As Cartas e Escritos de Francisco Xavier são narrativas eloquentes de uma jornada pelo Oriente que absorveu toda a vida do santo. As suas experiências e idiossincrasias, valores e categorizações são apresentados num claro discurso erudito. O missionário raramente e neutro nas suas opiniões, centrado no seu objectivo omnipresente: a conversão dos povos e a expansão da Companhia de Jesus.
Qual é então a posição das mulheres, tanto no sentido coletivo quanto no individual, nas viagens e nos objetivos que são a temática central das Cartas e Escritos de Xavier? Qual é o papel das mulheres, esse termo secundário e silenciado do binómio homem/mulher, que estabelece uma dicotomia semelhante aos binómios civilizado/selvagem e europeu/nativo que pontuam as narrativas de Xavier e o contexto histórico das suas artes? As mulheres não estão ausentes dos seus escritos, mas seria ingénuo argumentar em favor da misoginia do autor tanto quanto do seu “profundo conhecimento do coração feminino”, para citar Paulo Durão em As Mulheres nas Cartas de Sao Francisco Xavier (1952).
Este artigo explora as quatro grandes categorias do feminino patentes nas Cartas e Escritos: as mulheres europeias; as mulheres orientais convertidas; as mulheres que professam outra religião; e as mulheres enquanto agentes e objetos do pecado, uma representação transversal a todas as categorias. Todas estas representações interculturais dependem do contexto, das circunstâncias e das estruturas de pensamento que o autor opta por destacar e narrar.