Macaenses / Redefinições

ALGUNS ASPECTOS EM TORNO DA IDENTIDADE ÉTNICA DOS MACAENSES

Jorge Morbey*

l. INTRODUÇÃO

Jovem macaense(meados do Século XX).

«Macaense

que te (in)defines

pelo não ser bem

que também não és, bem...

um mais ou menos

entre dois pólos

que se atraem

e se repelem

pela diferença

no desconhecimento

divergente.

Fronteira difusa

num mar de gente,

tão transparente

e frágil que se esquece.

Por ti passam

calcando,

e tropeçam

no gemido

silencioso

e sentido.

Miragem

de olhos postos no Ocidente

e coração suspenso.

A queda livre,

no abandono

de um voo

sobre o mar

difuso

difuso

a apagar-se... » 23. Dez. 89

Este poema de Cecília Jorge parece poder representar um profundo e sentido lamento, um amargo reconhecimento da inexistência de uma identidade colectiva macaense. Todavia, na indefinição "entre dois pólos" estará o cerne da identidade colectiva macaense nos nossos dias1.

Num plano teórico, identidade significa "mesmidade", isto é, carácter do que é o mesmo. Traduz a coincidência da substância consigo própria.

No plano social, a identidade é o carácter colectivo que resulta das características comuns dos membros de um grupo. Designa-se por "identidade colectiva" e tem subjacente uma "personalidade-base".

Se é característica comum dos macaenses dos nossos dias — como o poema enuncia — a sua indefinição "entre dois pólos" diferentes que se desconhecem e divergem, aí estará, sem dúvida, um aspecto essencial da sua identidade colectiva.

Por menos habilitado que seja, um observador que, vindo do exterior, permaneça em Macau algum tempo não tem grande dificuldade em distinguir os macaenses dos chineses ou dos portugueses da Europa residentes no Território. Poderá ter dificuldade em enunciar as diferenças, mas sente-as facilmente.

Infelizmente, não existem estudos cientifica-mente fundamentados que forneçam dados sobre o que é especificamente macaense numa óptica sócio-cultural.

Esta enorme lacuna é tanto mais grave se ava-liada na dimensão global da população do Território e no contexto sócio-político da transição de Macau para a soberania plena da República Popular da Chi-na. Sem estudos cientificamente fundamentados so-bre os três segmentos principais da população de Macau (portuguesa de origem local, chinesa de ori-gem local e chinesa imigrada), seu relacionamento e interinfluências, numa abordagem interdisciplinar com especial empenho da sociologia, da antropolo-gia, da psicologia social e da demografia, o processo político da transição iniciou-se e decorre ao sabor de intuições e juízos superficiais ou apriorísticos. Mas essa é matéria reservada aos políticos e aos governantes e aos êxitos que para si sempre reco-lhem, mesmo quando à custa do silêncio dos gover-nados.

2. ORIGEM POLI-ÉTNICA

Os macaenses têm a sua origem no estabele-cimento dos portugueses em Macau, nos meados do século XVI.

O primeiro censo realizado em Portugal (1527 - 32) revelou a existência de 280.528 fogos que correspondiam a uma população global situada entre um milhão e um milhão e meio de habitantes. Em 1640, a população do País não atingia ainda os dois milhões.

Abro aqui um parêntesis para referir que a população da China, na época em que os portugue-ses chegaram a Macau, se estima em duzentos mi-lhões de habitantes.

O apogeu da expansão portuguesa, entre 1495 e 1521 — reinado de D. Manuel I —, com o contro-lo de extensas regiões a partir de pontos-chave na América, em África e na Ásia, representou um es-forço, em termos de recursos humanos do País, que não tinha — como não teve condições para se pro-longar no tempo. O desdobramento da população europeia de Portugal através da mestiçagem com os povos orientais está na origem do aparecimento das primeiras gerações de euro-asiáticos que, todavia, atingiram a idade adulta já no início do declínio do poderio português no Índico e no Pacífico. Lado a lado, portugueses europeus e portugueses asiáticos circularam e defenderam como puderam as praças onde se haviam estabelecido.

