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MACAU: O PRIMEIRO PONTO DE ENCONTRO PERMANENTE NA CHINA

Tereza Sena*

Guilherme Ung Vai Meng:" Ruínas de S. Paulo". Lápis sobre papel,38x29cm, 1994.

NOTA EXPLICATIVA

Este texto foi escrito em 1989. Sentiam-se então enormes dificuldades no diálogo, troca de informações e confronto, quer de conceitos e de metodologias, quer mesmo de dados factuais, entre historiadores chineses e portugueses quanto à realidade e interpretação histórica de Macau. O desconhecimento mútuo das fontes e da língua era (e ainda é) um fosso enorme, mas o debate, a compreensão e a colaboração eram inexistentes. Hoje, finalmente estabelecidas algumas formas de comunicação, dão-se, infelizmente ainda, os primeiros passos.

Ao tentar, talvez prematuramente para a aceitação geral da importância da tarefa, dar corpo a uma ideia de trabalho em comum** e estabelecer o confronto das duas perspectivas, sentimos a necessidade de produzir um texto informativo, e de reflexão também, sobre a História de Macau, para que a mesma fosse dada a conhecer aos investigadores chineses principalmente, mas também aos estrangeiros, sobretudo aos anglófonos. Trata-se de uma síntese, elaborada numa perspectiva ocidental de abordagem, não o negamos, mas tão relativizada quanto possível, onde se tenta a descentração nacionalista e a inserção na conjuntura da evolução histórica mundial, posições não dominantes na historiografia local existente até então.

Daí que este artigo inclua algumas citações— por vezes extensas — de fontes e de obras de referência consideradas importantes para a mensagem que se pretendia transmitir, bem como notas e transcrições que seriam dispensáveis para um público académico português. Contudo, por razões várias, nunca foi o mesmo publicado na íntegra, embora constitua a base de diversas versões -mais ou menos desenvolvidas e adaptadas ao público ou ao país a que se destinavam.

Quis a Revista de Cultura publicar a versão integral deste texto em 1996 numa secção especialmente dedicada à historiografia. Embora tal atitude pudesse parecer redundante da nossa parte, acedemos por dois motivos. Primeiro, por que será, em consequência, finalmente traduzido e publicado em chinês, cumprindo-se um dos propósitos que lhe deram origem. Segundo, porque, não obstante as suas limitações, também ele já faz parte da História do entendimento que hoje se pretende analisar. Bem haja por isso.

Já vai longa esta introdução, mas julgámo-la necessária. Resta-nos apenas acrescentar que não alterámos a estrutura do texto, publicando-o tal como ele foi inicialmente concebido, limitando-nos a introduzir-lhe as actualizações, sobretudo bibliográficas, cuja omissão lhe retiraria a utilidade que sempre lhe procurámos incutir.

Bem no sul da China1, no estuário do Rio das Pérolas, existe uma cidade não muito conhecida, mas que, no entanto, goza de um estatuto único no mundo. Trata-se de Macau, como é designada internacionalmente, ou Ou-Mun (Ao-mên), segundo as expressões chinesas2.

É, actualmente, e desde 1979, um Território chinês que continuará a ser administrado por Portugal até 19 de Dezembro de 1999. Passará, então, a integrar a República Popular da China, mantendo-se, por cinquenta anos, um período de transição durante o qual a língua e o direito portugueses permanecerão oficiais, de par com os seus correspondentes chineses, naturalmente.

Tratando-se de uma situação resultante da diplomacia e dos acordos firmados entre os dois países, é, ela também, reflexo das profundas transformações que em ambos se verificaram a partir da década de 70 deste já adiantado século XX. Se, em Portugal, a Revolução do 25 de Abril de 1974 teve como uma das principais consequências o pôr termo à desadequada política colonial nos territórios que administrava em África e na Ásia, abrindo-se igualmente ao diálogo com todas as nações do Mundo e — por maioria de razão com a República Popular da China, com quem restabeleceu relações diplomáticas em 8 de Fevereiro de 1979 —, as alterações internas, operadas na própria China, que levaram à formulação por Deng Xiaoping, em 1983, da política consignada na máxima Um País, Dois Sistemas, tendente à reintegração de Hong-Kong, Macau e Taiwan na R. P. C., tornaram possível o entendimento quanto à complicada questão da soberania de Macau. Esta viria a ser formalmente resolvida com a assinatura da Declaração Conjunta Luso-Chinesa em 26 de Março de 1987, ratificada no ano seguinte, e com a conclusão da Lei Básica em 1993.

Mas, por que é portuguesa a administração de Macau, um pequeno Território de 20,96 k㎡, onde vivem cerca de 424 430 habitantes3 dos quais apenas cerca de 3 a 4% são portugueses ou de origem portuguesa?

Aqui entramos num complicado problema historiográfico se não nos soubermos abstrair de preconceitos e explicações centradas ou/e politizadas, e, mesmo, já numa atitude mais científica, da procura -- em nosso entender infrutífera — de uma prova que venha a esclarecer definitivamente a questão, não sendo provável que exista (ou talvez que tenha existido) um documento escrito que consignasse a cedência, ou até o aluguer, de Macau aos portugueses pela China, no século XVI. Apenas dispomos de testemunhos, quer chineses, quer portugueses, muitos dos quais relativamente tardios (dos séculos XVII e XVIII) sobre o assunto.

Naturalmente que não rejeitamos o valor ou a evidência das fontes documentais.Contudo, todos sabemos que, no século XVI, época em que os portugueses se fixaram em Macau, (e até muito mais tarde) a produção das crónicas, e mesmo de relatos, era fortemente marcada de intencionalidade política, religiosa e nacionalista, quando não etnocêntrica, quer no Ocidente, quer no Oriente. Ou seja, não se limitavam os cronistas, os viajantes, os governantes, os missionários e os mandarins a registarem os factos. Produziam-nos de acordo comos seus juízos de valor, considerações e explicações distintas, de acordo com a respectiva mentalidade, cultura, costumes, regras civilizacionais e as intenções do seu país e/ou da sua religião.

Socorramo-nos de José MattosO4:

"(...) Até à emergência da história estrutural, e sobretudo até ao aparecimento da história das mentalidades, os historiadores ignoraram geralmente esta função do arquivo, isto é, a de operar um trabalho selectivo dos materiais oferecidos à memória. Até há pouco, os historiadores consideravam as peças de arquivo como textos propriamente documentais, isto é como destinados a servir as necessidades da intercomunicação corrente, e não como textos monumentais, isto é como produzidos pelo poder constituído para perpetuar as acções consideradas notáveis; ao fim e ao cabo, como textos destinados a assegurar a perpetuação desse mesmo poder. Sendo assim, não se punha em dúvida a veracidade dos documentos arquivísticos, uma vez provada a sua autenticidade. (...) Não existia a noção de que o arquivo fosse ele próprio um instrumento da construção da memória, orientada pelo poder."

E de Rocha Pinto5, no respeitante à literatura de viagens: "Embora a esmagadora maioria dos escritos fugisse à lógica da construção histórica, informada da ideologia hegemónica das crónicas, e utilizasse a narrativa como estrutura e mesmo se não escapava ao fito de herança para a posteridade — como as crónicas oficiais --, e ainda mesmo que já não fosse mero receptáculo passivo da gesta nacional, visto que os seus autores se valiam da vivência pessoal, exteriorizando a sua visão do mundo e valorizando sobretudo a trajectória emocional e individual, restando os quadros sociais como panos de fundo, naturalmente, mesmo quando os registos e relatórios tivessem sido ordenados ou encomendados por terceiros, como tantas vezes sucedia, tudo isso não bastou para que essa tal maioria de escritos se tornasse, desde logo, o inimigo a abater pela escolástica e pelas classes dominantes."

A propósito dos mal-entendidos civilizacionais que malograram a embaixada de Tomé Pires à China, sendo uma das queixas chinesas, para além do desconhecimento do cerimonial imperial, a de "que compravamos moços, e moças furtadas, filhos de pessoas honradas, e que os comiamos assados", João de Barros expressa magistralmente a ideia que aqui pretendemos transmitir ao fazer o seguinte comentário nas suas Décadas6: "as quais coisas eles criam serem assim, porque de gente que nunca tiveram notícia, e eramos terror, e medo a todo aquelle Oriente, não era muito crer-se que faziamos estas cousas, porque outro tanto cremos nós deles, e de outras nações tão remotas, e de que temos pouca notícia". Trata-se, sem dúvida, de uma excelente lição de descentração mental e de relativismo com mais de quatro séculos....

"Vejam agora os sábios na Escrituraque segredos são estes de natura!".

Luís de Camões, in Os Lusíadas, Cant. V (1572)

Por outro lado, o movimento humanista7 que então se desenvolve no Ocidente, e que culminará com a universalização8 do Homem, a que correspondem os padrões do nosso século, estava ainda longe de ser um dado inquestionável e adquirido.

Na Europa, católicos e protestantes degladiavam-se em lutas religiosas; a Inquisição perseguia judeus e defensores de ideias mais ousadas e centrífugas à verdade proclamada por reis e papas, ao mesmo tempo que -- à medida que as viagens dos navegadores portugueses e espanhóis iam permitindo ao Ocidente uma real apreensão do mundo — se olhavam com espanto — mas também com admiração, respeito e curiosidade pelo novo (como sinónimo de diferente) —, povos sobre os quais até então quase só9 se tinham ouvido lendas e fantasias.

A título de exemplo veja-se o que, em meados do século XIII (1260), dizia o florentino Brunetto Latini no Livro do Tesouro10 sobre a índia: "Na Índia o ar é tão bom que há duas colheitas por ano, e, no inverno, um vento doce e agradável. Como os indianos nunca foram expulsos das suas terras têm cinco mil cidades bem povoadas... Ao Oriente fica a região da pimenta, atravessada por um grande rio; dum lado, elefantes e outros animais selvagens, do outro, homens e grande quantidade de pedras preciosas". E sobre a seda, repetindo os clássicos, não obstante o bicho da seda já haver sido introduzido no Ocidente: "Seres che di foglie e di scorze d'arbori, per forza d'acqua, fa una lana ond'elli vestono loro corpi"11.

Mas detenhamo-nos um pouco sobre estas questões.

Esta visão do novo foi ab initio caracterizada pelo imediatismo da descrição e, por vezes, mediatizada por um entrosamento do mítico e do mágico com a interpretação intuitiva da realidade observada, como aponta Rocha Pinto12. D'Intino13 desenvolve a tese de que as escassas notícias que a cultura ocidental possuía — e foi obtendo — da China, alimentaram, sobretudo nos autores portugueses da segunda metade do século XVI, o conceito de utopia. A China tornou-se, assim, um topos quer da nossa literatura de viagens, quer da própria historiografia da época, representando a sociedade ideal, perfeita, justa, pacífica, organizada, rica e abundante onde não existiria nem miséria nem corrupção, e cujos princípios de virtude e piedade eram fortes indicadores de uma fácil predisposição para a sua conversão ao catolicismo. Corrente a que não seria certamente alheio -- acrescentamos nós — S. Francisco Xavier cujo sonho era, como é do conhecimento geral, a evangelização da China.

Este mito, ou se quisermos "a sedução do modelo chinês", como bem define Vitorino Magalhães Godinho14, que ainda — talvez devido não só às dificuldades no contacto, como à fraca penetração dos ocidentais no Celeste Império -- permanecerá vivo ao nível do pensamento filosófico no século XVIII, atinge nesta época uma amplitude mais vasta — se bem que igualmente idealizada — levando a que autores como Voltaire e Diderot, depois de Leibniz e Wolff, entre outros, exaltem o racionalismo do povo chinês, por confronto com as sociedades ocidentais suas contemporâneas que, como se sabe, criticaram profundamente. Cabe ao referido enciclopedista, nos conhecidos Essais Sur les Moeurs15a seguinte observação: "Jamais la religion des empereurs et des tribunaux ne fut déshonorée par des impostures, jamais troublée par les querelles du sacerdoce et de 1'empire, jamais chergée d'innovations absurdes qui se combatent, les unes avec les autres, avec des arguments aussi absurdes qu'elles et dont la démence a mis généralement le poignard aux mains des fanatiques, conduits par des factieux. C'est par là surtout que les Chinois l'emportent sur toutes les nations de l'univers."

Posteriormente, no século XIX e inícios do seguinte, encontramo-lo, cremos, transferido para o domínio da ficção e integrado na corrente orientalista que abrange, contudo, um imaginário bem mais vasto.

Ilustraremos o que acabamos de afirmar com a transcrição de alguns dos primeiros relatos sobre a China, remetendo16 o leitor interessado para a citada colectânea de Raffaella D'Intino.

Vejamos, então, o que Duarte Barbosa17 escreveu18, baseando-se em testemunhos orais que recolheu nas suas andanças pelo Oriente, mas principalmente em Malaca, cerca de 1516, sobre "(...) o reino da China, que dizem que é uma grandíssima terra e senhorio pela terra firme, e de longo da costa do mar, povoada também de gentios.

O rei dela é gentio, honra muito os ídolos, está sempre no sertão, tem mui grandes e boas cidades, nenhum estrangeiro pode entrar pelo sertão, sȯmente nos portos de mar negoceiam; seu maior trato é nas ilhas.

Se algum embaixador doutro reino vem a ele por mar, primeiro que a ele vá, lhe fazem a saber como lhe trazem certas embaixadas e presentes, então o manda ir onde ele está.

Os moradores deste reino são grandes mercadores, são homens brancos e bem dispostos. Suas mulheres são de mui formosos corpos, ele[s] e elas têm os olhos pequenos, nas barbas três ou quatro cabelos não mais, por gentileza, e, quanto mais pequenos têm os olhos, tanto os hão por mais gentis homens.

(...)

Os trajos da gente desta terra são como os de alemães.

Comem em mesas altas como nós, com suas toalhas mui alvas, para quantos hão-de comer a uma mesa, põem uma faca, bacio, guardanapo e um pouco de prata; não tocam com a mão o que comem, chegam muito o prato à boca, e, com umas tenazes de prata ou pau metem o comer na boca mui amiude, porque comem muito depressa, e fazem muitos manjares de carnes, pescadas e outras muitas cousas. Comem mui bom pão de trigo, bebem muitas maneiras de vinhos; e, muitas vezes, a cada comer, comem carne de cães, e hão-na por mui boa carne.

São homens de muita verdade, porém não são bons cavaleiros, mas grandes mercadores, tratantes em toda a mercadoria.

Fazem aqui muita soma de porcelanas, que é boa mercadoria para todas as partes, que se fazem de búzios, de cascas de ovos e claras, e outros materiais, de que se faz uma massa que lançam debaixo da terra por espaço de tempo, que entre si têm por grandes fazendas e tesouro; porque quanto mais se achega o tempo para as lavrar, vale muito mais; o qual chegado, lavram-nas de muitas maneiras e feições, delas grossas, outras finas, e, depois de feitas as vidram e pintam.

Aqui se cria mui boa seda, de que fazem muita quantidade de panos de damasco de cores setins e outros panos rasos e brocadilhos. Também há muito ruibarbo, almíscar, prata, aljôfar e pérolas, porém não são perfeitos em redondeza.

Neste reino se fazem muitos brincos formosos e dourados, como cofres mui ricos, pratos de pau, saleiros e outras coisas subtis, e há na terra para isso homens mui engenhosos.

Calçam botas como gente de terra fria. Navegam em juncos, trazem velas de esteiras como em Moçambique e os cabres e enxárcia de certa verga.

São deles grandes corsários, navegam para Malaca com toda a mercadoria da China, que aí vendem mui bem, e carregam de muito ferro, salitre, retrós de cores e outras miudezas, como os venezianos soiam trazer antes às nossas partes, e de pimenta de Samatra e do Malabar, que vale na China a quinze e dezasseis cruzados o quintal, e daí para cima, segundo onde a levam, e, em Malaca a compram a quatro cruzados pouco mais ou menos. Também levão anfião a que nós chamamos ópio, incenso, coral, pano de Cambaia e Paleacate.

Estes chins que vivem de trato e navegação, trazem de contínuo suas mulheres e filhos dentro nas naus, onde vivem sempre, e não têm casas.

Confina este reino da China com Tartária da banda do Norte."

Consulte-se, também a Suma Orientaldo boticário e feitor Tomé Pires — a quem aludiremos com mais pormenor adiante —, a qual, embora anterior, mais profunda e mais genuína, já que o seu autor, para além de ter viajado pelo Oriente, viveu em Malaca entre 1512 e 1515, onde teve ocasião de contactar com mercadores de inúmeras nacionalidades e origens e redigiu grande parte da sua obra, teve, na época muito menor circulação do que o livro de Duarte Barbosa. Enquanto que este último foi imediatamente traduzido para espanhol e italiano — sendo publicado em 1550 por Ramúsio19 —, a Suma Oriental20 permanecerá parcialmente inédita até meados do século XX, altura em que Armando Cortesão logrou encontrar uma cópia, preparando-lhe de seguida uma versão inglesa21.

E esse facto não se deverá certamente a um qualquer acaso fortuito, visto que a obra de Tomé Pires, para além de conter "a primeira informação fidedigna sobre os países e ilhas entre Bengala e o Japão", como nos diz A. Cortesão22, veiculava importante e inédita informação sobre as Molucas — a fonte das especiarias, à época objecto de intensa disputa entre Portugal e Castela —, naturalmente abrangida pela então vigente política de secretismo estratégico da Coroa portuguesa. Ramúsio, que incluiu, anónima, por desconhecer o autor23, no seu Delle Navigationi et Viaggi, a única parte24 que era conhecida da Suma Oriental, é bem explícito quanto a esse ponto, embora cometa a incorrecção de considerar a obra de Duarte Barbosa não só anterior como a fonte de informação de Tomé Pires.

A Suma Oriental, que, como bem sintetiza Juan Gil25, é um "tratado escrito de maneira consciente in usum Serenissimi Regis, (...) um informe confidencial que mais que leitura atractiva aspira a ser útil" é essencialmente um repositório de informações de natureza comercial, geográfica e geo-estratégica, propósitos a que. não foge a descrição que Tomé Pires nos veicula da China. Diz-nos ele26, a partir dos testemunhos das "gemtes de cá desta par[te] do Levante" que as "cousas da China, sam assaz grandes asi na terra como em gemtes e rriquezas e estados27 e cousas outras, que mais se creram com verdade averem se na Europa28 que não nesta terra da China. Hela hé terra grande (...). Ho rei da China hé gemtio, he senhor de grande terra e gemte, ha quall gemte hé branca de nosa allvura. (...) Tem geito de se prezarem da barba29. (...). Bebem gimtillmente de suas beberajeens, gabam muito o noso vinho e bebem grandemente. Hé gemte fraca em sua terra."

