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RESUMOS

Os Ye, Mercadores de Cantão, 1720-1804 
Os Ye, mercadores de Cantão, constituem um significativo exemplo daquele grupo de comerciantes habitualmente designado por “pequenos mercadores”. Conhece-se muito pouco destas pequenas casas comerciais, pelo que este artigo, ao retratar as actividades dos Ye, procura alargar a nossa compreensão do comércio no seu todo. Os Ye estiveram activamente envolvidos no comércio entre 1720 e 1804, período caracterizado por forte crescimento e expansão. Dois deles, Cudgin e Yanqua, conseguiram enriquecer e retirar-se da sua actividade com as suas fortunas intactas. O seu sucesso, sem precedentes à época, é considerado ainda hoje com um caso exemplar. Diferentemente, os outros três membros da família, Leunqua, Giqua e Tianqua, tendo adoptado estratégias diferentes, acabaram em completa ruína. Não conseguiram controlar o seu crescente endividamento que acabou por lhes absorver todo o capital e os levar à falência. Este exemplo dos Ye permite-nos, assim, uma visão única dos sucessos e fracassos dos “pequenos mercadores”, a qual, por sua vez, nos ajuda a compreender melhor a complexidade do contexto e o modo do seu funcionamento.
[Autor: Paul A. Van Dyke, pp. 6-47]

A Frota Mercante Portuguesa em Macau nos séculos XVII e XVIII 
Este artigo examina e debate a presença da frota mercante portuguesa em Macau, com especial ênfase no último quartel do XVII e todo o século XVIII. É escrito sob a perspectiva da comunidade portuguesa, armadores, empresários e investidores em Macau. Assim, são abordados uma série de assuntos políticos, económicos e comerciais. Todavia, as actividades dos portugueses e da sua frota mercante nesta época são difíceis de analisar em detalhe, uma vez que se perderam muitas das provas históricas directas. O maior e mais espectacular sucesso de outras companhias europeias e de outros operadores privados concorrentes contribuem também para a dificuldade deste estudo pois, de certa forma, ensombram a actividade dos portugueses. Para o mundo exterior, no século XVIII, a cidade de Macau não era propriamente tida como um centro de prosperidade. Todavia, a sua frota mercante era bastante activa e contribuía efectivamente para a economia marítima da China. Neste contexto, é de realçar que a frota mercante portuguesa em Macau constituía à época o único elemento da estrutura do comércio marítimo da China com base em solo chinês e que regular e directamente comercializava bens e mercadorias no Oceano Índico e na malha de portos asiáticos.
[Autor: George Bryan Souza, pp. 48-64]

A Justiça Qing e os Crimes de Morte em Macau 
Os homicídios ocorridos em Macau com a intervenção de estrangeiros (especialmente quando um destes era o presumível culpado) estão na base dos mais graves conflitos entre as autoridades de Macau e as autoridades imperiais. Se estas os consideravam como súbditos e, portanto, sujeitos às leis chinesas, as primeiras recusavam a sua entrega por tal não lhes ser permitido pelas leis de Deus e do Reino. Este artigo, através da análise de alguns dos casos concretos de que há registo, procura traçar a evolução da legislação Qing até finais da 1.ª metade do século XIX, evolução que corresponde a uma política de feição mais centralizadora e, por outro, mais severa em relação aos estrangeiros que viviam no interior do Império. O limite temporal estabelecido compreende-se à luz das medidas adoptadas por Ferreira do Amaral e que se traduziram numa alteração profunda do estatuto político de Macau, arrancando-o do contexto da ordem imperial.

O Poder da História na Ficção Pós-Colonial. Os Romances de Brian Castro e Mia Couto 
O poder da narração de histórias e a sua associação com a voz dos povos marginalizados, noções de pluralidade e hibridismo, surgem muitas vezes como tema e preocupação característicos da narrativa pós-colonial. Este artigo centra-se no tratamento dado à narração de histórias por dois romancistas que deram já um contributo significativo à literatura dos seus respectivos países. Mia Couto, que escreve em português, é o romancista moçambicano de maior renome na actualidade. Brian Castro, de origens lusitanas longínquas, escreve em inglês e é hoje considerado um dos romancistas mais inovadores na Austrália. De uma certa forma, ambos são produtos ancestrais da expansão colonial portuguesa: Couto é moçambicano de origem europeia, Castro um australiano com uma complexa ascendência luso-eurásica. Ambos estão perfeitamente conscientes do peso histórico que carregam nos ombros e ambos usam a narração de histórias como uma metáfora para outorgarem uma qualquer forma de poder àqueles que não se revêem nas correntes dominantes da política e da cultura. A diferença entre os dois reside no facto de que Mia Couto o faz para reflectir as diferentes vozes de uma nação emergente e Brian Castro para questionar os valores culturais tradicionais homogeneizados do seu país de adopção. Apesar do artigo fazer referência aos diversos trabalhos destes dois escritores, é dedicada particular atenção aos livros A Varanda do Frangipani de Mia Couto e After China de Brian Castro.
[Autor: David Brookshaw, pp. 143-149]

