Nasci a 27 de Março de 1910. Um ano mais tarde, desencadeou-se a Revolução Burguesa de 1911 que acabou com a Dinastia Qing (1616-1911).
Quando andava na escola primária, eclodiu o Movimento do 4 de Maio de 1919; movimento patriótico que visava reivindicar a ciência e a de-mocracia para a China. Foi naquela altura que o marxismo começou a ser difundido pela China.
Apaixonei-me pela pintura, na minha adoles-cência. Quando andava na escola secundária, levado pela ideologia democrática, promovia manifestações pelas ruas, junto com os meus colegas, gritávamos xpalavras de ordem, devastávamos as mercadorias importadas de países hostis, assim como a Inspecção para a Interdição do Ópio onde, de facto, vendiam abertamente a droga.
Em 1928, quando terminei os meus estudos secundários, tropas da Revolução Nacional passaram por Jin Hua, minha terra natal. Fomos recebê-las nos arredores e organizámos um comício entre militares e civis no campo de desportos da escola. Mais tarde, a Revolução foi traída e havia dirigentes dos movimen-tos de massas reprimidos num mar de sangue.
No Verão de 1928, após exames, fui admitido pelo Instituto Nacional de Belas Artes "Lago do Oeste". Matriculei-me na Faculdade de Pintura. Quase no fim do primeiro semestre, o director deu-me um conselho depois de ter examinado os meus esboços; um conselho decisivo para mim: "Dificilmente con-seguirás aprender grandes coisas aqui. Porque é que não vais para o estrangeiro?"
Na Primavera do ano seguinte, eu e vários colegas tão idealistas como eu, partimos para Paris como se fugíssemos à família.
No começo, a família mandava-me dinheiro, mas isso durou pouco tempo e vi-me obrigado a empregar--me numa oficina de laca chinesa. Às vezes, trabalhava lá, em part-time, para poder aprender desenho num atelier de Montparnasse. Apaixonei-me desde muito cedo pelos impressionistas franceses e não olhava com bons olhos o academismo.
Disse algumas vezes: "Passei três anos em Paris, pobre mas livre". Apesar disso nunca conheci o que era fome. Li muitas obras realistas de intervenção so-cial e filosóficas. Da literatura, o que me atraía era a poesia. Vagueava como uma gota de água que flutuasse à mercê da corrente...
No dia 18 de Setembro de 1931, as tropas in-vasoras japonesas ocuparam sem grande dificuldade as três províncias do Nordeste da China. A crise na-cional agravava-se dia a dia. Em Paris, assisti a uma reunião da União Anti-Imperialista. O meu primeiro poema, intitulado "O Grande Encontro", relata esse acontecimento.
Certo dia, quando estava a desenhar nos arre-dores de Paris, um francês embriagado aproximou-se de mim e bradou-me: "Ó chinezinho! Com a tua pátria em perigo, ainda tens ânimo de fazer pintura, aqui!?" Isto doeu-me como uma bofetada.
Nos inícios de 1932, preparava-me já para voltar à China, completamente privado de apoio financeiro da parte da minha família. Naquela altura, as tropas invasoras japonesas atacavam Xangai. As nossas forças armadas e o nosso povo ofereciam resistência. Aos 28 de Janeiro, dia da Resistência de Xangai, em-barquei em Marselha. Após uma viagem de um mês e quatro dias, cheguei a Xangai. Mas o conflito já acabara. O Kuo-Min-Tang, que se retirava perante a agressão japonesa, assinou o Tratado de Armistício de Xangai. Ao ver as ruínas na Zona Zhabei de Xangai quase desatei a chorar.
Voltei triste à terra natal. Não fiquei lá nem sequer um mês. Em Hangzhou encontrei um antigo colega. Informou-me que em Xangai existia um Liga de Artistas da Ala Esquerda. Em Maio, ao chegar a Xangai, aderi àquela organização. Eu e vários pintores jovens, fundámos o Instituto de Pesquisas "Terra Primaveril". Em Junho, promovemos uma exposição em Baxianqiao. Em 12 de Julho, à noite, quando es-távamos a aprender o esperanto, num quarto do segundo andar, vários agentes secretos da Polícia da Concessão Francesa interromperam-nos e levaram--nos a todos. Dos treze detidos, onze foram postos em liberdade após um interrogatório. Mas eu e outro colega ficámos presos. A partir daquele momento, disse adeus à pintura e comecei a escrever poesia em plena prisão.
No poema "Gaita de cana" citei G. Apollinaire:
"Tinha uma gaita de cana
Que não daria por nada do Mundo
Nem pelo bastão de Marechal de França..."
Para mim, a gaita de cana simbolizava a arte e o bastão de Marechal, a injustiça. No poema vilipendiei Aristides Briand e Otto Bismarck e declarei que levantaria o meu punho, como em 1789, contra a Bastilha; Bastilha esta que não era a de Paris. Não sei se a administração da prisão sabia alguma coisa de poesia ou se até a leria, mas consegui mandar o poema para fora da cadeia, mais tarde publicado na revista "Época".
Ao longo das noites de insónia torturante, à luz da fraca claridade projectada através da janela resguar-dada com grades de ferro, rabiscava versos num bloco de notas. Cheguei a escrever duas frases na mesma linha! De dia separava-as. Estes poemas, assinados com o pseudónimo de "Wojia", foram levados às es-condidas pelos meus visitantes para fora da prisão e publicados.
Nos começos de 1933, num dia de neve, ao ver os flocos através da janela, cuja abertura tinha o tamanho duma tigela, lembrei-me da minha ama de leite e compus "Rio Dayen, minha ama de leite". Para escapar à vigilância da cadeia, mudei de nome literário. Foi o meu advogado que levou os manus-critos a um amigo meu. Este entregou-os mais tarde na redacção da revista "Chungguan" (Luz Primaveril).
Foi o meu primeiro trabalho publicado sob o pseudónimo de Ai Qing.
Após três anos e três meses de cativeiro, fui posto em liberdade. Regressei à terra natal.
Um dia, a caminho da feira, o meu pai pergun-tou-me: "Aqueles rabiscos que garatujas para aí, têm algo de poesia? Ouvi dizer que tens tido muito êxito com esses versos; é verdade?" Ele não considerava poesia aquilo que eu compunha. Para ele, poesia tinha de ser toda rimada, com cinco ou sete caracteres numa linha, mas bem sabia que nada podia fazer contra a minha carreira poética.
Na primeira metade do 1936, ensinei durante meio ano lectivo na Escola de Magistério Feminino de Hangzhou. Depois fiquei desempregado.
Continuava a fazer versos num caramanchão de Xangai.
desde a p. 50
até a p.