Contrariamente à tradição grega que numa mesma área cultural estabeleceu vários poderes polí-ticos — as cidades-estado —, a expansão portuguesa adoptou o figurino do Império Romano em que, sob o mesmo poder político, se acolhiam diversas áreas culturais — os domínios, conquistas ou colónias.

Para além da miscigenação biológica, o fenó-meno da cristianização dos povos com os quais os portugueses estabeleceram contacto duradouro deu lugar a fenómenos de hibridização cultural, de tal modo que, ainda hoje, em algumas partes do Orien-te, os termos "cristão" e "português" são sinónimos. E o estereótipo dos portugueses entre alguns povos orientais não corresponde ao tipo somático ibérico mas ao dos mestiços euro-asiáticos das comunidades de luso-descendentes espalhadas pelo Índico e pelo Pacífico que, durante muitos séculos, têm constituí-do a única referência de Portugal entre os povos que as circundam2.

Por estas razões, os primeiros macaenses te-rão sido luso-asiáticos cristãos, de origem euro-india-na e euro-malaia, principalmente.

Tem-se discutido muito àcerca da origem poli-híbrida dos macaenses. Não existe, porém, uma síntese definitiva sobre as suas origens e a sua evo-lução ao longo dos séculos.

É um dado adquirido que os macaenses são euro-asiáticos de ascendência portuguesa. Historica-mente, a componente portuguesa da identidade co-lectiva dos macaenses tem permanecido como seu elemento estruturante. A sua componente asiática, porém, tem variado. Actualmente ela é predominan-temente chinesa. Mas são abundantes as informa-ções que apontam para uma intervenção asiática não chinesa preponderante no passado.

Tradicionalmente, aliás, ganhou peso a tese de que a ascendência chinesa dos macaenses apenas tem relevância no século XX. Nesta hipótese, ocor-reu um fenómeno de mutação antropo-biológica e cultural que consistiu em:

a. Extinção gradual da Comunidade Macaen-se tradicional, predominantemente euro-asiática não chinesa, em consequência da emigração da maior parte das famílias que a compunham e que:

a. 1. Começou a registar-se nos anos que se seguiram à II Guerra Mundial, em consequência das enormes dificuldades por que passou o Território;

a. 2. Acentuou-se nos anos posteriores aos tu-multos que ocorreram em Macau, em Dezembro de 1966, repercutindo no Território a instabilidade ge-rada pela Revolução Cultural na China;

a. 3. Voltou a acentuar-se nos anos seguintes à Revolução do 25 de Abril de 1974, pela convicção generalizada de que o novo Poder político instituído em Portugal pretendia entregar o Território à Repú-blica Popular da China, no quadro tumultuoso em que se desembaraçou das outras colónias;

b. Crescimento de uma Comunidade Luso--Chinesa protagonizada pelos filhos de:

b. 1. Mulheres chinesas de modesta condição unidas com europeus de menor posição — ex-milita-res de baixa patente, polícias, etc.;

b. 2. Mulheres macaenses com homens maca-enses;

b. 3. Mulheres macaenses com europeus do tipo anteriormente descrito;

b. 4. Mulheres chinesas com homens macaenses;

b. 5. Mulheres macaenses com homens chineses.

Fachada principal da casa apalaçada. Macau, 1944-45. Aguarela de George Smirnoff. (Colecção do Museu Luís de Camões).

Só um estudo sistemático que use os registos de nascimento, casamento e óbito como ferramenta principal poderá fornecer indicações mais precisas sobre o peso relativo das diferentes componentes ét-nicas na formação e renovação sucessiva da socieda-de macaense.

Índia, Malásia, Filipinas, Sião, Cochinchina, Japão, Timor, Bengala, China, Rússia Asiática, Arábia e litoral africano, eis as principais origens não europeias dos macaenses. Em boa parte dos ca-sos, os oriundos dessas paragens eram já mestiços com ascendência portuguesa.