À mulher chinesa, que assemelha à castelhana, dedica Tomé Pires30 alguma atenção: "As molheres parecem castelhanas tem sayas de Refeguos/E coses & sainhos mais compridos que em nosa terra os cabelos compridos emRodilhados (...) po gemtill maneira em cima Da cabeça E lamcam nelles mujtos preguos Douro pa os ter & aRedor Da pedraria quem ha tem (...) E nas orelhas & pescoço/poem mujto aluayade nas fases he arrabiqe sobre elle. E sam alcoforadas q seujlha lhe nom leua a vamtaJa he bebem como molheres De terra fria trazem capatos de pomtilha de seda he brocados trazem todas avafios nas maaõos sam Da nosa aluura & delas tem os olhos pequenos & outsa gramdes. E narizes como ham de ser//."...

Descreve também com algum pormenOr os chineses que se deslocam a Malaca, a sua actividade comercial, formas de organização e de comportamento — de modo não muito abonatório, refira-se. Contudo, afirma tratar-se de "gemte baixa", expressando uma opinião bastante diferente sobre o país que, como veremos adiante, considera "terra homrrada e boa e riqa". Assim: "Estes que vem a Malaca sam de pouca verdade e furtão, estes sam da gemte baixa. Comem com dous paos31, tomam a porcelana32 com a mão esquerda, e com a mão direita e com a boca e com os paos se servem. Vem se em jumcos a Malaca com mercadarias, (...). Partem de Malaca e em Junho e poem na viajem da ida e vimda sete oito meses, hé segura viagem. A China hé terra de muitas mercadarias e de muitos mantimentos. Sam muito siosos de sua terra, nesta maneira que quallquer jumco que chega/ a seu porto loguo sabem a mercadaria que trazem e lhe preguntâo o que quer. Tamto que ho sabem, demtro em dous tres dias sam ao bordo do jumco com quanto am mister, e tem regimento amtre si que não lhe am de comprar nenhua cousa por meudo, por que se allgum ho faz hé preso e perde toda sua fazemda. E isto por nam emtrarem na cidade, e isto hé posto amtre eles por lei, por ser este porto amtigo com este custume. E ali lhe sam dadas todas as mercadarias que am mister, e acabamdo de as recolher e tomarem os mantimentos que lhes sam neçesarios logo se am de partir, sem estar hahi dia nem ora."

Mas a versão do manuscrito de Paris dá-nos mais extensa informação sobre a China:"A terra da China hé de muitas cidades [e] fortalezas, todas de pedra e quaall. A cidade omde o rei estaa chama se Cambara33. Hé de gramde povo e de muitos fidallgos de imfimdos cavallos. O rei nun qua hé visto do povo nem dos gramdes, sallvo de muito pouquos, por asiestar em costume."34

Depois de enumerar os reinos tributários à China e respectivas embaixadas, detém-se, com mais algum pormenor sobre a inacessibilidade da pessoa do soberano: "Estes embaixadores quamdo vam ao rei nom o vem, somemte ho vulto do corpo detras huua cortina e dali respomde, estamdo sete esprivaes esprevemdo35 palavra quamdo a diz. Asinamaquillo os oficiaes mamdaris sem o rei poor a mãao nem ser visto. Tornan se a vir e se levam de presemte mil, faz lhe[s] merçee do dobro. (...) Donde esta hé a verdade e nom como diziam que estavam quoatro homees asemtados à vista e falavam com todos sem saberem quall hé o rei. E estes embaixadores podem amcorar em a cidade de Quamtom, como se dirá no diamte"36.

Acerca do processo de ascensão ao trono dá-nos as seguintes informações que, embora incorrectas, não deixam de ser curiosas e sintomáticas do que se pensava ser o modelo político chinês, ideia que perdurará até Camões, como veremos adiante. Diz-nos assim Tomé Pires: "Ho rei da China nom soçede de pai a filho nem sobrinho, somemte por eleicam do coselho de todo ho regnno, [que] amda sempre na cidade de Cambara, omde o rei está, e o mandarim que se por estes aprova fiqua rei."

Não deixa o mesmo de referir as restrições chinesas ao comércio externo, registando que: "Nom pode sair nenhuum chim pera a bamda de Siam, Jaaoa37, Malaqua, Pacee38, e dhy adiante sem licemca dos regedores de Quamtom. E pollas asynaturas da licemça de poder sair he tornnar lhe llevam tamto que ho nom podem soportar e nom saem. E se alguum estranjeiro estaa na terra da China, ja nom pode sair, somemte se non hé por licemça do rei. E por esta licemca, se hé riquo fiqua sem nada. E quallquer junco ou naao que pasa os termos que lhe sam postos pera amcorar perdese a fazemda pera ellrei e a jemte morre por iso"39. Mal sabia Tomé Pires, ao escrever estas linhas, que seria precisamente esse o seu destino...

Descreve-nos depois as "fortalezas", ou melhor, as feitorias chinesas a partir de Cauchi40, indicando os produtos transaccionáveis e fornecendo também utéis informações geográficas sobre Ainão, Nantoo41, Chamcheo42 e Cantão — que neste livro aparece pela primeira vez43 designado pela forma como virá a ser internacionalmente conhecido. Dedica-lhe especial atenção, pondo mesmo de lado a descrição de outros locais, como Fuquien, já que Cantão era, como bem refere, "a chave do reino de China"44. Assim, este porto "(...) hé mor que todos e omde hé o trato todo destas partes" e "omde o regnno todo da China descarregua suas mercadarias todas, e asi da terra firme como do mar muitas. A cidade de Quamtom hé à boca da foz de huum gramde riio que tem de prea maar tres bracas e quatro. (...) E tem portos homde estam muitos juncos gramdes. Vigia se a çidade, fecham se as portas, [que] sam fortes. Estes reis que disemos que tem sellos, quarndo mamdam seus embaxadores fazem a mercadaria em a cidade demtro, e senom fazem fora, obra de XXXta leguoas de Quamtom, e de Quamtom lhe levam a mercadaria. (...)

Afirmam que todos os que trazem mercadarias de Quamtom aas ilhas ganham tres qatro cimquo por dez. E os Chiis tem este costume asi por lhe nom tomarem a terra como por receberem os drrtos das saidas das mercadrias, alem [dos] da entrada. E o principall hé por medo de lhe nom tomarem a cidade, por que se diz que he riqua cidade a de Quantom, he vem cosairos muitas vezes jumto com ella. Hé capitam desta cidade hitaão, pessoa prinçipall, e cad'ano hé huum capitam por hordenamca do rei e nom pode mais estar. Haa outro capitam do maar casy como ho da terra, com jurdicam sobre si. Ambos sam mudados cad'ano.

Dizem que os Chiis fezerom esta hordenamça de nom poderem hir a Quamtom por reçeo dos Jaaos e Malaios, que hé çerto que huum jumco destas naçoees desbaratam vinte juncos de Chiis. Dizem que a China hé de mais de mill juncos, que cada huum trata homde lhe bem vem. Mas hé jemte fraqua, e segumdo ho medo que tem a Malaios he Jaos, bem certo será que huua naao de iiii c tonees faria despovoar Quamtom, a quall despovoada teria a China grande perda.

Nom tiramdo a groria a cada terra, bem parecem as cousas da Chiina serem de terra homrrada e boa e riqa muito. (...) E a Chiina pera as nosas naaos hé viajem de vinte dias. (...)"45

Detém-se depois em pormenorizadas enumerações das mercadorias transaccionáveis com a China, especialmente a partir de Malaca, e aos seus pesos e medidas, para concluir com uma interessante descrição da Tartária e seus habitantes.

Uns anos mais tarde, em 1563, e ainda por conhecimento indirecto, registam-se as não muito divergentes anotações de Garcia da Orta sobre o mesmo império da China no seu Colóquio dos Simples e Drogas e Cousas Medicinais da India. Garcia da Orta, que viveu durante mais de trinta anos na Índia, exercendo medicina e dedicando-se ao estudo e à descrição das plantas medicinais, e que foi postumamente condenado pela Inquisição, classifica os chineses como "gente tam descreta e tam sabida" e "homens muy sutis em comprar e vender, e em officios macanicos", não deixando de lhes reconhecer a superioridade administrativa e cultural: "e em letras não dam vantagem a alguns outros, porque tem leis escritas, conformes ao direito comum, e outras muito justas; como se pode ver bem por hum livro que ha dellas nesta India; (...) quanto mais que os homens que vão á China veem lá praticar muyta justiça e usar della; damse lá gráos e muytas onrras aos letrados, e elles sam os que governão o rei e a terra. Nas pinturas que fazem vem pintadas catedras, e homens que estão lendo, e ouvintes que estão ouvindo; quanto mais que, pera vos convencer seu gram saber, abasta que a arte de emprimir sempre foy lá usada, e não ha em memoria de homens, ácerca delles, quem a enventou"46. Refere também,com algum ineditismo para a época, as viagens marítimas e o empório comercial da China no Índico, afirmando que "os chins navegarão esta terra muito tempo ha"47, e fazendo menção, para além de outros vestígios, à Chinacota48. Mas não nos deteremos neste ponto, nem com outras muitas possíveis citações que alongariam demasiado o texto, prejudicando-lhe o encadeamento e a exposição de ideias. Foi nossa intenção centrarmo-nos nas primeiras descrições da China produzidas pelos portugueses por via do conhecimento indirecto, tentanto de certa forma determinar qual seria o conhecimento disponível (e não certamente o comum a todos os navegantes e homens que a demandaram) à data dos seus primeiros contactos com o Celeste Império.

Também na China, detentora de uma civilização e cultura milenares, pouco permeável à influência externa — a que não seria alheia a barreira da língua (ideográfica, monossilábica e aglutinante) — se encarava, com estranheza e rejeição49, a aproximação desses bárbaros em tudo diferentes. Os seus comportamentos, cultura, modos de pensar e de agir constituíam elementos perturbadores, que nada tinham a ver com os padronizados hábitos civilizacionais e os princípios sócio-político-filosóficos de um confucionismo dominante, regulador e exaltante de valores próprios e tradicionalistas. Eram estes os aspectos mentais que vigoravam na altura em que se produziu, nos inícios do século XVI, o encontro entre portugueses e chineses, quando o homem ocidental já passara — utilizando mais uma vez as palavras de Rocha Pinto — "de uma localização absoluta no espaço para uma localização relativa do mesmo"50, construindo progressivamente a noção de espaço real em detrimento do espaço mítico51.

Oriundos dum pequeno país da Europa setentrional, o mais ocidental da Europa e da Península Ibérica — cujo território partilhavam com o recém-unificado reino de Castela —, banhado pelo oceano Atlântico (o qual constitui aproximadamente metade das fronteiras do País), terra de escassas gentes52 e dinheiro, de há muito que os portugueses se haviam empenhado na tarefa de desbravar o Oceano. Nesta aventura, em que foram pioneiros na Europa — e retenha-se esta noção53 da expansão europeia quinhentista como uma tarefa colectiva, embora sujeita a ritmos distintos e a desfasagens temporais, e obra de um planeamento sistemático —, romperam os mares — cujo domínio então disputavam com os castelhanos54. Foram movidos por intuitos comerciais e religiosos é certo, mas também pelo sonho da aventura e pela curiosidade, e chegaram às mais longínquas paragens de que havia notícia na Europa desde a Antiguidade: ao tão mítico quão deslumbrante Cataio55 e, daí, um pouco mais tarde, às Léquias56, à Ilha do Ouro ou Cipango57, ou seja, ao Japão, — terras de cujas culturas, civilizações, organizações e governos pouco ou nada sabiam de real e concreto —, concorrendo igualmente para o desmembramento dos poderosos domínios comercial e religioso do Islão.

Por seu turno, a China — depois de uma igualmente gloriosa época de expansão e epopeia marítimas, ocorridas sob a égide do imperador Ming, Yung-lo, que reinou entre 1403 e 1424, as quais permitiram ao mais brilhante navegador chinês, Cheng Ho (Zheng He)58 alcançar as costas orientais de África —, e de um período de prosperidade, resultante do comércio externo59, — polarizado, monopolista e tributário —, no Índico e Pacífico, dedica-se, a partir de meados do século XV, às tarefas da própria reestruturação e estabilização internas, mostrando-se fortemente preocupada com a defesa e fiscalização das zonas costeiras.

Sem uma política — leia-se vontade —uniforme quanto ao comércio externo, alternará,ao longo dos tempos, entre permissões e proibições do mesmo. A este facto não seriam certamente alheios os interesses das zonas costeiras meridionais -- à frente dos quais alinhava a província de Guangdong _, a ele tradicionalmente ligadas, e que o perpetuam de forma ilegal, em conflito com as regiões setentrionais e interiores, numa China hegemonicamente agrícola.

Quanto a nós, terá sido exactamente o reflexo disso, e também a capacidade de adaptação e de diálogo dos portugueses às situações que se lhe deparavam — ou seja, o produto de um entendimento, ora tácito ora explícito, entre portugueses e chineses —, que permitiu a perpetuação da situação de Macau por mais de quatrocentos anos. Esta constitui, possivelmente, um dos únicos testemunhos mundiais de coexistência e convivência seculares entre dois povos em tudo diferentes e que, nem por esse facto, perderam as suas identidades próprias. O segredo residirá, talvez, na perpetuação -- ao longo dessa plurissecular história comum — de legitimidades jurídico-institucionais paralelas sobre um mesmo Território, ainda que sucessivamente adaptadas aos novos tempos.

"Pergumtarees pollos Chins,

e de que parte veem..."

D. Manuel (1508)

Nas costas da China, aventureiros isolados tentaram o entabulamento de relações comerciais -- uma vez ultrapassada a grande barreira dos mares com a passagem do Cabo da Boa Esperança em 1487 pelo navegador português Bartolomeu Dias e a chegada às costas da Índia da armada de Vasco da Gama em Maio de 1498.

Era grande o interesse do rei de Portugal, D. Manuel, no estabelecimento desse contacto, como se infere da leitura do Regimento que, em 1508, deu a Diogo Lopes de Sequeira, o qual concretizou, no ano seguinte, a primeira expedição portuguesa a Malaca: "Item. Pregumtarees pollos Chins, e de que parte veem, e de cam lomge, e de quamto em quamto vem a Mallaca ou aos lugares em que trautam, e as mercadaryas que trazem, e quamtas naaos delles vem cada anno, e pellas feyçoees de suas naaos, e se tornam no anno em que veem, e se teem feitores ou cassas em Mallaca ou em outra alguuma terra, e se sam mercadores riquos, e se sam homeens fracos se guerreiros, e se teem armas ou artelharias, e que vestidos trazem, e se sam gramdes homeens de corpos e toda a outra enformaçam delles, e se sam christãos se gentios, ou se he grande terra a sua, e se teem mais de huum rey antre elles, e se vyveem antre elles Mouros ou outra allguma gente que nam vyva na sua ley ou cremça e, se nam sam christaãos, em que creem ou a que adoram, e que custumes guardam e pera que parte se estemde sua terra, e com quem confynam"60. E foi o que os viajantes portugueses fizeram, cumprindo à risca as instruções régias, produzindo textos repletos de informações marcadamente geográficas e comerciais sobre a China, como acabámos de ver, sabendo-se que a primeira referência escrita que é feita aos seus habitantes em documentos portugueses se encontra no planisfério de Cantino e data de 1502 e que o primeiro encontro entre portugueses e chineses terá ocorrido, dois anos depois, em Coulão. Das ainda incorrectas informações que assim conseguiu obter, dará o rei de Portugal conhecimento aos seus congéneres espanhóis em 1505: "y tambien supe nuevas ciertas de grandes gentes de cristianos, que son allende de aquel reino de Cochim, los quales [...] tienen reyes muy grandes, los cuales obedecen á uno solo, y son hombres blancos y de cabellos loros, é habidos por fuertes, e llamase la tierra Malchima, de donde vienen las porcelanas é asmisle [i. e.,almíscar] [...], y de las porcelanas hay vasos tan finos que uno solo vale hallá cien cruzados"61. Não nos esqueçamos, ainda, do chinês que, acompanhado de algumas preciosidades — um livro e um mapa do litoral da China —, Afonso de Albuquerque terá enviado62 de Malaca para Portugal em 1512, e que foi certamente o primeiro que alguma vez pisou solo europeu.

E Malaca, onde se iniciarão os contactos comerciais entre portugueses e chineses, desempenhará, neste contexto, um papel fundamental. Sendo uma cidade marcadamente cosmopolita e inteiramente dependente do comércio e das ligações marítimas, era, desde os inícios do século XV, o centro nevrálgico de todo o comércio no Extremo Oriente, desde o Ceilão à Insulíndia, e o local de cruzamento — e de redistribuição dos respectivos produtos —, de três das mais importantes rotas comerciais da Ásia, a saber: a das especiarias; a do algodão e a dos produtos requintados da China, situação de que os portugueses se deram conta63, logo que chegaram ao Oriente.

Sendo um sultanato, antigamente dependente do reino do Sião e de cuja alçada se libertara há cerca de duas ou três décadas, Malaca era, ainda à época em que foi conquistado por Portugal, em 1511, tributária ao Reino da Grande Claridade, situação que viria a influenciar negativamente os primeiros contactos dos portugueses com a China64, não obstante haver referências65, quer portuguesas quer chinesas, à ajuda dada pelos chins no desembarque das tropas de Albuquerque aquando da conquista da cidade.

Malaca tornar-se-á, em consequência, a melhor base de suporte para os intentos portugueses na China e na Insulíndia, tanto do ponto de vista diplomático como do comercial e até do náutico. Será de lá, mas contando com os conhecimentos, o apoio, e até o financiamento, do novo bendara da cidade nomeado pelos portugueses, Nina Chatu, que partirão, logo em Maio de 1513, Jorge Álvares66, e outros dois compatriotas, com destino à China. Acompanhavam-nos; em viagem de regresso, os quatro juncos chineses que, em Abril desse mesmo ano, lá se haviam deslocado a "apalpar a terra"67, ou seja, os primeiros navios chineses que tocaram Malaca após a sua conquista por Afonso de Albuquerque.

Terão sido estes os primeiros de muitos portugueses que alcançaram a China no século XVI, ao aportarem a Tamão68, local onde, em nome do rei de Portugal, erigiram um padrão, o que é corroborado por fontes chinesas da época69, e onde Jorge Álvares, que já lá deixara um filho, viria, muito provalmente, a falecer e a ser sepultado uns anos mais tarde.

Os resultados desta expedição marítima à China, a primeira concretizada por ocidentais, foram tão positivos que se dizia ser "tão lucrativo vender pimenta na China, como levá-la para Portugal"70, atitude que haveria de influenciar decisivamente a atitude e a insistência dos portugueses no estabelecimento de relações com o Império do Meio.

