Três Compositores e a Poesia de Camilo Pessanha

ARQUITECTURA DE MACAU: UMA MISTURA DE INFLUÊNCIAS PORTUGUESAS E CHINESAS*

Wong Shiu Kwan **

INTRODUÇÃO

Oestabelecimento dos Portugueses em Macau data de há quatrocentos anos. Durante este período, a cultura ocidental, trazida pelos Portugueses, entrou em contacto e misturou-se com a cultura dos Chineses. Nas páginas deste estudo é feita uma tentativa de levantamento destas influências mútuas, no campo da arquitectura, considerando as ideias e características que estão na base deste tipo especial de arquitectura apenas encontrado em Macau.

Razões para a escolha do assunto

A arquitectura de Macau representa um ramo à parte no desenvolvimento arquitectónico do Oriente; é a ligação entre dois diferentes tipos de arquitectura, a oriental e a ocidental. Os belos edifícios que encontramos em Macau são exemplares de um tipo especial de arquitectura com características tanto da arquitectura chinesa como da arquitectura portuguesa. Com a chegada da modernização, estão a desaparecer rapidamente, o que tomará cada vez mais difícil a pesquisa destas influências mútuas, no futuro.

Contribuição desejada

Este estudo pretende mostrar a forma como Portugueses e Chineses adoptaram, com êxito, as características das suas próprias arquitecturas e as combinaram de forma funcional e harmoniosa, adaptando-as às condições de Macau. Neste momento, o desenvolvimento da arquitectura chinesa está praticamente parado. Ao contrário do Japão, a moderna filosofia arquitectónica ocidental não foi bem assimilada pela arquitectura chinesa tradicional. A arquitectura de Macau serve de exemplo do modo como isto foi conseguido no passado. Com as análises feitas, de acordo com este estudo, uma abordagem semelhante pode surtir efeito num futuro próximo, no que diz respeito à modernização da arquitectura chinesa.

Método de pesquisa

A pesquisa é conduzida principalmente pela observação e referência - observação das características dos edifícios existentes, e tendo como referência a sua história. Através da determinação da idade dos edifícios, pode ser elaborada a sequência das diferentes fases da arquitectura de Macau. Os exemplos são depois analisados nos aspectos do planeamento, construção e decoração. Assim, podemos saber de que modo as influências mútuas das arquitecturas portuguesa e chinesa afectaram a arquitectura de Macau.

Este trabalho preocupa-se principalmente com o estudo dos edifícios onde se encontram tanto a arquitectura chinesa como a portuguesa. É dada particular atenção àqueles que, erigidos em épocas mais remotas, estão agora a diminuir significativamente em número.

O período escolhido para este trabalho compreende a época anterior à chegada dos Portugueses, desde 1557, até 1937, o início da 2a Guerra Mundial, na Ásia. O estudo do período pré-português é destinado a dar uma imagem do que era a arquitectura em Macau sem a influência dos Portugueses. O ano de 1937, pode ser considerado o período limite no desenvolvimento da arquitectura de Macau sob as duas influências. Nesta altura, tanto as influências chinesas como portuguesas tinham praticamente desaparecido, sendo o estilo dominante a construção em concreto. A maioria dos edifícios construídos depois da Guerra são geralmente de baixa qualidade, e, muitas vezes, completamente desintegrados da personalidade arquitectónica de Macau. Assim, o período após o início da Guerra está excluído do nosso trabalho.

Termos de referência

Neste estudo, "Arquitectura de Macau" é considerado um tipo especial de arquitectura, com características portuguesas e chinesas, como a encontrada em Macau. Não contempla, de um modo geral, os edifícios de arquitectura puramente chinesa ou portuguesa.

O termo "influência portuguesa" é aqui interpretado como incluindo todas as influências europeias em Macau. Basicamente, a arquitectura portuguesa não tem, em si própria, um estilo distinto; é uma mistura de várias influências estrangeiras, mourisca num período mais antigo e italiana num período mais recente. Com excepção de algumas particularidades, tem muito em comum com a arquitectura dos países mediterrânicos da Europa.

PRIMEIRA PARTE GEOGRAFIA E HISTÓRIA DE MACAU GEOGRAFIA DE MACAU

Localização e Área

O território de Macau, sob administração Portuguesa, localiza-se na margem Oeste do Rio das Pérolas. O Farol da Guia, na colina mais alta de Macau, situa-se nas coordenadas 22° 11' 51" N. e 113° 32' 48" E. 1 Este território é constituído por uma península onde se encontra a cidade de Macau e com as ilhas da Taipa e Coloane a sul. A península tem cerca de 3 milhas de comprimento e l milha na sua parte mais larga. A área total é de cerca de 6 milhas quadradas, ocupando a península 2,1 milhas quadradas. O ponto mais alto é o Alto de Coloane com 687 pés.

Características Físicas

A península de Macau é irregular na forma, tendo 8 milhas de circunferência, com algumas pequenas colinas, nomeadamente as da Guia e da Penha. Um dos lados da península está esculpido em forma de baía semicircular, conhecida como Praia Grande; o outro lado, com a ilha da Lapa em frente, forma o Porto Interior. O solo de Macau é granítico. Os aterros, em redor da cidade e na Taipa, resultaram de depósitos aluviais.

Clima

O clima é tropical de monção, com uma temperatura média anual que ultrapassa os 20°C. 2 A humidade é alta situando-se entre os 75% e os 90%. A precipitação também é alta, variando entre os 40" e os 80", com chuvas, sobretudo, entre Abril e Setembro, muitas vezes acompanhadas de tufões. O mês mais quente é Julho, com uma temperatura média de 28,3° C., enquanto o mês mais frio é Janeiro, com 14,6°C. O mês mais húmido é Abril, os mais secos Outubro e Novembro.

População

De acordo com o censo de 1960, a população de Macau é de 169.299 habitantes, dos quais 160.674 são Chineses, 7.974 Portugueses e 561 de outras nacionalidades. 3 Da população Portuguesa, 5119 nasceram em Macau, 1080 são oriundos de Macau, 1178 de outros territórios ultramarinos portugueses, e 597 de outras origens. No momento presente, devido ao afluxo de pessoas vindas de países vizinhos, estima-se a população em 280.000.

HISTÓRIA DE MACAU

Antes da chegada dos Portugueses

Macau era usado como porto muito antes da chegada dos Portugueses e oferecia um excelente abrigo em caso de tempestade. Era utilizado por barcos de pesca e juncos de comércio. Os Hakka, oriundos de Shantung fixaram-se em Macau e cercanias durante a dinastia Sung em 960-1270 d. C. Comerciantes de Fukien e das ilhas Liu Kiu começaram a usar este porto durante a dinastia Yuan, 1270-1368 d. C. Os mais antigos colonizadores de Macau foram duas pequenas famílias de Fukien, uma com o apelido de Tsum e a outra Ho4, que construíram as suas casas no vale de Mong Há. A lenda atribui a Neang Ma, a protecção dos marinheiros, nos primórdios da dinastia Ming, 1368-1644 d. C. 5 O templo erguido à entrada do porto deu o nome de "A Ma Kao" ao lugar, mais tarde adoptado pelos Portugueses para se estabelecerem.

Estabelecimento da Povoação

Portugal foi a primeira nação europeia a estabelecer colónias e postos comerciais no Oriente. No início do séc. XVI fixou-se no litoral da África Ocidental e Índia, sendo Goa o mais importante centro do comércio. Durante o governo de Afonso de Albuquerque6, um dos primeiros governadores de Goa, os Portugueses iniciaram a expansão do comércio para a China. A tomada de Malaca em 1511 intensificou o desenvolvimento deste projecto. Em 1513, Jorge Alvares conduziu uma expedição através do Mar do Sul da China, e colocou um padrão7 em Tamao, na ilha de Lintin, perto de Nam Tau.

Em 1517, uma embaixada Portuguesa chefiada por Tomé Pires foi enviada à China para estabelecer relações com os Chineses. Contudo, desentendimentos com os funcionários Chineses locais levaram a hostilidades entre os dois povos.

Entretanto uma outra expedição encabeçada por Martim Affonso de Melo Coutinho8 foi atacada por uma frota de barcos chineses, à entrada do Rio das Pérolas em 1522. Na verdade, ambas as tentativas falharam, sem qualquer tipo de êxito. Contudo, durante este período de tempo, fez-se comércio em vários lugares do litoral de Kwangtung, Fukien e Chekiang, para norte, em Liampo perto de Ningpo, sem o consentimento oficial das autoridades Chinesas.

Em 1554, Leonel de Sousa, um comandante português, firmou um acordo com os chineses através do qual foi concedida autorização para comerciar no Sul da China. As mercadorias eram trocadas de Agosto até Novembro na ilha de Shanchuan, ilha de S. João, cinquenta milhas a sudoeste de Macau. Eram construídas cabanas temporárias de bambu e palha, para os portugueses, logo destruídas quando partiam9. Entre 1554-55, esta "Feira" mudou para Lampacau até 1560, numa altura em que cerca de quinhentas a seiscentas pessoas se tinham ali fixado.

Os portugueses chegam a Macau pela primeira vez em 1534, para secar a mercadoria atingida durante um tufão. Em 1553, forma, temporariamente, entrepostos comerciais, em Macau. Para obter regalias para si próprios, os portugueses ofereceram, às autoridades chinesas, uma renda anual de 500 taeis. 10 Em 1557, como recompensa pelo combate aos piratas, que infestavam esta parte da costa do Sul da China, foi-lhes concedida autorização para fixar residência permanente em Macau. O ano de 1557, é geralmente considerado como a data para a fundação da cidade de Macau pelos portugueses.

A Origem do Nome

Muito antes de Macau entrar para a histúria das primeiras relações Sino-Portuguesas, o lugar era conhecido como "Kum Tau Im Chong", significando "O Saleiro do Cesto Dourado". Durante a dinastia Ming, 1368-1644 d. C. constituía parte do distrito de Heung Shan, e era então conhecido como Ho Keang, que significa "O espelho em forma de ostra", ou Hoi Keang, "Espelho do mar". 11 Estas variantes estavam todas relacionadas com a famosa baía, agora chamada de Praia Grande, que formava um agradável círculo, que fazia lembrar um espelho a alguns funcionários chineses mais poéticos. O nome mais comum agora utilizado pelos chineses é Ou-Mun, que quer dizer "Passagem para a Baía do espelho do mar".

O termo português é derivado de A-Ma-O, ou A-Ma-Cao, que significa "Baía de A-Má", a Deusa dos marinheiros de Fukien. O antigo templo, dedicado a esta Deusa à entrada do Porto Interior, antecede a chegada dos primeiros Portugueses. 12 Os primeiros colonos portugueses chamaram à sua nova terra "Povoação do nome de Deus de Amacao na China". Em 1586, foi concedido o estatuto de cidade pelas autoridades Indo-Portuguesas de Goa, com o nome oficial de "Cidade do Nome de Deus na China". Contudo, este nunca se popularizou, e o nome da Deusa chinesa continuou a ser perpetuado na variante mais comum de Macau.