Do ponto de vista étnico, a variedade das ori-gens que em quatro séculos e meio se mesclaram nos macaenses estruturou-se em redor do carácter e das manifestações próprias dos portugueses, muitas vezes recriadas localmente.

Mesmo entre povos com estratificação mais antiga, as suas características próprias não permane-cem imutáveis ao longo dos tempos, nem a tradição cultural apresenta estabilidade rígida. A herança cul-tural de cada povo é sempre afectada pelos fenómenos de acultura-ção originados por influênci-as do exterior e por transformações internas determi-nadas pela sua própria evolução: as "culture changes" na designação dada pelos antropólogos anglo-saxónicos.

A herança cultural dos macaenses é extrema-mente rica pela enorme variedade de influências ex-teriores que tem recebido ao longo dos séculos. A sua diversidade étnica conferiu grande plasticidade à identidade colectiva macaense, bem visível no modo como se integraram entre os expatriados em Hong Kong e Xangai, desde meados do século XIX, na sociedade australiana, canadiana, norte-americana e brasileira, desde meados deste século, como vivem em Portugal e viveram nas antigas colónias portu-guesas ou, simplesmente, permanecem em Macau.

3. IDENTIDADE ÉTNICA

Não é fácil encontrar um conceito definidor de macaense. Na passada década de 80, uma con-juntura política peculiar procurou fazer vingar a tese de que macaense era todo o natural de Macau. Tal tese inseria-se num processo que visava abater a influência do líder dos macaenses, Carlos

Assumpção. Pretendia-se, contra uma tradição se-cular, que a Comunidade Portuguesa local, onde predominavam os macaenses, constituía um estor-vo à harmonização de interesses entre a Adminis-tração portuguesa, os líderes da Comunidade Chi-nesa e os representantes oficiosos da República Po-pular da China.

Tal tese, obviamente, não vingou. Desde logo porque sendo a população nascida em Macau consti-tuída maioritariamente por chineses, eles não se identificam como "macaenses" mas como "Ou Mun yan" (gente de Macau). Distinguem-se dos macaen-ses que designam por "tou sán" ("filhos da terra", "nascidos na terra", "locais").

Estes, por seu turno, têm preservado a sua identidade face aos chineses locais, ainda que com eles mantenham relações de parentesco. No antigo dialecto local, "maquista" era a designação que o macaense tinha de si próprio. Ao chinês designa por "china". O uso desta designação parece encontrar-se em declínio nas gerações mais recentes pela carga negativa que transporta actualmente. Tradicional-mente, o chinês baptizado e que, assim, adquiria nome cristão/português era designado por "chon kao" (entrado na religião, cristão novo).

Os chineses de Macau distinguem entre os portugueses europeus e os macaenses. Aqueles de-signam por "kuai lou" (diabo-gajo), "ngau sôk" (tio boi) e "ngau pó" (mulherona vaca).

É menos sensível a definição pelos macaenses da sua diferenciação étnica relativamente ao grupo formado pelos portugueses europeus.

As designações "ngau sôk" e "ngau pó" — recebidas do dialecto cantonense — com que tradici-onalmente os portugueses e as portuguesas da Euro-pa eram designados pelos macaenses, possuía um carácter depreciativo, próximo das alcunhas nasci-das no seio de rivalidades regionalistas ou clubistas, mas não chegaram a constituir um marcador étnico. De natureza semelhante, embora com conteúdo um tanto diferente, é o termo "macaio", usado pelo por-tuguês europeu ao pretender opôr a sua suposta su-perioridade em relação ao macaense.

A circunstância dos macaenses luso-chineses valorizarem de modo desigual a sua herança cultural ambivalente, enaltecendo a componente portuguesa e depreciando a chinesa, pode constituir para um observador menos atento uma atitude incompreensí-vel de racismo e uma inqualificável ingratidão filial. Apesar de conhecer relatos de atitudes indiciadoras da existência de preconceitos — nas relações com parentes chineses, na rejeição de valores tradicionais da China, na não aceitação de determinados hábitos de vida, etc. —, esse tipo de comportamento tem resultado do papel que tradicionalmente a estrutura da família reserva a cada um dos progenitores, tanto na sociedade portuguesa como na chinesa. Por esta razão, o papel liderante do marido como sede da autoridade na estrutura familiar, foi sempre questão pacífica nos casamentos inter-étnicos de portugueses com chinesas.

