N. Rimsky-Korsakov: Abertura de A Noiva do Czar
Nikolai Rimsky-Korsakov (1844-1908) é um compositor representativo da música nacionalista russa do século XIX. Embora o seu grande reconhecimento no mundo da música ocidental se deva sobretudo às suas esplêndidas obras orquestrais, como as conhecidas suítes sinfónicas Scheherazade e Capriccio Espagnol, Rimsky-Korsakov dedicou a maior parte da sua energia criativa à ópera, tendo escrito 15 ao longo de toda a sua vida, nas quais se revelam plenamente o seu apuramento técnico enquanto compositor orquestral com um gosto especial em convocar diversos estilos vocais.
A ópera em quatro actos A Noiva do Czar é a décima obra operática do compositor, constituindo uma adaptação da peça homónima do dramaturgo russo Lev Mey. Baseada em factos históricos, a peça narra a tragédia amorosa de uma mulher comum de nome Marfa, durante o reinado de Ivan Vasilyevich (também conhecido como “Ivan, o Terrível”), em meados do século XVI, envenenada pouco tempo depois de se ter tornado na terceira mulher do notório tirano. A produção foi estreada na Rússia em 1899, na Ópera Privada, uma companhia fundada em 1885, por doação do empresário russo Sava Mamontov. A abertura abrange dois temas com uma forte aura russa. O primeiro tema, apreensivo e dinâmico, sugere um conflito emocional e a morte que acaba por sobrevir, sendo o segundo tema lento e cantábile, representando o romance belo, intenso, mas efémero, da protagonista.
Por Danni Liu
Texto originalmente escrito em chinês
S. Rachmaninoff: Rapsódia sobre um Tema de Paganini, op. 43
Embora a sua música seja frequentemente considerada do “romantismo tardio”, Sergei Rachmaninoff afastou-se muito dos seus compositores contemporâneos. No final do século XIX, ao invés de optar pelo frenesim poético representado por Richard Strauss ou pela ilusão utópica de Gustav Mahler, Rachmaninoff optou por uma reflexão auto-imersiva sobre o mundo espiritual da humanidade. No início do século XX, apesar de ser confrontado com novas formas musicais complexas, a introdução de novas técnicas de composição, incluindo a “atonalidade” e a “dodecafonia”, a influência de diversos estilos musicais, como o impressionismo, o expressionismo e o neoclassicismo, Rachmaninoff aderiu ao profundo lirismo e romantismo dramático herdados de Tchaikovsky. Em virtude do seu lirismo intrínseco, típico das melodias folclóricas eslavas, Rachmaninoff é aclamado como a “última glória do romantismo russo”.
O talento composicional de Rachmaninoff foi frequentemente ignorado durante a sua vida devido ao fascínio que causava enquanto pianista virtuoso. No entanto, é possível vislumbrar a sua personalidade singular, desenvolvida no contexto romântico a partir das suas composições, desde miniaturas como os 24 Prelúdios e os Études-Tableaux, a grandes obras como óperas, sinfonias e os seus quatro concertos para piano. Apesar de ter sido composta em 1934, entre as duas Guerras Mundiais, a Rapsódia sobre um Tema de Paganini evidencia poucos vestígios do primeiro conflito. Considerada o “quinto concerto para piano” do compositor, a obra é uma majestosa combinação de técnicas sinfónicas com o sofisticado virtuosismo exigido a um solista em concerto, toda ela envolta na magnificência e narratividade lógica das rapsódias. As variações ao longo do andamento único tendem, visivelmente, a assumir a forma de uma suíte, evidenciando as 24 variações do tema uma incindível coesão ao longo do desenvolvimento contínuo e enérgico dos três conjuntos de variações vagamente intervalados, como se de três andamentos se tratassem. O âmago desta rapsódia, nomeadamente o tema que dá origem às 24 variações, foi inspirada no Capricho n.º 24 de Paganini, evocando límpidas gotas de orvalho a cair sobre um tabuleiro de pedra, espalhando-se em todas as direcções através de um diálogo entre a orquestra e o piano.