Os primórdios, séc. XVI

De início, os Portugueses estavam hesitantes no que diz respeito a um desenvolvimento intensivo de Macau. Havia dúvidas em relação à segurança ou continuidade da sua permanência, e tanto Shanchuan como Lampacao eram muitas vezes usadas pelos comerciantes. Contudo, nos primeiros anos de fixação, construíram-se armazéns, residências, edifícios públicos e eclesiásticos, logo seguidos por fortificações e acampamentos militares. Em 1563, a população, de início, cerca de quinhentos portugueses, aumentou para novecentos, excluindo crianças, além de naturais de Malaca, negros e outros prisioneiros, quando habitantes de Lampacao se deslocaram para Macau. 13 Chegavam cada vez mais chineses para negociar com os Portugueses. Geralmente ficavam a viver nas suas aldeias ou casas próprias nos arredores da cidade. Os dois povos tinham um relacionamento amigável. Em 1573, as autoridades Chinesas resolveram construir uma parede do outro lado do istmo que separo Macau do continente. Em 1587, um mandarim civil foi designado para residir e governar a cidade em nome do Imperador da China. Os Portugueses não eram autorizados a construir novas igrejas ou casas sem licença das autoridades Chinesas. 14

Macau em 1632 -uma das primeiras gravuras descritivas da cidade (Fotografia in Livro do Estado da india Oriental, Antonio Bocarro).

Os primeiros colonizadores Portugueses em Macau não estavam sob a alçada de nenhum governo, gozando de completa liberdade individual, sem qualquer tipo de controlo ou directriz do governo indo-português de Goa. Em 1586, foi concedido a Macau o estatuto de cidade pelo Vice-rei e foram nomeados alguns funcionários judiciais pelas autoridades de Goa. Davam-se os primeiros passos para uma forma democrática de administração municipal. Os cidadãos eram eleitos representantes, estes, por sua vez, nomeavam três residentes para vereadores. Estes três, juntamente com três funcionários públicos e um Secretário do governo, formavam o Senado investido do governo da cidade.

A posição e segurança de que a cidade gozava, resultavam do facto de ser a escolhida para centro das actividades religiosas no Extremo Oriente. Em 1575, a Diocese de Macau foi estabelecida por Bula Papal.

Os contornos primitivos da cidade foram ditados por uma cadeia de elevações que corre de Noroeste para Sudoeste, e foi ao longo desta espinha dorsal que o principal sistema rodoviário se desenvolveu. A área noroeste adjacente ao Porto Interior viu desenvolver-se a primeira urbanização. A zona sudoeste desenvolveu-se após 1590, e cresceu nas vizinhanças da paróquia de S. Lourenço.

A Idade de Ouro, séc. XVII

O comércio com o Japão, no início do séc. XVII, contribuiu, em grande medida, para o grande florescimento económico que acelerou o rápido desenvolvimento da cidade. Os portugueses tornaram-se os principais intermediários, e detinham o monopólio do transporte marítimo de mercadorias nas ligações comerciais entre a China e o Japão. Ao mesmo tempo, desenvolvia-se com Manila o rendoso negócio de mercadorias chinesas. Os fabulosos lucros alcançados e a consequente prosperidade atraiu o interesse de Holandeses e Espanhóis.

Em 1622, os Holandeses atacaram Macau mas foram expulsos com um pesado número de baixas. Este acontecimento impressionou as autoridades chinesas que autorizaram os Portugueses a fortificarem a cidade.

Por volta de 1630, a população de Macau era composta de 437 portugueses e euro-asiáticos, e 403 cristãos nativos, mulheres e crianças chinesas. Nesta altura, a população chinesa era cerca de 10.000 pessoas; e se a estas juntarmos o grande número de escravos, os números totais seriam entre quinze e vinte mil. 15

Os limites da cidade eram definidos pelas fortes muralhas erguidas entre a Fortaleza de S. Paulo e o mar. Quase todos as áreas planas tinham sido ocupadas. Grandes praças abertas eram construídas perto das igrejas e edifícios públicos. Macau desenvolveu-se a partir da Praia Grande, ao longo da marginal, e gradualmente foi-se expandindo para o centro da cidade. Era exercido um controlo sobre os materiais usados que tinham de ser à prova de fogo. Havia seis conventos ou mosteiros, com três igrejas paroquiais, nomeadamente a Sé Catedral, S. Lourenço e S. António; a capela de S. Lázaro foi construída, fora da cidade, para os leprosos. 16

(Reproduzida de Hsiang-Shan-Chih. Gravura gentilmente cedida por Luís G. Gomes).

Em 1639, os Portugueses foram expulsos do Japão. A perda do comércio japonês foi compensada, em certa medida, pela entrada nos mercados de Timor e Macassar. A subida de D. João VI ao trono português, em 1640, teve, como consequência, a interrupção do comércio com Manila. Embora a paz entre Portugal e Espanha, em 1668, tivesse restabelecido as ligações comerciais, os lucros tinham diminuído consideravelmente. O cerco ao Estreito de Malaca, pelos Holandeses, praticamente isolou Macau de Portugal. Em 1685, o Imperador Kiang Hsi abriu os portos chineses ao comércio estrangeiro, uma medida desfavorável para Macau. Os Mandarins procuraram conceder direitos de porto chinês a Macau, e foi enviado para aqui o Hopu, Comissário da Alfândega Chinesa, em 1688. Em Macau, os funcionários chineses cobravam direitos sobre todas as mercadorias idas para e vindas de Cantão. Foi um duro golpe para a economia de Macau. Seguiu-se um período de depressão; era o declínio do antigo esplendor de Macau.

O Declínio (séculos XVIII e XIX)

Com a abertura do comércio chinês, um crescente número de comerciantes estrangeiros, incluindo os da Companhia Britânica das Índias Orientais, estabeleceram os seus escritórios e residências em Macau. Entretanto Macau estava quase exclusivamente reduzida ao comércio com o Sião. A navegação portuguesa deixara de ser um factor essencial na economia da cidade.

Em 1831, um tufão atingiu Macau e arrasou muitas casas na Praia Grande. A igreja da Penha e a Sé Catedral foram seriamente atingidas e a reparação dos estragos demorou algum tempo. Sucedeu-se ao tufão, um incêndio desastroso, que destruiu mais de 400 edifícios, principalmente no bairro chinês da cidade. Em 1835, outra tragédia ocorreu com a destruição, pelo fogo, do mais célebre edifício de Macau, a igreja de S. Paulo, apenas sobrevivendo a fachada.

Hong Kong tornou-se porto franco, em 1841. Esta política acentuou, ainda mais, o declínio de Macau como grande praça comercial no Oriente. Seguiu-se uma profunda crise acompanhada de desemprego. Muitos habitantes emigraram para Hong Kong à procura de novas oportunidades.

De 1850 em diante, a população portuguesa aumentou de forma muito lenta, em comparação com a comunidade chinesa. Em 1835, a população de Macau era estimada em 34.628 habitantes, constituída por 4.628 portugueses e outros europeus, e 30.000 chineses dos quais 13.000 eram cristãos. 17 Não existia uma indústria permanente. As receitas vinham essencialmente do monopólio do jogo. Muitas das grandes residências dos antigos comerciantes ricos de Macau, foram votadas ao abandono ou tornaram-se habitações superlotadas de pobres. A fase mais importante de desenvolvimento ocorreu de 1850em diante, na parte ocidental da cidade, entre a Rua do Seminário e o Porto Interior. Esta zona tinha-se desenvolvido apenas de forma esporádica, durante o séc. XVII. A maioria dos novos edifícios eram pequenos. Os velhos portões da cidade e muralhas adjacentes foram demolidos para permitir a expansão residencial em direcção às Portas do Cerco.

Em 1874, outro tufão atingiu Macau causando prejuízos a numerosas casas do bairro chinês, de tal modo que muitas tiveram que ser totalmente reconstruídas.

A Praia Grande, Macau, 1841(reproduzido de The Chinese Empire - T. Allom,1858, Vol. II, p. 45).
Vista da cidade e porto da colina sob o Forte da Guia, 1840(reproduzido de The Chinese Empire, por T. Allom, London, Vol II, p. 27).

Em 1880, foram estabelecidas indústrias no istmo adjacente à Ilha Verde, onde foi aberta uma fábrica de cimento. Também apareceram pequenas lojas de trabalhos em metal e de ferralharia. A partir do fim do séc. XIX, tornou-se óbvio para as autoridades que para Macau prosperar, de novo, eram exigidas novas instalações portuárias. Assim, muitos dos projectos tidos em consideração entre 1890 e 1910 diziam respeito à dragagem e aterro de zonas necessárias às instalações do novo porto.

O século XX

Em 1910, começou a obra do novo porto, interrompida pela Primeira Guerra Mundial, 1914-1918. Em 1921, os trabalhos foram retomados, tendo o governo de Portugal proporcionado uma ajuda financeira. A proposta implicava a construção de um porto exterior e instalações marítimas auxiliares, que cobririam uma área de cerca de 140 acres. Foram destinadas dez milhões de patacas ao projecto e o contrato foi outorgado à Netherlands Harbour Works Company. Em 1923, foi dragado um canal com quatro milhas, desde o Porto Interior até ao mar, e foi completado um pontão, em 1926. O projecto do aterro resultou na criação de um novo porto exterior, e na aquisição de uma larga faixa de terra a sudoeste, tão necessária para a construção de edifícios residenciais e municipais.

Em 1910, a população de Macau era de 74.866, da qual 71.021 eram Chineses, 3.601 Portugueses e 244 de outras nacionalidades. 18 A deflagração de distúrbios civis na China e a expansão da Segunda Guerra Mundial após 1937, conduziu a um rápido aumento da população, em 1939. 19 Havia problemas no que diz respeito às acomodações existentes e aos locais de construção disponíveis. Em 1941, os refugiados vieram aumentar as dificuldades. Contudo, Macau permaneceu neutro durante a guerra e foi poupado à ocupação japonesa.

Macau é uma cidade única, envolvendo tanto chineses como portugueses numa sociedade cosmopolita. Dotada de recursos tão limitados, continua a sobreviver. O seu traço distintivo mantém-se intacto; era uma cidade bastante desenvolvida nos séc. XVII e XVIII, e é rica de herança cultural do seu glorioso passado.

SEGUNDA PARTE O DESENVOLVIMENTO DA ARQUITECTURA DE MACAU

A evolução de Macau sob as mútuas influências da arquitectura chinesa e portuguesa, pode ser, de forma grosseira, dividida em quatro períodos:

- Antes de 1557, ou seja antes da chegada e fixação dos Portugueses, não existindo influência portuguesa na arquitectura local;

- 1557-1700, o primeiro período com pequenas influências mútuas das arquitecturas portuguesa e chinesa, sendo a influência portuguesa predominante em Macau;

- 1700-1900, o ano de 1700 marca, aproximadamente, o início do apogeu no desenvolvimento das duas influências, fundindo-se as arquitecturas portuguesa e chinesa num estilo único;

- 1900-1937, introdução do betão armado em Macau e o aparecimento do estilo internacional, o declínio das duas influências até ao seu quase desaparecimento por volta de 1937.

Antes de 1557

Antes da chegada dos Portugueses, a pequena península, agora conhecida como Macau, era lar de um pequeno número de pescadores, abrigados em palhotas, em redor dos dois templos que então existiam em Macau. Hoje, estes dois templos ainda se encontram em boas condições; são os templos de A-Má e Kun Yam.