Decorre, portanto, da própria estruturação interna da família e não de preconceito racial (a existir, o preconceito racial actuaria na inviabi-lização do próprio casamento), a transmissão das referências culturais portuguesas como referências principais, de geração em geração. Neste contexto, assumiu sempre papel de primordial importância a decisão quanto à educação escolar dos descenden-tes de casamentos interétnicos. A opção pelo ensi-no ministrado em português tem sido tão óbvia como a própria autoridade paterna na estrutura fa-miliar. E a escolarização em português tem actuado como um centrifugador que separa as duas compo-nentes culturais de que o macaense luso-chinês é portador, moldando a sua matriz cultural portugue-sa e remetendo para a periferia dessa matriz básica os elementos da sua herança cultural chinesa. Com-preende-se, assim, que o macaense domine o portu-guês escrito e falado mas, em regra, não leia nem escreva o chinês.

O domínio escrito e falado do português que, como qualquer idioma, é a chave de acesso a uma cultura e, simultaneamente, da sua difusão, tem constituído o factor mais poderoso de enraízamento dos macaenses à Cultura Portuguesa. Na mesma me-dida, a circunstância de não lerem nem escreverem o chinês tem constituído factor decisivo do seu desenraízamento face à Cultura Chinesa a cujas for-mas mais eruditas são alheios.

O percurso de vida dos macaenses luso-chi-neses — como já acontecera com as gerações prece-dentes de luso-asiáticos não chineses — tem sido balizado por estímulos permanentes de fidelidade à sua matriz cultural portuguesa e, correspondente-mente, para o distanciamento em relação à sua he-rança cultural chinesa.

Terminada a escolaridade de nível secundá-rio, ao lado de um número mais reduzido dos que têm podido prosseguir estudos universitários em Portugal, permanecem em Macau os demais. Para estes, a chegada à vida profissional, no funcionalis-mo público, principalmente, premeia a opção pater-na tomada na sua infância e que se consubstancia no prestígio social de passar a integrar o aparelho admi-nistrativo que regula a vida do Território.

A partir da segunda metade da passada déca-da de 70, principalmente por ter cessado a vinda dos contingentes militares portugueses para Macau, re-duziu-se a frequência dos casamentos interétnicos que fora regra nos decénios anteriores — português europeu com mulher chinesa — e ganhou peso rela-tivo o casamento dos macaenses com chinesas de-tentoras de qualificações académicas que as posicionam em melhor condição social que a das gerações precedentes.

Simultaneamente, produziu-se um facto novo, pelo menos em termos de frequência. Encontrando-se reduzida a oferta de portugueses com quem pu-dessem casar, as macaenses passaram a fazê-lo, em maior frequência, com homens chineses.

Destes casamentos, é de data muito recente a chegada à idade adulta dos primeiros filhos. Sendo também luso-chineses, a posição liderante do pai na estrutura familiar determinou, do mesmo modo, as referências culturais paternas, e não as maternas, como referências principais. Radicando igualmente no pai a decisão quanto à educação escolar, a sua matriz cultural é moldada pela do pai que, como é óbvio, nada tem a ver com a cultura portuguesa e parece nortear-se principalmente pelos valores mais caros à sociedade de Hong Kong. Assim se compre-ende que para estes novíssimos macaenses o portu-guês seja uma língua estranha. Dominam o Chinês falado e escrito (em caracteres não simplificados) e o Inglês. Nas relações familiares, entre eles e os ou-tros luso-chineses de matriz cultural portuguesa, passou a privilegiar-se o dialecto cantonense como veículo de comunicação.