Ao nível diplomático, o papel pioneiro foi protagonizado por Tomé Pires71 — que, como vimos, também nos deixou um texto fundamental para a nossa visão inicial do Oriente e da própria China72 —, de quem se acabaria por perder o rasto, sem que tivesse conseguido entabular relações comerciais e diplomáticas com o Celeste Império. Mas se não logrou o tão almejado contacto com o imperador, registe-se que havia, contudo, obtido afável e prolongado acolhimento em Cantão. Idêntico resultado terá em 1522 a missão de que Martim Afonso de Melo Coutinho, no ano anterior nomeado "capitão da fortaleza que se há de fazer na China"73, fora incumbido, ou seja, a de consolidar a amizade que D. Manuel já julgava estabelecida com os chineses, devendo para o efeito conduzir novo embaixador ao Império do Meio. É interessante salientar como, face ao insucesso da expedição, Martim Afonso virá a realçar, curiosamente para a época, como Portugal subestimara — talvez ainda devido à escassez de informações precisas — o potentado que era a China, guiando-se, nesses primeiros contactos, por uma estratégia74 idêntica à implementada nas zonas costeiras do Índico e do Pacífica, absolutamente contrária às concepções e à política de relacionamento da China com o exterior, como veremos adiante.

O que desde então se passou até se registarem as primeiras referências ocidentais relativas a Macau, na década de 50, e daí à fixação dos portugueses nesta pequena península de nome Hoi-Keang (Hao Ching Ao)75, na boca do Rio das Pérolas, entre 1552 e 155776, é algo de muito vago e difuso. E isto apesar de referências à embaixada de Tomé Pires e das descrições e relatos77 da China produzidos a partir de um conhecimento vivencial, onde figuram nomes como os dos cativos Cristovão Vieira e Vasco Calvo — os quais marcam a dianteira nesta matéria com textos datados de 1524 --; Galiote Pereira e sobretudo, embora um pouco mais tardiamente, frei Gaspar da Cruz, entre outros, sem, no entanto, esquecer Fernão Mendes Pinto78.

Este, um dos pioneiros portugueses que terá aportado a Macau, a caminho do Japão, e o primeiro que lhe registou o nome79 em língua portuguesa, em carta datada de 20 de Novembro de 1555, deixou-nos uma obra fundamental --a Peregrinação80, publicada postumamente em 1614 —, na qual relata as suas andanças (1537-1558) pelo Oriente. Para cá veio, ainda jovem, em busca de fortuna, tal como os seusirmãos81, Álvaro e António, tendo-o percorrido, desde a Abissínia ao Japão, mercanciando pela Índia e Malaca, donde passou ao Sião, Pegue Samatra, não sem grandes incidentes e atribulações82.

Se bem que a sua obra seja um entrosamento entre a ficção e a realidade83, constitui a Peregrinação uma obra ímpar e um precioso testemunho sobre os primeiros contactos dos portugueses com o Oriente, sendo certo que calcorreou toda a costa da Birmânia à China e ao Japão. Há, contudo, — e para isso existem inúmeras edições críticas da sua obra e estudos sobre a mesma --, que ultrapassar os anacronismos e as incorrecções que contém, motivados tanto pelo estilo narrativo adoptado, como pelas importações do imaginário colectivo que reflecte, e que distinguir, como nos dizem António José Saraiva e Óscar Lopes84 entre os capítulos "que se inspiram evidentemente na experiência directa e capítulos que são reconstruções a partir de fontes literárias e outras igualmente indirectas. Está no primeiro caso a descrição do Japão, ou antes, dos meios aristocráticos japoneses, de que F. M. P. apreendeu com finura feições típicas (...) antecipando-se aos observadores exotistas do século XIX. Está no segundo caso a descrição da China, prodigiosa civilização que o espanta e cuja superioridade ele procura explicar pela história, leis, normas morais e preceitos religiosos. Esta descrição da China é na realidade o esboço de uma utopia, e antecipa-se à crítica social mediante contrastes de civilizações, tão praticada no século XVIII."

De qualquer forma são hoje consideradas inverosímeis quer a sua narração da destruição de Liampó85, quer a descrição da viagem que terá realizado?86, entre 1540 e 1544, ao interior da China, entre outras, não obstante se considerar que Fernão Mendes Pinto as terá elaborado de memória, -- fantasiando-as, como vimos --, a partir de testemunhos, orais e escritos, de companheiros e, mesmo, de autores orientais87. No respeitante à China, de que também nos transmite uma visão idealizada— sendo mesmo, no seio da literatura portuguesa de viagens, um dos principais responsáveis por ter alimentado essa concepção utópica —, está provado que a sua principal fonte88 de informação foi o já referido Tratado... de Gaspar da Cruz.

Igualmente no período de fixação dos portugueses em Macau terá o seu grande poeta Luís de Camões89, que viajou pelo Oriente entre 1553 e 1569, passado por estas paragens, permanecendo ainda hoje a sua estadia no Território — segundo uns, como provedor dos órfãos e defuntos — uma incógnita, não obstante a polémica gerada em tomo do assunto90.

E o autor do poema épico Os Lusíadas91, publicado em 1572, que o haveria de imortalizar e de tornar no símbolo da nação portuguesa, a qual comemora no dia da morte do poeta -- 10 de Junho — o seu dia nacional. Nele nos relata, recriando a estrutura dos clássicos gregos congéneres, a epopeia marítima dos portugueses e a História de Portugal. Embora exalte claramente a hegemonia, o modelo político e a organização do Celeste Império -- e é bem curiosa a menção à muralha da China e à absorção que o império faz da prata do Japão —e se revele já um autor marcadamente humanista, não nos descreve a China como o modelo a seguir, veiculando ainda, de forma clara, a ideia da superioridade europeia92. Senão vejamos:

    "(...)
    Verás as várias partes, que os insanos
    Mares dividem, onde se apousentam
    Várias nações, que mandam vários Reis, 
    Vários costumes seus e várias leis. 
    
    Vês Europa Cristã, mais alta e clara
    Que as outras em polícia e fortaleza. 
    
    (...)
    
    Vês, corre a costa que Champá se chama, 
    Cuja mata é do pau cheiroso ornada; 
    Vês, Cauchichina está, de escura fama, 
    E de Ainão vê a incógnita enseada; 
    Aqui o soberbo Império, que se afama
    Com terras e riqueza não cuidada, 
    Da China corre, e ocupa o senhorio
    Desde o Trópico ardente ao Cinto frio. 
    
    Olha o muro e edifício nunca crido, 
    Que entre um império e outro se edifica, 
    Certíssimo sinal e conhecido, 
    Da potência real, soberba e rica. 
    Estes, o Rei que tem, não foi nacido
    Princepe, nem dos pais aos filhos fica, 
    Mas elegem aquele que é famoso
    Por cavaleiro, sábio e virtuoso. 
    
    Inda outra muita terra se te esconde, 
    Até que venha o tempo de mostrar-se. 
    Mas não deixes no mar as Ilhas onde
    A Natureza quis mais afamar-se; 
    Esta, meia escondida, que responde
    De longe à China, donde vem buscar-se, 
    É Japão, onde nace a prata fina, 
    Que ilustrada será co a Lei divina."93

Obra esta bem diferente da do já mencionado Fernão Mendes Pinto, seu contemporâneo, que não nos descreveu a epopeia, mas, muito antes pelo contrário, a gesta do homem real, a viagem do chatim94, sobre a qual faz incidir, incessantemente, e das mais variadas formas, os seus julgamento e espírito crítico. Retrata acima de tudo o espírito dos pioneiros que demandavam, muitos dos quais por conta própria, a fortuna no Oriente, fazendo o que se chamou de "comércio de Índia em Índia"95, em boa parte uma consequência da liberdade de trato decretada em 1515 pelo vice-rei Lopo Soares de Albergaria nas terras a Leste do Cabo Comorim.

Basta dizer-se que em 1545 haveria cerca de 200 portugueses independentes96 nas costas da China, número que rapidamente passará para 2 000 vinte anos depois97, abrangendo embora este último cômputo a China e o Sião.

Foram longos anos de percursos, aventuras, violências, choques, odisseias e escalas individuais, subjacentes a estas acções pioneiras98, no contacto clandestino e ilegal —e por essa razão tão pouco documentado — com uma potência solidamente cônscia e orgulhosa dos seus milenares valores políticos, institucionais, sociais e culturais como era a China de então, não obstante a referida divisão entre os partidários da manutenção do comércio externo e os defensores do total isolamento face ao exterior. Apenas poderemos referir que esta acabou não só por permitir, como mesmo por gerir — obviamente que movida por interesses próprios, quer eles fossem regionais ou nacionais —, a fixação dos portugueses numa nesga do seu vasto território, a qual se foi tornando definitiva, dando origem ao que é hoje Macau, apesar de haver sido banido na China, em 1522, todo o comércio com os povos do Ocidente e da ousadia dos portugueses ao desafiarem a ordem pré-estabelecida no Império "ao minar o sistema altamente regulado do comércio tributário"99.

Como se processou esta mudança, ao ponto de ser permitida a permanência portuguesa em terras do Celeste Império, na Cidade do Nome de Deus de Macau, na China, por mais de quatrocentos anos, é outro ponto controverso e gerador de encaloradas mas inconclusivas discussões.

Por falta de prova documental, e consequente inconciliabilidade das diferentes versões existentes quer na historiografia de cada um dos países, como entre ambas, debatem-se distintas posições. Uns privilegiam a ideia de que Macau foi perpetuamente doada aos portugueses em recompensa do auxílio que prestaram às autoridades da província de Guangdong na extradição dos piratas que assolavam e devastavam as costas da região, depois do capitão-mor da viagem da China, Leonel de Sousa, ter restabelecido a paz e o comércio com aquela em 1554. Outros, a de que a permanência portuguesa em Macau foi permitida em virtude do pagamento anual de determinada quantia e, outros ainda; —sobretudo os autores chineses de meados deste século —, que ela se processou através da usurpação territorial.

Dependem, naturalmente, as diferentes interpretações100 não só das épocas que as viram surgir, como, também, da nacionalidade e convicções dos seus defensores.

    "Os fát-lóng-kei puderam então entrar, 
    desordenadamente. 
    (...) Com o tempo, a sua permanência
    tornou-se um facto consumado". 

Tcheong-U-Lâm e Ian-Kuong-Iâm,

Ou-Mun Kei-Leok (Século XVIII)

O que é certo é que os portugueses se fixaram neste pequeno porto, sobranceiro ao qual existia um templo dedicado à deusa Neong-Má, Neang-Má ou A-Má, motivo pelo qual também era conhecido pela designação Baía de A-Má. Segundo afirmam os especialistas101, não sem alguma controvérsia acrescente-se, o seu actual nome ocidental terá derivado da evolução da transliteração dessa expressão chinesa — não obstante a diversidade de formas em presença — para Amagau e/ ou Amacao, Macao e, finalmente, Macau.

Convém referir, no entanto, que, nesta época, já os portugueses frequentavam com alguma assiduidade os portos japoneses meridionais102, nomeadamente os das ilhas de Tanegaxima e Kiu-Shiu, tais como Usuqui, Funai, Cagoxima, Hirado e Omura.

A partir do seu estabelecimento103 em Macau, dele fizeram o alicerce dum contínuo e proveitoso comércio com o Extremo Oriente, penetrando lentamente na China, mercanciando durante cerca dum século (1543-1639) entre ela e o Japão, actividade de que Macau deteve a exclusividade durante metade deste período e que, aliás, representava, na época, o circuito comercial mais lucrativo104 do Estado da Índia105. A rota era assegurada pelo Kurofuné (navio negro), a nossa Nau do Trato, que, a partir de 1571, se fixou definitivamente no excelente porto de Nagasáqui, o qual passou a constituir o término da Rota do Japão. A referida exclusividade manteve-se até cerca de 1600, altura em que os navios chinenses retomaram o comércio directo com o Japão, que já vigorara entre 1368 e 1549, mas que só voltará a ser oficializado106 em 1644.

Um facto que bem atesta da dependência e intimidade das relações entre o Japão e Macau é a constatação de que era precisamente o capitão-mor da viagem do Japão107 a autoridade máxima do governo político e militar da cidade de Macau durante a sua estadia no Território, nesta fase inicial da sua existência.

Assim, através do comércio, da religião, da técnica, da pólvora, da gastronomia ou do amor, foram os portugueses deixando marcas culturais e civilizacionais da sua passagem por esta zona do mundo.

Desde cedo, foram coadjuvados nesta tarefa pelos representantes da Igreja Católica que, em 1576, elevará Macauà categoria de diocese.

Mas ficou a dever-se sobretudo à acção dos jesuítas não apenas grande parte da difusão do catolicismo por terras do Oriente — incluindo a China e o Japão, onde gozaram de enorme preponderância e prestígio —, como o próprio conhecimento recíproco das cultura e civilização ocidentais e orientais. Ao ponto de, em 1580, lhes ter sido doada a cidade de Nagasáqui, já aberta ao comércio com os portugueses desde 1569. Por Bula de Gregório XIII, datada de 28.01.1585, obtiveram a exclusividade da evangelização do Japão, cujo povo S. Francisco Xavier caracterizara como: "gente de honra, desejosa de saber, obedienteà razão e a melhor de quantas se haviam descoberto"108.

Os jesuítas fizeram de Macau109 o centro irradiador da sua acção, com relevo para o papel desempenhado pelo Colégio de S. Paulo, elevado à categoria de Universidade110 em 1595, sob a direcção do P. e Duarte de Sande, local onde já haviam instalado a primeira imprensa de caracteres móveis na China em 1588.

A testemunhar esta importância é ainda hoje patente a imponência da célebre fachada da Igreja da Madre de Deus, desenhada pelo jesuíta genovês Carlo Spínola, martirizado no Japão em 1622, e construída cerca de 1640, enquanto que a Igreja, popularmente designada de S. Paulo, que fora edificada entre 1601 e 1602, viria a ser destruída pelas chamas em 26 de Janeiro de 1835. Para a sua construção e embelezamento terão não só contribuído artífices e artistas japoneses refugiados111 em Macau, como os próprios réditos112 do comércio luso-nipónico, já que, por decisão do Senado, a cidade de Macau contribuiu com 3 130 pardaus para a reconstrução da Igreja de S. Paulo, em cumprimento de uma promessa pela salvação de um navio desaparecido.

Bastará referir, para sublinhar o alcance daquela contribuição113, os nomes de S. Francisco Xavier, o Apóstolo do Oriente, que visitou o Japão logo em 1549-1551 e morreu em Sanchoão no ano seguinte, e o de Mateus Ricci, distinto matemático e cartógrafo, que logrou assento na própria Corte imperial chinesa.

De início, os portugueses foram os únicos ocidentais, sendo, a partir do século XVI e até se extinguir no XIX, a sua língua utilizada em todo o Oriente como uma nova língua franca, ocupando parte do espaço de comunicação anteriormente sob a égide do malaio114. Tratando-se de um português simplificado e não uniforme porque misturado com outras línguas da região — principalmente com o malaio e as do continente indiano, sobretudo das zonas costeiras, como o guzarate, o marata e o concani--,era não só utilizado na redacção de documentos oficiais respeitantes ao contacto entre os diversos povos orientais com os ocidentais, como, mesmo, entre estes —holandeses, ingleses, dinamarqueses, espanhóis, etc... — desde a Índia às Maurícias, Samatra ao Japão, Batávia ao Sri Lanka, Celebes às Nicobar e até na própria China, sem esquecer as actuais Tailândia e Birmânia115.

Desse contacto linguístico resultou a introdução de inúmeros vocábulos de origem portuguesa nas línguas locais (e vice-versa), nomedamente no japonês116 e no próprio malaio.

A partir do século XVII, os portugueses disputaram com os holandeses e os ingleses, o rendoso monopólio da troca entre a seda e a prata; a colocação nos mercados europeus dos produtos originários dum Oriente distante, exótico e requintado: o chá, a porcelana, o mobiliário, a seda e, mesmo, ainda que mais tarde, a mão-de-obra117.

Macau foi por isso, a partir de 1603, alvo de sucessivos ataques holandeses118, dos quais se regista como o mais violento aquele que culminou no dia 24 de Junho de 1622. A celebrar a vitória comemora-se ainda hoje nessa data o dia da cidade. A História da presença portuguesa no Oriente, a partir dos finais do século XVI e durante o seguinte, está perpassada da conflitualidade e concorrência entre Portugal, e a recém-unificada Holanda. Subjacente estavam questões comerciais, religiosas e políticas que dividiam a Europa, e que se farão sentir de forma especialmente aguda no Japão logo a seguir à chegada do primeiro navio holandês ao arquipélago nipónico, em 1600, e ao estabelecimento da sua primeira feitoria em Hirado em 1609.

Contudo, a mais desastrosa consequência será a tomada de Malaca em 1641, em virtude do que praticamente ficaram bloqueadas as ligações entre Macau e a Índia e outros portos de que dependiam os seus tradicionais circuitos comerciais.

Mas uma das mais importantes questões em presença era — para além do antagonismo entre holandeses e espanhóis, a cuja coroa Portugal estava, na época, sujeito —, a contestação do princípio e política do mareclausum consignada pelo Tratado de Tordesilhas119, por oposição à do mare librum, teorizada por Hugo Grócio.

Por seu turno os ingleses, detentores de forte avanço tecnológico que lhes permitiu revolucionar a nível mundial -- com a introdução da máquina a vapor -- o antigo sistema de transportes e da produção, irão, aos poucos, monopolizando o comércio externo da China e utilizando Macau — a coberto da antiga aliança existente entre Portugal e o seu país --como porta de entrada em território imperial. Assim acontecerá a partir dos inícios do século XIX e até saírem vencedores da Guerra do Ópio120 em1842.

Enfraquecidas as suas gentes pela dependência do ópio — cujo tráfego, porque vantajosa moeda de troca para a aquisição dos produtos chineses, tradicionalmente pagos em prata, era liderado pelos ingleses há largas décadas —; derrotada militarmente; obrigada a integrar-se em termos de igualdade na comunidade das nações, a China iniciou então uma fase de grande dependência externa, da qual só viria a libertar-se já neste século.

Logo em 1808, e a pretexto de em Macau se ter abrigado uma embarcação francesa, tentarão fixar-se militarmente neste pequeno porto, o mesmo acontecendo durante o referido conflito com a China.

Mais tarde, e uma vez vitoriosos, os ingleses implantar-se-ão fortemente no vale do rio Yan-Tzé, em Xangai e outras cidades do Sul da China — no que foram secundados por quase todas as potências estrangeiras — e incrementarão a economia imperialista com a criação de Hong-Kong em 1841, a qual se virá a tornar numa das maiores praças financeiras mundiais.