O Templo de A-Má

O Templo de A-Má era originalmente um pequeno santuário, dedicado à deusa Neang-Ma, protectora dos navegantes, em Fukien. O primeiro foi erigido no inicio da dinastia Ming, 1368-1644. O conjunto de templos existente, data a sua construção de 1573-1621, durante o reinado de Wan Li. 20 Não se sabe se o actual edifício do templo é uma reprodução exacta do que existia antes da chegada dos Portugueses a Macau, já que há poucos registos, antes de 1557, disponíveis do lugar. No entanto, considerando que o Templo foi religiosamente conservado durante mais de quatrocentos anos, 21 pode-se presumir que o actual edifício conserve as principais, senão a totalidade das características do período pré-português. Daí que o Templo de A-Má possa ser considerado um exemplo da arquitectura de Macau, que antecede a chegada dos Portugueses, e assim sem as suas influências.

O templo de A-Má está localizado num local romântico do Porto Interior de Macau. Fica na encosta de um relevo acidentado conhecido como a Colina da Barra e é composto de três partes dispostas no meio de pedras e árvores.

O Templo de A-Má, em 1746, semelhante ao que é hoje. Os dois mastros em frente do templo já não existem. A pedra, em primeiro plano, tem esculpida a caravela, milagrosamente salva pela Deusa A-Má (reproduzido do Ou-Mun-Kei-Leok- U. L. Tcheong, K. I. Ian, p. 74).
O Templo de A-Má, Macau (reproduzido de The Chinese Empire, por T. Allom, London, 1858, Vol. I, p. 66).
Terraço e santuários no Templo de A-Má (reproduzido de The Chinese Empire, T. Allom, Vol. I, p. 68.)
O Templo de A-Má semelhante ao que é hoje.

A fachada do edifício é definida por uma cerca de pequenos muros ligando os pedregulhos de granito. Por detrás do pórtico de entrada, há um pequeno pátio, que dá acesso ao edifício principal do conjunto, dedicado à Deusa A-Má ou Neang Ma. Um lance de escadas subindo a colina conduz aos outros dois edifícios, o mais alto dedicado a Kun Yam, Deusa da Misericórdia e o mais baixo ao Deus da Benevolência. Os edifícios têm as empenas a suportar o telhado de madeira. Os telhados estão revestidos de telhas de vidro com os característicos beirais chineses virados para cima. As paredes são de estuque e pintadas a verde ou a vermelho. 22

O Templo de Kun Yam

O mais antigo dos dois templos é o de Kun Yam situado em Mong Há. Já é conhecida a sua existência na Dinastia Yuan, 1279 - 1368, 23 sob a forma de um pequeno santuário, com um minúsculo altar consagrado a Kun Yam, a Deusa da Misericórdia. O posterior desenvolvimento e ampliação do templo, teve lugar na dinastia Ming, e os actuais edifícios datam de 1627. O templo foi restaurado durante os reinados de Chia Ching, 1796-1821, e de Tong Chih, 1862-1875. Tal como no caso do Templo de A-Má, não há registos que nos atestem do edifício antes da chegada dos Portugueses. No entanto, ao contrário do Templo de A-Má, a reconstrução levada a cabo numa época posterior, introduziu influências portuguesas, particularmente nos edifícios conventuais ao lado do templo.

1557-1700

Os primeiros colonizadores de Macau, incluindo tanto Chineses como Portugueses, cuidaram de construir as suas casas à maneira dos seus lugares de origem. Tentaram conservar o seu modo de vida tradicional. Não tinham, ainda, entrado em contacto com as ideias e técnicas dos seus novos amigos. Contudo, com o passar do tempo, o uso dos materiais da zona e o emprego de artífices chineses nos trabalhos, levaram a que aparecessem as influências chinesas na arquitectura portuguesa, tais como a construção de telhados e a aplicação de motivos de adorno chineses. De um modo geral; as influências mútuas eram poucas nesta época, sendo mais no sentido dos Chineses influenciarem os Portugueses do que o contrário.

O Templo de Kun Yam, a entrada principal como é hoje.
(Reproduzido de Ou-Mun-Kei-Leok - U. L. Tcheong, K. I. Ian, ilustração oposta à pág. 78).
(Reproduzido de Ou-Mun-Leok - U. L. Tcheong, K. I. lan, ilustração oposta à pág. 20).
Lin Fong Miu (Pagode de Lin Fong) na Avenida Almirante Lacerda foi erigido em 1592 e restaurado em 1876 ***. O templo é tipicamente chinês na sua arquitectura, com ricas decorações em terracota. É de plano simétrico e semelhante ao de Kun Yam.
Instalações costeiras do Hopu, no Porto Interior de Macau, 1688-1849 (reproduzido do Ou-Mun-Kei-Leok - U. L. Tcheong, K. I. Ian ilustracão da pág. 34).
Instalações do Comissariado da Alfândega da China em Macau, erigido em 1688, e demolido em 1849 (reproduzido do Ou-Mun--Kei-Leok - U. L. Tcheong, K. I. Ian, ilustração na pág. 32).
Leal Senado no séc. XVII (reproduzido do Ou-Mun-Kei-Leok - U. L. Tcheong, K. I. Ian, ilustração na pág. 44.

Foi durante este período que a maioria das igrejas em Macau foi construída. Elas mantiveram, até hoje, a sua traça original sem grandes alterações. Ainda se vêem algumas casas de habitação em certas zonas de Macau, nomeadamente nas proximidades de S. to António e S. Lourenço. Eram construções fortes, com paredes maciças e elementos estruturais pesados. A maioria dos exemplos remanescentes são, predominantemente, de arquitectura chinesa.

S. Paulo

A Igreja do Colégio de S. Paulo foi completada em 1603, com a actual fachada acrescentada entre 1620 e 1637, e a escadaria construída em 1640. Os elementos que compõem a fachada são uma extraordinária mistura de formas medievais, clássicas, e orientais. O engenho e as tradições locais foram introduzidos, de modo a transmitir um sermão completo, em pedra, para os crentes. Grande parte do trabalho foi feito pelos cristãos japoneses de Macau, muitos dos quais eram artífices experimentados.

São Paulo, alçado da fachada (reproduzido do Journal of Oriental Studies, vol. I, No. 2, July,1954, University of Hong Kong - P1.10).
S. Agostinho Diz-se que foram os Espanhóis a construir esta igreja em honra de Nossa Senhora da Graça, mas tendo recebido ordens de retirar para Manila em 1589, sucederam-lhes os frades portugueses. A igreja foi restaurada em 1814. 24 O edifício tem características ibéricas. A fachada está ornamentada com um complicado trabalho em estuque, um alto-relevo em branco sobre fundo amarelo pastel. As janelas e as portas estão pintadas a verde escuro contrastando com a fachada. O telhado, é construído em telha chinesa sobre uma estrutura de madeira, de varas de abeto.
Igreja Sào Lourenço, situada na Rua de S. Lourenço, numa pequena elevação no coração de uma zona residencial. Já era conhecida a sua existência por volta de 1618, não estando registada a data exacta da sua fundação ****. Embora a igreja tenha sofrido alterações e reconstruções ao longo do tempo, a estrutura principal mantém-se pouco alterada relativamente à traça inicial. Do ponto de vista arquitectónico é uma construção ibérica, com grande preocupação e delicadeza nos detalhes e na decoração. O telhado, chinês, é inclinado e em telha, apoiado em armações para suporte em madeira. Painéis chineses em terracota estão incorporados nas paredes de pedra e constituem motivos de decoração.
Alçado da Secção Sudoeste Escala aproximada: 1 polegada = 18 pésReproduzido do Journal of Oriental Studies, 1957, Plate XII, M. Hugo-Bunt.
Desennos do Departamento de Arqmtectura da Umversidade de Hong Kong, Hong Kong.
Residência dos finais do séc. XVI, no n°l da Rua de S. António. A área de habitação situa-se no primeiro andar, sendo o rés-do-chão usado como dependência de empregados e arrecadação. As paredes são maciças e resistentes. As janelas são grandes e espaçadas. O telhado é de construção chinesa, estando a parte de cima escondida por um parapeito. O empedrado dos alicerces contrasta com o revestimento de estuque da parede acima. As goteiras estão revestidas de gesso em forma de secções de bambu, muito utilizado pelos operários chineses em Macau. O edifício é típico da arquitectura doméstica dos primeiros tempos da fixação em Macau.

1700-1900

Este período marca o apogeu do desenvolvimento das influências mútuas na arquitectura de Macau. Em 1800, desenvolveu-se um estilo próprio de arquitectura com características portuguesas e chinesas. Estas influências evoluíram para além dos meros limites da decoração e aplicação de material local, para outros aspectos da construção. Era na arquitectura doméstica que este estilo mais se evidenciava. Ainda aparecem muitos exemplares deste período, conferindo características especiais à cidade de Macau.

As construções de traça puramente chinesa são os templos. São geralmente muito pequenos, com um átrio principal abrindo-se para um largo, no meio de uma zona comercial/residencial. Alguns situam-se nos arredores da cidade.

Teatro D. Pedro V O Teatro Dom Pedro V, na Rua de S. Agostinho, finais do séc. XVIII. O teatro está integrado no edifício do Clube de Macau, que é o ponto de encontro dos portugueses residentes em Macau. A entrada do teatro é em estilo clássico com uma pequena área aberta, em frente. O telhado, ao estilo chinês, é apoiado em armações de suporte, em pontos intermédios. O peso do telhado assenta em arcadas nos dois lados do edifício. No conjunto, as influências chinesas são menores nos edifícios públicos, quando comparadas com os edifícios residenciais.
Tin Hau Miu. Situado na Rua dos Pescadores, este templo foi construído durante o reinado de Kuong Soi (1875-1908) e restaurado em 1955. *****
Desenhos do Departamento de Arquitectura da Universidade de Hong Kong, Hong Kong.
Fachada de prédio na Rua Pedro N. da Silva, residência no n. ° 24, Travessa dos Anjos. ****** Foram introduzidos motivos ocidentais no traçado, tais como a balaustrada, as janelas e a varanda. As arestas do telhado não se vem da rua.
A planta segue o desenho típico chinês com as salas principais ao meio e os quartos dos lados. A parede exterior no rés-do-chão é rasgada por amplas janelas, guardadas com pesadas grades de ferro, formando, assim uma protecção à volta da casa. O peso do telhado é suportado pelas paredes de alvenaria e por uma fileira de colunas de madeira em volta do pátio central.
Fachada da residência da Rua da Praia Grande, n. ° 47. A planta deste edifício é tipicamente chinesas. Contudo, os motivos de decoração, as varandas e o balcão são ocidentais no desenho e construção. Os detalhes são pintados de branco, com o fundo em verde pastel. A estrutura assenta em paredes mestras com colunas em redor do pátio, e todas as paredes divisórias são estruturais. O chão é de tábua larga.
Interior da residência na Rua da Praia Grande, n. ° 47, visto do pátio, no rés-do--chão. O interior é profusamente decorado com motivos chineses e ocidentais. As colunas de madeira esculpidas, debaixo das vigas, são de desenho chinês, enquanto que o parapeito de ferro e o tecto de madeira têm motivos ocidentais. A lanterna está suspensa por cima de um pequeno altar. Esta casa é o exemplo perfeito da simbiose da arquitectura chinesa e portuguesa.
O jardim. ******* Chega-se ao jardim por uma série de portões e átrios, com vários pavilhões espalhados aqui e ali. O centro do jardim é dominado por um grande-lago com lírios e com uma ponte a atravessá-lo. Como o terreno é plano, o principal edifício, da foto acima, está resguardado do jardim por árvores e plantas.
1900-1937 O virar do século testemunhou o decrescer das influências quer chinesas quer portuguesas na arquitectura de Macau. O estilo internacional da moderna construção em cimento armado foi, a pouco e pouco, ganhando importância. A influência chinesa ainda pode ser vista na decoração interior das casas de habitação. O desenho dos edifícios deste período, não tem, no entanto, o refinamento dos seus antecessores. Falta a qualidade necessária para acertar o passo com o avanço da tecnologia.
A Biblioteca Pública Chinesa, na Avenida de Sta. Clara, construída no início do séc. XX. A planta é de forma octogonal. A construção é em betão, com motivos decorativos clássicos. O emprego do betão não causou mudanças apreciáveis na arquitectura do edifício. As portas e janelas estão pintadas de vermelho, em contraste com o cinzento dos arcos e colunas
Residência na Rua da Praia Grande, 83 Fachada de residência virada para a Praia Grande. A aparência exterior do edifício é ocidental, com as varandas da frente apoiadas em pesados pilares de tijolo, decorados com motivos clássicos. O edifício está pintado de amarelo pastel, com pormenores decorativos em branco, muito vulgar nos edifícios de Macau. Contudo, as portas da entrada principal são de desenho chinês, e o portão de entrada situa-se alguns degraus acima do nível da rua.
Vista para o saguão, residência na Rua da Praia Grande, 83. Notar a viga de betão no canto esquerdo. Os candeeiros de petróleo são mais para fins decorativos e cerimoniais do que para iluminar.
A dependência dos criados, separada da zona principal da casa, por um pátio. O betão é utilizado na estrutura, contudo o telhado inclinado permanece com estrutura em madeira.
RESIDÊNCIA NA RUA DO SEMINÁRIO, 5-7, 1918 A fachada.
A parte lateral do edifício. Todas as janelas têm persianas ajustáveis de madeira, pintadas de castanho. As características chinesas são encontradas emalgumas partes do edifício, tais como os tubos de drenagem em forma de secção de bambu, a porta de duas folhas na entrada principal, e o telhado inclinado por cima da cozinha e da dependência de empregados.
A planta está grosseiramente dividida em duas partes: a zona de habitação e a área de serviço, ligadas por um pátio com uma passagem, ao nível do primeiro andar. Os quartos comunicam directamente uns com os outros. Todas as paredes são estruturais, suportando as traves de madeira. O telhado era originalmente inclinado, coberto com telhas chinesas, e apoiado por vigas de madeira à volta, assentando nas empenas de alvenaria.
O interior da casa.