Salvaguardadas as naturais distâncias, a subs-tituição da identidade étnica nestes novíssimos ma-caenses é um fenómeno da mesma natureza daquele que se verifica a partir da segunda geração dos por-tugueses que se radicam em outros países da Europa ou dos originários de diversos países que se fixam na América Latina, por exemplo.

Mas há uma diferença que não pode deixar de registar-se. A mudança de identidade étnica nestes últimos opera-se em resultado da dinâmica de fenómenos migratórios protagonizados por elemen-tos com uma determinada identidade étnica que se reinserem noutro grupo com identidade étnica dife-rente. A substituição da identidade étnica destes novíssimos macaenses luso-chineses, diferentemen-te, opera-se no próprio espaço geográfico de que são originários, tanto eles como as suas progenitoras.

A abertura do grupo dos macaenses ao grupo dos chineses, por intermédio dos elementos femini-nos daquele grupo, contribuirá para a sua extinção progressiva se não fôr compensado por número equivalente de casamentos de homens macaenses e portugueses europeus com mulheres macaenses e chinesas. Uma investigação dos registos de casa-mento e nascimento poderá fornecer indicações se-guras sobre as perspectivas de evolução do grupo dos macaenses.

4. CULTURA MACAENSE

Não é tarefa fácil definir os elementos funda-mentais da cultura macaense. Haverá uma cultura macaense? Será ela autónoma em relação à cultura portuguesa e às culturas dos povos orientais que ao longo dos séculos conviveram em Macau? Ou, sim-plesmente, será uma forma de cultura portuguesa hibridada?

A referência à cultura de qualquer povo civi-lizado não pode deter-se apenas na análise das suas formas e instituições. Aliás, nestas áreas, os macaen-ses não tiveram condições para inovar. As formas e as instituições dos macaenses foram historicamente o decalque das dos portugueses europeus. Em alguns casos é possível descortinar a sua permeabilização por elementos das culturas orientais mas a sua confi-guração básica manteve-se portuguesa.

Mais do que as formas e as instituições, im-porta encontrar o conteúdo espiritual de cada cultu-ra. Nele reside a chave que dá acesso à compreensão da cultura de um povo e da sua evolução porque é ele que permanece mais duradouramente ao longo das transformações morfológicas e ideológicas que se operam no tempo.

Os diferentes aspectos que a cultura de um povo reveste são variáveis seleccionadas e transfor-madas pelo seu fundo temperamental. Este é o lastro e a constante da cultura de cada povo.

Dada a heterogeneidade cultural originária e a sua sucessiva renovação ao longo dos séculos, po-der-se-á falar numa constante temperamental-base dos macaenses? Ou, pelo contrário, eles serão o re-sultado — nas diversas épocas da sua História — de várias mentalidades que sob a aparência de coexisti-rem pacificamente, encobriam situações de conflito real ou latente?

Foto de intimidade do distinto historiador, escritor e sinólogo macaense Luís Gonzaga Gomes (falecido em 1974). (Fotografia do Arquivo Histórico de Macau, anos 50).

Tanto quanto se conhece da sua História, para além de conflitos de interesses, de violência variá-vel, registaram-se conflitos entre mentalidades dife-rentes, mesmo entre portugueses europeus radicados que, em regra, opuseram os recém-chegados aos re-sidentes mais antigos. Na raíz de tais conflitos situa-va-se o confronto entre a mentalidade portuguesa europeia, mais puritana, em regra, e a mentalidade portuguesa aculturada ao Oriente, permeável a cos-tumes asiáticos tidos por aquela como pecaminosos ou simplesmente indignos. Esses conflitos de menta-lidades nasciam no modo diferente de encarar a es-trutura da unidade básica da sociedade — a família e, a partir daí, percorriam horizontal e verticalmente todo o grupo. Nesse contexto, a Igreja Católica fun-cionava como fonte de norma e controlo social que muitas vezes suplantava o poder civil e outras vezes contemporizava com usos menos afeiçoados aos seus cânones. Globalmente, porém, por acção direc-ta junto dos fiéis ou por influência exercida junto do poder civil, a norma social dos macaenses foi mol-dada pela religião católica sendo reiterada pela sua liderança, geração após geração. A norma social era complexa pois, muitas vezes, abarcava de modo complacente a sua contravenção. Daí que da perso-nalidade-base do macaense faça parte a sua grande religiosidade e, ao mesmo tempo, a adopção de nor-mas de conduta em contravenção com a moral cató-lica.

