O Comércio

"MACAU" - UM PAINEL DE GUILHERME UNG VAI MENG

L. S. C.

Já aqui, de outra forma, o dissemos: entre as diversas expressões pictóricas, hoje, em Macau, a pesquisa da mais pura identidade macaense decantará, em lugar de destaque, a pintura de Guilherme Ung Vai Meng,

É a Macau mais típica e prestável ao traço (na alma e nos temas), é a Macau humanizada e estuante de vida que se reporta nos seus desenhos e pinturas, onde perpassam claridades, luzes, reminiscências mediterrânicas, aqui exiladas do Portugal extremo-ocidental. Ousadamente, sem complexos, também na sua mais recente experiência matérica Ung Vai Meng irá plasmar, na composição das manchas de cor, texturas e materiais, o cerne identificador de sua terra, gerada do antigo encontro de Portugal com a China.

Assim introduzimos o seu painel "Macau", vencedor do concurso da Biblioteca Nacional, e já agora instalado na parede do "hall" de entrada da sua sede.

A primeira impressão, é sentir-mo-nos "esmagados" ante a grandeza e a sugestão de força que dele se libertam.

O passo detém-se, torna-se vagaroso à intimação daquele poder que ainda nos repuxa a cabeça à viragem da escada, a reter-nos o olhar.

É um pedação de casco de um velho navio aparelhado por titãs? Ou portentoso tronco de Árvore Triste (Árvore da Vida ou de S. José) a descair à terra como reposteiros pesados, canelado de raízes, lianas ou cipós, como jugulares de seivas grossas?

É Macau; Portugal e a China; o apelo da Terra e do Mar.

Extensíssimos, os fundos terrosos de serapilheiras de sacos de arroz, tintadas de sienas, recortam um bloco da terra chinesa, cenário grandioso da mais antiga cultura agrária do Mundo.

Sobre eles, exuberante relevo manuelino do cordame emaranhado, evocação da aventura marinheira e da sua consagração na pedra de janelas e portadas magníficas.

Assim a Terra e o Mar; Oriente e Ocidente num abraço de cordas; de cordas poderosas como as da Porta dos Nós de Vila Viçosa, cordas grossas como anacondas, entrosadas em françados densos, estiradas em tensão sansónica, aqui e ali agarrotadas no sufoco dos nós - elementos matéricos inculcadores do mais impressivo dinamismo.

Ei-las que se amontoam e convergem, como à atracção de potentíssimo polo invisível, apetecendo virar o painel para lhe surpreender, nas costas, a força secreta que remove a Terra, e move navios e mares. Aí, a sede do dragão.

Poderosa sugestão da vitalidade presente com amarras ao passado, este painel é na verdade um emblema futurante de Macau, voto de coesão e de identidade.

Homenagem a povos camponeses e marinheiros, ao esforço braçal, construtivo e produtor, tamanha fábrica só não está bem onde a puseram. Uma árvore hercúlea não é para floreiras de "marquise". Heráldica para grandiosa muralha, acanha mais ainda o espaço que lhe reservaram. Melhor a veríamos numa das futuras gares marítimas, em moldura de feng-shui, a saudar os visitantes da Cidade do Nome de Deus.

Painel"Macau"de Guilherme Ung Uai Meng

desde a p. 114
até a p.