Conclusão

A arquitectura de Macau evoluiu sob as mútuas influências das arquitecturas chinesa e portuguesa. A proporção destas influências varia conforme o período de tempo. Assim, no início, apenas se encontrava arquitectura chinesa em Macau. Após a chegada dos portugueses, os edifícios em puro estilo chinês continuaram a ser construídos. Contudo, construções puramente portuguesas nunca existiram. Existia sempre algum traço chinês. Nos sécs. XVI e XVII, a maioria dos edifícios erigidos tinham características predominantemente portuguesas, sendo as construções chinesas raras e sem importância, tendo poucas sobrevivido ao tempo. Os sécs. XVIII e XIX testemunharam um decréscimo crescente das construções portuguesas. Os novos edifícios mostram uma simbiose notável das influências portuguesa e chinesa. Constituem grande parte dos prédios existentes hoje em dia em Macau, dando um traço arquitectónico especial à cidade. Por fim, o séc. XX encerra o ciclo de desenvolvimento da mistura daquelas duas influências.

O efeito daquela simbiose nas construções públicas e religiosas é pequeno. É nos prédios de habitação que o estilo da arquitectura de Macau é mais distinto. As residências do séc. XVIII, tomando como exemplo a da Travessa dos Anjos, n. ° 24, embora as ideias e características sejam portuguesas, p.28, são adaptadas ao gosto chinês. Um século mais'tarde, tal como vemos na residência do n. ° 47 na Avenida da Praia Grande, p.29, as características portuguesas apareciam em elementos exteriores ao edifício. Assim, a fachada pode ser portuguesa enquanto o interior é uma mistura de influências chinesa e portuguesa. Comparada com as residências do século passado, aumentou a proporção da influência portuguesa. Com o virar do século, a influência portuguesa avançou para o campo da decoração de interiores. Eram cada vez mais usados motivos portugueses, muitas vezes lado a lado com chineses, como na residência da Rua da Praia Grande, n. ° 83, p.32. Contudo, a atmosfera no interior da casa permanecia predominantemente chinesa. Após a Primeira Guerra Mundial, apenas se encontra a influência chinesa no desenho e disposição do mobiliário, sendo o resto do edifício ao estilo ocidental. A decoração torna-se mais simples e menos ornamentada, como na residência da Rua do Seminário, nos. 5-7/9.33. Nos anos seguintes, houve um aumento gradual do betão, conduzindo ao desenvolvimento de um estilo internacional em Macau.

Museu Luís de Camões, Macau (antiga casa de habitação). O andar principal eleva-se sobre uma cave de arrecadações, com acesso por uma grande escadaria que conduza um átrio de entrada. Em frente da escadaria há um jardim. Os quartos, no interior da casa comunicam entre si.
^^PLANTA Tipos de plantas Os edifícios em Macau podem ser, grosso modo, divididos em dois tipos, de acordo com o desenho das plantas, nomeadamente aqueles em que o rés-do-chão é usado como arrecadação, a dependência de criados e a principal área de habitação no primeiro andar, e aqueles em que a zona de habitação fica no rés-do-chão. O primeiro tipo é frequentemente encontrado nas casas de habitação em Portugal, e pode considerar-se ter sido introduzido em Macau pelos portugueses. Esta planta é, normalmente adoptada nos edifícios mais antigos dos séculos XVI e XVII. A maioria dos edifícios em Macau pertence ao segundo tipo. ^^TERCEIRA PARTE ANÁLISE DA ARQUITECTURA DE MACAU Quando aprincipal zona de habitação fica situada no rés-do-chão, a sequência da planta é geralmente: vestíbulo, pátio, sala principal, pátio de serviço, cozinha e dependência de empregados. Nos prédios mais pequenos há apenas a sala principal, com os quartos de ambos os lados e com a cozinha num dos extremos da casa. Nas casas de habitação de vários andares, o vestíbulo abre-se geralmente para uma sala da frente, que juntamente com o pátio central e com a sala detrás, ocupam dois andares em altura. Os quartos são no primeiro andar, com acesso por uma escada situada num dos lados do pátio central. Mais tarde, a altura de tecto do rés-do-chão é aumentada, de modo a não ser necessário deixar dois andares para o pátio principal. Assim, uma sala de estar e jantar passa a ser no primeiro andar enquanto que a sala principal no rés-do-chão é dedicada a cerimónias e festas. É seguida uma estrutura simétrica, com o eixo principal atravessando as salas e quartos mais importantes do edifício. Em alguns locais, devido às irregularidades do terreno, a simetria pode ser alterada tomando outras formas. Encontramos um santuário em quase todas as casas chinesas. Nas casas mais pequenas, um altar em vez de uma sala. Fica situado no eixo central, geralmente numa extremidade.
Sala de entrada da Rua da Praia Grande, 83. A entrada principal é resguardada por portas de dobradiças que conferem privacidade nos dias normais e podem ser completamente removidas nos dias especiais.
Planta do rés-do-chão Residência da Avenida Coronel Mesquita, 13, nos finais do séc. XIX.
Planta do rés-do-chão da Travessa da Sé, 3. O desenho é tipicamente chinês.
Travessa da Sé.
Um pátio central no Seminário de S. José. No meio do pátio há um poço.
Um saguão numa residência de vários andares na Rua da Praia Grande, 83. Por detrás da entrada de luz, fica a sala principal. Num dos lados, a escada e do outro, a sala de leitura.
Residência na Rua Praia do Bomparto. Aqui, o pátio principal situa-se em frente da casa definido, pelo muro da rua. O pátio, plantado com árvores e flores, serve de espaço de convívio ao ar livre, ao mesmo tempo que se goza de grande privacidade.
Varanda do Centro de Saúde. A maioria das varandas encontradas em Macau são muito amplas, conforme mostra a fotografia.

Balcões

O balcão saliente é uma característica tipicamente barroca, muito usada em Macau. Dá relevo à monotonia da fachada e valoriza arquitectonicamente as casas da cidade. Protege do mau tempo, serve para observar o movimento da rua, e nos andares mais altos, para ter plantas.

O balcão é geralmente sustentado por uns suportes salientes, na parede exterior do prédio. Os suportes verticais são em forma de esbeltas colunas de ferro fundido ou de pedra. A parte central da plataforma saliente projecta-se em forma de bojo segmentado, formando uma linha curva na fachada do edifício. Quando observada numa fileira de casas, esta linha curva cria um movimento ondulante na fachada. O gradeamento é de fino trabalho em ferro, com padrões graciosos, ora chineses, ora portugueses.

CONSTRUÇÃO

Estrutura

A estrutura da maioria dos edifícios em Macau é formada pelas paredes mestras, suportando o piso e o telhado. A parede estrutural é preferida ao sistema de pilar e viga. Como a maioria dos edifícios de Macau é de vários andares há o problema de resistir aos tufões. Neste aspecto, a parede estrutural oferece uma solução melhor do que a estrutura em viga quando só se dispõe de materiais como a madeira, o tijolo e a pedra. As vigas de madeira, tão comuns entre os chineses, raramente são usadas em Macau.

O espaço entre as paredes estruturais é preenchido com traves de madeira, em intervalos curtos. O comprimento da madeira disponível limita a posição das paredes. Nas salas grandes, são utilizadas grandes vigas para suportar o piso, reduzindo assim o vão das traves. No caso do telhado substitui-se por uma armação de suporte. Para pequenos vãos, usam-se barrotes de secção redonda.

Alicerces

Os alicerces são construídos acima do nível do chão, por vezes 3 ou 4 pés. A pedra é o material mais empregue. Quando é usado cascalho, este é rebocado para esconder as irregularidades. A maioria das vezes, o trabalho de alvenaria é revestido com pedra de cantaria de excelente argamassa.

Nos terrenos em declive, os alicerces muitas vezes constituem a parede da cave, com uma parte acima e outra abaixo do nível do solo. Neste caso, o alicerce funciona como parede de arrimo.

Nos pavilhões de jardim, os alicerces são, por vezes, um pequeno podium, no qual assenta a estrutura do edifício.

Paredes As paredes são espessas e bem construídas, já que constituem a estrutura do edifício. A espessura da parede também ajuda a fornecer isolamento térmico. Os edifícios antigos de Macau usavam "chunambo" para as paredes, uma mistura de terra, palha e cal, tudo desfeito e misturado com conchas de ostra. As paredes assim, ficam espessas e resistentes. Quando aquela mistura é aplicada nas paredes exteriores elas tornam-se muito resistentes. A maioria das fortalezas e muralhas da cidade, construídas nos primeiros tempos, eram deste material. O tijolo era o principal material de construção utilizado. Extremamente duro e resistente, vinha do sul da China; era bem cozido, e a mistura, ligada por um aro de metal, era constituída por excelente argila azul acinzentada. Era cozido em forno de carvão, e por vezes, tinha o cunho do oleiro gravado. 25 Quando uma parte velha do Seminário de S. José foi deitada abaixo, alguns tijolos foram analisados na Universidade de Hong Kong, e apesar de terem cerca de 300 anos, provaram ser de melhor qualidade do que os da London Stock ou da Fletton. 26 Eram tijolos de grandes dimensões, medindo 14"x 41/2"+3". Os tijolos castanho pálido, secos ao sol, são raramente usados. As paredes totalmente de pedra eram pouco usuais nas casas de habitação. A maioria das vezes, eram uma combinação de pedra e tijolo, pedra na parte inferior da fundação e tijolo na parte superior. O mármore é geralmente reservado para os interiores.