Esta outra presença ocidental no Extremo Oriente abalará fortemente a economia, a estabilidade e a própria sociedade de Macau, tal como acontecera dois séculos antes, então em consequência da proibição do comércio externo decretado no Japão, o qual havia sido, durante quase cem anos, a base da existência, crescimento e permanência portuguesa em Macau. O Território viverá momentos de angústia até conseguir desbravar novas formas de sobrevivência121, a qual fora assegurada, em idênticas circunst^ancias, no século XVII, pelo acesso a novos mercados no Sueste Asiático; pelo restabelecimento do comércio com Manila e pela obtenção do monopólio das transacções entre a China e a Batávia a partir de 1718.

Àquele golpe seguir-se-á — e até à afirmação duma dominação colonial, de que o governador Ferreira do Amaral 122 terá sido a expressão emblemática, contando com a favorabilidade da conjuntura internacional e com a dependência que a derrota militar provocara no outrora poderoso império sínico —, a imposição de constantes exigências normativas e pecuniárias a Macau por parte da mesma China, após a queda da dinastia Ming em 1644. De entre elas as geralmente apontadas como mais gravosas terão sido a criação duma alfândega chinesa em Macau, Ho-Pu, em 1684, e a imposição, em 1736, da permanência no Território de um Tso-Tang, ou mandarim.

Destas situações decorrerão não apenas novos encargos tributários impostos tanto à população local como àquela que aqui se ia radicando, portuguesa ou estrangeira, como, mesmo, o desenvolvimento de conflitos políticos, económicos, sociais, raciais, e até religiosos.

A fim de apaziguar, negociar, esclarecer e regulamentar tais situações, Portugal enviará outras quatro embaixadas123 a Pequim. Uma em 1667, chefiada por Manuel de Saldanha, outra em 1726 por Alexandre Metello de Sousa e Menezes, a terceira, em 1752, por Francisco Assis Pacheco de Sampaio e a última, em 1783, pelo bispo D. Alexandre de Gouveia, as quais se revelarão ineficazes, no entanto.

Só em 1887, e após mais de duas décadas de negociações, se assinará o Protocolo de Lisboa, confirmado e ratificado pelo Tratado de Comércio e Amizade, celebrado entre Portugal e a China em 28 de Agosto do ano seguinte, no qual é reconhecida a perpétua ocupação do território de Macau pelos portugueses, mercê da conjuntura internacional por demais referida124, e que posteriormente servirá de base à denúncia, desse e doutros tratados, pela China.

Mas mesmo assim ficariam por resolver as questões inerentes à delimitação territorial de Macau, colocadas desde cerca de 1573 com a criação das Portas do Cerco125 — clara afirmação por parte da China do interesse na existência, mas de uma forma controlada, deste entreposto comercial. Aquelas arrastar-se-ão até este século sem grandes resultados, vigorando acima de tudo nestas — e noutras — questões o direito consuetudinário.

Tais indefinições não obstaram, contudo, a que desde muito cedo se tenham institucionalizado em Macau — elevada a cidade em 1586 — formas de administração126 e de soberania127 claramente portuguesas, as quais vão desde a organização do poder municipal em 1583, com a designação de Senado da Câmara, mais tarde Leal Senado; do judicial em 1587, e do progressivo fortalecimento do central, inicialmente representado pelo capitão-geral, e depois pelo governador.

Até 20 de Abril de 1844, o Território encontrar-se-á na dependência do Estado da Índia, por sua vez representativo da Coroa.Desde essa altura, Macau, juntamente com Timor e Solor, passarão a constituir uma província do então Ultramar Português.

A partir dos finais do século XVIII, a cidade irá crescendo cada vez mais até obter a configuração actual -- ela mesma em mutação—, não só fruto dos constantes assoreamentos que, natural ou artificialmente, a dotarão de maior extensão territorial, como do incontrolável afluxo de gentes que, principalmente oriundas da China, a tornaram dia a dia mais populosa, alterando-lhe a fisionomia, a arquitectura, o quotidiano, os costumes, o ambiente e principalmente a economia.

Assim sucedeu de forma maciça em 1937, aquando da invasão japonesa à China e, já durante a II Guerra Mundial, quando Hong-Kong caiu em poder das forças nipónicas em 1941.

Desenvolvendo-se diaria e rapidamente, estando ligada desde 1974, pela Ponte Nobre de Carvalho128 à Ilha da Taipa — por sua vez unida à de Coloane por um istmo artificial desde 1968 —, Macau, que neste século se tornou local de atracção turística internacional pelo incremento do jogo e pela realização anual de um Grande Prémio de Fórmula 3 a partir de 1954, é hoje bem diferente da pacata cidade que acolheu Sun Yat-Sen em 1892, o homem que anunciaria a República chinesa em 10 de Outubro de 191 I. Dela foi, ainda, o primeiro presidente provisório, após a proclamação oficial da mesma, em 1 de Janeiro de 1912.

Macau é testemunho de tudo isso porque resistiu sob administração portuguesa às vagas mercantilistas e imperialistas da conquista e dominação de novos mercados; às convulsões mundiais deste século e às alterações políticas internas da própria China. Sentiu-lhe, naturalmente, os reflexos e teve de se adaptar aos novos tempos, geradores de mutações a todos os níveis e também ao daquele que respeita ao seu próprio, e em muitos aspectos, único, estatuto no mundo, preparando-se, agora, na sequência dum processo iniciado em 1985, para a transição definitiva, a qual culminará no ano de 2049, altura em que se integrará plenamente na milenar China.

NOTAS

** Sobre este assunto vejam-se os nossos textos:

— "MACAU: Em Busca das Suas Fontes e da Sua História" Revista de Cultura, Macau, (4), Janeiro/Março de 1988, pp.79-83. Versões chinesa e inglesa;

— "Sobre a História de Macau. Historiografia. Metodologia e Periodização", comunicação apresentada no Encontro Sobre a História de Macau, Macau, Universidade da Ásia Oriental, 16 e 17 de Junho de 1990;

— "Projecto de Pesquisa e Publicação de Fontes Comparadas Para a História de Macau: Objectivos, Metodologia e Execução", in Leba, Lisboa, (7), 1992, pp. 493-514;

— "História de Macau: Contributos para uma Abordagem Global", in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (19), Abril/Junho de 1994, pp. 102-1 12. Versões chinesa e inglesa.

1. Situada na respectiva orla meridional, a cerca de 60 Km a sudoeste de Hong-Kong, os seus valores de latitude e de longitude variam respectivamente de 22° 06'40" Norte a 22° 13'01" Norte e de 113° 34' 47" Este a 113° 35' 20" Este.

2. Segundo T'ien-Tsê Chang, Sino-Portuguese Trade from 1514 to 1644. A synthesis of portuguese and chinese sources, Leiden, E. J. Brill, 1934, p. 87, a designação chinesa mais correcta será, no entanto, Hao-ching-ao, significando Baía de Hao-ching.

3. De acordo com o opúsculo Macau em Números, Macau, Direcção dos Serviços de Estatística e Censos, Junho de 1996.

Contudo, o último Censo, referente ao dia 31 de Agosto de 1991, indicava o número de 355 693 residentes para uma população global de 403 038. Geraram estes dados alguma controvérsia porquanto o número anteriormente estimado rondava os cerca de 460 mil habitantes.

Tais dúvidas tornam-se mais perceptíveis se atentarmos nas características flutuantes da população do Território, a qual engloba ainda uma forte componente marítima, factores que naturalmente foram levados em consideração pelo mencionado recenseamento.

4. "Os Arquivos Oficiais e a Construção Social do Passado", in A Eserita da História. Teoria e Métodos, Lx., Editorial Estampa, 1988, p. 91.

5. A Viagem. Memória e Espaço. Cadernos da Revista de História Económica e Social, (11-12), Lx., Sá da Costa, 1989, p. 91.

Vd. tb. a introdução de Raffaella D'Intino à sua colectâneaEnformação das Cousas da China. Textos do Séc. XVI, Lx., Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1989, pp. XIII-XXIII, mas, sobretudo, a obra de referência básica de Vitorino Magalhães Godinho, Mito e Mercadoria. Utopia e Prática de Navegar, Lx., Difel, 1990.

6. Ásia. Décadas, III, iv, 1, apud Armando Cortesão, A Suma Oriental de Tomé Pires e o Livro de Francisco Rodrigues, Coimbra, Universidade de Coimbra, 1978, p. 36.

Cf. K. C. Fok, "Pimeiras Imagens da Dinastia Ming Sobre os Portugueses", in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (23), Abril/Junho de 1995, especialmente pp. 5-6.

7. Para a precisão do conceito consulte-se, entre outros, o supracitado livro de Vitorino Magalhães Godinho, p. 148, onde o resume como: "Um conjunto de valores, definindo, não um, mas vários humanismos, com tónicas diferentes. Ao humanismo técnico-prático, de espírito de precisão, de observação e experiência provocada, voltado para o porvir, contrapõe-se o humanismo livresco que à Antiguidade vai haurir os seus padrões, mas que recuará ante a progressiva afirmação da superioridade dos Modernos sobre os Antigos. (...) Mas nas atitudes humanistas —falemos no plural, conforme conviemos — há algo mais. Há, com o vertiginoso alargamento do horizonte geográfico e consequente conhecimento de tantos outros povos tão diferentes que se chega a duvidar se são humanos, por fim o triunfo da concepção da unidade da espécie humana através dessa variedade, aparente mas não de essência. Donde o interesse pelos outros como outros; mas só difícil, lenta, penosamente os homens chegarão a abster-se de impor os valores da sua etnia ou civilização aos outros, a que primeiro se nega pertencerem à civilização e depois se reconhece representarem outras civilizações. E dentro do Estado, urbano ou nacional, o humanismo é a tomada de consciência, não menos difícil, lenta e penosa, de que o homem é o valor supremo na sociedade — cidadão e não súbdito. Em qualquer dos casos, a ressureição da Antiguidade não passa de uma das correntes que ao grande movimento confluem, e este movimento é essencialmente um descobrimento conexo do descobrimento do mundo, uma invenção do ser humano no espaço novamente inventado."

8. "O processo multissecular de desencravamento tendente a colocar em relação os que até então foram "univers cloisonées" de culturas e civilizações atinge uma fase decisiva quando a cristandade ocidental chama a si a iniciativa, assumindo perante o mundo "a construção do espaço e a invenção da humanidade". Tomando como ponto de partida o século XIII, altura em que o cabedal técnico-científico e a utensilagem mental do homem do Ocidente foram suficientes para permitirem o desenvolvimento que posteriormente se desencadeou, poderemos constatar que, em finais de Quinhentos, o take-offda Europa do Ponente era um facto consumado e que levara consigo os destinos do resto do mundo, provocando uma verdadeira revolução da postura humana no universo, abalando rodas as estruturas, desde a demografia e a civilização material aos modos de pensar e de sentir, passando pelos comportamentos e pelas condutas, reformando, enfim, os horizontes ontognoseológicos do homem de então." -- são as palavras com que João Rocha Pinto inicia o já citado estudo, p. 27, e que bem explicitam a ideia que aqui queremos transmitir. Para maior desenvolvimento, vd. tb. Vitorino Magalhães Godinho, op. cit..

9. Vd. os nem sempre considerados contactos sino-europeus anteriores ao século XVI apontados por Benjamin Videira Pires, Os Extremos Conciliam-se (Transculturação em Macau), Macau, Instituto Cultural de Macau, 1988, especialmente os Caps. I a III, pp. 11-33. E, mais uma vez, Vitorino Magalhães Godinho, op. cit., nomeadamente os Caps. IV, "Da geografia mítica e livresca às explorações reais", pp. 153-167 e VII "Sociedades e civilizações da Ásia. Perspectivas do caravaneiro e perspectiva do navegador", pp. 255-295.

10. Apud Augusto Reis Machado na sua introdução ao Livro Em Que Dá Relação do Que Viu e Ouviu no Oriente Buarte Barbosa, que editou, Lx., Agência Geral das Colónias, 1946, p. 8.

11. Apud Raffaella D'Intino, op. cit., p. XIII, n. 8, deonde retiramos a citação.

12. Op. cit., pp. 52, 71, 74 e 75, sobretudo.

13.0p. cit., pp. XIII-XXXIX.

14."A visão da China como civilização, sociedade, economia, poder-se-ia seguir partindo da Suma Oriental de Tomé Pires em 1512-1515 (fls. 160-152v°), através da "Enformação da Chyna, mandada per huu homem a mestre Framcysquo", inserta no Livro que trata das cousas da India e do Japão, anónimo de cerca de 1548, de Fernão Lopes de Castanheda, no liv. IV, caps. XXVII e XXX (este descreve Cantão), da História do Descobrimento e Conquista da Índia pelos Portugueses (1551-1554), até o Soldado Prático (cap. XXXII), em 1610; com a etapa decisiva do Tratado da China, de frei Gaspar da Cruz, saído do prelo em 1570, a primeira obra a revelar à Europa aquele império na sua multiplicidade de facetas e na sua extensão (Marco Polo dá-nos os Mongóis na China). O primeiro citado, ainda por informações indirectas; mas já o enaltece: "Non tirando a groria a cada terra, bem parecem as cousas de Chijna serem de terra homrrada e boa e riqua muito". Aliás, em 1534 Garcia de Resende gaba as suas "polícias tam polidas" (embora o paradigma ainda seja o império turco). A propósito de Cantão, Castanheda realça que a cidade "he taro bem regida que nom tem enveja às milhores d'Europa". Caminha-se para a sedução do modelo chinês a contrapor aos vícios dos reinos cristãos, que no século XVIIII triunfará. Como então se conceberão os antípodas como os que representam o mundo ao invés, alteridade e até contraposição, alternativa cultural à Europa (Urs Bitterly)", op. cit., p. 134. Veja-se também como, a pp. 586-587, contesta a exclusividade dessa utopia e sublinha o realismo das descrições pioneiras dos portugueses sobre a China.

15. Paris, 1963, I, p. 205, apud Rafaella D'Intino, op. cit., p. XXXIX, n. 124.

16. Nós mesma desenvolvemos um pouco mais este tema na comunicação"O Fim da Viagem Será o Fim da Utopia", apresentada, em 1993, no Encontro Sobre o Português Como Língua de Cultura, einserta no volume das respectivas Actas, Macau, Praiagrande Edições, 1995, pp. 317-330.

17. Duarte Barbosa era filho de Diogo Barbosa, um apaniguado do Conde de Tentúgal, D. Álvaro, irmão do 3° Duque de Bragança, que, acusado de traição e conspiração com os castelhanos, foi condenado ao cadafalso em 1483. Por esse motivo, D. Álvaro procuraria refúgio em Castela, no que foi acompanhado por Diogo Barbosa. Este, após a morte do seu senhor, viria a fixar residência com a família em Sevilha, não sem que antes tivesse tentado a sorte nas Índias, integrando a expedição de João da Nova em 1501. Secundou-o o filho, Duarte Barbosa, que empreendeu diversas viagens pelo Oriente, do que nos dá notícia no seu Livro..., concluído em 1516. Contudo, a mais destacada aventura de Duarte Barbosa estaria ainda para surgir, visto que só em 1519 partiria — e, ao que parece, igualmente descontente com o rei de Portugal — com o seu cunhado Fernão de Magalhães para a demanda das Molucas pelo Ocidente, realizando a viagem de circum-navegação que o haveria de celebrizar. Mas nem Magalhães nem Barbosa regressariam, tendo ambos sido assassinados nas Filipinas em 1521. Para mais pormenores consulte-se a referida introdução de Augusto Reis Machado aoLivro..., cit., pp. 10-12.

18. Livro Em Que Dá Relação do Que Viu e Ouviu no Oriente Buarte Barbosa, cit., pp. 217-219. Cf. n. 10.

19. Libro di Odoardo Barbosa, incluso no primeiro volume do seu Delle Navigationi et Viaggi, Veneza, Tomasso Giunti, 1550. A obra, que consta de três volumes, acabou de se publicar em 1554.

20. Editada por Armando Cortesão, a partir do manuscrito que encontrou em 1937 na Bibliothéque de l'Assemblée Nationale, em Paris, juntamente com O Livro de Francisco Rodrigues, Coimbra, Universidade de Coimbra, 1978, pp. 130 e ss.. Sobre a história e a descoberta do manuscrito, veja-se o que nos diz a pp. 3-7.

21. Publicada pela Hakluyat Society em 1945, embora com uma transcrição do texto original. Vd. op. cit., "Proémio" e "Prefácio", VI-X.

22. Não obstante os anteriores relatos dos viajantes medievais. Vd. op. cit., p.78.

Sobre a importância da obra, que classifica como "a primeira geografia global do Oriente nos tempos modernos" veja-se Rui Loureiro na sua edição de o Manuscrito de Lisboa da "Suma Oriental" de Tomé Pires (Contribuição para uma edição crítica), Macau, Instituto Português do Oriente, 1996, pp.27-43.

23. Ramúsio faz seguir o livro de Duarte Barbosa do "Sommario di tutti li regni, Citta, e populi orientali, con li traffichi e mercantie, che iui si trouano, cominciando dal mar Rosso fino alli popili dalla China"que diz ser "tradotto dalla lingua Portoghese nella Italiana", afirmando-nos, contudo, desconhecer o respectivo autor: "(...) o sumário, segundo o que consegui averiguar, também foi composto por um cavalheiro português, que navegou por todo o Oriente, e tendo lido o Livro de Barbosa, desejou descrever quase as mesmas coisas à sua maneira e de acordo com a informação que recebera, e especialmente sobre aquela parte onde estão as Molucas, que têm para norte uma longa costa de terra firme, (...); e segundo me disseram, ele tentou descrevê-la com mais pormenor do que era capaz, pois essa é uma das partes mais singulares e notáveis que o globo descreve (...). Contudo, quando ele regressou à pátria, se quis que o seu livro fosse visto, foi obrigado a dele suprimir toda aquela parte que, para o fim, trata das Molucas e das especiarias. E tendo eu nesse tempo ordenado, com grandes complicações e dificuldades, que o livro fosse transcrito mesmo em Lisboa, apenas consegui obter uma cópia, e mesmo essa imperfeita; e o mesmo fiz para o Livro de Barbosa em Sevilha. Tanto podem os interesses do príncipe." Apud A. Cortesão, op. cit., pp. 67-68.

24. O manuscrito de Lisboa, que muito provavelmente serviu de base à cópia de Ramúsio feita entre 1525 e 1528, "contém apenas uma cópia parcial da Suma Oriental, da qual foram suprimidas a dedicatória a el-Rei e as extensas secções dedicadas a Malaca e à Insulíndia. Sendo a obra de Tomé Pires uma descrição da Ásia marítima ordenada no sentido oeste-leste, isso significa que os cortes foram efectuados no início e no final do manuscrito. A omissão de todas as referências ao imenso arquipélago que se estendia para leste do estreiro de Singapura justifica-se amplamente, pois, como vimos, essas regiões, onde eram produzidas algumas das mais valiosas mercadorias asiáticas, estavam a ser objecto de intensa disputa entre Portugal e a vizinha Espanha. Logo, todas as informações a elas respeitantes possuíam um elevado valor estratégico", como nos diz Rui Loureiro, op. cit., p. 41. Para maior detalhe, consultem-se também as ps. seguintes.

