O Livro da Selva reimaginado

1.º Acto

O nível do mar está a subir, as águas dominam a terra e os seres humanos lutam pela sua sobrevivência em busca de terrenos mais elevados. Uma criança vê-se separada da sua família e acaba por ir parar a uma cidade inundada, abandonada pelos seus habitantes humanos. Vários monumentos foram arrancados do seu lugar e reorganizados; e animais de todas as formas e tamanhos reuniram-se aqui, formando uma aliança inquieta, enquanto tentam viver com este novo clima imprevisível, reivindicando esta paisagem urbana para si e marcando os seus territórios em bibliotecas, supermercados, edifícios governamentais e até locais de culto.

A criança é descoberta pela matilha de lobos liderada por Raksha e Rama. Raksha quer ficar com a criança, mas Rama insiste na opinião de que os seres humanos são perigosos, pelo que a criança deve ser destruída. Raksha protege Mowgli e apresenta-a a um conselho de animais, liderado por Akela, um cão, e por Chil, um papagaio que acompanha a discussão com olhos atentos a partir do céu. Os animais falam de um caçador misterioso, um ser humano que foi expulso pela sua própria espécie. O caçador voltou a estas terras e mantém os animais em constante estado de ameaça, inspirando-lhes medo. Após longa deliberação, a criança é aceite pelo conselho e inicia-se o processo para lhe atribuir um nome: Mowgli. Mowgli recebe imediatamente uma incumbência: terá de provar o seu valor e ajudar os animais na sua busca por alimentos. Talvez os instintos humanos sejam precisamente o que eles precisam.

Mowgli tem como companheiros Bagheera, uma pantera albina sequestrada que cresceu num palácio, e Baloo, um urso dançarino fugitivo. No entanto, durante a sua busca por alimentos, Mowgli é levada pelos Bandar-log, macacos de laboratório, que foram alvo de todo o tipo de experiências. Através da astúcia, os Bandar-log enganam Baloo e Bagheera e raptam Mowgli. Bagheera e Baloo têm agora de encontrar um animal capaz de causar medo aos Bandar-log. Afinal de contas, eles não são animais do mundo das árvores. Os dois procuram Kaa, um píton-das-rochas que escapou do cativeiro, mas ainda vive com os traumas causados por uma vida inteira passada atrás do vidro de uma jaula.

2.º Acto

Mowgli é levado para o covil dos Bandar-log, um edifício governamental saqueado. Os Bandar-log não são estranhos à humanidade; surgiram de laboratórios e regurgitam jingles publicitários e discursos políticos que ouviram quando estavam enjaulados. Ouviram, copiaram e imitaram os seres humanos, mas agora querem converter-se eles próprios em seres humanos. Mowgli é a peça que faltava no quebra-cabeças. Uma criança humana que os possa ensinar a tornarem-se totalmente humanos.

Com a ajuda de Kaa, Baloo e Bagheera resgatam Mowgli das mãos dos Bandar-log no momento em que ela está prestes a ajudá-los a criar o fogo: o bem mais temido da humanidade. Os animais não conseguem controlar o fogo. Os seres humanos conseguem.

Quando Mowgli é salva, o trio regressa ao conselho onde Hathi, o líder dos elefantes, lhes conta a sua história sobre os tempos em que as selvas que eles outrora conheceram foram criadas.

Mas quando o caçador finalmente invade o seu território e abate Chil, os animais sabem que isso significa o início do fim da paz que eles construíram juntos. Mowgli, lembrando-se das palavras da sua mãe ao longo da sua viagem, decide levantar-se, lutar pelos novos amigos, procurar e acabar com a selvajaria do caçador.

Quero mergulhar nos mitos de hoje e nas histórias infantis de amanhã. Por isso, quero encontrar uma maneira de pegar numa história conhecida e familiar e observá-la a partir da perspectiva das crianças de hoje, dos meus filhos, dos nossos filhos, que são e se tornarão os nossos contadores de histórias no presente e no futuro.

Porquê?

A história de O Livro da Selva sempre me foi muito próxima. Não só porque já tinha interpretado, em criança, o papel de Mowgli numa produção indiana de dança, mas, sobretudo, por causa das três lições profundas que a história continha e que, desde então, trago comigo. As lições de semelhança entre as espécies, a interdependência vinculativa entre humanos, animais e natureza e, finalmente, um sentido de família e da nossa necessidade de pertença.

Actualmente, vivemos tempos incertos, sem precedentes, não só para a nossa espécie, mas para todas as espécies deste planeta. E a causa destas dificuldades, deve-se sobretudo ao facto de que esquecemos a relação com o nosso lar, o nosso planeta. Todos nós o habitamos, todos tiramos dele e todos construímos sobre ele, mas esquecemo-nos de lhe retribuir o nosso respeito.

Por conseguinte, se queremos um futuro melhor, acredito que devemos fazer mudanças desde a base. Daí que me sinta impelido a partilhar a história – carinhosamente conhecida como O Livro da Selva – com crianças e adultos de todas as culturas, a fim de reaprender o que nós, como espécie, tão convenientemente esquecemos. E acredito que a forma mais forte e profunda de contar essa história é através da magia da dança, da música e do teatro.

O quê?

Esta produção traça a história original de Rudyard Kipling, mas esta versão em particular é a minha própria interpretação do original. Mowgli e todas as personagens conhecidas da história original estão nesta nova versão, com uma nova partitura.

Como?

Estou extremamente consciente das mensagens profundas implícitas na obra original. Mas também estou ciente da força e relevância dessas mensagens para o mundo de hoje. E sempre acreditei que, antes das palavras, estão as acções, pelo que decidi abordar esta produção com uma acção directa sobre as alterações climáticas.