Colunas de madeira, pavilhão na Avenida Horta e Costa, 7.

O Iong Sam Tong no Jardim Lou Lim Ieoc. Todo o edifício está construído acima do nível do chão com um alicerce em pedra. As colunas de madeira são ligadas por vigas de madeira, também. Na extremidade inferior, o pedestal de pedra impede a entrada de humidade na madeira.

As colunas ou pilares de tijolo geralmente suportavam o peso dos arcos. São, na maioria das vezes, encontrados nas varandas ou nas galerias à volta dos pátios. No interior das casas, o arco segmentado usa-se para ligar grandes espaços abertos, tais como o da entrada até à sala principal, situada depois do pátio central. Os arcos de tijolo e os pilares são invariavelmente decorados à maneira clássica. Os trabalhos em pedra ou em tijolo são raramente usados para os arcos, que na maioria das vezes são rebocados e pintados, com as molduras em branco.

Arcadas à volta do pátio interior, numa residência na Rua da Praia Grande, 47.

Este tipo de arcos tem características ocidentais e era muito usado na arquitectura de Macau. Os arcos no exterior dos prédios são geralmente de forma semicircular, apoiados em pesadas colunas de secção rectangular. As molduras à volta dos arcos são, por vezes, reforçadas com canas de bambu.

Pilares de tijolo nas arcadas de uma fachada, numa residência no Largo de S. Paulo.

O parapeito e as molduras dão grande ênfase à horizontalidade competindo com as linhas verticais dos pilares. O trabalho em pedra da fundação, actua como base estética do edifício, contrastando com as superfícies rebocadas das fachadas.

Telhados

Antes do aparecimento do betão armado em Macau, a maioria dos telhados tinham dois níveis de inclinação, com a madeira usada como material principal para a sua estrutura. Quando as varandas em arcadas são utilizadas, aparecem, muitas vezes, encimadas por um telhado plano. Depois de 1900, os telhados planos tornaram-se cada vez mais comuns. Eram geralmente construídos em betão, e suportados por paredes ou colunas de tijolo. O telhado plano oferece espaço adicional para secagem ou para recreio, e torna-se, rapidamente, muito popular.

Disposição das telhas num telhado chinês, Rua da Praia Grande, 83. As telhas estão colocadas em duas camadas, com respiradouros colocados a intervalos regulares. A argamassa de cobertura dá protecção adicional aos lados das telhas quadradas.

Seminário de S. José. Vigas de madeira com as extremidades expostas por cima da empena.

Uma estrutura de telhado tipicamente chinesa.

Residência na Rua da Praia Grande, 83. Os vigamentos redondos assentam nas empenas. Os tectos muitas vezes não existem, ficando a parte debaixo do telhado exposta ao interior, com as madeiras pintadas de preto.

Quase todos os telhados inclinados, em Macau, são de construção chinesa. A estrutura é constituída por terças de varas de madeira dispostasà volta, abrangendo a parede de um lado ao outro. Quando não existem grandes vãos, são usadas treliças como suportes intermédios. A limitação relativamente ao comprimento da madeira existente, restringe o vão até 20 pés, na maioria dos casos. Este vão determina a posição das paredes.

No cimo das terças existem vigas em ripa fina, suportando a camada dupla de telhas de barro. As telhas são dispostas alternadamente em cumeeira e entalhos, formando uma série contínua de canais ao longo da inclinação do telhado. A camada inferior é composta por peças finas e quadradas, dispostas lado a lado, em fileiras ascendentes com os bordos sobrepostos. Os bordos das telhas são cobertos por outras semicirculares que ficam presas e são cobertas com argamassa. São feitos respiradouros para o espaço entre as duas camadas, em intervalos regulares. Não existem caleiras, quando os beirais são projectados para fora da parede exterior. Quando o telhado termina em parapeito existe um rego atrás do parapeito que conduz a água da chuva até aos tubos de drenagem.

As chaminés não são geralmente usadas em Macau. As cozinhas são muitas vezes construídas num edifício separado, no quintal, e não há geralmente lareiras nestas casas.

A predominância da influência chinesa na construção do telhado é devida à disponibilidade de materiais, e à qualidade aliada à sua aplicação. É preciso notar que muitos edifícios em Macau têm uma fachada inteiramente ao estilo ocidental, escondendo um telhado chinês por detrás.

Não é raro encontrar-se, em Macau, um edifício cujo exterior seja chinês enquanto o interior tenha características ocidentais. Isto, não é só verdade no que diz respeito à decoração, mas também na construção do edifício. Os exemplos apresentados provam isto. O telhado do edifício, juntamente com as colunas de madeira do átrio em frente da casa, são tipicamente chineses. Contudo, as armações para suporte que se encontram no interior, apoiando-o em pontos intermédios, são ocidentais. A construção é uma mistura de métodos portugueses e chineses. O peso do telhado é suportado pela fila de colunas de um dos lados e por uma parede estrutural do outro.

Pavilhão na Avenida Horta e Costa, 7. A fachada do pavilhão.

Pavilhão na Avenida Horta e Costa. A estrutura do telhado exposta ao interior.

Parapeitos

Os parapeitos são vulgarmente usados em Macau. Aqui, segue-se o modelo ocidental. Está associado tanto aos telhados inclinados como aos planos. Visualmente dá ênfase à horizontalidade como fronteira entre o edifício e o céu. Actua como remate de todas as linhas verticais do edifício. Nas casas chinesas de um só piso, o telhado, com cumeeira e beiral, tinha a mesma função. Contudo, nas construções de vários pisos, a cumeeira dos telhados inclinados não se vê da rua. Nestes casos, o parapeito, juntamente com os ornatos nas cornijas, daria a ênfase à horizontalidade para compensar as linhas verticais do edifício, que vêm sobretudo das grandes aberturas das janelas. Assim, a utilização desta característica ocidental realça a beleza do edifício, e quando encontrado numa fileira de casas ao longo duma rua, ajuda a dar um caracter uniforme à paisagem urbana.

O parapeito ocidental é, por vezes, utilizado em conjunto com características chinesas, tal como a decoração dos beirais nos telhados chineses, ou as obras em gesso nas decorações chinesas.

Pavilhão de residência na rua Horta e Costa, 7. O parapeito ocidental, é usado com motivos decorativos chineses, os beirais virados para cima, em porcelana. As colunas parecem ocidentais, enquanto o gradeamento de madeira é chinês. O jardim circundante é de desenho chinês.

Residência na Rua do Bazar. Um típico beiral chinês em talha, com cores brilhantes, encimado por um parapeito ao gosto ocidental, usando tijolos vidrados, de forma quadrada, para as almofadas das janelas.

Residência na Avenida de Ouvidor Arriaga. O parapeito ocidental está decorado com trigramas chineses no frontispício.

PORTAS

Nos edifícios onde a principal área de habitação fica no rés-do-chão, a entrada principal está equipada com dois ou três conjuntos de portas. O externo, que abre para fora, é uma porta de duas folhas, à altura dos olhos, para proteger a privacidade. A intermédia, é uma porta de correr, gradeada com barras de madeira de secção redonda, por uma questão de segurança, enquanto mantém a ventilação e ilumina o interior da casa. Na parte interior, é de construção sólida, abrindo para dentro da casa e está sempre fechada durante a noite. Em algumas casas, o conjunto exterior era suprimido.

A entrada está alguns degraus acima do nível da rua, e recuada da linha do beiral, de modo a formar um átrio na fachada da casa.

Nestes edifícios onde o piso principal fica no andar superior, para onde se sobe por uma escada exterior situada no pátio, as portas da entrada principal são de desenho mais simples. É apenas usado um conjunto de portas.

Residência na Rua Central. Quando o parapeito não é usado, o beiral é prolongado para além das paredes exteriores, dando protecção ao topo da parede.

Portas de entrada principal, na Rua da Praia Grande, 47. Notar que o conjunto interior de portas é de desenho ocidental, enquanto que os outros dois são tipicamente chineses.

No interior, a parte de cima das portas, tem bandeiras que permitem a entrada de ar e luz. Por vezes, são usados dois conjuntos de portas, sendo o de fora tipo persiana, e o de dentro de construção sólida.

As portas são invariavelmente feitas de madeira. A teca é usada para as melhores e a san cheung para as mais vulgares. O madeiramento é normalmente pintado, as portas exteriores de cores escuras, castanho ou preto, as interiores de creme. O vidro das bandeiras é, por vezes, em vitral de cores brilhantes. Quando a porta se abre numa parede mestra, esta é rematada por um arco ou por um caixilho. Para as portas exteriores é muito usada a moldura de madeira, a contrastar com a superfície estucada da parede.

Residência na Rua Formosa. Uma entrada tipicamente chinesa, ligeiramente recuada para trás da linha do beiral, e um degrau acima do nível da rua.

Entrada de um beco comunitário. A abertura é construída em pedra.

A parte superior da entrada está protegida por telhas chinesas.

Portão de entrada no pátio de uma casa portuguesa.

O frontão ao estilo ocidental é aqui empregue juntamente com motivos chineses no topo do muro.

Escada exterior de material resistente que conduz a um átrio de entrada.

Tipicamente português.

Portas ao longo de corredor, Seminário de S. José

JANELAS

As janelas exteriores dos edifícios em Macau podem ser, grosseiramente, divididas em dois tipos: as do rés-do-chão e as dos andares superiores.

As do rés-do-chão têm geralmente moldura em pedra, protegidas com fortes barras de ferro, como segurança. Nos edifícios mais antigos, não há janelas colocadas nas aberturas, já que o rés-do-chão não é para habitação, mas sim para arrecadação. Nas casas de construção mais recente, as janelas têm persianas ajustadas.

As janelas dos andares superiores são altas, indo quase do tecto ao chão. A abertura está dividida em dois conjuntos de janelas, estando o mais baixo à altura da cintura.

Portas no Templo de Kun Yam.

São portas tipicamente chinesas, de vaivém.

São usadas finas lâminas de concha de ostra como substituto do vidro, usado em todos os edifícios dos primeiros tempos de Macau.

Porta da passagem à volta do pátio interior, Templo de Kun Yam.

Janelas do rés-do-chão de uma casa portuguesa.

As janelas são invariavelmente feitas de madeira. Antigamente, eram usadas finas lâminas de concha de ostra em vez de vidro. Permitem a entrada de luz suave para o interior das casas. As persianas de madeira são encontradas em quase todos os edifícios de Macau. Como as persianas são ajustáveis, servem para regular em ângulos diferentes, de acordo com a posição do sol. São geralmente pintadas de castanho ou verde escuro.

A abertura da janela é muitas vezes encimada por um lintel de pedra ou madeira. Por vezes, existe um arco em tijolos. A moldura de pedra não tem qualquer tipo de acabamento e contrasta com a superfície rebocada da parede. Por cima da janela, uma pequena cornija oferece a protecção necessária.

As janelas são amplamente espaçadas, para dar ritmo à verticalidade do edifício, um método muito usado em Portugal, no desenho de alçado. As fortes linhas verticais oferecidas pelas grandes aberturas das janelas, competem com a pequena cornija e o parapeito no topo do alçado, para obter equilíbrio.