25. Nas suas"Palavras Introdutórias" à referida edição de Rui Loureiro, op. cit, I.

26. Por facilidade de leitura, utilizamos a edição já citada (cf. n. 22) do manuscrito de Lisboa, muito recentemente publicada por Rui Manuel Loureiro, pp. 145-146 e 193-201, não obstante tratar-se, como vimos, de uma versão mais sintética do que a de Paris (cf. ns. 20 e 24). Acrescentaremos, no entanto, as passagens desta última que considerarmos importantes, utilizando igualmente a edição de Rui Loureiro, que compara e coteja ambas.

27."Riquezas pompas estados/", na versão publicada por A. Cortesão, op. cit., p. 252, diferença contudo não assinalada por Rui M. Loureiro, op. cit..

28."averem se em noso portugall", no manuscrito de Paris, apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 145. Observação que, embora veiculando um preconceito etnocêntrico, à época comum como vimos, já indicia o referido reconhecimento da existência de uma civilização superior na China.

29."tem huum Jeito Dalemaaes tem na barba trinta quoremta cabellos", no manuscrito de Paris, apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 145.

30. Transcrevemos esta descrição, inclusa no manuscrito de Paris a partir da edição de A. Cortesão, op. cit., p. 253, visto que a de Rui Loureiro a omite. Também ela é significativa da atitude comparativista e do quadro mental dominante na época, a que já aludimos. Cf. n. 28.

31. Segundo A. Cortesão, op. cit., p. 253, n. 225, trata-se da mais antiga descrição europeia conhecida dos fai-chis.

32. "altamja ou porcelana", no manuscrito de Paris, apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 146.

33. Pequim, designação só utilizada a partir dos inícios do século XV, como se sabe. Cambara é possivelmente uma sobrevivência da Cambalu ou Cambaluc de Marco Polo, ou ainda da Cambalech de outros escritores medievais, como afirma A. Cortesão, op. cit., pp. 253-254, n. 226.

34. Apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 193.

35. Escrivães, escrevendo.

36. Apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 194.

37. Java.

38. Pacém, actualmente Pasai ou Pasé, porto situado no norte de Samatra e o primeiro reino muçulmano de todo o Sueste Asiático.

39. Apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 195.

40. Cochinchina, do malaio Kuchi, mas significando Tonquim. Vd. Luís Filipe F. R. Thomaz, De Ceuta a Timor, Lx., Difel, p. 524

41. Nantoo ou Namtó, em cantonense Nan-t'ou ou Nam t'au, segundo Armando Cortesão, op. cit., p. 362, n. 373.

42. Chincheo, Chuan Chou ou Chang Chou. Sobre a respectiva localização (cf n. 75) em Fuquien, veja-se A. Cortesão, p. 359-360, n. 370.

43. A. Cortesão, op. cit., p.361, n. 372, onde também refere os diferentes topónimos.

44. Apud Rui M. Loureiro, op. cit., p. 201. Refira-se que também Garcia da Orta nos Colóquios dos Simples e Drogas da Índia, Lx., Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1987, fac-símile da edição de 1895, dirigida e anotada pelo Conde de Ficalho, II, p. 58, destacará, na China, Cantão como "porto della muyto celebrado". Sobre a primeira descrição pormenorizada do porto de Cantão feita por um europeu, o padre jesuíta Belchior Nunes Barreto, essa já a partir do conhecimento directo, consulte-se o artigo, recentemente publicado, de Benjamin Videira Pires, "A Mais Antiga Descrição de Cantão (1555)", in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (23), Abril/Junho de 1995, pp. 31-33. Cf. n. 61.

45. Apud Rui M. Loureiro, op. cit., pp. 195-197.

46. Colóquios... cit., I, p. 260.

47. Idem, I pp. 204-206.

48."Fortaleza dos chins" em Calicute, depois cedidapelo samorim local a PedroAlvares Cabral em 1500. Op. cit, 1, p. 205 e Gaspar Correia, Lendas da Índia, Porto, Lello & Irmão, I, 1975, p. 186.

49. Vd., por exemplo, K. C. Fok, "PimeirasImagens...", cit., pp. 3-12.

50. Op. cit., p. 51.

51. Vd. Vitorino Magalhães Godinho, "Entre Mito e Utopia: Os Descobrimentos, Construção do Espaço e Invenção da Humanidade nos Séculos XV e XVI", in Revista de História Económica e Social, Lx., (12), Julho-Dezembro de 1983, pp. 1-43 e a mais recente Mito e Mercadoria..., cit..

52. Com cerca de um milhão de habitantes em 1500, para uma Europa de 95 milhões, segundo Costa Pinto, op. cit., p. 66 e cerca de um milhão e quatrocentos mil habitantes em 1527, como afirma Vitorino Magalhães Godinho, Mito e Mercadoria..., cit., p. 375.

53. Veja-se a síntese de, e a bibliografia citada por, Rocha Pinto na op. cit, principalmente a pp. 63-67,71-75 e 96.

Para uma obra de maior fôlego e detalhe temos o jámencionado livro de Vitorino Magalhães Godinho, Mito e Mercadoria...., cit..

54. Pelo Tratado de Tordesilhas, celebrado, após longas negociações, entre Portugal e Castela em 7 de Junho de 1494, ficou consignada, com o aval do Papa Alexandre VI, a partilha da descoberta do Mundo entre os dois países. Sob a égide de Portugal ficaram todos os domínios a Oriente do meridiano que passa a 370 léguas de Cabo Verde enquanto que os situados a Ocidente seriam considerados como pertença de Castela.

55. A designação, também Cathay, Citeu, Khitai ou Khata deriva do povo manchu Kitans (Qitañ) que durante os séculos X a XII dominou a China do Norte, e é a forma pela qual a China passa a ser conhecida no Ocidente a partir do império mongol (1278-1368) -- sobretudo devido a Marco Polo--,enquanto que na Antiguidade, desde Plínio e Estrabão, e mesmo ainda na Idade Média, se designava por Seres. Contudo, só nos finais do século XVI, inícios do seguinte, a partir das observações de Martin de Rada, Mateus Ricci'e sobretudo de Bento de Goes, se procederá à sua identificação definitiva com a China -- designação por sua vez possivelmente derivada da dinastia Ts 'in (Ch'in) do terceiro século antes de Cristo. Sobre o assunto, vd. Eduardo Brazão, Em Demanda do Cataio. A Viagem de Bento de Goes à China (1603-1607), Macau, Instituto Cultural de Macau, 2a ed., 1989 e Samuel Couling, Encyclopaedia Sinica, Hong Kong, Oxtord University Press, 2a ed.,1991, p.96.

Durante toda a Idade Média e ainda na época da expansão portuguesa, o Cataio simbolizará o reino e a sociedade ideais, quer pela sua tolerância, quer pela sua riqueza, não obstante a constante flutuação ou mobilidade da respectiva localização ao longo dos séculos, mito esse que posteriormente, e como vimos será transferido para a China. Vd. Raffaella D'Intino, op. cit., sobretudo pp. XV-XXIII e XXX-XXXVIII.

56. Vd. A. Cortesão, op. cit., p. 370, n. 387.

57. Designação de origem chinesa, utilizada por Marco Polo, de que deriva o termo Nippon, enquanto que o nosso vocábulo parece ter fido origem na palavra malaia Japun ouJapan.

58. Eunuco, membro de uma família muçulmana chinesa originária de Yunnan, viveu entre 1371 e 1435. Organizou e comandou, durante os vinte e oito anos que mediaram 1405 e 1433, sete dispendiosas, bem sucedidas e grandes (27 800 homens) expedições que levaram a frota chinesa, constituída por sessenta e duas enormes embarcações, à longínqua costa ocidental africana e à Arábia, apoiando, assim, porvia marítima, as pretensSes hegemónicas e comerciais chinesas na Indochina e contrariando o estrangulamento comercial provocado pelaocupação de vastos domínios na Ásia Central pelo terrível Tamerlão, que se preparava, mesmo, para invadir a China quando foi surpreendido pela morte em 1405.

Sobre a importância dos conhecimentos e técnicas náuticas chinesas, vejam-se algumas referências na síntese do saudoso Luís de Albuquerque sobre o "Seminário Sobre Ciência Náutica e Técnicas de Navegação dos Séculos XV e XVI", in Revista de Cultura, Macau, (3), Outubro-Dezembro de 1987, pp. 141-144 e o artigo de Joseph Needham, "Science and China's Influence on The World", in The Legacy of China, ed. Raymond Dawson, Oxford, Oxford University Press, 3a ed. 1971, pp. 234-308. Quanto ao paralelismo e comparação das navegações chinesa e portuguesa, consulte-se Orlando Ribeiro, Aspectos e Problemas da Expansão Portuguesa, pp. 75-85, apud Vitorino Magalhães Godinho, Mito e Mercadoria..., cit., p. 305.

59. Seguimos aqui as linhas mestras expostas por Roderich Ptak na conferência "O Comércio Marítimo dos Ming e o Comércio Português na Ásia: Uma Comparação"proferida em Macau no dia 27 de Setembro de 1991, posteriormente publicada na Revista de Cultura, Macau, (13/14), Janeiro/Junho de 1991, pp. 21-38, com o título "China and Portugal at Sea. The Early Ming Trading System and The Estado da India Compared".

Vd. igualmente Videira Pires, op. cit., pp. 31-32. Estimulante é a proposta, apresentada por Jorge dos Santos Alves, de desenvolvimento de estudos sobre o processo de asiatização dos portugueses e o confronto das "políticas diplomáticas genericamente coerentes e globais da Coroa Portuguesa (através do Estado da Índia) e do Império Chinês". Conjugação essa que, de alguma forma, poderá ter contribuído "para que alguns estados asiáticos estabelecessem um certo paralelismo entre aspraticas convencionais de uma e de outro e até para que "alguns acordos firmados entre os reis de Portugal e monarcas asiáticos fossem equiparados na sua indissolubilidade, e mesmo, aqui e além, tomados como uma sucessão de antigos pactos com o Império Chinês, meras formalizações de uma transferência de vassalagem de um Estado para outro" sobretudo no século XVI, "enquanto não seesfumara na memória política da Ásia marítima o prestígio dos Ming amplamente demonstrado através [das] grandes expedições oceânicas chinesas da primeira metade do século XV", como foi o caso dos reinos de Ormuz e do Sultão de Johor, que cita. Vd., pois, "Natureza do Primeiro Ciclo de Diplomacia Luso-Chinesa (séculos XVI a XVIII)", estudo incluído na recentíssíma colectânea Estudos de História do Relacionamento Luso-Chinês. Séculos XVI-XIX, por ele organizada em colaboração com António Vasconcelos de Saldanha, Macau, Instituto Português do Oriente, 1996, pp.181-184.

60. Apud António da Silva Rego, A Presença dePortugal em Macau, Lx., Agência Geral das Colónias, 1946, pp. 1-2.

61. Apud Rui M. Loureiro, Cartas dos Catívos de Cantão: Cristovão Vieira e Vasco Calvo (1524-?), Macau, Instituto Cultural de Macau, 1992, p. 11.

62. Vd. Luís Keil, Jorge Alvares. O primeiro Português Que Foi à China, inicialmente publicado em 1933, mas reeditado em Macau, Instituto Cultural de Macau em 1990, edição a que nos reportamos, p. 9.

63. E rapidamente perceberam a necessidade de se estabelecerem nesse porto, como bem demonstram as constantes instruções do Rei D. Manuel ordenando desde 1505 aos seus homens que descobrissem"assim a Malaca e a quaisquer outras partidas que não forem sabidas". Neste contexto, a primeira tentativa portuguesa para alcançar Malaca, frustrada aliás, ficou a dever-se, em 1506, a Francisco Pereira, Estevão de Vilhena e a um filho Gaspar da Índia — o judeu que foi com Vasco da Gama para Portugal —, o qual serviu de intérprete. A segunda, precisamente aquela que referimos atrás, concretizou-se em 1509, sob o comando de Diogo Lopes de Sequeira. Não obstante o bom curso dos contactos iniciais, o entendimento gorou-se e a armada teve de regressar à índia deixando alguns portugueses prisioneiros em Malaca.

Face à exposta dificuldade no estabelecímento de relações com este entreposto e à situação criada durante a estadia de Diogo Lopes de Sequeira, Afonso de Albuquerque decidiu assumir pessoalmente o comando de uma terceira expedição, em 1511, do que resultou a conquista da cidade. Refira-se o interesse que o local despertava junto dos castelhanos, acrescido do facto de argumentarem estar dentro dos limites atribuídos ao seu país pelo Tratado de Tordesilhas, o que terá constituído um dos motivos que levaram Aíbnso de Albuquerque a agir rapidamente e a consumar a conquista de Malaca. Vd., a este propósito, Luís Filipe R. Thomaz, op. cit., pp. 297-298,494-497,546-547,563-564 e 582-584 e João Paulo Oliveira e Costa, "A Coroa Portuguesa e a China (1508-1531) — do Sonho Manuelino ao Realismo Joanino" naja referida colectâneaEstudos de História do Relacionamento..., cit., pp. 15-16, de onde retirámos a citação supra do regimento dado a D. Francisco de Almeida.

64. Como se infere dos documentos chineses analisados por K. C. Fok, art. cit., pp. 6-7, acerca da "irreverência bárbara" dos portugueses, desafiando as "leis e regulamentos burocráticos chineses". Vejamos, pois, como, a partir das queixas do enviado do rei de Malaca, deposto pelos portugueses, os censores Qiu Daolong e He Ao reportam ao imperador chinês, dizendo-nos o primeiro deles:"Malaca era um estado vassalo que tinha recebido o direito de governar a si próprio, mas os estrangeiros, portugueses, ousaram anexar o seu território e, além disso, de nos seduzir com a esperança de lucros por forma a que lhe déssemos o direito de governar e de nos pagarem tributos. Não devemos nunca aceitar tal pretensão, nem receber o seu enviado. Temos de lhes dizer claramente se os consideramos obedientes ou recalcitrantes. Devemos exigir que devolvam a Malaca o território ocupado; só depois disto é que devemos deixá-los pagar-nos tributos. Caso se mantenham renitentes em desistir daqueles erros, devemos distribuir manifestos por todos os estados vassalos estrangeiros para dar a conhecer os seus crimes, devendo-se enviar expedições punitivas contra eles."

65. Damião de Goes, Chronica do Felicissimo Rei Dom Manuel, Lisboa, 1567, Parte III, Cap. XVII, fol. 35 e 36, apud Luís Keil, op. cit., p. 9, n. 2. A 1a ed., da responsabilidade de Francisco Corrêa, é constituída por dois volumes saídos em 1566 e 1567.

No respeitante às fontes chinesas, consulte-se a nota anterior.

66. Na qualidade de feitor de um junco, adquirido no ano anterior no Pegu, onde também se havia deslocado com o cargo oficial de escrivão da embarcação. Ambos estes navios, tal como outros enviados de Malaca nos primeiros anos da administração portuguesa, foram armados a meias entre a Coroa portuguesa — neste caso concreto pimenta da Índia, cravo de Pacém e outras especiarias — e Nina Chatu, salvaguardando embora a bandeira e os direitos do rei de Portugal (vd. Luís Filipe R. Thomaz, op. cit., pp. 307; 416 e 498-499). Sabemos que deverá ter regressado a Malaca por volta de Março-Abril de 1514; que em 1519 voltou a Tamão na frota de Simão de Andrade e que em 1521 participou no combate do Pago contra o rei de Bintão, o antigo senhor de Malaca. Tais serviços mereceram-lhe a nomeação para o cargo de escrivão pelo capitão de Malaca, Jorge de Albuquerque.

Viria a falecer na China, aonde fez terceira viagem, provavelmente em Tamão, aos 8 de Julho de 1521, como atesta João de Barros, Ásia. Décadas, III, vi, II, fazendo jus à sua memória: "(...) e foi enterrado ao pé de um padrão de pedra com as armas deste reino, que ele mesmo Jorge Alvares ali pusera um ano antes que Rafael Perestrelo fosse àquelas partes; no qual ano que ali esteve ele tinha enterrado um seu filho, que lhe faleceu. E pero (ainda que) aquela região de idolatria coma o seu corpo, pois por honra da sua pátria em os fins da terra pôs aquele padrão, não comerá a memória de sua sepultura, enquanto esta nossa escritura durar", apud Manuel Teixeira (comp.), Antigos Navegadores e Marinheiros Ilustres nos Monumentos e Toponímia de Macau, Macau, Obra Social dos Serviços de Marinha, 1984, p. 8. A cidade de Macau perpetua a lembrança de Jorge Alvares na estátua, de Euclides Vaz, fronteira ao Tribunal, erigida em 1954, e na sua própria toponímia. Para mais pormenor, vd. Manuel Teixeira, Toponímia de Macau, II, Macau, Imprensa Nacional, 1981, pp. 269-271.

Sobre a sua biografia, os estudos decisivos continuam a ser o, já referido, de Luís Keil, Jorge Álvares... e o de Artur Basílio de Sá, Jorge Álvares — Quadros da sua biografia no Oriente, Lx., Agência Geral do Ultramar, 1956, em que o destrinça dos seus homónimos. Vejam-se ainda José Maria Braga, China Landfall, 1513 — Jorge Alvares' voyage to China: compilation of some relevant material, Macau, Imprensa Nacional, 1955, sep. do Boletim do Instituto Português de Hong-Kongo, mais recente, apontamento editado por Ronald Bishop Smith, Jorge Alvares, thefirst Portuguese to sail to China: being the Portuguese text of a letter in his handwriting found in the "fragmentos" of the Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lx., Tipografia Silvas, 1972.

67. De acordo com o testemunho de Rui de Brito Patalim, à altura capitão de Malaca, apud Luís Keil, Jorge Alvares... cit., p. 9.

68. J. M. Braga, "Tamão dos Pioneiros Portugueses", in Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, Macau, (424), Julho de 1939, pp. 945-957, fixou, ao que parece definitivamente, a localização de Tamãona ilha de Lin-Tin: "Tudo indica que Tamão estivesse situado em Chu-Kiang (Rio de Cantão ou da Pérola no distrito do Rio de Este, porque é evidente que o porto de Tun-Men (ou Tuen-Moon-O conforme o dialecto usado pronunciando os sons dos caracteres chineses em português) não estivesse aonde está San-Chuan, em cuja vizinhança o mar é bravo.

É mais de crer que fosse perto de Cantão em águas calmas.

Pelo narrado por Castanheda, Goes e Correa sabemos que Tamão estava situado 1°a três léguas da costa; 2° a trés léguas de Nantó; 3° a dezóito a vinte léguas de Cantão.