Os indivíduos ou os grupos vindos de diferen-tes proveniências e nas mais diversas épocas, ou se submetiam à norma ou não se reinseriam no grupo dos macaenses. E surgiam novas formas de contra-venção da norma que a passavam a integrar.

Factor importante de homogeneização do gru-po formado pelos macaenses foi o dialecto falado em Macau. Remanescendo da língua franca que du-rante séculos foi o veículo de comunicação entre mercadores, religiosos e habitantes dos portos do Índico e do sueste asiático, com decisiva influência do papiá cristão de Malaca e muito escassamente influenciado pelo dialecto cantonense, o "maquista" pela maior facilidade de aprendizagem que oferecia em relação ao português padrão, contribuiu decisiva-mente para a unificação, na sociedade macaense, dos elementos provenientes do exterior.

A exiguidade territorial determinou a aproxi- mação física e cultural dos que chegavam de novo e se amalgamavam no todo social. Mas a cultura supe-rior dos macaenses não é o somatório das diferentes culturas de que eram portadores os que, de diversas proveniências, passaram a integrar a sociedade ma-caense. Ela é o resultado de um processo constante de integração destas e da cultura portuguesa em algo novo em que todas se integraram e todas se inter-influenciaram por um fenómeno de sublimação espi-ritual.

Adé dos Santos Ferreira entre um grupo de crianças macaenses (festa de aniversário de Gustavo Sales da Silva, 21 de Outubro de 1931).

Mas a unificação e a permanência da socieda-de macaense deve-se ao mar. As raízes seculares da sociedade macaense são trans-oceânicas e conver-gem dos cinco continentes na minúscula península que lhe serviu de berço. A sua prosperidade brotou da grande força atractiva do Mar da China sulcado pelas viagens da Índia, do Japão, de Manila, de Ti-mor e das ilhas das especiarias. O mar foi a fonte de energia que defendeu a sociedade macaense da enor-me força centrípeta da China. Quanto mais a socie-dade macaense se apoiou no mar e menos se apoiou em terra, maior foi a sua autonomia, mais vasta era a sua prosperidade e mais profundamente se recortava a sua identidade colectiva.

Foi ainda o mar que imprimiu o carácter es-sencialmente expansivo dos macaenses ao conferir--lhes a missão de estabelecer laços e de intermediar interesses entre vários povos da região. A sociedade macaense fundou-se e cresceu pela acção conjugada de navegadores, mercadores e missionários. Do se-guro marítimo à produção da lorcha, decorre um ci-clo de três séculos do engenho macaense virado ao mar. A força centrípeta do Mar da China semeado de tufões foi a alma da sociedade macaense e ditou as páginas de que é feita a época áurea da História de Macau.

Composta por um número sempre reduzido de pessoas para a dimensão dos empreendimentos que a História lhe reservou, escasseou à sociedade macaense, em constante mutação, o tempo de maturação indispensável para se exprimir em obras de arte superiores. Entre outras, a obra mu-sical de Pedro José Lobo, as obras literárias de Deolinda da Conceição, José dos Santos Ferreira e Henrique de Senna Fernandes, a pintura de Luís Demée, Herculano Estorninho, António Concei-ção Júnior, Carlos Marreiros e Vítor Marreiros, constituem o auspicioso despontar de manifesta-ções artísticas verdadeiramente superiores e origi-nais na sociedade macaense cujo revigoramento o futuro político de Macau deveria preservar a todo o custo, para que tenha continuidade o registo das memórias de quatro séculos e meio de História iniciado por Carlos Augusto Montalto de Jesus, José Maria Braga e Luís Gonzaga Gomes, entre outros ilustres macaenses.