Janelas no andar superior, numa casa da Rua da Felicidade.

Como a parede da fachada da casa não é estrutural, as janelas ocupam o todo da fachada.

Janela no primeiro andar de residência no Largo de S. Lázaro.

As conchas de ostras são usadas na fenestração. O conjunto de janelas interior, impede que se veja do exterior, permitindo o máximo de ar e iluminação.

As janelas que dão para o pátio interior ou saguão são muitas vezes de desenho delicado. No caso de um saguão encimado por uma clarabóia, as janelas ocupam toda a parede de lado do saguão e oferecem uma excelente oportunidade para o carpinteiro transformar o conjunto num biombo de fino rendilhado. São usados vitrais para dar uma luz difusa aos espaços interiores.

Janela no primeiro andar, residência na Rua de S. Lourenço.

Clarabóia de residência na Avenida Horta e Costa, 7. O desenho, em vitral, é ao gosto ocidental.

Janelas viradas para o saguão, numa residência da Rua da Praia Grande, 47. São janelas típicas chinesa que rodam em gonzos, com poemas chineses escritos nos vitrais.

ORNATOS

Faianças

A influência chinesa é predominante no caso das faianças decorativas. Encontram-se em quase todos os prédios, em Macau. Os mais comuns são as telhas quadradas de terracota nos painéis usados no alto das paredes, ou para formar um rendilhado nas aberturas das janelas. São geralmente verdes e fixos com argamassa.

Painel chinês, de terracota, no cimo de parede estrutural, S. Lourenço.

Telhas de terracota nas aberturas das janelas viradas para um pátio, uma casa portuguesa.

Tijolos de construção usados como gradeamento.

Telhas comuns formando um bonito padrão em grelha, no cimo de uma parede, residência na Travessa dos Anjos, 24.

As influências portuguesas são encontradas, principalmente, nos vasos de louça vidrada usados como balaústres em jardins e parapeitos, e os azulejos. Os primeiros são muito comuns em Macau, muitas vezes usados em conjunto com ornamentos de características chinesas; contudo os azulejos raramente são usados. Como são de fabricação portuguesa, são muito caros e difíceis de obter. Por isso, são usados em pequenas quantidades, debaixo dos beirais ou, no interior, como revestimento na parte inferior das paredes.

Reboco

As características portuguesas e chinesas das obras em gesso estão indiscriminadamente misturadas nos edifícios de Macau. Como o trabalho em gesso é a forma mais barata de ornamentação, encontra-se mesmo nas casas pobres.

Vasos verdes de louça vidrada, no Jardim de S. Francisco.

Azulejos portugueses usados sob o beiral de um edifício, Macao Youth Club, Avenida da República.

Tubo de drenagem da água pluvial, residência na Rua da Praia Grande, 47.

Residência na Travessa dos Anjos.

Friso decorativo, tipicamente chinês, debaixo do beiral. Os desenhos são pintados de cores brilhantes.

O Templo de Kun Yam.

Trabalho em gesso na bandeira de uma porta em arco.

Residência na Rua da Praia Grande, 83. Motivos ornamentais clássicos no topo da coluna. Notar que o trabalho em ferralharia do gradeado é de desenho chinês. As persianas por cima do gradeado dão privacidade à varanda.

As influências chinesas são predominantes na ornamentação dos tubos de drenagem pluvial. São tubos em terracota, com 4" de diâmetro e 2-4' de comprimento. São revestidos de gesso no exterior, têm a forma de secções de bambu, uma característica típica do Sul da China.

Por vezes, podem ser vistos em fachadas estilo ocidental como motivo ornamental.

Debaixo dos beirais dos telhados chineses encontram-se, muitas vezes frisos de figuras moldadas em barro, pintadas de cores alegres, acompanhadas de versos de poetas famosos.

As influências portuguesas são principalmente encontradas na ornamentação das cornijas, dos parapeitos e na aplicação de motivos clássicos na fachada dos edifícios.

Alvenaria

A ornamentação com alvenaria não é vulgar nos prédios de habitação. É principalmente associada a edifícios públicos e religiosos. A alvenaria é usualmente encontrada em gradeamentos, medalhões comemorativos, candeeiros e molduras de aberturas. No último caso, é geralmente plana. Fachadas em pedra são raras, sendo o melhor exemplo a da Igreja de S. Paulo, que mistura influências da arte ocidental e oriental.

Motivos ornamentais no muro do parapeito, residência na Rua da Praia Grande, 47 Estes motivos ajudam a quebrar a linha recta do muro do parapeito.

Ornatos na cornija, residência na Rua do Seminário. 5-7.

Medalhão comemorativo no Leal Senado.

Os candeeiros de cada lado da escadaria são de pedra.

O gradeado em pedra no Templo de A-Má.

A ornamentação é tipicamente chinesa.

Reproduções de Journal of Oriental Studies, Vol. I, No. 2, July, 1964.

A fachada de S. Paulo é um sermão em pedra executado com ideias e motivos ocidentais mas por artífices chineses, com influências da arte oriental.

O tímpano (primeira fileira): alçado, planta e secção.

Desenhado por Wong Tin Chun e Ho Kum Kee.

O quarto andar (segunda fileira): parte do alçado, planta e secção. Desenhado por Jackson Wong, Ho Kom Kee e Loke Chong Yoof.

O segundo andar (quarta fileira): parte do alçado e parte da planta. Desenhado por Ng Chun Man, Jackson Wong e Wong Siu Ling.

Ferralharia

A ferralharia com fins ornamentais é, principalmente em ferro fundido ou ferro forjado. Como nos balaústres, cercas, guardas de janelas ou portões, o desenho é muitas vezes de padrão complicado constituído por peças-modelo dando ênfase à verticalidade. O metal é geralmente pintado de verde ou castanho escuro.

Primeiro andar (entrada): parte do alçado e parte da planta. Desenhado por Wong Siu Ling, Ng Chun Man e Doreen Young.

Protecção de ferro em janela de rés-do-chão, residência na Rua da Praia Grande. O padrão é tipicamente ocidental.

Gradeamento à volta do saguão, residência na Rua da Praia Grande, 47.

O desenho do gradeamento de ferro é ocidental, enquanto que o trabalho de carpintaria debaixo das vigas de madeira, é tipicamente chinês.

Sebe de jardim, residência na Rua Praia do Bomparto.

O padrão do gradeamento é ocidental.

Gradeamento de varanda, residência na Rua da Praia Grande, 83.

É costume entre os chineses ricos ter o apelido da família incorporado no desenho do gradeamento de metal.

Gradeamento na varanda da residência na Rua da Praia Grande, 47.

O efeito geral é chinês, mas são encontrados alguns motivos ocidentais

no desenho, quando comparado com os padrões tipicamente

portugueses e chineses dos exemplos anteriores.

Carpintaria

O trabalho de carpintaria em motivos ornamentais está principalmente associado ao interior dos edifícios. A teca é o material mais comum usado para trabalhos mais delicados, em talha. É, muitas vezes, envernizada ou deixada sem acabamento, deixando à vista os veios da madeira natural.

A porta de entrada é ornamentada com motivos ocidentais, mas feito com mão-de-obra chinesa.

Talha debaixo de vigas, residência na Rua da Praia Grande, 47.

Talha por cima da porta na Rua da Praia Grande, 83. Os motivos salientes são pintados em dourado.

Fino rendilhado na parede lateral do saguão.

Decoração Interior

O interior das casas de habitação em Macau, é decorado com uma mistura de influências portuguesas e chinesas. As paredes da sala principal são, muitas vezes, cobertas com pinturas ou caligrafias chinesas. A disposição chinesa do mobiliário é geralmente mantida, com as cadeiras ao longo das paredes da sala e uma grande mesa ao centro. O mobiliário de melhor qualidade é em teca ou ébano com embutidos em mármore. Encontram-se muitas vezes espelhos no patamar das escadas.

Abertura circular num painel de talha delicada.

Lanterna sobre o altar do Céu, na Rua da Praia Grande, 47. As lanternas chinesas são mais para fins decorativos e de cerimonial do que para iluminar.

Candeeiro de tecto ocidental, suspenso de tecto de madeira contra um fundo de decoração chinesa.

Interior da sala principal. Rua da Praia Grande. 47.

ARQUITECTURA PAISAGÍSTICA

Tanto na filosofia como no desenho dos jardins, os chineses são completamente diferentes dos portugueses. Para os primeiros é, antes de mais, arte pictórica servindo de apoio à contemplação, para os outros, razão e fórmula. Assim, no que diz respeito ao desenho do jardim, há poucas influências mútuas chinesas e portuguesas. Contudo, os vários traços decorativos podem mostrar, em alguma medida, as influências mútuas, muitas vezes na aplicação dos materiais, e, por vezes, no desenho dos padrões.

Muitas vezes não existem tectos. Encontram-se apenas nas casas.

São de desenho ocidental.

Tecto na Rua da Praia Grande, 83. Quando o betão é usado na construção das casas, a parte inferior é rebocado e ornamentado.

O velho palacete da Flora na Avenida Sidónio Pais destruído pela explosão de um paiol próximo. Desenho tipicamente português, formal e geométrico, axial e simétrico, o desenho foi completamente transformado.

Jardim traseiro do "Notícias de Macau" na Calçada do Tronco Velho. As colunas de pedra, dos dois lados da álea, suportam latadas de lindas trepadeiras. A planta do jardim aparece na página seguinte.

Planta do jardim traseiro do "Notícias de Macau", na Calçada do Tronco Velho.

É um desenho de jardim tipicamente português, para uma casa de habitação, com uma álea coberta que conduz a um espaço aberto e circular ao centro, árvores e plantas dos dois lados da álea. Entre o jardim e a porta do edifício há um átrio coberto.

Jardim de Lou Lim Ieoc, Avenida Horta e Costa, 7.

A ponte de nove curvas atravessando o lago artificial.

CONCLUSÃO

As influências mútuas da arquitectura chinesa e portuguesa não estão distribuídas de igual modo por todo o edifício, sendo alguns aspectos mais salientados, outros menos. Devido ao diferente modo de estar na vida dos chineses e portugueses, a simbiose de influências não causa muitas alterações quer na planta típica chinesa quer na portuguesa. E na construção e decoração que as influências são mais importantes e visíveis. As ideias e as formas são desenhadas livremente quer ao nível da arquitectura chinesa quer portuguesa, de forma a criar um edifício funcional e sólido. A mistura de motivos ornamentais chineses e portugueses nas várias partes do edifício infunde um interesse especial à arquitectura de Macau. Dão realce um ao outro, emprestando ao edifício vivacidade e cor. Assim, o resultado das influências mútuas em Macau é melhor do que quando é empregue apenas um tipo de arquitectura.

As influências mútuas da arquitectura chinesa e portuguesa produziram um tipo especial de arquitectura mais conveniente para as condições especiais de Macau. Este estilo, embora contento elementos chineses e portugueses, é elegante e harmonioso. Os dois estilos ligaram-se de forma a criar uma nova identidade. As qualidades de cada um foram, em Macau, adoptadas para encobrir os defeitos do outro.

O muro do jardim. As ornamentações nas aberturas do muro são chinesas, ainda que a forma das separações verticais pareça mais ocidental do que chinesa.

O pavilhão ao fundo do lago artificial. Neste edifício vê-se uma mistura de características ocidentais e chinesas.