Julgamos com razão que Nantó corresponde a NamTau, cidade importante no distrito de San-On, fóra hoje dos territórios limítrofes ingleses, porque era aquí que o Pei-Wo, mencionado por Castanheda por Pio (Pi-O), residia.

É portanto necessário que encontremos uma ilha a três léguas a Oeste de Nam-Tau. Essa ilha seria Lin-Tin.

E como é que surgiu Tamão ou Tamam? Inclinamo-nos a julgar que os portugueses deram á ilha o nome do ancoradouro ou passagem Moon. Moon em cantonenese, foi certamente o som que deu mão ou man com que se formou Tamão ou Tamam. Não estamos certos sôbre qual foi o dialecto falado com os primeiros portugueses, mas o porto era chamado Tuen-Moon-O, do "Tung-Koon-Hsien-Chi", citado acima, e confirmado por Tien-Tsê-Chang, pág. 36 do livro referido. [op. cit.]

Éste devia ser o nome dado ao ancoradouro e naturalmente os portugueses deram à ilha o nome do ancoradouro. (...)

Ilha de Lin-Tin, a três léguas da ilha de Tai-Shan, a três léguas da costa e a 20 léguas de Cantão, Tudo no ancoradouro de Tuen-Moon, passagem aonde era controlado o tráfico marítimo e fluvial, nome ainda hoje usado pelos homens de mar da localidade."

Braga rebate, assim, a opinião de Andrew Ljungstedt, "Esboço Histórico dos Estabelecimentos Portugueses na China por[...]", in Echo Macaense, Macau, 1893, p. 382, que situara "na costa NO. de Sanchuang", esse "pÔrto afamado, aonde afluíam negociantes chinas estrangeiros para ali fazerem as suas transacções. João de Barros e outros historiadores o designavam pela palavra malaia Beniaga ou Veniaga, que significa um mercado ou lugar para negócios comerciais", —opinião que, segundo Braga, terá induzido em erro historiadores como Danvers, Mayers, Morse, Colomban, J. J. More, para além de Levy Gomes, Montalto de Jesus e — acrescentamos nós — o próprio autor da Enclycopaedia Sinica, que o refere como "the habour on the north-west of the island of Sancian, St. John, or Shan shan, the only spot where foreign trade was permitted till 1554, when Lampacao was substituted. The name is sometimes used for the whole island", cit., p. 542.

Já Luís Keil, Jorge Alvares... cit., defendera, em 1933, posição idêntica à de Braga, que será igualmente secundada por Luís Gonzaga Gomes "Chegam os Portugueses, Pela Primeira Vez, à China", in Boletim do Instituto Luís de Camões, Macau, rol. I, (3), Julho de 1966, pp. 267-285, sobretudo nas pp. 271 e 277-8, e por Manuel Teixeira, de quem se pode consultar, por exemplo, Primórdios de Macau, Macau, Instituto Cultural de Macau, 1990, p. 8. Também Benjamin Videira Pires, op. cit., p. 35, diz trata-se de T'ün Mun, a actual Castle Peak.

Contudo são inúmeras as designações ocidentalizadas utilizadas para este local: Tamau, Tamang, etc... segundo uns, pela corrupção dos vocábulos Ta ngao ou Ta ao (Enciclopaedia... cit.), segundo outros derivado de Tong-men (AIbert Kammerer, La Découverte de Ia Chine par les Portugais au XVIème Siècle et La Cartographie des Portulans, avec des notes de toponymie chinoise par Paul Pelliot avec XXIII planches et trois tableaux dont un en grand format, Leiden, E. J. Brill, supl. aoT'oung Pao, rol. XXXIX, 1944, p. 10).

69. Como sublinha, a partir de T'ien-Tsê Chang, op. cit., Rui Manuel Loureiro, Cartas dos Cativos.... cit., p. 12, de quem, por comodidade, transcrevemos a referência e a respectiva tradução: "os Fo-lang-chi (isto é, os Portugueses) levantaram um "monumento de pedra" em Tun-mên, "depois do período reinante de Chêng-tê ter começado."

70. Rui M. Loureiro, Cartas dos Cativos..., cit., p. 13.

71. Tomé Pires (ca. 1468- ca. 1527 ou 1540), o já nosso conhecido autor da Suma Orientalque, depois de ter sido boticário do malogrado Príncipe D. Afonso, filho de D. João II, falecido em 1491, veio para a Índia em 1511 como "feitor das drogas", sendo-o, logo no ano seguinte, da cidade de Malaca. Dai, viajou em 1513 até Java na frota comandada por João Lopes de Alvim, com a incumbência de, na sua qualidade de feitor, ir buscar especiarias.

Haveria de desempenhar, como se sabe, a difícil missão de ser o primeiro embaixador português à China em 1517, onde desapareceu provavelmente cerca de 1527 (vd. R. M. Loureiro, O Manuscrito... cit., p. 25).

As razões pelas quais foi escolhido para tal missão dá-no-las João de Barros: "(...) E posto que não era homem de tanta qualidade, por ser boticario e servir na Índia de escolher as drogas de botica que haviam de vir pera este reino, pera aquele negócio era o mais hábil e auto que podia ser; porque, alem de ter pessoa, e natural descrição com letras, segundo sua faculdade, e largo de condição e aprazível em negociar, era mui curioso de inquirir, e saber as cousas, e tinha um espírito vivo para tudo", apud Armando Cortesão, op. cit, pp. 22-23, mas consultem-se também as pp. 21-65.

De reter a interpretação complementar de R. M. Loureiro na obra supra-mencionada, p. 24, de que a escolha de um embaixador de baixa condição, como era a de Tomé Pires, teria sido ponderada como uma perda menor, caso se verificasse qualquer mau resultado da embaixada, como de facto veio a acontecer. Tal risco não era de forma alguma desconhecido nem dos oficiais régios, nem do próprio Tomé Pires, como já vimos.

Uma actualização, quer da temática, quer da bibliografia disponível, é-nos dada por Rui M. Loureiro, não apenas na já referida obra, pp. 13-26, como ainda na sua edição das Cartas dos Cativos..., cit..

A reedição do folheto de A. Cortesão, Primeira Embaixada Europeia à China. O boticário e embaixador Tomé Pires e a sua "Suma Oriental", Macau, Instituto Cultural de Macau, 1990, se bem que nada traga de novo relativamente à introdução à edição portuguesa da Suma Oriental, mais desenvolvida e redigida posteriormente como se sabe, apresenta a vantagem de incluir uma tradução chinesa do mencionado estudo.

Para uma versão chinesa dos acontecimentos, publicada durante a dinastia Ming (1621), veja-se a tradução de William Frederick Mayers, "First Arrival of the Portuguese in China", in Notes and Queries on China and Japan, I, Hong Kong, 1868, pp. 129-130, citada por Cortesão, A Suma..., cit., p. 27, n. 28. Vd., ainda, K. C. Fok, art. cit..

Apenas uma nota final para referir que também a figura de Tomé Pires é relembrada em Macau onde existe uma rua com o seu nome. A este propósito, consulte-se Manuel Teixeira, Toponímia..., cit., II, pp.271-272.

72. Embora A. Cortesão, A Suma..., cit., p. 34, admitisse, baseando-se em Gaspar Correia, que Tomé Pires teria escrito um livro específico sobre a China, Rui Loureiro, O Manuscrito..., cit., p. 30, mostra-se peremptório em afirmar que a alusão do cronista se refere à Suma Oriental.

73. Por carta de 7 de Março de 1521, transcrita no apêndice documental (n° 3) que João Paulo Costa anexa ao art. cit, pp. 64-65.

Quanto à biografia de Martim Afonso de Melo Coutinho consulte-se a obra supra-mencionada, pp. 30 e ss, bem como a bibliografia nela indicada.

74. Sobre este assunto, veja-se o já citado estudo de João Paulo Costa e a documentação que publica em apêndice. Mas não podemos deixar de salientar o mencionado lamento de Martim Afonso de Melo a D. João III, no regresso da sua frustrada expedição à China, que bem mostra a referida inadaptação: "porque tam cego vinha das informações que lá tinham dado a el-Rei vosso pai que santa glória haja que me parecia que ao menos a metade seria verdade até que vi de tudo o contrário ". Acusa, ainda, os informadores da Coroa de haverem julgado "as forças dos chins pelos almíscares que pesavam e não pelos pelouros de ferro coado que lhe[s] viam fazer", apud João Paulo Costa, art. cit., pp. 4 e 48. Os interessados poderão consultar a transcrição integral, e paleográfica, deste documento, datado de Goa, 25 de Outubro de 1523, que constitui o doc. n° 9 do já mencionado apêndice, pp. 75-81.

Para uma visão global sobre o assunto e uma tentativa de classificação e periodização do relacionamento luso-chinês, tal como de identificação dos respectivos agentes, veja-se o interessante e já mencionado trabalho de Jorge dos Santos Alves "Natureza do Primeiro Ciclo de Diplomacia...", cit., pp. 179-218.

75. Para as diferentes designações tais como Hoi-Kiang, Ho-Keang, Ho-Keng (cf. n. 2), e, sobretudo, para a inexistência de um estudo aturado e comparativo sobre a nomenclatura dos diferentes nomes chineses para Macau (cf. n. 101) e outros locais (cf. n. 68), veja-se o bem documentado trabalho de José Maria Braga, "The Western Pioneers and Their Discovery of Macau, in Boletim do Instituto Português de Hong-Kong, Hong-Kong, (2), Setembro de 1949, pp. 7-214, sobretudo a n. 110 na p. 173, e as pp. 103-104 para este caso concreto, mas a obra de apoio fundamental continua a ser o já referido trabalho de Albert Kammerer, La Découverte de Ia Chine..., cit..

76. Os autores chineses, como por exemplo, Yuan Ban Jian e Yuan Gui Xiu, A Concise History of Macau, Hong Kong, Zhong Liu Publisher, 1988, pp. 12-15, apontam geralmente a data de 1553 (32° ano de Chia-ching), preferindo referenciar as primeiras aportagens dos portugueses a Macau, de acordo com a obra Ou-Mun Kei-Leok. Monografia de Macau, de Tcheong-U-Lâm e Ian-Kuong-Iâm. Repare-se, no entanto que a versão portuguesa de Luís Gonzaga Gomes, Macau, Tipografia Mandarim, 1979, p. 104, indica incorrectamente o ano de 1554, quando as versões chinesas da mesma obra referidas por K. C. Fok, p. 329 e T'ien-Tsê Chang, op. cit., p. 91, indicam o ano de 1553 para a mesma citação.

Uma boa compilação de fontes chinesas sobre o assunto-e sobretudo do debate que então se produziu quanto à estratégia a adoptar relativamente à presença dos portugueses em Macau-,estàcontida nos artigos do já referido K. C. Fok,"The Ming Debate on How to Accomodate the Pormula. The Portuguese Settlement and Early Chinese Reactions", in Revista de Cultura, Macau, (13-14), Janeiro/Junho 1991, pp.328-344 (de que publicou uma versão portuguesa no n°16, Outubro/Dezembro de 1991, pp.13-30)e "The"Macau Formula"at Work-An 18th Century Qing Expert's View on Macau", in Estudos de História do Relacionamento..., cit., pp.219-234.

77. Sobre estas consultem-se, para além da bibliografia já citada, Vitorino Magalhães Godinho e Rui Manuel Loureiro. Diz-nos o primeiro, na obra Mito e Mercadoria..., cit. pp. 291-292: "Quanto à China, depois da primeira visão directa que nos dão as cartas dos cativos Cristovão Vieira e Vasco Calvo, de 1524, é um outro cativo, anónimo, que em 1554 conta em Malaca a Enformação de alguas cousas acerca dos costumes e leis do Reyno da China, e Galeote Pereira, feito também prisioneiro (em 1549) que escreve um tratado sobre a China do Sul, especialmente importante quanto à justiça, traduzido para italiano e publicado em Veneza em 1565, depois vertido para inglês (Londres, 1577) e incluído nas colecções de Hakluyt e Purchas. O Tratado em que se contam muito por estenço as cousas da China do dominicano frei Gaspar da Cruz (que utiliza Galeote Pereira) saiu do prelo em Évora em 1569, com um apêndice sobre Ormuz: foi o primeiro livro impresso na Europa sobre o Celeste Império. Descreve os costumes chineses, trata do chá, refere a Grande Muralha, trata do aproveitamento da terra, dos ofícios mecânicos, do vestuário, da administração pública, dos ritos e adorações (apesar da atitude negativa que perante eles assume); está a par da antiga expansão chinesa; são, porém, confusas (e prejudicadas pelas reminiscências clássicas) as suas noções sobre a Tartária e a Rússia, mas sabe dos costumes dos mongóis, das relações com Samarkande (e por aqui com a Pérsia e Ormuz). No conjunto, um quadro perfeitamente válido e que por longas décadas não será ultrapassado."

Este tratado de Gaspar da Cruz foi, no mesmo ano, reeditado por Rafaella D'Intino, op. cit., pp. 147-254 e por Luís de Albuquerque, Rui Manuel Loureiro e Maria da Graça Pericão, Primeiros Escritos Portugueses Sobre a China, Lx., Alfa, 1989, pp.50-186.

Por seu turno, Rui Loureiro, em artigo que tivémos a oportunidade de ler já na fase final de revisão deste texto, aborda o tema, completando-o com outras citações. Vd. "Imagem da China na Cultura dos Descobrimentos Portugueses" in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (23), Abril/Junho de 1995, pp. 13-18. Ao mesmo autor se devem, para além da bibliografia já citada e da versão portuguesa, e respectiva edição, da parte do De Missione Legatorum laponensium ad Romanam Curiam respeitante à China, a partir da edição inglesa (1599), com o título Um Tratrado Sobre o Reino da China dos Padres Duarte Sande e Alessandro Valignano (Macau, 1590), Macau, Instituto Cultural de Macau, 1992, dois volumes não publicados da sua dissertação de doutoramento intitulada A China na Cultura Portuguesa do Século XVI — Notícias, Imagens e Vivências, defendida na Faculdade de Letras de Lisboa em 1995, mas dela apenas pudémos ler o que pelo autor tem vindo a ser divulgado.

78. Fernão Mendes Pinto (ca. 1510-1583) era natural de Montemor-o-Velho, onde nasceu entre 1509 e 1514 no seio de uma família de parcos haveres. Muito jovem, com cerca de dez ou doze anos, foi viver para casa de um tio em Lisboa, onde serviu a vários fidalgos, nomeadamente como moço de câmara de D. Jorge, 2° Duque de Coimbra, bastardo de D. João II. Da capital partiu para a Índia em 1537, tendo viajado durante aproximadamente 21 anos pelo Oriente, onde foi um pouco de tudo, até noviço da Companhia de Jesus. É digno de nota o relato que o P. e Aires Brandão nos dá da sua empolgada decisão -- à vista do cadáver incorrupto do apóstolo, recém-chegado à Índia nesse Dezembro de 1554 --, de seguir as pegadas de S. Francisco Xavier, com quem tantas dificuldades passara e tantas vezes viajara por estas longínquas terras. Todo o documento, que nos fornece interessantes informações sobre o nosso autor, é bem revelador do carácter inflamado de Fernão Mendes Pinto, que o P. e Brandão descreve como um homem que "avia muitos annos que andava n'esta terra e continuadamente muito versado em chatinarias e tratos, acquerindo asi muito dinheiro, tratando do Japão pera a China e pera Peru (sic) de maneira que forão muitos os annos que n'isto gastou." E mais adiante, põe na boca de Fernão Mendes Pinto, o que considerava serem palavras ditadas pelo Espírito Santo: "que elle o mais de seu tempo gastara em acquirir dinheiro com seus tratos e chatinarias e que já estava desposto pera se ir pera Portugal guozar d'elle, e que porem, pello que elle sentia de Japão e do muito fruitro que se lá faria, avendo quem, que elle faria huma cousa (...) se o Padre se desposesse ir pera Japão, que elle d'aquella ora despedia de si quoanto possuia e tinha, e se iria em sua companhia acabar sua vida em tão santa obra (o que este homem podia ter de seu, segundo se vio, senão honze ou doze mil pardãos): (...) E dise mais, que não tão somente o dizia asi, mas que logo o poria por obra (...) e que de quoanto dinheiro tinha tomaria sómente tres ou quatro mil pardaos, ou o que fosse necessario, os quoais levaria pera edificar huum collegio na principal cidade de Japão [...]". À medida que se prepavara a partida para o Japão, aumentava o fervor de Femão Mendes Pinto:"E porque não houvesse mais detença ou embaraço do demonio, elle começou logo a destrebuir o que tinha ganhado com tanto trabalho e perigos do corpo e alma, fazendo logo muitas esmolas a pobres e outras obras de misericordia. Mandou somente pera Portugal setecentos mil reis, ou o que for, (...) e isto pera o d'ahi darem a huuns seus parentes que elle manda. (...) Tinha muitos escravos seus cativos, aos quoais todos forrou, mandando a cada huum por si que d'ali por diante aso Deos conhecessem por Senhor. (...)

Tanto que o viso-rei soube que Femão Mendez hia pera o Japão (e não todavia o como hia, porque o encobria elle sempre) o mandou por seu embaxador pera o mesmo rei, com cartas em resposta das que lhe elle escrevera; [...].

Isto que este homem fez foi causa pera entre estes homens da India de muita admiração, porque era avido entre elles por huum dos que n'esta terra tinha mais dinheiro amoedado, estando ja de caminho pera Portugal, e fazendo-se-lhe ja a matalogem [provisão dos mantimentos] em Couchim.

(...) E vendo Fernão Mendez o que os seus companheiros fazião, não quis ficar soo sem prometer alguma cousa ao Senhor: ali lhe prometeo perpetua castidade, pobreza e obedientia, asi e de maneira que os irmãos lhe prometião, (...).

(...) D'ahi a pedaço o mandou o Padre chamar, e forão dar com ele, que estava no altar tirando dos seus dedos anees, que trazia de pedras de muito preço, e os estava metendo no braço do menino Jesu.

(...)Elle hé muito conhecido de todos os reis e senhores de Japão pela continuação que la tinha com seus tratos passados, e tido em muita conta entre elles; (...)". Texto publicado na Monumenta Xaveriana, Tomus II, Fasc. VI, Annus 21, Fasc. 242, Febr. 1914 (59, Frater Aires Brandão Sodalibus Societatis, Goa 23 Decembris 1554) e citado a partir da transcrição inserta na "Introdução" à 8a edição completa em língua portuguesa da Peregrinação, Porto, Portucalense Editora, 1944, I, pp. XIV-XVII, preparada e organizada por Costa Pimpão em colaboração com César Pegado, a que se reportam todas as nossas citações.