Comparada com outras adaptações da peça de Paganini, tais como as Variações sobre um Tema de Paganini de Brahms e os Grandes études de Paganini de Liszt, esta recriação de Rachmaninoff assemelha-se a uma árvore de grande porte: o tema, representando o tronco, é semelhante ao original, na medida em que incorpora tanto a sua delicadeza como a sua pujança; novos rebentos de originalidade crescem a partir das variações, tal como representados na técnica de inversão utilizada na melodia harmoniosa da Variação 18, a qual cativa o coração com pureza como a luz refrescante do céu. Os frutos que absorvem a essência do universo introduzem um marcado sentido ritualístico ao citar o hino medieval Dies Iræ (Dia do Juízo Final).
Ao longo da história, alguns académicos consideraram as obras de Rachmaninoff um mau exemplo, declarando que “lhe faltava criatividade e talento, pois imitava o estilo de Tchaikovsky e seguia conservadoramente as técnicas de composição que prevaleceram no final do período romântico” e que as suas obras “são imitações emotivas, superficiais e vulgares do modernismo”. Alguns críticos chegaram mesmo a acreditar que “as suas obras seriam rejeitadas e ignoradas em menos de meio século”. Apesar de todas estas críticas, constatamos hoje que a importância de Rachmaninoff superou o teste do tempo.
W. A. Mozart: Concerto para Violino n.º 5 em Lá Maior, K. 219 “Turco”
Foi depois de ter abandonado o seu cargo na corte de Salzburgo e de se ter tornado um “músico livre” que Mozart compôs o Concerto para Violino n.º 5 em Lá Maior. Rígida e requintada, a composição transmite um abrupto contraste entre as secções fortes e delicadas. Utilizando técnicas altamente engenhosas, o compositor realça o timbre e o papel central do solo de violino, produzindo uma aura ágil e vigorosa com notas agudas de grande exuberância. Este concerto põe à prova o nível geral dos intérpretes no domínio do seu instrumento, dado o grau de exigência das técnicas típicas das obras de Mozart, incluindo a atenção à dinâmica sonora, velocidade estável, secções de bloco e contrastes de volume.
L. Bernstein: Abertura de Candide
Na década de 1950, Leonard Bernstein impressionava o mundo operático, tanto a partir do pódio, dirigindo icónicas companhias como o Teatro alla Scala de Milão, bem como a partir da sua mesa de trabalho, compondo novas óperas de dimensão diversa. Em 1953, a dramaturga Lillian Hellman sugeriu que Bernstein levasse a obra Cândido de Voltaire à cena e Bernstein convenceu-a a adaptar este conto para uma opereta neoclássica, ao invés da peça de teatro com acompanhamento musical que ela inicialmente havia ponderado. Este conto filosófico e satírico relata a série de infortúnios vivenciados pelo gentil e inocente Cândido e a sua amada, colocando em causa o optimismo leibniziano (“este é o melhor de todos os mundos possíveis”).
A estreia nova iorquina de Candide em 1956 não teve muito êxito, provavelmente devido ao tema, excessivamente rebuscado para o público. Mais tarde, Bernstein adaptou-a para diversas versões, a fim de serem apresentadas em diferentes locais, mas foi a abertura que granjeou popularidade a nível mundial. Em 26 de Janeiro de 1957, Bernstein iniciou um concerto da Filarmónica de Nova Iorque com esta abertura, convertendo-a instantaneamente numa das peças favoritas para abrir espectáculos orquestrais.
Célebre pela sua esplêndida orquestração e excelente percussão, a abertura de Candide é composta por três partes: o início, altamente expressivo, a secção central lenta e lírica e a emocionante coda.
Notas ao programa originalmente escritas em chinês e gentilmente cedidas pela Orquestra Sinfónica de Xangai (excepto notas sobre “Abertura de A Noiva do Czar” )