CAUSAS DAS INFLUÊNCIAS MÚTUAS

Exigências climáticas

Tanto Portugal como Macau gozam de um clima momo, temperado, onde o sol e o ar constituem o principal problema a resolver. Assim, muitas das ideias e técnicas familiares aos portugueses, no seu país, aplicam-se também a Macau. O uso da varanda e das persianas ajustáveis, ao gosto de Portugal, é apropriado para o clima tropical. Assim, a partir de exigências funcionais, os portugueses introduziram a sua própria arquitectura em Macau.

Disponibilidade dos materiais de construção

Quando os Portugueses constróem as suas casas em Macau, têm dificuldade em obter material de Portugal, com excepção de algum, muito específico. Deste modo, tinham que utilizar os materiais de construção chineses, locais. Gradualmente, tomaram-se familiares com as técnicas associadas usadas para a aplicação destes materiais.

Os construtores chineses, em Macau, por outro lado, achavam difícil encontrar madeira de boa qualidade para a construção tradicional chinesa. Os tijolos e pedra tinham de ser usados como substitutos na maioria das construções. As estruturas de suporte em alvenaria acarretavam problemas novos, particularmente no que diz respeito às aberturas nas paredes estruturais. A este respeito, os Portugueses pareciam ser mais talentosos e apresentavam melhores soluções.

Exigências do terreno

Devido ao grande desenvolvimento de Macau, era inevitável a construção de edifícios de vários andares. As técnicas portuguesas de construção eram mais apropriadas para esta finalidade, com os materiais disponíveis em Macau. Assim, muitas das casas apresentam influências portuguesas na construção.

Empregar o mesmo empreiteiro

Os portugueses que se fixavam em Macau eram em pequeno número. Para construir suas casas tinham de recorrer a construtores locais, chineses. Ao fazerem isto, apresentarem as técnicas chinesas de construção aos portugueses. Os chineses também aprendiam com os portugueses, e quando construíam para o chineses, introduziam ideias e características portuguesas na arquitectura chinesa.

Tendência para a ocidentalização

Nos finais do séc. XIX, havia uma grande tendência entre os chineses para adoptar os padrões de vida e a tecnologia ocidentais. Quando construíam as suas casas, a tendência era fazê-lo ao estilo ocidental, pelo menos no exterior. Contudo, muitas vezes, as tradições chinesas eram ainda fortes. Isto reflectia-se nos interiores e decoração, que continuava predominantemente ao estilo chinês.

Composição da população

Nos primeiros tempos, a população de Macau era composta principalmente por portugueses, havendo poucos colonos chineses. A arquitectura portuguesa dominava a indústria da construção. Depois do séc. XVII, a maioria da população era chinesa, e muitos portugueses casaram com chinesas, e por isso, tornaram-se mais chineses do que portugueses, no modo de vida. Tornou-se difícil, portanto, encontrar uma casa de habitação puramente ao estilo chinês. Havia mais casas chinesas construídas sob influência portuguesa do que ao contrário. Além disso, as relações amigáveis entre os dois povos encorajavam estas influências. A ausência de ressentimentos e desconfianças tornava mais fácil a aceitação das influências um do outro.

APÊNDICE NOTAS SOBRE A ARQUITECTURA DE HABITAÇÃO CHINESA

Planta

A arquitectura doméstica é um reflexo da ideia chinesa de família. A família é considerada a unidade básica do país. É altamente autónoma, e gere os seus próprios assuntos. Desempenha um papel importante no estabelecimento de padrões de ordem social, e ajuda a fomentar o sentimento de unidade entre os seus vários membros.

Uma casa tipicamente chinesa consiste numa série de moradias individuais dispostas em redor de um pátio central. São geralmente de um só andar e desenvolvem-se horizontalmente, aumentando o número de pátios. Sob o ponto de vista arquitectónico, o pátio central exprime a identidade da família, e é um espaço funcional em termos de luz e ventilação, funcionando também como espaço de habitação exterior. A planta da casa fornece os espaços de intimidade necessários à vida da família, e contudo une os seus membros por laços de interesse e companheirismo.

A planta baseia-se no conceito de axialidade e simetria, com o eixo central correndo ao longo das divisões mais importantes. É aqui que estão situados os aposentos do chefe de família e a sala principal. A importância é, além disso, acentuada pelo seu desenho simétrico, com tectos mais baixos para os dois aposentos laterais. O local é determinado pelo Feng Shui, e todas as construções importantes estão viradas a sul.

Os limites funcionais e integrais da família são definidos por um muro alto, apenas entrecortado pelas portas necessárias e oferece o máximo de privacidade a todas as actividades da família. Todas as janelas dão para o pátio.

Construção

A estrutura consiste num telhado apoiado em colunas de madeira com os intervalos preenchidos com tijolos ou pedras. A armação do telhado é primeiro montada no chão e depois subida. As colunas são colocadas em posição de a aguentar. As colunas não ficam enterradas no solo mas apenas assentes em pedestais de pedra. A maioria das colunas é lisa, de secção quadrada ou redonda. A estabilidade da estrutura depende da armação de madeira; as paredes, de blocos de pedra ou tijolos não funcionam como apoios. O espaço é inteiramente ocupado por portas e janelas rendilhadas, num fino trabalho de carpintaria.

Os tijolos são o principal material usado, geralmente cozidos até obterem a cor cinzenta. A pedra é mais usada para os alicerces e pavimentos. As telhas são universalmente usadas para os telhados. Os telhados planos são raros, e não se vêem chaminés nas casas chinesas. O chão é, de tijolo largo e grosso de cor avermelhada, ou de cimento.

Portas e janelas

Na entrada principal, a parede é muitas vezes recuada em relação ao beiral para criar um átrio coberto. A porta de entrada está normalmente mais alta uns degraus em relação ao nível da rua. As portas giram sobre gonzos de madeira encaixando no lintel e na soleira. Um biombo móvel é colocado no interior para dar privacidade.

O muro do pátio é geralmente composto por portas e janelas, protegidas do clima por uma varanda ou grandes beirais. É usado o papel de arroz em vez do vidro. No sul da China, como substituto, são usadas pequenas lâminas de concha de ostra cortadas em quadrados ou polígonos.

Desenho da fachada

A parte principal de um edifício chinês não é a empena, mas a fachada. Assim, nem os telhados nem as empenas têm uma importância preponderante. Com as linhas verticais e horizontais das colunas e vigas, os beirais e cumeeiras dos telhados, o ritmo do vertical e horizontal é enfaticamente acentuado. É adicionada vida arquitectónica nas construções, no desfazer da linha recta especialmente nos telhados. A superfície do telhado e das empenas são ricamente ornamentadas com muitas linhas e superfícies suaves, de modo a harmonizar melhor com a irregularidade de linhas da paisagem circundante.

Ornamentações

Na maioria dos edifícios chineses, o telhado é a única parte ornamental. As paredes são quase sempre rebocadas, e quando o não são, os tijolos são cobertos de boa argamassa. Em lugar de uma cornija ampla, o topo da parede é frequentemente decorado com um friso de motivos de barro pintado,em baixo-relevo. Telhas verdes envernizadas, a formar uma espécie de grade, são usadas para as aberturas das paredes.

Os tectos, não são sempre usados, sendo o telhado a única cobertura dos quartos. Talhas de madeira adornam as cornijas dos quartos e as bandeiras das portas. As carpetes não são muito usadas. O mobiliário é do mesmo grau de qualidade do usado na Europa. A iluminação é feita com candeeiros a óleo e velas. As lanternas são mais utilizadas para fins decorativos e rituais nas festas e celebrações.

Conclusão

A casa chinesa oferece isolamento do mundo exterior. Dentro dos muros, o espaço interior combina livremente com o exterior através de varandas e pátios, Vê-se quase todo o céu, por cima dos telhados baixos. O desenho do edifício, como um todo, expressa o desejo interior de união do homem com a natureza. É o princípio que está por detrás da construção que dá à arquitectura chinesa uma característica distinta.

NOTAS SOBRE A ARQUITECTURA DOMÉSTICA PORTUGUESA

Planta

O pátio central é um traço característico da arquitectura portuguesa. Encontra-se em quase todas as construções excepto nas mais pequenas. A planta é quase sempre centrípeta com os vários elementos da planta empurrados para os lados do pátio em vez do centro. Os pátios são rodeados de galerias em todos os andares, que servem de ligação e protegem do sol.

Planta de casa antiga

Passando a porta de entrada principal aparece um pátio aberto, donde sobe uma escada para o andar superior. A escada é uma estrutura permanente de pedra ou tijolo. A sala e o escritório formam os aposentos principais e ficam por cima do piso de arrecadação. Os quartos comunicam uns com os outros, ou dão para um corredor.

Construção

O princípio de construção usado é o do telhado apoiado em duas paredes paralelas, e fechado em todas as extremidades por uma parede de empena. As paredes-meias são usadas como suporte das vigas de madeira dos andares superiores. Os telhados de inclinação baixa são cobertos de telhas curvas, vermelhas. As chaminés são um elemento interessante de sua forma longa e estreita. O chão é pavimentado com tijoleira baça.

As varandas são muitas vezes usadas nas casas da cidade. As traves de madeira das varandas são apoiadas em suportes projectados da parede. O gradeamento, em finas pilastras de madeira ou em bela ferralharia.

Janelas

Nas casas pobres, mais pequenas, as janelas têm caixilhos de madeira. Nas casas construídas com materiais mais resistentes, é usada a moldura em madeira. Os batentes das janelas são, por vezes, subdivididos por travessas horizontais e por traves verticais que permitem ventilação para o interior da casa, com a máxima segurança. As janelas são amplas e espaçadas.

O desenho da fachada

As casas da cidade são geralmente de dois andares e de alçado pouco apelativo. De fora, as casa são austeras e pouco convidativas. As paredes, de alvenaria são rebocadas para eliminar as irregularidades. Estas são lisas e caiadas em vários tons de pastel. A horizontalidade é marcada, introduzindo um friso de ornatos na separação dos pisos. As fachadas contam com a disposição das janelas para produzir algum efeito. A verticalidade é marcada utilizando as próprias aberturas. A clássica cornija dos beirais concorre com as fortes linhas verticais das grandes aberturas das janelas.

Os alicerces de pedra são construídos à superfície do solo e actuam esteticamente na composição, articulando o trabalho de alvenaria com a concepção rústica. A superfície rebocada contrasta com o trabalho de alvenaria em redor das aberturas.

Ornamentos

A madeira é muito usada para trabalho de decoração de interiores, nas arcas clássicas e no elaborado revestimento das paredes. O tecto dos quartos principais são forrados de madeira trabalhada.

O trabalho em telha é a característica mais predominante das construções portuguesas. Os azulejos decorativos, tipicamente portugueses, são usados com grande mestria. O pavimento é sempre branco com um tom ligeiramente azulado. As cores mais usadas são o azul, verde, amarelo e mais raramente o castanho. Os padrões são de grande variedade; alguns de geometria mourisca, outros clássicos, e outros naturalistas.

O trabalho em metais é usado nos exteriores, nas barras para as janelas e gradeamento dos balcões. Normalmente estão colocados verticalmente, pouco espaçados, em forma de elegantes balaústres.

Conclusão

A arquitectura portuguesa não é um estilo em si. Tem algumas características locais mas é muito influenciada pela arquitectura dos países vizinhos, mourisca nos primeiros tempos, italiana e francesa posteriormente.

Traduzido do inglês por Iva Flores.

- Pórtico de três arcadas. Dórico sem pedestal.

- Ordem dórica proposta para imagem acima.