Claro que em breve "todos estes fervores se vierão depois a esfriar & finalmente se desvenacerão", como bem salientou o P. e Francisco de Sousa no seu Oriente Conquistado..., 1a parte, p. 110, apud"Introdução", cit., p. XVIII, e acabou por deixar a ordem, por motivos e em condições que ainda não estão completamente esclarecidos.

Será aquela a última viagem do aventureiro ao Japão, que regressará a Lisboa em 22 de Setembro de 1558. Uma vez em Portugal fixou residência em Almada, casou-se com Maria Correia de Brito, de quem teve descência, à qual terá legado a sua Peregrinação -- escrita de memória anos após o retorno à Pátria. Cumprindo uma disposição testamentária, entregaram-na, por sua vez, as filhas de Fernão Mendes Pinto à Casa dos Penitentes de Lisboa, que se encarregou de a fazer editar somente mais de trinta anos após a morte do autor, ocorrida em 8 de Julho de 1583, precisamente no ano em que os "serviços que.., tem feytos nas partes da Imdia" lhe foram finalmente reconhecidos pela coroa portuguesa, que então lhe atribuiu uma tença de dois moios de trigo.

79. Maquao, Ama cuao, Amaquá mas também Amaquam, segundo Graciete Batalha, "Este Nome de Macau...," in Revista de Cultura, Macau, (1), Abril/Junho, 1987, p. 12. Cf. n. 75.

80. Foi uma uma obra amplamente traduzida logo a partir do século XVII, durante o qual se publicaram seis versões espanholas, três francesas, duas holandesas (incompletas) e alemãs, e três inglesas (incompletas), havendo muitas outras posteriores. Cf. Francisco Leite de Faria, As Muitas Edições da "Peregrinação" de Fernão Mendes Pinto, Lx., Academia Portuguesa de História, 1992 e"Nova Tradução Holandesa do Livro de Fernão Mendes Pinto", in Revista da Biblioteca Nacional de Lisboa, Lx., 2a S., vol. 8, (1), Janeiro/Junho 1993, pp.247-250. Igualmente úteis para este e outros domínios, e nomeadamente para a referência dos estudiosos da Peregrinação e do seu autor, são as indicações incluídas por Daya de Silva emThe Portuguese in Asia. An annotated bibliography of studies on Portuguese colonial history, 1498-C.1800, Zug (Switzerland), IDC, 1987, n° 372, pp. 53-55 e Henry Scholberg (et all.), Bibliography of Goa and the Portuguese in lndia, New Delhi, Promilla & Co., Publishers, 1982, pp. 136-141.

Em inglês temos, por exemplo, a bem antiga tradução de Henry Coger, publicada em 1653 e reeditada em 1969, Voyages and Adventures of Femand Mendes Pinto. Written originally by himself in the Portuguese tongue, and dedicated to the Majesty os Philip, King of Spain..., mas a única considerada fiel, para além de profusamente anotada e trabalhada, é a de Rebecca Catz, The Traveis of Mendes Pinto. Fernão Mendes Pinto, Chicago, University of C. Press, 1989. A esta autora se deve igualmente a contestação da ideia, veiculada por autores chineses, que liga Fernão Mendes Pinto à pirataria, no artigo "Fernão Mendes Pinto, um pirata? Mas que absurdo!", in Revista de Cultura, Macau, (5), Abril/Junho de 1988, pp. 69-74. Contudo, para uma relativização de tão complexo assunto, e para a compreensão da bem frequente indistinção chinesa entre pirataria e comércio ilegal, vejam-se Roderich Ptak, "Piracy along the Coasts of Southern India and Ming-China: Comparative Notes on Two Sixteenth Century Cases" e Luís Filipe F. R. Thomaz"Do Cabo Espichel a Macau: vicissitudes do corso português", in As Relações Entre a Índia Portuguesa, a Ásia do Sueste e o Extremo Oriente. Actas do VI Seminário Internacional de História Indo-Portuguesa, Macau/Lx., 1993, pp. 255-273 e 537-568.

Jin Guoping e Zhang Zhengchun preparam uma tradução da Peregrinaçãopara chinês, tarefaimensa, mas de há muito necessária tanto pelo próprio mérito da obra, como para o esclarecimento de alguns mal-entendidos. Contribuirá, sem dúvida, para uma melhor compreensão, por portugueses e chineses, deum passado em muitos aspectos comum. Apurámos, entretanto que os capítulos referentes à China estão a ser traduzidos por Wang Suo Yin a fim de integrarem uma antologia de textos de viajantes portugueses na China a ser publicada em 1997 na Biblioteca Básica de Autores Portugueses, que, sob o patrocínio do Instituto Cultural de Macau, tem vindo a divulgar a nossa literatura junto do público chinês.

81. Há referências a um primo, Francisco Garcia, e a dois irmãos de Fernão Mendes Pinto, Álvaro e António, que também circularam pelo Oriente, tendo mesmo um destes sido martirizado pelo rei de Bintão ao recursar-se a renegar a fé católica e a converte-se ao islamismo. Vd., por exemplo, a mencionada Introdução" aPeregrinação, cit., p. XI.

82. Como ele próprio nos diz: "(...) & não sem alguns sobresaltos & perigos da vida me quis tambe levar às partes da India, onde em lugar do remedio q eu hia buscar a ellas, me forão crecendo com a idade os trabalhos, & os perigos." E, mais adiante, "& perigos da vida q passei no discurso de vinte & hu anos em q fuy treze vezes cativo, & dezasete vendido, nas partes da India, Etiopia, Arabia felix, China, Tartaria, Macassar, Samatra, & outras muitas provincias daquelle oriental arcipelago, dos confins da Asia, a q os escritores Chins, Siames, Gueos, Elequios, nomeão nas suas geografias por pestana do mudo (...)", op. cit., I, pp. 1-2.

83. (...) porque o Autor soube imprimir a tudo quanto quis contar-nos uma aparência verosímil de coisa vivida, geralmente convincente, mesmo quando descreve regiões que não visitou, ou inventa situações e personagens", como nos dizem António José Saraiva e Óscar Lopes, História da Literatura Portuguesa, Porto, Porto Editora, 5a ed., s. d., p. 312. Vd. ainda, e mais uma vez, a já referida "Introdução" à edição da Peregrinação, sobretudo pp. XLI-LXXXVIII; Armando Cortesão, A Suma.... cit., pp. 60-61 e, para uma leitura mais actual, Rui Manuel Loureiro, "A China de Fernão Mendes Pinto, entre a realidade e a imaginação", in Estudos de História doRelacionamento..., pp.137-177.

84.0p. cit., p. 312.

85. Vd. por exemplo T'ien-Tse Chang, op. cit., pp. 75-80. Um recente e importante contributo para esta polémica é o estudo comparativo das fontes portuguesas e chinesas elaborado por Jin Guoping e Zhang Zhengchun, "Liampó Reexaminado à Luz de Fontes Chinesas" in Estudos de História do Relacionamento..., cit., pp. 85-135.

86. Vitorino Magalhães Godinho, Mito e Mercadoria..., cit., p. 587 quase que chega a afirmar que Fernão Mendes Pinto nunca veio à China. Contudo os estudos mais recentes de Rui Manuel Loureiro, nomeadamente "A China...", cit., pp. 150-151, relativizam essa suposição, considerando-o um profundo conhecedor do litoral chinês entre Cantão e Liampó, mas negando peremptoriamente as suas incursões pelo interior do Império. Estimulante é ainda o desenvolvimento da hipótese apresentada por Michel Cartier no IVe Colloque International de Sinologie de Chantilly e publicada com o título de "Voyage à travers une Chine imaginaire: La Pérégrination de Fernão Mendes Pinto", Paris, 1991, apud op. cit., p. 151 e 167, que Rui Loureiro nos dá, idem, pp. 163-169, do propósito de Fernão Mendes Pinto em fazer coincidir estas viagens imaginárias com a geogafia da China conhecida à época pelos portugueses.

87. Dada a imensidão da bibliografia sobre Fernão Mendes Pinto, remetemos o leitor para, além da já citada, os estudos de Christovam Ayres, Jordão de Freitas, D. Manuel, Visconde de Lagoa, Adolfo Casais Monteiro, Armando Cortesão, Fidelino de Figueiredo, Hernâni Cidade, António José Saraiva e Georg Schurhammer entre outros. Mais uma vez uma referência especial a Rui Loureiro "A China...", cit., pp. 157-177, onde menciona as fontes possivelmente utilizadas por Fernão Mendes Pinto para a redacção da sua Peregrinação, incluindo as chinesas, ao que parece ainda não identificadas.

88. Vd. Georges Le Gentil, Les Portugais en Extreme Orient: Fernão Mendes Pinto, un précurseur de l'exotisme au XVIe Siècle, Paris, Hermann, 1947 e de novo Rui Manuel Loureiro nomeadamente em "A China...", cit., pp. 160 e ss.

89. Camões, que terá vivido entre ca. 1524/5 e 1580, não obstante possuir profunda erudição e conhecimentos dos clássicos, seguiu a carreira das armas, que o levou até Marrocos, onde, na sequência de um combate, perdeu a vista direita. Boémio, desregrado e inadaptado, são inúmeras as referências a motins e rixas em que, por diversos motivos -- e não poucas vezes os amorosos —, se terá envolvido, os quais lhe terão valido diversas prisões e desterros, quer em Portugal, quer na Índia. Estas situações reflectem-se aliás na sua obra -- a par de uma vertente lírica inultrapassável — onde é patente a constatação amarga do desconcerto do mundo, ou seja, a desfasagem sentida entre as suas íntimas exigências, aspirações e mérito e os meios que a fortuna sempre lhe negou para os realizar, que o levam a refugiar-se — ainda que magistralmente —num bucolismo e num culto da saudade do imaterial.

90. Depois do estudo de Jordão de Freitas, Camões em Macau, Lx., Imprensa Libanio da Silva, 1911, vd. F. G. Bell Aubrey, Luis de Camões, London, Univ. of Oxford, 1923, que, na opinião de Charles Boxer, Camões e Diogo do Couto: Irmãos em Armas e nas Letras, Lx., Sep. da revista Ocidente, número especial, Novembro de 1972, era, na altura, o melhor estudo sobre a estadia de Camões na Ásia, bem como o número comemorativo do IV Centenário da sua morte do Boletim do Instituto Luís de Camões, Macau, vol. XIV, (1/4), Primavera/Inverno de 1980.

91. A palavra Lusíadas significa os habitantes da Lusitânia — nome romano para designar parte do que é hoje Portugal —, ou seja os lusitanos. De acordo com escritores humanistas, seriam estes os descendentes de Luso, um pastor que, por sua vez, descendia de Baco, o deus romano do vinho.

Saiu em Abril de 1995 uma primeira tradução integral de Os Lusíadasem chinês, tarefa ciclópica realizada por Zhang Weimin num espaço de seis anos. A edição, que teve o apoio da Fundação Oriente, foi efectuada em Pequim pela Zhong Guo Wenlian Chuban Gongsi, mas tem, contudo, merecido algumas críticas por parte dos especialistas. Até então possuíamos apenas a versão chinesa da adaptação da obra para o público infantil, elaborada por João de Barros, Os Lusíadas Contados às Crianças e Lembrados ao Povo, que se ficou a dever a Luís Gonzaga Gomes, Pou Kuc Wan (葡國魂), Macau, Comissão Executiva do IVCentenário da Publicação de Os Lusíadas, 1972.

92. Confrontar com a postura algo mais relativizada deTomé Pires. Cf ns. 28 e 30.

93. Alusão clara à envagelização do Japão, país com o qual, à época da estada de Camões no Oriente, as relações dos portugueses e nomeadamente dos missionários jesuítas, com destaque para S. Francisco Xavier, eram não só amistosas como grandemente lucrativas e promissoras, sobretudo comparativamente à China, do ponto de vista da expansão da fé católica. Socorramo-nos mais uma vez de Rui Manuel Loureiro, Um Tratado Sobre o Reino da China..., cit., p. 14: "No último quartel de Quinhentos, a missão jesuíta no Japão, fundada por Xavier em 1549, estava florescente. No curto espaço de uma geração, os Jesuítas tinham conseguido converter mais de 150 mil japoneses ao Cristianismo, e entre eles numerosos dáimios (os senhores de Arima, Omura e Bungo, por exemplo), e tinham fundado 200 igrejas e 2 seminários." Cf. n. 108.

De Os Lusíadas, utilizámos uma vulgar edição escolar organizada por Emanuel Paulo Ramos, Porto, Porto Editora, 1990, para citar as estâncias 91, 92 e 129a 131 do Canto X.

94. Tratante, palavra que, com o tempo, foi aquirindo um certo sentido prejuratde "negociante de tretas". Cf Sebastião Rodolfo Dalgado, Glossário Luso-Asiático, New Delhi/Madras, Asian Educational Services, 1988, ed. fac-similada da original de 1919.

Mas bem exemplificativas do que acabámos de afirmar, afiguram-se-nos as palavras de Costa Pimpão na já citada "Introdução" à sua edição da Peregrinação, I, LXXX: "Fernão Mendes não esconde coisa alguma: nem a cobiça que, sob os mais variados pretextos, o levava a êle, como aos outros, a arriscar a vida, nem a coragem e o desprendimento da mesma em face do perigo, nem a sua ferocidade em face do inimigo vencido, nem o pavor da morte quando esta surge, a frio, como um espectro, nem a contrição tardia, no momento em que, longe de todo o socôrro humano, inerme, prostrado, se vê prestes a carregar para a eternidade com o pêso de todos os delitos cometidos...

Em vez da epopeia, que iguala os homens aos deuses, vemos aqui a pobre argila humana, bem decaída, atolando-se na vasa de que Deus tentara erguê-la, inteiramente "atada" a tôdas as misérias da terra (...) A Peregrinação é o reverso da medalha que estamos habituados a considerar. Ao lado da gesta e dos Acta sanctorum, ficou-nos nela a crónica miúda do chatim que se faz embaixador para melhor alcançar o privilégio do trato, e nega os direitos da mercancia para enriquecer mais depressa."

95. Sobre a concorrência, e por vezes até complementariedade, entre o monopólio comercial da Coroa e o comércio privado, uma questão sempre presente, veja-se Luís Filipe R. Thomaz, op. cit., pp. 199-206; 294; 411; 418-486; 554-555 e, sobretudo, 569-580. Mas, para o caso de Macau, o trabalho fundamental neste domínio é a obra de George Bryan Souza, A Sobrevivência do ImpérioS"Os Portugueses na China (1630-1754), Lx., Dom Quixote, 1991.

96. Carta do capitão de Malaca, Simão de Melo ao rei D. João III. Vd. Luís Filipe R. Thomaz, op. cit., p. 296.

97. Carta do capitão Martim Afonso de Melo e Castro ao rei, publicada por António da Silva Rego, Documentação para a História das Missões do Padroado Português do Oriente, vol. IX, Lisboa, Agência Geral do Ultramar, 1953, p. 539.

98. João Paulo de Oliveira Costa traz-nos, no art. cit., uma documentada contribuição sobre estes pioneiros nos mares da China, especialmente para o caso dos investidos em cargos oficiais.

99. Vd. K. C. Fok, "Primeiras Imagens...", cit., p. 7 e, genericamente, Jorge dos Santos Alves, art. cit..

100. As melhores sínteses que conhecemos sobre o assunto são a citada obra de António da Silva Rego, já em boa parte desactualizado; a dissertação de mestrado de William R. Uselis, The Origin of Macao, Universidade de Chicago, 1958, polc., editada em 1994 pelo Museu Marítimo de Macau, e o posterior artigo de Luís Gonzaga Gomes, "Teses Divergentes Sobre a Origem da Cidade de Macau", in Boletim do Instituto Luís de Camões, Macau, vol. III, (2), Verão de 1969, pp. 123-141. Embora a dissertação de doutoramento de K. C. Fok, elaborada em 1978, se intitule precisamente The Macao Formula: A Study of Chinese Management of Westerners from the Mid-sixteenth Century to the Opium War Period, o facto de não ter ainda sido publicada torna-a inacessível, aguardando-se com grande expectativa a sua edição. Por enquanto, uma introdução ao assunto pode ser feita através dos artigos já referidos.

101. Vd. Graciete Batalha, art. cit., pp. 7-15; Luís Gonzaga Gomes, "Diversos Nomes de Macau", in Boletim do Instituto Luís de Camões, Macau, vol. III, (1), Primavera de 1969, pp. 57-72; Charles Ralph Boxer, Fidalgos no Extremo Oriente, Macau, Fundação Oriente/Museu e Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1990, pp. 16-17; Soren Egerod, "A Note on the Origin of the Name of Macao", in T'oung Pao, Leiden, (47), 1959, pp. 63-66 e Manuel Teixeira, Primórdios de Macau, Macau, Instituto Cultural de Macau, 1990, pp. 11-12. Cf. n. 75.

102. Onde ainda hoje subsistem marcas profundas, mesmo ao nível do imaginário, desse contacto estabelecido há mais de quatrocentos anos, do qual poderemos considerar como momento culminante a Missão Tensho (1582-1590). Não obstante a proximidade de relações, baseadas num espírito de admiração, respeito mútuo e de intercâmbio cultural e tecnológico, que se estabeleceram no sul do arquipélago, com relevância para a ilha de Kiu-Shiu — os ocidentais — especialmente os católicos e os portugueses — viriam a ser considerados elementos perturbadores e ameaçadores da ordem estabelecida, dando origem ao fechamento do País do Sol Nascente ao Ocidente, o por demais conhecido período Sacocu (reino fechado), que vigorou entre 1641 e 1848.

Sobre os primeiros contactos, as perspectivas do Outro e a visão do Japão nos viajantes e missionários portugueses de quinhentos e seiscentos, vejam-se João Paulo A. Oliveira e Costa, A Descoberta da Civilização Japonesa pelos Portugueses, Macau, Instituto Cultural de Macau/Instituto de História de Além-Mar, 1995; Michael Cooper, "The Early Jesuits in Japan and Buddhism" e Helmut Feldmann "As disputas de São Francisco Xavier com Bonzos e Nobres do Japão relatadas por Luís Fróis S. J. e João Rodrigues S. J. ", in Portuguese Voyages to Asia and Japan in the Renaissance Period. Proceedings of the International Conference. Sophia University, Tokyo. September 24-26, 1993, s. l. n. d., Embassy of Portugal in Japan, pp. 146-161 e 282-297, respectivamente.

Uma referência especial para o número da Revista de Culturaespecialmente dedicada a "Portugal e o Japão, Séculos XVI e XVII. O Retrato do Encontro", Macau, IIa S., (17), Outubro/Dezembro de 1993.

Para uma informação mais genérica sobre a bibliografia das relações luso-nipónicas, com relevo para Macau e para Wenceslau de Moraes, consulte-se o catálogo trilingue (português, japonês e inglês)Portugal e o Japão. Nos 60 anos da morte de Venceslau de Morais, Macau, Instituto Cultural de Macau/Biblioteca Nacional de Macau, 1989.