As alterações climáticas estão e continuarão a afectar todas as criaturas vivas deste belo planeta. Como podemos então criar um trabalho com menos cenários, para que possamos viajar com mais leveza nas digressões? Desde o confinamento, passei a apreciar a tecnologia de uma forma que não fazia antes da COVID-19, simplesmente porque me permitiu permanecer ligado aos meus entes queridos, à minha equipa artística e ao resto do mundo. Sem a tecnologia, ter-me-ia sentido verdadeiramente sozinho.

E assim, para O Livro da Selva reimaginado, o palco está quase vazio – não existe um cenário físico tradicional. Para o conseguir, explorei o uso de tecnologia, projecções e filmes como cenário imaterial. Não nos devemos esquecer que, na maioria das vezes, grandes histórias podem ser contadas com as ferramentas mais simples. Os nossos corpos, as nossas vozes e a nossa convicção nessa história.

Por Akram Khan

Encenação e Coreografia: Akram Khan
Colaborador Criativo e Ensaiador: Mavin Khoo
Dramaturgia: Tariq Jordan
Apoio Dramatúrgico: Sharon Clark
Composição: Jocelyn Pook
Design de Som: Gareth Fry
Design de Iluminação: Michael Hulls
Cenografia: Miriam Buether
Direcção de Arte e Animação: Adam Smith @YeastCulture
Produção e Direcção de Design de Vídeo: Nick Hillel @YeastCulture
Rotoscopia e Animação: Naaman Azhari, Natasza Cetner, Edson R Bazzarin
Direcção de Ensaios: Nicky Henshall, Nico Monaco (digressão), Andrew Pan, Angela Towler
Bailarinos: Maya Balam Meyong, Hector Ferrer, Harry Theadora Foster, Filippo Franzese, Bianca Mikahil, Max Revell, Matthew Sandiford, Elpida Skourou, Holly Vallis, Jan Mikaela Villanueva, Lani Yamanaka
Apoio de Animação: Nisha Alberti, Geo Barnett, Miguel Mealla Black, Michelle Cramer, Jack Hale, Zuzanna Odolczyk, Sofja Umarik
Intérpretes de Voz: Tian-Lan Chaudhry, Joy Elias-Rilwan, Pushkala Gopal, Dana Haqjoo, Nicky Henshall, Su-Man Hsu, Kathryn Hunter, Emmanuel Imani, Divya Kasturi, Jeffery Kissoon, Mavin Khoo, Yasmin Paige, Max Revell, Christopher Simpson, Pui Yung Shum, Holly Vallis, Jan Mikaela Villanueva, Luke Watson, Alunos do 3.º ano da Escola Rambert (2021-2022)
Direcção de Produção: Farooq Chaudhry
Directora Executiva: Isabel Tamen
Directora Operacional: Mashitah Omar
Direcção Técnica: Zeynep Kepekli
Gestão Técnica: Michael Cunningham
Gestão de Produção de Digressão e Criação de Adereços: Marek Pomocki
Engenheiro de Iluminação: Stephane Dejours
Engenheiro de Som: Enrico Aurigemma
Assistência Técnica de Vídeo e Projecção: Matthew Armstrong
Assistência Técnica de Direcção de Cena: Samuel Collier

Co-produção por Curve Leicester, Attiki Cultural Society – Grécia, Hipódromo de Birmingham, Festival Internacional de Edimburgo, Esplanade – Theatres on the Bay Singapore, Festspielhaus St. Pölten, Internationaal Theater Amsterdam, Joan W. and Irving B. Harris Theater for Music and Dance – Chicago, Lincoln Center for the Performing Arts – Nova Iorque, Maison de la Danse / Pôle européen de création – Lyon, National Arts Centre – Canadá, New Vision Arts Festival – Hong Kong, Orsolina28, Pfalzbau Bühnen – Theater im Pfalzbau Ludwigshafen, Romaeuropa Festival, Stanford Live / Universidade de Stanford, Teatros del Canal – Madrid, théâtre de Caen, Théâtre de la Ville – Paris

A adaptação técnica de O Livro da Selva reimaginado é gentilmente apoiada por Les Théâtres de la Ville de Luxembourg

Com o apoio de Garfield Weston Foundation, Genesis Foundation, Angela Bernstein CBE

Apoiado por Arts Council England

Agradecimentos especiais a Tom Davis-Dunn, Pui Yung Shum, Luke Watson, Thomasin Gülgeç, Lucia Chocarro, Fukiko Takase, Vanessa Vince-Pang, Tina e Richard Fagan, Sue Buckmaster, The Coronet Theatre, Universidade de Roehampton, Sr. e Sr.ª Khan, Yuko Khan, Sayuri, Kenzo e Ayana Khan, Amanda Britton, Darren Ellis, Sharon Watson, Ann David, Anda Winters, Ella Roberts, Anna CY Chan e todos os alunos da Academia de Artes Performativas de Hong Kong que participaram nos ensaios de criação e todos os alunos do 3.º ano da Northern School of Contemporary Dance (2021-2022) e alunos do 3.º ano da Escola Rambert (2021-2022) que trabalharam com Akram na residência de I&D.

Música de Jocelyn Pook © Copyright 2022 Chester Music Limited

Música gravada por
Cantores: Tanja Tzarovska, Melanie Pappenheim, Sushma Soma, Sohini Alam, Voya Zivkovic
Músicos: Jocelyn Pook (piano, viola, voz e teclado), Mulele Matondo (guitarra e sanza), Belinda Sykes (shawm e gralla)
Gravação e Mistura: Steve Parr

“How Dare You?” (Como Se Atrevem?), Greta Thunberg, gravação das Nações Unidas
“Blah, blah, blah” (Blá, Blá, Blá), discurso de Greta Thunberg

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