde dos Arcos Gov. or e Cap. m General da Capitania de Bahia, a respeito do Navio Ulisses, e suas cargas, "Arquivos de Macau", s. 3, 18 (1) Jul. 1972, pp.37-8.

52 RELLAÇÃO dos Officios, que na prezente monção são dirigidos pelo Leal Senado da Camara da Cidade de Macáo ao Ill. mo e Ex. mo Senhor Vice Rey D'Estado: n° 14, "Arquivos de Macau", s. 3, 18 (1) Jul. 1972, p. 44.

53 SOBRE a izempção dos direitos de entrada nas alfandegas de Brazil, "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, p. 263.

54 SOBRE os naturais de Macáo, "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, p. 266.

55 Podem consultar-se:

SOBRE as antigas providencias dadas por Gen. De Goa, "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, pp. 268-9.

PROVIDENCIAS dadas pela Rainha N. Snr. a p. a o Porto da Cidade de Macao em 4 d'Abril de 1783, "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (5) Maio 1969, pp. 269-80.

56 Podem consultar-se:

PROVISÃO da R. Junta de Goa em que acomp. a o Tratado do Comercio com a Gram Bretanha, "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (6) Jun. 1969, p. 293. COPIA do Tratado do Commercio "Arquivos de Macau", s. 3, 11 (6) Jun. 1969, pp. 293-303.

A passagem citada encontra-se à página 294.

Este alvará representa efectivamente uma reviravolta no sistema comercial português.

57 CASTRO, Martinho de Melo e, Apontamentos e noticias para a instrução, pp. 31-2.

desde a p. 41
até a p.