103. Dada a extensão de temas focados nesta parte do nosso artigo, e tratando-se de uma abordagem genérica, não entraremos em detalhadas informações de carácter bibliográfico, que o avolumariam demasiado, limitando-nos a referir algumas mais recentes contribuições por nós consideradas fundamentais. Para uma informação um pouco mais detalhada no domínio da historiografia de Macau, remete-se o leitor para o nosso artigo, "História de Macau: Contributos para uma Abordagem Global", m Revista de Cultura, Macau, IIa S., (19), Abril/Junho de 1994, pp. 102-112.

104. Vd. João Paulo de Oliveira e Costa, Os Portugueses e o Japão, s. l., ed. Salvador Caetano, 1993, p. 5 e Charles Ralph Boxer, nomeadamente OGrande Navio de Amacau, 4a ed., Macau, Fundação Oriente/ Museu e Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1989, pp.148-149.

105. Era a designação dada ao conjunto dos poderes político, económico, financeiro, administrativo, judicial, militar e religioso dos territórios, feitorias, fortalezas ou simples entrepostos comerciais sob o domínio português, que se estendiam desde o Cabo da Boa Esperança até ao Extremo Oriente, delegados, a partir de 1505, pelo rei de Portugal nos vice-reis e governadores da Índia.

106. Cf. Videira Pires, A Embaixada Mártir, Macau, Instituto Cultural de Macau, 2a ed., 1988, p. 13 eCharles Ralph Boxer, OGrande Navio..., cit., pp.

107. Vd. Charles Ralph Boxer, Fidalgos no Extremo Oriente, 1550-1770. Factos e Lendas de Macau Antigo, Macau, Fundação Oriente/Museu e Centro de Estudos Marítimos de Macau, 1990, com especial destaque para os Cap. III "Fidalgos e Samurais" e Cap. VI"O Primeiro Capitão-Geral", pp. 43-60 e 103-117, respectivamente. De O Grande Navio..., cit. têm maior interesse os documentos que transcreve sob o título de "Os Privilégios e os Deveres dos Capitães-Mores da Viagem ao Japão", pp. 151-156. Uma visão e informação bibliográfica mais actualizadas estão contidas na comunicação de Vitor L. G. Rodrigues, "Os Capitães-Mores da Carreira do Japão: Ponto de Vista Sócio Económica", in Portuguese Voyages to Asia and Japan..., cit., pp.208-227.

108."Xavier, São Francisco"in Dicionário de História de Portugal, dr. Joel Serrão, Porto, Livraria Figueirinhas, 1990, vol. VI, p. 353. Cf. n. 93. Uma boa perspectiva da actividade jesuítica no Japão é-nos dada por Manuel Ferreira da Silva em "O Itinerário de uma Cristandade" in Portuguese Voyages to Asia and Japan..., cit. pp. 228-265, tal como é exemplificativa desse esforço a estatística que João Paulo Costa nos fornece na comunicação apresentada à mesma Conferência, "Os Jesuítas no Japão (1549-1598). Uma Análise Estatística", op. cit., pp. 298-333.

109. Foi bem patente esse papel de apoio relativamente ao Japão. Em 1623 edificou-se, junto a S. Paulo, o Seminário de Sto. Inado com o intuito específico de preparar religiosos para a evangelização do arquipélago, local onde se instruíram missionários e se ordenaram os primeiros sacerdotes japoneses em 1597. Também o rico comerciante e médico, introdutor da medicina europeia no Japão através de Oit. a, e pioneiro da fundação de Nagasáqui (1567-1568), o bem conhecido Irmão jesuíta, Luís de Almeida (ca. 1525-1583) ai se ordenou por volta de 1579. Acolheu ainda missionários e católicos expulsos do Japão, nomeadamente o P. e jesuíta Giovanni Nicolao, fundador de escolas de pintura Namban, a que deucontinuidade em Macau, onde, aliás, se encontram algumas pinturas dela saídas, como é o caso do retrato de S. Miguel existente no Semindrio de S. José.

Não poderia deixar de mencionar, ainda, a estadia em Macau do P. e João Rodrigues (Tçuzu), o conhecido autor da História da Igreja do Japão(1620-1633), duma gramática japonesa e organizador do dicionário Arte da Língua de Japam..., (1604), o qual viria a falecer nesta cidade e, naturalmente, a longa permanência dos legados dos dáimios ao Papa, um dos quais acabaria por se refugiar em Macau em 1614.

Vd. Manuel Teixeira, Japoneses em Macau, Macau, Instituto Cultural de Macau/Comissão Territorial para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1993.

110. Razão pela qual tiveram lugar em Macau, nos meses de Outubro a Dezembro de 1994, uma série de iniciativas comemorativas do IV Centenário da sua fundação, nomeadamente o Simpósio Internacional Religião e Cultura, dedicado à história do Colégio de S. Paulo, organizado pelo Instituto Cultural de Macau ecujas actas se encontram em vias de publicação.

A principal síntese a este respeito continua a ser, apesar de tudo, o estudo do jesuíta Domingos Maurício Gomes dos Santos, Macau Primeira Universidade Ocidental do Extremo Oriente, originalmente publicado em 1968, mas reeditado, acrescido de traduções chinesa e inglesa, pela Fundação Macau/Universidade de Macau, em 1994, por ocasião das referida efeméride.

111. Diz-nos Manuel Teixeira, Japoneses—, cit., pp. 5, 8 e 11, que, tanto o facto de os caracteres chineses estarem redigidos à maneira japonesa, como a própria utilização de crisântemos — o símbolo do Japão -- na ornamentação da fachada de S. PaulO, comprovam essa contribuição.

Muitas das mulheres casadas com portugueses, e dos filhos destes, viriam, na sequência das perseguições e expulsôes decretadas no Japão a partir de 1587 e até ao corte definitivo de relações em 1639 a ser acolhidos em Macau.

112. Vd. Manuel Teixeira, Japoneses..., cit., pp. 7-8.

113. Não pretendemos, nem nos atreverfamos, a enunciar a imensidão de bibliografia sobre o assunto, sendo conhecidos do público académico e interessado os mais proeminentes especialistas e as principais fontes para o estudo da história e da acção multifacetada dos jesuftas no Oriente. Limitamo-nos, por isso, e receando tratarem-se de contributos, que reputamos de importantes, ainda não grandemente divulgados, a referir o livro de Edward Malatesta, S. J., em colaboração com Gao Zhiyu, Departed, Yet Present. Zhalan, the Oldest Christian Cemetery in Beijing, Macau, Instituto Cultural de Macau/Ricci Institute, University of San Francisco, 1995 e o número daRevista de Culturadedicado ao assunto, "Os Jesuítas, Macau e a China. O Encontro Oriente/Ocidente", Macau, IIa S., (21), Outubro/Dezembro de 1994.

114. Tratando-se de uma língua de uma rede marítima, este português substituiu parcialmente a anterior língua de comunicação, predominantemente malaia e árabe, falada pelos pilotos que sulcavam o Índico e Pacífico. Luís Filipe R. Thomaz, De Ceuta..., cit., pp. 653-655, que descreve estas linguaefrancae e a respectiva complementariedade, sublinha que o malaio nunca perdeu a sua posição preponderante nas redes marítimas internas do arquipélago asiático, no comércio costeiro e nas relações entre os povos da região. Neste contexto, o português aparece como a língua das redes comerciais de longa distância no Índico, bem como a língua usada pelos habitantes da Insulíndia no contacto com as restantes regiões asiáticas.

115. Luís Filipe R. Thomaz, op. cit., pp. 659, sumaria a evolução deste português, como a língua de uma rede comercial, em três momentos: inicialmente como uma língua de contacto, independente das sociedades locais já que era apenas necessária nas relações com os estrangeiros; o seu uso, numa segunda fase, nos locais urbanos e suburbanos mais dependentes dessa rede comercial marítima, situação que implicou que se tornasse na língua de parte dessas populações e especialmente ligada aos espaços de adopção da religião católica. E, por fim, uma terceira fase, já posterior à perda de hegemonia marítima e à ruptura da rede comercial marítima a que se encontrava associada, como a língua de comunicação que permaneceu em espaços sociais restrictos, fenómeno frequentemente associado a uma certa aculturação sócio-religiosa.

Uma obra de apoio importante nesta área, e especialmente para o estudo desta última vertente, onde se destacam os nomes de Alan Baxter e Kenneth David Jackson, é o trabalho da autoria de Maria Isabel Tomás, Os Crioulos Portugueses do Oriente. Uma bibliografia, Macau, Instituto Cultural de Macau, 1992. Contudo, e para uma visão mais clássica, mencionem-se OS estudos pioneiros de David Lopes, AExpansão da Língua Portuguesa no Oriente Durante os séculos XVI, XVII e XVIII, Barcelos, Portugalense Editora, 1969, 2a ed.; Luís de Matos, "O Português — Língua Franca no Oriente", in Colóquios Sobre as Províncias do Oriente, 1 vol., Lx., Junta de Investigações do Ultramar, 1968, pp. 11-23; J. M. Braga, "Notes on The Lingua Franca of The East", in Renascimento, Macau, vol. I, (4), Abril de 1943, pp. 404-412.

116. onde se registam cerca de quatro mil palavras — algumas das quais de utilização circunscrita à região de Nagasáqui e outras já em desuso—, sintomáticas do tipo de contactos então estabelecidos. Veja-se o pequeno, mas interessante, artigo de Isabel Tomás "Da História À Língua -- A Influência do Português na Língua Japonesa"in Macau-Tanegashima. Teatro da História Luso-Nipónica, Macau, Direcção dos Serviços de Educação, Centro de Apoio Pedagógico-Didáctico, 1991, pp. 22-24.

117. Referimo-nos ao tráfego de cules, culis, qules, coolies na forma inglesa, que, após a abolição da escravatura negra nas colónias inglesas e na América, se desenvolveu, a partir de 1851.

Tendo-se iniciado em Amoy cerca de 1845, rapidamente se estendeu a diversos portos como Wampu, Canning, Macau e Hong-Kong, de onde partiam anualmente milhares de chineses, engajados e tratados em condições sub-humanas na maioria dos casos. Os principais destinos eram, entre outros, o Peru, Cuba, Demerara, ilha de Bourbon, Austrália, Hawai, Filipinas, Califórnia, Guadalupe e Martinica para o trabalho das plantações de açúcar, do serviço doméstico, da recolha do guano, da construção de caminhos de ferro e das fábricas, sobretudo na América central e do sul.

Em Macau desenvolveu-se por iniciativa de companhias estrangeiras que operavam no Território, não obstante o nome do macaense José Vicente Jorge (1803-1858) ser referenciado como interveniente na fase inicial. Vd. o artigo de Manuel Teixeira, "The So Called Portuguese Slave Trade in Macao", in Boletim do Instituto Luís de Camões, Macau, vol. X, (1/2), Primavera/Verão 1976, pp. 75-97, em que nos baseámos.

Desde cedo se manifestaram as preocupações dos governantes portugueses relativamente a este assunto -- que gerou acesa polémica na sociedade contemporânea, sobretudo na década de 60 (Vd., por exemplo, as posições de Marques Pereira). Viria a ser abolido no Território em Dezembro de 1873, --admitindo-se então, não só o erro que se cometera ao permiti-lo, mas também que os interesses económicos dele advenientes eram sobretudo favoráveis a Hong-Kong, e reconhecendo-se a desumanidade que o tráfego acarretava. Asim, foram realmente constantes, mas pouco eficazes cremos, as disposições regulamentadoras, tendentes a minorar as violências e extorsões do processo, decretadas em 1853, 1855, 1856, 1859, 1860; proibindo os portugueses de engajarem, 1868, 1871, 1872 e 1873.

Para uma visão da época, consultem-se António Feliciano Marques Pereira, Relatorio da Emigração Chineza e do Porto de Macau dirigido a S. Exa o Governador Geral de Macau Isidoro Francisco Guimarães, Macau, Typographia de J. da Silva, 1861 e Andrade Corvo, nomeadamente "A Emigração dos "Cúlis", in Revista de Cultura, Macau, (7/ 8), Outubro de 1988/Março de 1989, pp. 49-53 e, para uma mais recente, a obra de Beatriz Basto da Silva, Emigração de Cules — Dossier Macau 1851-1894, Macau, Fundação Oriente, 1994.

118. Sobre esta rivalidade no espaço geográfico em que Macau se insere, veja-se Beatriz Basto da Silva, "Between Goa and Macau: Portuguese and Dutch Rivalry in the Seventeenth Century", in Portuguese Voyages to Asia andJapan..., cit., pp. 116-133. Macau reflecte-o de forma indirecta um pouco por todo o lado. Para além dos casos já referidos, tomemos como exemplo o da Igreja da Penha, edificada em 1622, fruto de uma promessa da tripulação portuguesa, na viagem do Japão, uma vez livre dos ataques de um navio holandês...

119. Cf. n.54.

120. Designa-se genericamente por Guerra do Ópio uma série de conflitos que opuseram a China à Inglaterra entre 1839 e 1842, reacendidos mais tarde, no período compreendido entre 1856 e 1860. Contudo, a assinatura do Tratado de Nanquim, em 29 de Agosto de 1842, pelas consequências que teve — cedência de Hong-Kong à Inglaterra; pagamento de avultada indemnização pecuniária e reconhecimento da igualdade dos dois Estados que, daí em diante, negociariam obrigatoriamente de forma directa -- foi o golpe decisivo na política de isolamento do grande Império Celeste.

121. Benjamim Videira Pires, A Embaixada... cit., Macau, p. 117. Sobre este assunto consulte-se a obra fundamental de George Bryan Souza, A Sobrevivência do Império..., cit..

122. Empossado no cargo em Abril de 1846, foi assassinado por um grupo de chineses em 22 de Agosto de 1849, tendo captado a hostilidade da comunidade chinesa de Macau também pelo facto de ter mandado levantar as sepulturas do bairro de Mong-Há com o propósito de rasgar avenidas novas.

123. Sobre a questão da diplomacia luso-chinesa, no seu conjunto, e numa perspectiva inovadora mas predominantemente ocidental, de que nos deu as primeiras pistas em "A Primeira Década de Diplomacia Luso-Chinesa Após a Fundação de Macau", in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (19), Abril/Junho de 1994, pp. 7-12, vd. Jorge dos Santos Alves, art. cit., e a bibliografia nele referenciada relativamente a cada uma das mencionadas embaixadas. Para uma visão mais descritiva, e para além dos autores já citados, os trabalhos de Eduardo Brazão continuam a ser uma útil fonte de informação. Cf. n. 127.

124. Cf. n.120. Vd. Camões C. K. Tam, "A Disputa Sino-Portuguesa Sobre a Posse da Soberania de Macau e o Tratado e Comércio entre a China e Portugal sob o Ponto de Vista do Direito Internacional", in Revista de Cultura, Macau, IIa S., (19), Abril/Junho de 1994, pp. 80-88.

Não pretendendo entrar na discussão teórica sobre a questão dos tratados desiguais, limitamo-nos a sublinhar tratar-se de um tema quase que omnipresente na historiografia da Ásia, como ficou bem patente na recente 14th Conference of the Internacional Association of Historians of Asia, Banguecoque, 20-24 de Maio de 1996, tal como já fora objecto de viva discussão no Seminário Internacional sobre Macau e as Práticas Convencionais nas Relações Luso-Chinesas, realizado em Macau, 13-15 de Novembro de 1995.

125. De início abrindo apenas mensal, e depois diariamente, constituíram não apenas uma forma de fiscalizar a circulação de pessoas e bens entre Macau e China como um entrave à expansão e penetração territorial da primeira.

126. Vd. o estimulante trabalho pioneiro, dada a bem conseguida tentativa de integração da estrutura jurídico-institucional do Território no conjunto mais vasto do Império ultramarino português, de AntónioManuel Hespanha, Panorama da História Institucional e Jurídica de Macau, Macau, FundaçãoMacau, 1995.

127. Sobre este tema, até há bem pouco tempo insuficientemente trabalhado numa perspectiva actualizada e renovadora (vd. Tereza Sena, art. cit., p. 104), merecem destaque os estudos entretanto publicados por António Vasconcelos de Saldanha e que integram um projecto de maior fôlego sobre a Questão de Macau, em fase de conclusão, nomedamente: "O Significado e a Importância das Práticas Convencionais nas Relações Luso-Chinesas", comunicação apresentada no referido Seminário Internacional sobre Macau e as Práticas Convencionais nas Relações Luso-Chinesas; A "Memória Sobre o Estabelecimento dos Portugueses em Macau" do Visconde de Santarém (1845). Os Primórdios da Discussão da Legitimidade da Presença dos Portugueses em Macau, Macau, Instituto Português do Oriente, 1995; "Aproximar Portugal e a China num Entendimento Amistoso". As ofensivas diplomáticas chinesas para a compra de Macau — Contributo para o estudo das missões do Zongli Yamen ao Ocidente (1868-1891)", in Estudos de História do Relacionamento..., cit., pp. 279-397; "As Conferências Intergovernamentais de 1909 para a Delimitação de Macau e o seu Significado nas Relações Luso-Chinesas", in Administração, Macau, (30), Dezembro de 1995, pp. 753-776; e, para uma fase mais recente, Alguns Aspectos da "Questão de Macau" e o seu Reflexo nas Relações Luso-Chinesas no Âmbito da Organização das Nações Unidas, Lx., Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas/Centro de Estudos de Instituições Internacionais, 1995, Sep. daRevista Portuguesa de Instituições Internacionais e Comunitárias, pp. 131-208.

128. Governador de Macau entre os finais de 1966 e de 1974, a quem se ficou a dever a sua construção. Em 1994, já durante a vigência do mandato do actual governador, Vasco da Rocha Vieira, inaugurou-se a Ponte da Amizade, que também liga Macau à Taipa.

* Responsável pela Divisão de Estudos e Investigação e Publicações do Instituto Cultural de Macau. Coordenadora do Projecto de Pesquisa e Publicação de Fontes Comparadas Para a História de Macau, do mesmo Instituto. Licenciada em História (F. L. L.). Mestre em História de Portugal dos Séculos XIX e XX (F. C. S. H.). Autora da tese "A Casa de Oeiras e Pombal: Estado, Senhorio e Património". Prémio Fundação Marquês de Pombal — 1994. Ex-bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian e membro da direcção da Sociedade Portuguesa de Estudos do Séc. XVIII. Autora de diversos trabalhos de investigação sobre a estrutura político-económica senhorial; Inquisição; Regeneração, Sidonismo e Renascença Portuguesa e de textos de reflexão, opinião e divulgação sobre Macau e a sua História, tem publicação dispersa por revistas da especialidade e jornais, quer no âmbito histórico, quer no literário.

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