Detalhes. Balaústres de uma casa da época de Luís XVI, Rua de Tournon.

NOTA DO AUTOR

O autor tem o prazer de aqui expressar a sua gratidão e reconhecimento para com C. H. Wong, professor associado do Departamento de Arquitectura da Universidade de Hong Kong, pela orientação prestada durante a preparação desta tese; a H. G. Hollmann, professor associado do Departamento de Arquitectura da Universidade de Hong Kong pelas suas sugestões valiosas; a L. G. Gomes, ex-Bibliotecário da Biblioteca Central de Macau e curador do Museu Luís de Camões pela fontes sobre vários edifícios históricos de Macau; a J. Graça pela grande ajuda prestada na tradução de textos do Português para Inglês; a Henrique de Senna Fernandes, ex-Director dos Serviços de Turismo de Macau, pela informações gerais sobre Macau; a L. K. Sit do Colégio Pui Ching pelas informações sobre a residência e jardim de Lou Kou; e last but not the least, a todos os cidadãos de Macau pela ajuda e cooperação durante a pesquisa arquitectónica dos seus edifícios.

BIBLIOGRAFIA

História de Macau

Pereira, J. F. Marques, Ta -Ssi- Kuo, Lisboa, 1899 -1902.

Morse, H. B., The International Relations of the Chinese Empire, London, 1910-18.

Pereira, A. F. Marques, Ephemerides Commemorativas da Historia de Macau, Macau, 1863.

Montalto de Jesus, C. A., Historic Macau, Hong Kong, 1902.

Boxer, C. R., Fidalgos in the Far East, The Hague, 1948.

Boxer, C. R., Macau na Época da Restauração, Macau, 1942.

Tcheong-U-Lam e Ian-Kuong-Iam, Ou-Mun-Lei-Leok tradução do chinês por Luís G. Gomes, Macau, 1950.

Braga, J. M., The Western Pioneers and Their Discover of Macao Macau, 1949.

G. Gomes, Luís, Efemérides da História de Macau, Macau, 1954.

Gomes, Artur Levy, Esboço da História de Macau, Macau,1957.

Visconde de Santarém, Memória sobre o Estabelecimento de Macau, Lisboa, 1879.

Descrição

Braga, J. M., Hong Kong andMacao, Hong Kong, 1960.

Braga, J. M. Pituresque Macao, Macao, 1926.

Simpson, C., Asia's Bright Balconies, Sydney, 1962.

Macau, comemorações do 40° aniversário da Revolução Nacional, Macau, 1967.

Chater, Sir C. P. The Chater Collection, T. Butterworth, London, 1924.

Guignes, M. de, Voyages a Peking, de L'imprimerie Imperiale, Paris, 1808.

Allom, T., The Chinese Empire, Illustrated, 4 Vols., London Print. Pub. Co., 1858.

Ljungstedt, A., Portuguese Settlements in China, J. Munroe, Boston, 1836.

Cummins, J. S., The Travels and Controversies of Fr. D. Navarrete, 1618-1686, Cambridge, 1962.

Downing, C. T., The Fan-Qui in China in 1836-7, 2 Vols., H. Colburn, London, 1838.

Anderson, A., Narrative of the British Embassy to China, J. Debrett, London, 1795.

Davis, S. F., The Chinese, C. Knight & Co., London, 1840.

Liddelt, T. H., China, Its Marvel and Mystery, C. Allen, 1909.

Ball, J. D., Macao, the Holy City, the Gem of the Orient Earth, China Baptist Publication, Canton, China.

Yvan, Dr., Six Months among the Malays anda Year in China, J. Blackwood, 1855.

China Repository, Vol. I, 1832, Vol. IX, 1840, Canton, China.

Rand, C., Hong Kong, The Island between, A. Knoff, New York, 1952.

Peplow, S. H. e Barker, M., Hong Kong, Around and About, Ye Olde Printerie Ltd., Hong Kong, 1931.

Macao Guide-Agência Geral do Ultramar, S. C. M. P., 1950.

Boletim de Macau - Centro de Informação e Turismo, Macau.

Hilliard, H., My Mother's Journal, Boston, 1900.

Arquitectura

Henriques, A. C., Monumentos Nacionais Existentes na Província de Macau - A. C. Henriques, Edições Círculo Cultural de Macau, 1956.

Boletim do Instituto Lu]s de Camões, Vol. II, N°` 1, Outubro de 1967 - Museu Luís de Camões, Macau, Imprensa Nacional, 1967.

Macau Review, Vols. I-II, Nos. 1-12 - (Imprensa Nacional, 1929-30.

Joumal of Oriental Studies, Vol. I, No. 2, 1954, Vol. IV. Nos. 1-2, 1957-8, Vol. VI, 1961-4 - The Institute of Oriental Studies, University of Hong Kong, Hong Kong.

Arquitectura Chinesa

Boyd, A., Chinese Architecture and Town Planning, A. Tiranti, London, 1962.

Sickman, L. e Scoper A., The Art and Architecture of China, Penguin, 1958.

Willetts, W., Chinese Art, 2 Vols., Penguin, 1959.

Bushell, S. W. Chinese Art, H. M. S. O., London, 1904.

Arquitectura Portuguesa

Lino, A. Raul, A Casa Portuguesa, Lisboa, 1905.

Watson, W. C., Portuguese Architecture, A. Constable & Co., A Ltd, 1908.

Bottineau, Y., Portugal, Thames and Hudson, London, 1957.

Sampaio, Albino F. História da Literatura Portuguesa Illustrada, 4 Vols., Livraria Bertrand, Lisboa, 1929.

***** Ver referência para a Nota (1) na p. 160, p. 47.

****** Esta fachada sofreu profundas transformações quando foi convertida em lojas. Não há registo da fachada original. A abertura da Rua Pedro N. da Silva é muito tardia comparada com este edifício. Isto explica a razão da entrada principal dar para a estreita Travessa dos Anjos, em vez da rua principal, como hoje em dia.

NOTAS

1 Anuário de Macau - Centro de Informação e Turismo, ano 1967, Província Portuguesa de Macau, (Composto e impresso na Imprensa Nacional, Macau, 1967), p. 19-37, Demografia.

2 Ver referência para Nota (l), p. 7, Clima; e Anuário Estatístico de Macau, ano de 1966 - Repartição Provincial dos Serviços de Estatística, Província de Macau, Portugal (Imprensa Nacional, Macau, 1967.) pp. 14-16, Clima.

3 Ver referência para Nota (l) na p. 143, pp. 7-8, População, e Anuário Estatístico de Macau, ano de 1966 - Repartição Provincial dos Serviços de Estatística, Província de Macau, Portugal (Imprensa Nacional, Macau, 1967.) pp. 19-37, Demografia.

4The Western Pioneers and Their Discovery of Macao - J. M. Braga (Imprensa Nacional, 1949, Macao) p. 106, The Establishment of Macao.

5É dado um relato pormenorizado da lenda em Macau Histórico - C. A. Montalto de Jesus (Imprensa Salesiana, 1926, Macau.)

6Fidalgos in FarEast, 1550-1770, FactandFancy in the History ofMacao - C. R. Boxer (M. Nijhof, 1948, The Hague.) p. 2, Bay of The Goddess Ama, and City of the name of God.

7 Um pilar comemorativo, com a cota de armas portuguesa.

8Ver referência para Nota (l) na p. 145, pp. 63-64 in Search of a Home.

9Macau na Época da Restauração - C. R. Boxer (Imprensa Nacional, 1942, Macau.) p. 15

10A Documentary Chronicle of Sino-Western Relations - S. F. Lo (University of Arizona, 1960, U. S. A.) p. 6-7, The Reign of Shuh-Chih.

11 Ver referência para Nota (l), p. 145, p. 104

12 Ver referência para Nota (l), p.145, p. 3.

13 Ver referência para Nota (l), p.145, p. 132.

14The Chinese - S. F. Davis (C. Knight & Co., London, 1940) p. 13.

15 Ver referência da Nota (3) na p. 145, pp. 99-100.

16Portuguese Settlements in China - A. Ljungstedt (J. Munroe, Boston, 1936).

17The China Repositary, Vol. III, Canton, Feb., 1835, pp. 485-486.

18 Anuário de Macau, ano de 1927 (Imprensa Nacional, 1927, Macau).

19 Anuário de Macau, ano de 1939 (Imprensa Nacional, 1939, Macau). População.

20 Relatório da Comissão Nomeada por Portaria de 10 de Setembro de 1960, alterada a sua constituição pela Portaria de 28 de Agosto de 1962. Destinada a estudar e propor as medidas adequadas à defesa do Património Artístico e Histórico existente na Província Ultramarina deMacau - A. C. Henriques, Pe. B. V. Pires, 1963, Macau. Pp. 41-43, Pagode da Barra.

21Ou-Mun-Kei-Leok - U. L. Tcheong, K. I. Ian, tradução do Chinês por L. G. Gomes, 1950, Macau. P. 39, e ilustração da p. 74 (reproduzida na p. 161).

22Descrição detalhada do Templo de A-Má in Renascimento, March, 1943, Macao, pp. 324-328, "Macao's Temple ofA-Má" - J. M. Braga.

23Ver referência para a nota (1) na pág. 160, pp. 43-44, Pagode de Mongha.

24Portuguese Settlements in China - A. Ljungstedt (J. Munroe, Boston, 1836)

25Diário de Francisco Ramponi, 1697-1700, Illustrated London News, Sept. 1 1th, 1954, pág. 416.

26Os testes da Universidade de Hong Kong conduzidos por O. Tunnell (Eng.) da Faculdade de Engenharia, revelaram o seguinte: Absorção após 24 horas de imersão, 15,8% do peso.

Ponto de rachadura, quando testado, 6001b./sq. in. Esforço de compressão 3.300 1b./sq.

Comparando com um tijolo Flettons: absorção 12-21%; ponto de rachadura 200 - 4001bb/sq. in.

*0 texto aqui publicado é a reprodução integral da tese de investigação do Arquitecto Wong Shiu Kwan, já editada no B. I. L. C.(Boletim do Instituto Luís de Camões), e depois publicado em separata (Imprensa Nacional de Macau, 1970).

A republicação justificou-se-nos pela raridade de trabalhos neste campo específico, e pelo interesse acrescido de um olhar que regista as abundantes provas de uma inter-influência cultural, em vésperas do seu desaparecimento.

Como critério editorial, e para preservar ao máximo a documentação iconográfica original e, mais ainda, permitir um cotejo com as existências actuais que sobreviveram, RC faz compaginar as originais ilustrações a preto e branco com algumas situações actuais, a cores. Os slides actuais são da autoria de Joaquim de Castro.

*** Ver referência à nota de rodapé (1) p. 160, pp. 44-45, Pagode de Lin Fong, e Ou-Mun—Kei-Leok - U. L. Tcheong, I. K. Ian; gravura na pág. 166.

**** The Macao Review, Vol. I, No. 5, April, 1930, Macao. The Church of St. Lawrence, J. M. Braga.

******* Uma descrição detalhada do jardim encontra-se no Boletim do Instituto "Luís de Camões", Vol. II No. l, Out. 1967 (Museu Luís de Camões, Macau.) pp. 147-188, O Jardim de Lou Kau - A. M. Amaro.

** Arquitecto, natural de Macau. Licenciatura pela Universidade de Hong Kong concluída em 1969. Trabalha actualmente no Architectural Service Department da administração de Hong Kong.

desde a p. 9
até a p.