Selecção de Macau de Hóquei-em-campo, uma das modalidades desportivas mais características e praticadas pelos macaenses.

Foto de 1948, tirada no King's Park de Hong Kong. De pé, da esquerda para a direita: Leonel Borralho, José Victor do Rosário, Adé Capitolé, Armando Basto, João Santos Ferreira, Alexandre Airosa.

Fila da frente: Frederico Nolasco, Fernando Marques, Lourenço Ritchie, Reinaldo Ângelo e Augusto Jorge.

5. PERSONALIDADE-BASE

A personalidade psico-social dos macaenses é complexa e contém antinomias cuja origem se expli-ca na fusão das diferentes tendências originárias dos elementos étnicos de que descendem.

Encravada entre o mar e o gigantismo chinês, incomparavelmente mais livre e mais próspera do que a sociedade chinesa feudal que chegou até ao século em que vivemos, a sociedade macaense pro-duziu um estereótipo criticamente negativo da China que, de geração em geração, se ratifica e faz parte integrante da personalidade-base do macaense — ainda que de ascendência chinesa — e que Camilo Pessanha enunciou em 1912: "Ignorância, boçalidade, superstição, deslealdade, covardia, ava-reza, sensualidade, crueldade, desfaçatez, cinismo, atonia moral..."3.

O macaense é, ao mesmo tempo, o sonhador e o homem de acção dotado de um fundo prático e realista. Menos dado à reflexão fria, é idealista, emotivo e imaginativo. Não se preocupa demasiado com o conforto mas, paradoxalmente, é atraído pela ostentação da riqueza e pelo luxo. É religioso sem ser místico. Dispõe de uma excelente capacidade de adaptação às mais diversas situações, ideias, pessoas e coisas sem que daí resulte qualquer diminuição ou perda de carácter. O receio da opinião alheia deter-mina o seu comportamento algo inibido. É irónico e, sem ter muito humor, é dotado de um agudíssimo espírito crítico e trocista.

O macaense é comedido até à excessiva mo-déstia na exteriorização do seu valor individual e colectivo. Deliberadamente, apagou-se na história da epopeia de que foi o protagonista permanente, deixando para outros o mérito que lhe pertence. As suas virtudes e os seus defeitos mantiveram-se ao longo dos séculos. Apenas as suas reacções variam consoante as circunstâncias históricas. Chamado ao desempenho de um papel relevante, excede-se no seu cumprimento. Confinado numa actuação me-nor, esmorece e vegeta. Ilustra o primeiro exemplo, acima de todos, a figura épica de Vicente Nicolau de Mesquita. Mas toda uma galeria de macaenses valorosos, cujas memórias modestamente se apaga-ram, tiveram um desempenho brioso e muitas vezes heróico: na defesa da sua terra contra os invasores holandeses: integrando os contingentes militares que socorreram os exércitos Ming ante a ameaça fatal dos manchus; tripulando lorchas no combate aos piratas; ou combatendo em África, como ofici-ais milicianos das Forças Armadas Portuguesas, durante a guerra que precedeu a independência das antigas colónias. Num contexto social que não o galvaniza, por ser impelido para um desempenho medíocre, o macaense adopta uma conduta virada para a mera conservação da existência. Perspicaz e inteligente, a sua imaginação impele-o a tirar parti-do do papel que desempenha, sem glória, para ali-mentar o gosto pela ostentação da riqueza e para aguçar o seu espírito crítico e trocista.

Esta maneira de ser foi uma fonte permanente de dificuldades para os governantes de Macau, prin-cipalmente nas épocas históricas de maior estagna-ção durante as quais nasce a apatia e se intensifica o seu espírito crítico, profusamente ilustrado pelos tra-dicionais "pasquins" redigidos no dialecto macaense e de que José dos Santos Ferreira terá sido o derra-deiro cultor, na linha dos seus conterrâneos dos prin-cípios do século XIX, Antonino Haggesborg e José Maria de Oliveira Lima. A crítica social e política dos macaenses é uma parte importante da história da imprensa portuguesa de Macau que a violência dos interesses em confronto e a pequenez do meio têm remetido geralmente para as formas defensivas de "carta de leitor identificado" e de artigos assinados com pseudónimo. Mas nem sempre o macaense opta por tais cautelas. A História regista atitudes de aber-to desafio em épocas de estagnação de que releva, entre todas, a de Carlos Augusto Montalto de Jesus assumida na segunda edição da sua obra "Historic Macau".

