Numa ilha deserta sem nome, ao longo do dia um casal de idosos repete incessantemente as mesmas accões. Wang Sheng, tece tiras de bambu enquanto Qianniang vai buscar água numa cesta. Falam sem parar, mas apenas em direcção às duas cadeiras à sua frente. Um dia, convidam todos para uma visita, aguardando ansiosamente que os seus convidados lhes revelem o sentido da vida. Equanto esperam, vêem-se a “cumprimentar” velhos amigos, primeiros amores, os seus filhos e até o imperador. Por fim, quando chega um dos muito aguardados convidados, este é mudo…
A ópera experimental Kunqu As Cadeiras é uma adaptação de uma peça homónima do dramaturgo francês Eugène Ionesco, aclamado como um dos pioneiros do teatro do absurdo. Apresentada num cenário usando apenas uma mesa e duas cadeiras, a configuração mais clássica das óperas tradicionais chinesas, esta produção cria uma cena repleta de “cadeiras” e “personagens” invisíveis que vão e voltam e que podemos perceber através do canto, dos diálogos, dos gestos e acções dos actores. As alternâncias de papéis tradicionais em diferentes secções e a exploração e inovação dos estilos de canto Kunqu, revelam as diferentes relações e estatutos das personagens. Embora mantendo o toque filosófico e absurdo essencial do original, esta produção também explora as questões fundamentais da vida sobre liberdade, vida e morte, amor, entre outras.
Sejam Wang Sheng, tecendo tiras de bambu enquanto Qianniang transporta água numa cesta, no início, ou os convidados invisíveis que mais tarde imaginam, todos servem como uma metáfora para a carreira, o amor, as amizades e os laços familiares do velho casal ao longo da vida. O absurdo, o nada e a natureza antiteatral desta peça representam um enorme desafio para os intérpretes. No entanto, a configuração das cadeiras e personagens virtuais combina perfeitamente com a ópera tradicional. Os movimentos corporais ligeiramente exagerados e as mudanças emocionais naturais dos dois actores destacam a solidão do palco vazio e exteriorizam vividamente a desolação do mundo espiritual. Talvez no coração de cada um exista uma ilha deserta rodeada por vastas águas, sem qualquer barco disponível para a ligar ao mundo exterior. A “aldeia de luzes” aos olhos de Qianniang deriva da sua paixão pela vida e da pura busca do amor, que evoca algum calor e coragem entre nós, apesar do desespero e da solidão.