O Matriarcado no Limite. O Culto Mítico de Nu Wa em Macau 
O repertório mitológico das primevas cultura e civilização chinesas encontra-se num sem número de textos clássicos. Estes textos são fontes de enorme valor para a compreensão do poder das narrativas
[Autor: Liu Jinglian, pp. 65-83]

Vida e Obra de Wu Yushan 
Wu Yushan (Wu Li) é uma figura de reconhecida importância no panorama cultural chinês durante a transição entre as dinastias Ming e Qing. Nascido no seio de uma família nobre, fiel aos Ming, Wu tornou-se famoso como pintor e poeta. Tal como outros seus contemporâneos, manteve-se ao longo de toda a sua vida íntegro na sua lealdade aos Ming, demonstrando um apurado sentido de responsabilidade na preservação e promoção da cultura chinesa. Dedicado às causas que amava, apesar das difíceis condições de vida, Wu desenvolveu uma notável produção literária e artística. No seu tempo, a Questão dos Ritos atravessava um momento particularmente difícil. Não existia muito espaço para os nobres convertidos procurarem compromissos entre Catolicismo e Confucionismo, porque os conflitos e as diferenças entre as doutrinas – uma representando a cultura ocidental, a outra a cultura chinesa – tinham-se tornado demasiado nítidos. Impunha-se uma escolha: ser-se católico ou confucionista. Wu Yushan conheceu o Catolicismo na meia-idade, já depois dos 40 anos. Prolongados anos de estudos teológicos e de pregação operaram uma tremenda transformação no seu credo religioso, acabando por abandonar o Confucionismo e abraçar o Catolicismo, já com 70 anos. Os seus poemas católicos, respeitando embora as formas da poesia clássica chinesa, exprimem plenamente os ensinamentos da sua nova religião.
[Autor: Zhang Wenqin, pp. 84-105]

Wu Yushan e a Demanda da Fé durante a Transição Dinástica 
Este artigo refere-se ao mundo interior de Wu Yushan e à sua demanda da Fé durante o período de transição da dinastia Ming para a dinastia Qing; à história da sua família, sempre leal aos Ming; ao seu orgulhoso e reservado carácter, típico da nobreza chinesa e ao seu extraordinário talento. O autor examina também o seu caminho para a Fé através das relações de amizade que Wu manteve com os missionários Ocidentais e a sua conversão ao Catolicismo, antes de se tornar padre. O artigo conclui que Wu Yushan, que era simultaneamente um típico nobre chinês e um seguidor do Catolicismo, constitui um excelente exemplo de fusão da fé religiosa com as culturas locais.
[Autor: Gu Weimin, pp. 106-124]

O Matriarcado no Limite. O Culto Mítico de Nu Wa em Macau 
O repertório mitológico das primevas cultura e civilização chinesas encontra-se num sem número de textos clássicos. Estes textos são fontes de enorme valor para a compreensão do poder das narrativas mitológicas, que reconstituem e se confundem com a História da China e que são cruciais para a promoção da coesão cultural e do sentido de identidade colectiva. De entre a multiplicidade de templos chineses de Macau, existe um, muito pequeno, consagrado à Deusa Taoista Nu Wa. A influência da mulher-serpente Nu Wa remonta à Antiguidade, sendo-lhe atribuído um papel pivot na história mitológica chinesa. Referências a esta divindade surgem nos mais prestigiados escritos clássicos remontando ao período dos Estados Beligerantes (475-221 a.C.) e à dinastia Han (206 a.C.-220), que a retratam como a Deusa criadora e garante da vida humana. Para além da sua imagem de matriarca como Mãe da Terra, ela é ainda descrita na novela mitológica Feng Shen Yan (Criação dos Deuses) da dinastia Ming (1368-1644) como uma Deusa encantadora, mas vingativa. Também Cao Xueqin (1717-1763) abre a sua obra-prima, Hung Lou Meng (O Sonho do Pavilhão Vermelho), com uma referência decisiva a Nu Wa, apresentando-a como a restauradora do céu. Este ensaio é um trabalho de investigação sobre o significado do mito de Nu Wa, a sua ascensão na hierarquia espiritual e o espírito de panteísmo expresso na sua “residência divina” em Macau. Discute ainda a forma como os textos literários chineses servem de veículo à consolidação do mito, quais as diferenças e semelhanças entre os mitos da criação do Oriente e do Ocidente e porque é que Nu Wa, nos dias de hoje, ainda mantém a sua influência e goza de alguma popularidade neste “limite” da China.
[Autor: Christina Miu Bing Cheng, pp. 127-142]

desde a p. 150
até a p.