6. CONCLUSÃO

Mais do que sintetizar para concluir os termos em que procedi à análise da identidade étnica dos macaenses e que não deixa de apresentar lacunas, parece-me adequado formular um apelo.

Em data muito recente, o Mundo congratu-lou-se e respirou de alívio por poder assistir ao fim do longo pesadelo representado pelo conflito entre israelitas e palestinianos.

Todos os povos têm direito a viver e prospe-rar na terra que consideram sua.

Num prazo de escassas gerações, não haverá macaenses se da terra que lhes serviu de berço tive-rem de partir.

Grupo humano de pequena dimensão mas com indiscutível identidade colectiva própria, o seu desaparecimento representaria uma perda irreparável para Macau que se transfiguraria num ponto vulgar e monotonamente igual a tantos outros que lhe são vizinhos. Mas seria também uma lesão para toda a Humanidade que se veria amputada de uma parte que, embora pequena, faz parte e é uma síntese vali-osa do todo uni versal.

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NOTAS

1Este poema de Cecília Jorge parece corresponder também ao sentimento geral dos macaenses que reflecte o trauma causado pela solução política encontrada para a sua terra que, até ver, os coloca perante o seguinte dilema: partirem de Macau se quiserem manter a nacionalidade portuguesa que sempre tiveram ou renunciarem a esta para poderem permanecer na terra que lhes serviu de berço. Este amargo dilema abriu-se aos macaenses com a assinatura da Decla-ração Conjunta, em 1987. A existir uma crise de identidade dos macaenses, ela é um efeito induzido da Declaração Conjunta. A debelação de tal crise apenas poderá ocorrer em resultado de negociação política entre os Estados portu-guês e chinês, no âmbito da transição de Macau para a soberania plena da R. P. da China, uma vez que se afigura remota a possibilidade dos macaenses encetarem um pro-cesso de pressão política dirigido directamente às autorida-des chinesas.

2Tive oportunidade de passar por experiências que compro-vam o que afirmo:

Em 1965, em Hong Kong, quando, à pergunta sobre a minha nacionalidade, respondi ao recepcionista de um hotel onde me alojei que era português, retorquiu ele, de imediato "eu também sou cristão".

Em 1985, num hotel em Malaca, em conversa idêntica com uma jovem malaia exclamaria ela: "Não pode ser! Você é alto, branco e alourado. Os portugueses são muito mais baixos e muito mais escuros". Referia-se ela aos luso--descendentes de Malaca.

Um português meu amigo que casou com uma jovem malaia residente em Hong Kong, em 1991, contou-me o espanto dos pais da noiva quando o conheceram porque "pensavam que eu era mestiço".

3Camilo Pessanha — "Prefácio" ao livro 'Esboço crítico da Civilização Chinesa', de J. António Filipe de Morais Palha. In "Camilo Pessanha prosador e tradutor". Organização, prefácio e notas de Daniel Pires. Instituto Português do Oriente, Instituto Cultural de Macau, 1992.

*Licenciado em Ciências Sociais e Políticas pelo ISCSPU, Lisboa. Foi Presidente do Instituto Cultural de Macau de 1986 a 1989. E actualmente Adido Cultural da Embaixada de Portugal em Pequim. Investigador de temas da História e da Sociologia macaenses, tem apresentado nos últimos anos várias comunicações em Seminários e Congressos e publicado diversos trabalhos em que se destacam: "Macau, 1999 - O Desafio da Transição" (Lisboa, 1990) e "A Língua Portuguesa no Oriente: passado recente e perspectivas de Futuro" (1993).

desde a p. 199
até a p.